Acórdão Nº 5008047-49.2020.8.24.0092 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 25-08-2022

Número do processo5008047-49.2020.8.24.0092
Data25 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5008047-49.2020.8.24.0092/SC

RELATORA: Juíza ANDREA CRISTINA RODRIGUES STUDER

APELANTE: KOMLOG IMPORTACAO LTDA. - EM RECUPERACAO JUDICIAL (AUTOR) APELANTE: DENISSON MOURA DE FREITAS (AUTOR) APELANTE: MARIA CRISTINA MARTINI DE FREITAS (AUTOR) APELANTE: KMA FABRICACAO E COMERCIO DE APARELHOS DE REFRIGERACAO LTDA (AUTOR) APELANTE: BANCO SAFRA S A (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Inicialmente, adoto o relatório da sentença proferida (evento 39), in verbis:

Cuida-se de ação movida por MARIA CRISTINA MARTINI DE FREITAS, KMA FABRICACAO E COMERCIO DE APARELHOS DE REFRIGERACAO LTDA, DENISSON MOURA DE FREITAS e KOMLOG IMPORTACAO LTDA. - EM RECUPERACAO JUDICIAL em face de BANCO SAFRA S A.

Acerca dos fatos que motivaram o ingresso desta demanda, a parte autora relatou ter celebrado com a acionada diversos contratos.

Destacou que os instrumentos possuem irregularidades e ilegalidades que prejudicam o cumprimento das obrigações ajustadas.

Em decorrência desses acontecimentos, ao lado da concessão de tutela de urgência, requereu a procedência dos pedidos para o fim de: a) substituir o índice de correção CDI pelo INPC; b) afastar a capitalização na periodicidade diária; c) excluir a cobrança da tarifa de emissão de contrato (TEC) e; d) determinar a repetição de indébito.

O pedido de tutela de urgência foi deferido.

Citada, a parte ré compareceu aos autos, oportunidade em que apresentou contestação.

Quanto ao mérito, defendeu a legalidade do contrato firmado entre as partes, salientando não haver irregularidades passíveis de controle judicial.

Houve réplica.

Na continuidade, resultou a parte dispositiva da sentença, que assim dispõe:

ANTE O EXPOSTO, confirmo a tutela de urgência outrora deferida e julgo parcialmente procedentes os pedidos para:

a) determinar o afastamento do índice CDI, substituindo-o pelo INPC como índice de correção monetária;

b) autorizar a capitalização de juros em periodicidade mensal, afastando a capitalização diária;

c) afastar, nos contratos objetos deste procedimento, a cobrança da Tarifa de Abertura de Crédito/Tarifa de Emissão de Carnê ou outra denominação para o mesmo fato gerador, determinando a restituição simples dos valores, com correção monetária pelo INPC, desde a data de cada pagamento, e juros simples de mora de 1% a.m., desde a citação e;

d) condenar à parte ré à restituição simples dos valores eventualmente cobrados e pagos a maior, com correção monetária pelo INPC, desde a data de cada pagamento, e juros simples de mora de 1% a.m., desde a citação.

Figurando os litigantes, reciprocamente, na condição de credores e devedores, está autorizado o encontro de contas com a extinção das obrigações na medida em que se compensarem (art. 368 do CC).

Diante da sucumbência mínima, condeno a parte ré ao pagamento integral das custas e dos honorários, estes fixados em R$ 10.000,00 (art. 86, par. ún., do CPC).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.

Irresignado, o banco requerido ingressou com recurso de apelação cível (evento 49), onde aduziu em síntese: a) a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor na espécie; b) a legalidade do CDI, eis que utilizado como componente remuneratório; c) a possibilidade da cobrança de juros capitalizados na periodicidade diária; e) não houve a imposição da Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) ou Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), mas apenas Tarifa de Cadastro (TC), a qual não se confunde as anteriores; f) a impossibilidade de descaracterização da mora. Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais ou, caso mantida a sentença, que a descaracterização da mora seja condicionada ao pagamento do valor incontroverso.

A parte autora inconformada, ingressou com recurso de apelação cível (evento 56), onde aduziu em síntese: a) a ilegalidade da capitalização mensal de juros; b) a necessidade de afastamento do CDI, "sem a substituição por outro índice" (p. 10); c) a verba honorária deverá ser arbitrada em percentual sobre o valor da causa ou do seu proveito econômico, não sendo admitida sua fixação por equidade ou, caso mantida a sentença, a fixação em quantia proporcional a importância do trabalho exercido pelos causídicos.

Ofertadas contrarrazões (eventos 69 e 70).

Após, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça e vieram-me, então, conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Tratam-se de recursos de apelação interpostos por Banco Safra S/A. e por Komlog Importação Ltda. - Em Recuperação Judicial, KMA Fabricação e Comércio de Aparelhos de Refrigeração Ltda, Denisson Moura de Freitas e Maria Cristina Martini de Freitas em face da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos da Ação Revisional.

Em análise aos argumentos da peça recursal, tem-se que:

1. Do Código de Defesa do Consumidor

Alega o réu a impossibilidade de aplicação do disposto no Código de Defesa do Consumidor, porquanto a parte autora não se enquadra no conceito de destinatária final, notadamente porque o fornecimento do crédito se destinou, sem a menor margem para dúvidas, ao incremento da atividade empresarial.

Encontra-se sumulado o entendimento de que "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras" (Súmula n. 297 do STJ), sendo um direito básico do consumidor "a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas" (art. 6º, V, Lei n. 8.078/1990).

No tocante ao fato da parte autora constituir pessoa jurídica, entretanto, é preciso observar especificamente as condições da relação havida entre as partes.

O Código de Defesa do Consumidor dispõe, em seu art. 2º, que "consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final".

A expressão "destinatário final" é alvo de controvérsia na doutrina, de modo que a interpretação conferida pode ser mais restrita ou mais ampla conforme a teoria adotada.

No entanto, prevalece na jurisprudência nacional, a teoria finalista, mas em sua versão mitigada, visando a atender situações em que o adquirente, ainda que integre o serviço ou o produto adquirido nas suas próprias atividades econômicas, a exemplo de autônomos, microempresas e empresários individuais, apresenta vulnerabilidade em face do fornecedor.

Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 182 DO STJ. RECONSIDERAÇÃO. APLICAÇÃO DO CDC. TEORIA FINALISTA. HIPOSSUFICIÊNCIA. ÔNUS DA PROVA. REEXAME DO CONTRATO E DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. AGRAVO INTERNO PROVIDO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. PEDIDO FORMULADO NO AGRAVO INTERNO. PESSOA FÍSICA. DECLARAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA FINANCEIRA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. DEFERIMENTO. 1. A Segunda Seção do STJ consolidou a aplicação da teoria finalista para a interpretação do conceito de consumidor. No entanto, em situações excepcionais, esta Corte tem mitigado os rigores dessa teoria para autorizar a incidência do CDC nas hipóteses em que a parte (pessoa física ou jurídica), embora não seja propriamente a destinatária final do produto ou do serviço, se apresenta em situação de vulnerabilidade ou hipossuficiência [...] (AgInt no AREsp 1667736/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 14/09/2020, DJe 22/9/2020).

Desta forma, considerando a evidente vulnerabilidade financeira e técnica da empresa autora diante do banco demandado, integrante do sistema financeiro nacional, afiguram-se plenamente aplicáveis as regras consumeristas à hipótese presente.

Portanto, mantenho a decisão no ponto.

2. Das taxas e tarifas bancárias

No que tange às taxas e tarifas bancárias, o banco recorrente sustenta que nunca exigiu dos autores qualquer valor referente a emissão de carnê ou abertura de crédito, cingindo as cobranças sobre a denominada Tarifa de Cadastro, que com aquelas outras não se confunde e é admitida pelo ordenamento jurídico pátrio.

A sentença, no ponto, entendeu que "as partes contrataram TAC/TEC depois de 30.04.2008 (evento 1), de onde transparece a ilegalidade".

E da análise das Cédulas de Crédito Bancário n. 2134953, n. 2135691, n. 2150207, n. 2167771, n. 21668998, n. 2169358, n. 2170089, n. 002170291, n. 002170585, n. 002167789, n. 002168670, n. 002168157, n. 00216837, n. 002168530, n. 002170445 e n. 2135682, verifica-se que foi estipulada a cobrança da rubrica denominada "Taxa de Emissão de Contrato".

Acerca do tema o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 565, que preconiza: "a pactuação das tarifas de abertura de crédito (TAC) e de emissão de carnê (TEC), ou outra denominação para o mesmo fato gerador, é válida apenas nos contratos bancários anteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008."

E colhe-se julgado desta Corte:

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO BANCO RÉU.CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO AO RECURSO. EFEITO INERENTE AO RECURSO (CPC, ART. 1.012, CAPUT). AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. APELO NÃO CONHECIDO NO PONTO. [...] TARIFA DE EMISSÃO DE CONTRATO. PACTOS FIRMADOS APÓS 30.4.2008. COBRANÇA INDEVIDA. SENTENÇA MANTIDA [...]...

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