Acórdão Nº 5008062-85.2020.8.24.0005 do Segunda Câmara Criminal, 23-02-2021

Número do processo5008062-85.2020.8.24.0005
Data23 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5008062-85.2020.8.24.0005/SC



RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO


APELANTE: ALEXSANDRO PEREIRA DE SOUZA (RÉU) ADVOGADO: SAMUEL SILVA (OAB SC022211) APELANTE: ENOEL FERNANDES DE FRANCA (RÉU) ADVOGADO: JOSIAS RIBEIRO DOS SANTOS (OAB SC050582) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na Comarca de Balneário Camboriú, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Enoel Fernandes de França e Alexsandro Pereira de Souza, imputando-lhes a prática dos crimes previstos nos arts. 180, caput, e 311, caput, do Código Penal e 33, caput, e 35, caput, da Lei 11.343/06, nos seguintes termos:
Fato 1
No dia 31.5.2020, por volta das 22h30min., na Rua 2480, n. 390, apto 204, Centro, Município de Balneário Camboriú, com as informações obtidas pela Agência de Inteligência da Polícia Militar, as quais indicavam que os Denunciados utilizavam o imóvel indicado para armazenar drogas e realizar a posterior distribuição na região, fazendo uso do veículo Hyundai/HB20, cor vermelha, placas OLE-6556, para distribuir os entorpecentes/drogas, iniciou-se o monitoramento do local.
Durante a vigilância, os servidores públicos visualizaram a chegada do Denunciado Enoel e do usuário identificado como João Pedro Batisti.
Ato contínuo, os policiais realizaram a abordagem de ambos e, durante a revista pessoal, na posse do Denunciado Enoel foi encontrada a quantia de 17g (dezessete gramas) de cocaína, escondida em suas partes íntimas, sendo um pacote maior e dois pacotes pequenos, já fracionados para a venda.
Dando prosseguimento à diligência, os agentes públicos deslocaram-se até o imóvel onde residem os Denunciados (aquele da Rua 2480, n. 390, apto 204, Centro, Balneário Camboriú). No local, encontraram o Denunciado Alexandre, e com ele estava a chave do veículo Hyundai/HB20, o qual estava estacionado na garagem do prédio. Já no interior do apartamento os policiais encontraram vários tipos de drogas: 94g (noventa e quatro gramas) de maconha, divididos em 6 invólucros; 1 (um) pacote pequeno contendo MDMA; 70g (setenta gramas) de cocaína, divididas em 35 pacotes e; 55 (cinquenta e cinco) comprimidos de ecstasy; mais 4 (quatro) balanças de precisão (3 (três) de cor prata, da marca Altomex, e 1 (uma) de cor branca, marca B-Max); 1 (um) caderno com anotações relacionadas ao comércio de drogas; 3 (três) pacotes de embalagens, contendo diversos sacos zip, transparentes, 2 (dois) rolos de papel filme; 1 (um) rolo de sacos plásticos transparentes; 1 (uma) faca de cozinha, marca Western, com cabo preto; e R$ 3.306,00 (três mil trezentos e seis reais) em notas diversas; além de outros objetos; conforme auto de exibição e apreensão.
Desse modo, vê-se que o Denunciado Enoel trouxe consigo, armazenou, manteve em depósito, transportou e vendeu quantidade significativa de drogas, e o Denunciado Alexandre armazenou, manteve em depósito, transportou e vendeu, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, para fins de tráfico ilícito, tratando-se de substâncias entorpecentes, cujos componentes são capazes de causar dependência física e psíquica em seus usuários, de venda, posse, armazenamento e transporte, proscritos em todo Território Nacional, por força da Portaria n. 344/98, da SVS/MS e subsequentes alterações.
Fato 2
Constata-se, também, que, durante o monitoramento realizado pela Polícia Militar, foram coletados robustos elementos probatórios aptos a demonstrar a existência de vínculo entre os dois Denunciados, resultando na indiscutível caracterização da prática, associada e reiterada do comércio ilícito de entorpecentes.
É fácil verificar que os Denunciados estavam reunidos pelo mesmo liame subjetivo e em comunhão de desígnios para a prática do tráfico de drogas, exercendo as atividades ilícitas em caráter habitual, com a existência de uma estrutura montada por ambos, para alcançar o máximo lucro com a venda de entorpecentes.
Fato 3
Durante a operação policial, realizaram-se pesquisas nos sistemas, obtendo-se êxito em descobrir que o automóvel HB20/Hyundai 1.0 Comfort, placas OLE-6556, chassi n. 9BHBG51CAEP213856, utilizado pelos Denunciados para distribuir as drogas, possuía registro de furto/roubo, ocorrido na Cidade de São José/SC, constando que a placa original do automóvel é MLO-5482, com a indicação da proprietária Priscila Helena do Amaral Vicente.
Assim, vê-se que os Denunciados, de forma livre e consciente, em comunhão de desígnios, adulteraram sinal identificador de veículo automotor (placa), visando utilizar automóvel que sabiam ser produto de crime.
Fato 4
Nas mesmas condições de tempo e lugar, verifica-se que os Denunciados conduziram, em proveito próprio, o veículo automotor descrito, sabendo tratar-se de produto de crime (Evento 1).
Concluída a instrução, a Doutora Juíza de Direito julgou parcialmente procedente a exordial acusatória e condenou Enoel Fernandes de França e Alexsandro Pereira de Souza à pena de 5 anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, e 500 dias-multa, arbitrados individualmente no mínimo legal, pelo cometimento do delito previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, absolvendo-os das imputações referentes aos crimes positivados nos arts. 180, caput, e 311, caput, do Código Penal e 35, caput, da Lei 11.343/06, com fundamento no art. 386, VII, do Código Penal (Evento 91, doc5 e Evento 96).
Insatisfeito, Enoel Fernandes de França deflagrou recurso de apelação (Evento 94).
Em suas razões, alega, preliminarmente, a nulidade processual por ausência de perícia das "embalagens, invólucros, câmeras ou imagens do local da apreensão", ou pela não realização de seu reconhecimento formal, de acordo com o procedimento pormenorizado no art. 226 do Código de Processo Penal.
Sustenta, ainda, que ocorreu invasão ilícita de domicílio para a obtenção de prova, o que causaria a invalidade de todos os indícios lá obtidos.
No mérito, afirma ser insuficiente a prova produzida, a fim de fundamentar sua condenação, seja quanto à materialidade seja quanto à autoria dos fatos, bem como que a sentença resistida fundou-se apenas em indícios coletados na fase administrativa.
Quanto às drogas encontradas em sua posse, requer seja reconhecido que elas eram destinadas para uso próprio, somando que a criminalização da conduta prevista no art. 28, caput, da Lei 11.343/06 é inconstitucional.
Subsidiariamente, requer a aplicação da causa de diminuição prevista no § 4º do art. 33, caput, da Lei 11.343/06, com a adoção da fração de diminuição mais benéfica. Nesse caso, também pretende que o regime inicial de resgate de pena seja o aberto e que a privativa de liberdade seja substituída por restritivas de direitos.
Finalmente, pugna que lhe seja reconhecido o direito de recorrer em liberdade, a detração penal e, em caso de absolvição, a restituição dos bens apreendidos (Evento 7).
Igualmente insatisfeito, Alexsandro Pereira de Souza também deflagrou recurso de apelação (Evento 93).
Em suas razões, requer a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06, no máximo, argumentando que a natureza e a quantidade da droga deveriam ser ponderadas apenas na primeira fase da dosimetria, e não como fundamento para a negativa do redutor (Evento 10).
O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento dos reclamos (Evento 13).
A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Leonardo Felipe Cavalcanti Lucchese, posicionou-se pelo conhecimento e desprovimento dos apelos (Evento 16)

VOTO


Antes de analisar o recurso, alerta-se sobre a presença de erro material na denúncia, quando se refere ao Denunciado Alexsandro pelo nome de "Alexandre", sem que isso, no entanto, dificulte a sua identificação, dada sua prisão em flagrante.
Contudo, por se constatar da documentação pessoal do ora Apelante que seu nome tem grafia diversa daquela adotada na incoativa (Evento 2, doc2, do inquérito policial), considere-se suprido, neste momento, o equívoco.
Superado isso, os recursos preenchem os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual devem ser conhecidos.
1.1. Preliminarmente, Enoel Fernandes de França sustenta a necessidade da decretação da nulidade da sentença condenatória, por ausência de perícia das "embalagens, invólucros, câmeras ou imagens do local da apreensão" (Evento 7).
Sem razão.
É que o requerimento de perícia referenciado pelo Apelante, constante na sua defesa prévia (Evento 36), ademais de genérico (sem especificar o quê e por qual motivo, deveria ser periciado, a seu ver), não foi reiterado ao fim da audiência de instrução, momento em que caberia se fazer o requerimento de diligências, acaso que parecessem pertinentes (CPP, art. 402).
Tampouco há, em verdade, alegações defensivas cuja comprovação dependa da realização de tais perícias, dado que a materialidade dos fatos (ou seja, a constatação de que o material encontrado na posse do Recorrente, nas condições especificadas na inicial a comprovadas pela prova oral, era ilícito) é demonstrada pelo auto de constatação e pelo laudo pericial constantes nos Eventos 2 e 37 do inquérito policial.
Com isso em vista, é evidente que, se as referidas perícias houvessem sido requeridas temporâneamente, estaria plenamente justificado o indeferimento de suas realizações, na forma do § 1º do art. 400 do Código de Processo Penal, que prevê a possibilidade de o Magistrado, destinatário da prova, "indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias", dispondo seu art. 184 que, "salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a autoridade policial negará a perícia requerida pelas partes, quando não for necessária ao esclarecimento da verdade".
Como melhor se verá, os demais elementos do acervo probatório são...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT