Acórdão Nº 5008016-14.2020.8.24.0000 do Grupo de Câmaras de Direito Público, 22-09-2021
Número do processo | 5008016-14.2020.8.24.0000 |
Data | 22 Setembro 2021 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça de Santa Catarina |
Órgão | Grupo de Câmaras de Direito Público |
Classe processual | Mandado de Segurança Cível (Grupo Público) |
Tipo de documento | Acórdão |
Mandado de Segurança Cível (Grupo Público) Nº 5008016-14.2020.8.24.0000/SC
RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ DE BORBA
IMPETRANTE: ARLINDO RECH IMPETRADO: Presidente - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis
RELATÓRIO
Arlindo Rech impetrou mandado de segurança contra o ato mediante o qual o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina indeferiu o seu pedido de aposentadoria. Relatou que exerceu o cargo de Escrevente Juramentado da Escrivania de Paz de Salto Veloso, vinculada à Comarca de Videira, desde 1992; que, em 2016, foi designado para responder interinamente pela serventia, função que exerceu até 1º-11-2018, quando foi exonerado do cargo pela autoridade impetrada; que no prévio Mandado de Segurança n. 0687490-60.2004.8.24.0023, cuja prestação jurisdicional transitou em julgado ainda em 2006, houve o reconhecimento de seu vínculo com o Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, e desde então recolheu as contribuições previdenciárias respectivas; que, ante o julgamento da ADI n. 4.641/SC, postulou à autoridade impetrada a sua aposentadoria por idade, haja vista o parecer exarado no Processo Administrativo n. 12.036/2018 no sentido de que os respectivos requisitos já estariam cumpridos em 2-10-2013, quando completou 65 (sessenta e cinco) anos de idade e já estava no exercício do cargo há mais de um decênio; e que, então, sobreveio o ato ora impugnado, mediante o qual foi indeferido o pedido em debate com fundamento na perda da qualidade de segurado decorrente da exoneração do impetrante. Clamou a concessão da ordem, inclusive liminarmente, para lhe garantir a imediata aposentadoria e a nulidade da decisão administrativa.
Postergado o exame da liminar para após as informações (evento 11), a autoridade coatora as prestou (evento 18) defendendo a legalidade do ato impugnado.
O Estado de Santa Catarina requereu o ingresso no feito (evento 20).
A liminar foi deferida para determinar à autoridade coatora que analise o pedido de aposentação do impetrante sem considerar o óbice relativo à sua exoneração (evento 24).
Houve interposição de agravo interno (evento 33).
Ofertadas contrarrazões (evento 39), o feito ascendeu a esta Corte e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da Exma. Sr.ª Dr.ª Eliana Volcato Nunes, opinou pela concessão da ordem (evento 44).
Vieram os autos à conclusão para julgamento.
VOTO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Arlindo Rech contra o ato mediante o qual o Presidente desta Corte indeferiu o pedido por ele formulado para que lhe fosse concedida a aposentadoria por idade em razão de seu trabalho como Escrevente Juramentado na Escrivania de Paz de Salto Veloso, vinculada à Comarca de Videira, entre 1992 e 2016 e como Escrivão de Paz interino entre 2016 e 1º-11-2018, quando foi exonerado do cargo por iniciativa da autoridade impetrada.
O primeiro ponto a se considerar é que está fora de discussão a inequívoca vinculação do impetrante ao Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, decorrente da ordem concedida no Mandado de Segurança n. 0687490-60.2004.8.24.0023, cujo trânsito em julgado ocorreu ainda em 2006.
Contudo, o cerne do dissenso reside não em afronta à res judicata, restrita, claramente, ao direito a que houvesse continuidade no recolhimento das contribuições previdenciárias, mas sim em saber se a sua exoneração e a perda da qualidade de segurado impedem a sua aposentadoria.
Em regra, ex vi do art. 5º, III, da LCE n. 412/2008, a exoneração de servidor vinculado ao RPPS faz com que não mais subsista a condição de segurado e o impede de, subsequentemente, obter benefício previdenciário derivado desse regime.
A situação que emerge dos autos, contudo, é peculiar, porquanto o impetrante não gozava da estabilidade inerente ao vínculo estatutário, ou seja, sua exoneração poderia partir, a qualquer tempo, de ato unilateral da administração, sem a necessidade de vir acompanhada de especial fundamento.
O caráter híbrido das serventias extrajudiciais, a que se atribui regime jurídico misto entre o público e o privado, reflete também no regime previdenciário dos serventuários admitidos até 18-11-1994, que, conquanto demissíveis ad nutum, vinculam-se ao RPPS por força do art. 48 da Lei n. 8.935/1994. Servidores ocupantes de cargo em comissão, verbi gratia, cujo vínculo com a administração também se pode desfazer sem maiores formalidades e por iniciativa exclusiva do gestor, vinculam-se ao RGPS, e não ao RPPS.
O risco do desfazimento súbito do vínculo não pode ser desconsiderado e implica na necessidade de que se interprete cum granu salis o transcrito regramento relativamente a esses segurados em particular.
Há precedente deste Grupo de Câmaras em que se reconheceu a possibilidade de concessão de benefício do RPPS a serventuário a despeito de sua exoneração, considerando o tempo de contribuição anterior à data de modulação de efeitos da decisão do Excelso Pretório na ADI n. 4.641/SC. Veja-se:
ESCREVENTE JURAMENTADO - MODULAÇÃO DE EFEITOS NA ADI 4.641/STF - APOSENTADORIA - PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO - IDADE MÍNIMA ATINGIDA DEPOIS - ORDEM CONCEDIDA. O STF (ADI 4.641) reconheceu a inconstitucionalidade da lei local que garantia aos cartorários extrajudiciais a aplicação do sistema previdenciário próprio; mas permitiu que aqueles que atingiram os requisitos para conquista de benefícios até a publicação do acórdão (26 de março de 2015) tivessem a prerrogativa respeitada. A Administração obedeceu ao comando, ainda que tenha denegado a aposentadoria: a impetrante não tinha idade bastante no momento em que cessou seu liame contributivo. A autora, todavia, completou o tempo de vida necessário durante o prazo da modulação. Há viabilidade - na linha de compreensão do STJ a propósito do regime comum - de implemento gradativo dos requisitos para aposentadoria. Segurança concedida. (TJSC, Mandado de Segurança n. 4004821-09.2018.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Grupo de Câmaras de Direito Público, j. 23-5-2018).
Do corpo do acórdão, extrai-se:
1. Está em xeque decisão do Presidente do Tribunal de Justiça que negou aposentadoria a escrevente juramentada.O assunto é sempre melindroso, mas neste mandado de segurança se podem abreviar os limites do debate.O ato questionado não nega aprioristicamente a possibilidade de a demandante obter a inativação pelas regras do Regime Próprio de Previdência Social. A rejeição veio da conclusão de que, na situação específica, a interessada não atingiu os requisitos temporais expostos constitucionalmente como necessários para atingir a prerrogativa.A possibilidade de...
RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ DE BORBA
IMPETRANTE: ARLINDO RECH IMPETRADO: Presidente - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis
RELATÓRIO
Arlindo Rech impetrou mandado de segurança contra o ato mediante o qual o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina indeferiu o seu pedido de aposentadoria. Relatou que exerceu o cargo de Escrevente Juramentado da Escrivania de Paz de Salto Veloso, vinculada à Comarca de Videira, desde 1992; que, em 2016, foi designado para responder interinamente pela serventia, função que exerceu até 1º-11-2018, quando foi exonerado do cargo pela autoridade impetrada; que no prévio Mandado de Segurança n. 0687490-60.2004.8.24.0023, cuja prestação jurisdicional transitou em julgado ainda em 2006, houve o reconhecimento de seu vínculo com o Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, e desde então recolheu as contribuições previdenciárias respectivas; que, ante o julgamento da ADI n. 4.641/SC, postulou à autoridade impetrada a sua aposentadoria por idade, haja vista o parecer exarado no Processo Administrativo n. 12.036/2018 no sentido de que os respectivos requisitos já estariam cumpridos em 2-10-2013, quando completou 65 (sessenta e cinco) anos de idade e já estava no exercício do cargo há mais de um decênio; e que, então, sobreveio o ato ora impugnado, mediante o qual foi indeferido o pedido em debate com fundamento na perda da qualidade de segurado decorrente da exoneração do impetrante. Clamou a concessão da ordem, inclusive liminarmente, para lhe garantir a imediata aposentadoria e a nulidade da decisão administrativa.
Postergado o exame da liminar para após as informações (evento 11), a autoridade coatora as prestou (evento 18) defendendo a legalidade do ato impugnado.
O Estado de Santa Catarina requereu o ingresso no feito (evento 20).
A liminar foi deferida para determinar à autoridade coatora que analise o pedido de aposentação do impetrante sem considerar o óbice relativo à sua exoneração (evento 24).
Houve interposição de agravo interno (evento 33).
Ofertadas contrarrazões (evento 39), o feito ascendeu a esta Corte e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da Exma. Sr.ª Dr.ª Eliana Volcato Nunes, opinou pela concessão da ordem (evento 44).
Vieram os autos à conclusão para julgamento.
VOTO
Trata-se de mandado de segurança impetrado por Arlindo Rech contra o ato mediante o qual o Presidente desta Corte indeferiu o pedido por ele formulado para que lhe fosse concedida a aposentadoria por idade em razão de seu trabalho como Escrevente Juramentado na Escrivania de Paz de Salto Veloso, vinculada à Comarca de Videira, entre 1992 e 2016 e como Escrivão de Paz interino entre 2016 e 1º-11-2018, quando foi exonerado do cargo por iniciativa da autoridade impetrada.
O primeiro ponto a se considerar é que está fora de discussão a inequívoca vinculação do impetrante ao Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, decorrente da ordem concedida no Mandado de Segurança n. 0687490-60.2004.8.24.0023, cujo trânsito em julgado ocorreu ainda em 2006.
Contudo, o cerne do dissenso reside não em afronta à res judicata, restrita, claramente, ao direito a que houvesse continuidade no recolhimento das contribuições previdenciárias, mas sim em saber se a sua exoneração e a perda da qualidade de segurado impedem a sua aposentadoria.
Em regra, ex vi do art. 5º, III, da LCE n. 412/2008, a exoneração de servidor vinculado ao RPPS faz com que não mais subsista a condição de segurado e o impede de, subsequentemente, obter benefício previdenciário derivado desse regime.
A situação que emerge dos autos, contudo, é peculiar, porquanto o impetrante não gozava da estabilidade inerente ao vínculo estatutário, ou seja, sua exoneração poderia partir, a qualquer tempo, de ato unilateral da administração, sem a necessidade de vir acompanhada de especial fundamento.
O caráter híbrido das serventias extrajudiciais, a que se atribui regime jurídico misto entre o público e o privado, reflete também no regime previdenciário dos serventuários admitidos até 18-11-1994, que, conquanto demissíveis ad nutum, vinculam-se ao RPPS por força do art. 48 da Lei n. 8.935/1994. Servidores ocupantes de cargo em comissão, verbi gratia, cujo vínculo com a administração também se pode desfazer sem maiores formalidades e por iniciativa exclusiva do gestor, vinculam-se ao RGPS, e não ao RPPS.
O risco do desfazimento súbito do vínculo não pode ser desconsiderado e implica na necessidade de que se interprete cum granu salis o transcrito regramento relativamente a esses segurados em particular.
Há precedente deste Grupo de Câmaras em que se reconheceu a possibilidade de concessão de benefício do RPPS a serventuário a despeito de sua exoneração, considerando o tempo de contribuição anterior à data de modulação de efeitos da decisão do Excelso Pretório na ADI n. 4.641/SC. Veja-se:
ESCREVENTE JURAMENTADO - MODULAÇÃO DE EFEITOS NA ADI 4.641/STF - APOSENTADORIA - PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO - IDADE MÍNIMA ATINGIDA DEPOIS - ORDEM CONCEDIDA. O STF (ADI 4.641) reconheceu a inconstitucionalidade da lei local que garantia aos cartorários extrajudiciais a aplicação do sistema previdenciário próprio; mas permitiu que aqueles que atingiram os requisitos para conquista de benefícios até a publicação do acórdão (26 de março de 2015) tivessem a prerrogativa respeitada. A Administração obedeceu ao comando, ainda que tenha denegado a aposentadoria: a impetrante não tinha idade bastante no momento em que cessou seu liame contributivo. A autora, todavia, completou o tempo de vida necessário durante o prazo da modulação. Há viabilidade - na linha de compreensão do STJ a propósito do regime comum - de implemento gradativo dos requisitos para aposentadoria. Segurança concedida. (TJSC, Mandado de Segurança n. 4004821-09.2018.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Grupo de Câmaras de Direito Público, j. 23-5-2018).
Do corpo do acórdão, extrai-se:
1. Está em xeque decisão do Presidente do Tribunal de Justiça que negou aposentadoria a escrevente juramentada.O assunto é sempre melindroso, mas neste mandado de segurança se podem abreviar os limites do debate.O ato questionado não nega aprioristicamente a possibilidade de a demandante obter a inativação pelas regras do Regime Próprio de Previdência Social. A rejeição veio da conclusão de que, na situação específica, a interessada não atingiu os requisitos temporais expostos constitucionalmente como necessários para atingir a prerrogativa.A possibilidade de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO