Acórdão Nº 5008139-92.2020.8.24.0135 do Quinta Câmara Criminal, 18-03-2021

Número do processo5008139-92.2020.8.24.0135
Data18 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Recurso em Sentido Estrito Nº 5008139-92.2020.8.24.0135/SC



RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA


RECORRENTE: ILSON CARLOS SCHULER SOBRINHO RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRIDO)


RELATÓRIO


O Ministério Público ofereceu denúncia contra Ilson Carlos Schüler Sobrinho, imputando-lhe a prática do delito previsto no art. 121, § 2º, II e IV, do Código Penal, conforme os seguintes fatos narrados na inicial acusatória (doc. 2):
No dia 2 ou 3 de março de 2020, no horário compreendido entre 22h e 07h, na residência localizada na Rua Manoel Deodoro Arcari, n. 335, Centro, Navegantes/SC, o denunciado ILSON CARLOS SCHÜLER SOBRINHO, com evidente animus necandi e por motivo de somenos importância, ceifou a vida da vítima Fábio Alexandre da Silva. Para realização de seu intento criminoso, o denunciado, utilizando-se de instrumento contundente e cortante (barra de ferro), desferiu diversos golpes contra a vítima, que lhes causaram "traumatismo crânio encefálico", causa eficiente de sua morte. De acordo com as investigações, o crime foi praticado por motivo fútil, na medida em que a vítima Fábio Alexandre, no dia 2 de março de 2020, no período vespertino, tentou cobrar suposta dívida de drogas do denunciado ILSON CARLOS, sendo, pois, o homicídio absolutamente desproporcional ao motivo que deu causa à desavença entre as partes Conforme ficou apurado, a investida e os golpes fatais desferidos pelo denunciado ocorreram de inopino, sem que a vítima, comprometida nos seus reflexos por estar dormindo em um sofá na própria residência do denunciado, os esperasse ou os presumisse. Para tanto, o denunciado ILSON CARLOS, na posse de uma barra de ferro, efetuou diversos golpes na região craniana e cervical da vítima, causando-lhe "ferimento corto contuso na região frontal com 2,5 cm de extensão com bordos não retilíneos; ferimento corto contuso na região anterior ao pavilhão auricular direito com 2,5 cm; ferimento corto contuso na orelha direita com 2,5 cm de extensão; e fratura (crepitação) em mandíbula direita e equimose arroxeada na região", levando a vítima a óbito em razão de traumatismo cranioencefálico, consoante se depreende do Laudo Pericial SISP N. 9405.20.01350 anexo.
Processado o feito, sobreveio decisão que admitiu a acusação e pronunciou o acusado Ilson Carlos Schuler Sobrinho como incurso no delito descrito no art. 121, § 2º, II e IV, do Código Penal (doc. 62).
Inconformado com a prestação jurisdicional, o acusado interpôs recurso em sentido estrito. Em suas razões (doc. 2 dos autos 5008139-92.2020.8.24.0135), requereu sua despronúncia, ao argumento de que inexistem indícios suficientes de autoria.
Defendeu que "todos os termos de declarações encartado aos autos demonstram com clareza A INEXISTÊNCIA de indícios suficientes de autoria que possa ensejar um decreto condenatório, além do que, no caso dos autos, TODO O CONJUNTO PROBATÓRIO REÚNE APENAS DEPOIMENTOS DE QUEM OUVIU DIZER ALGO, sendo forçoso reconhecer sua eficiência para comprovar a autoria do delito, sendo este o entendimento maciço da jurisprudência."
Alegou que "na casa, no dia do crime, também transitaram por lá as testemunhas Gisele Cristina Alves e Miriam Maroja Gomes, as quais também deveriam ter sido investigadas como autoras do crime. Destaca-se ainda que, dos depoimentos prestados pelos investigadores, estas tiveram versões conflitantes entre os termos de depoimento e versão apresentada diretamente ao Delegado de Polícia, o que certamente aponta para a fragilidade da versão por elas apresentada" (fl. 5).
Foram apresentadas contrarrazões pelo órgão ministerial (doc. 5 dos autos 5008139-92.2020.8.24.0135), nas quais pugnou pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto.
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Lio Marcos Marin (doc. 3 dos autos de segundo grau), manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do reclamo.
Este é o relatório

VOTO


O recurso é próprio (art. 581, IV, do Código de Processo Penal), tempestivo (doc. 64 do processo principal) e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual comporta conhecimento.
O recorrente almeja a despronúncia, sob o argumento de que não há prova suficiente para a manutenção da decisão atacada.
De início, anota-se que a decisão de pronúncia, segundo Guilherme de Souza Nucci:
É decisão interlocutória mista, que julga admissível a acusação remetendo o caso à apreciação do Tribunal do Júri. Trata-se de decisão de natureza mista, pois encerra a fase de formação da culpa, inaugurando-se a fase de preparação do plenário, que levará ao julgamento de mérito. (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado, 13. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 870).
Justamente por não se tratar de decisão que julga procedente ou improcedente a imputação da denúncia - tarefa constitucionalmente delegada ao Conselho de Sentença nos casos de crimes dolosos contra a vida, nos termos do art. 5º, XXXVIII, "d", da Constituição Federal - o julgador não deve expressar juízos definitivos sobre o mérito do delito, mas apenas avaliar se há elementos de prova aptos a confortar a versão apresentada na inicial incoativa.
Tanto é verdade que Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto ensinam que:
Também em virtude desse caráter restrito da pronúncia, é que se diz que o juiz deve se valer de linguagem sóbria e comedida, sem excessivo aprofundamento na análise da prova, de resto desnecessária porquanto na pronúncia - repita-se - apenas se remete o réu à Júri, cabendo ao Tribunal Popular, este sim, a análise detida do mérito. O excesso de linguagem poderá, mais adiante, exercer indesejável influencia na convicção os jurados que, leigos, decerto podem se deixar impressionar com a terminologia utilizada pelo juiz togado (CUNHA, Rogério Sanches. PINTO, Ronaldo Batista. Código de Processo Penal e Lei de Execução Penal Comentados, 2. Ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 1160)
Em resumo, havendo substrato mínimo de prova, é dever constitucional do juiz remeter a questão à análise dos jurados, responsáveis por decidir, de forma soberana (art. 5º, XXXVIII, "c", da Constituição Federal), sobre a materialidade do fato; sobre a autoria ou participação; sobre absolvição do acusado; sobre a existência de causa de diminuição de pena alegada pela defesa; e sobre a existência de circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação (art. 483 do Código de Processo Penal).
Feitas essas considerações, a fim de avaliar a higidez da sentença de pronúncia ora impugnada, passa-se à análise do recurso.
A prova da materialidade exsurge dos autos por meio do laudo pericial cadavérico do doc. 3, o qual atesta que Fábio Alexandre da Silva faleceu por traumatismo cranioencefálico, provocado por instrumento contundente, bem como, através do boletim de ocorrência doc 2, do inquérito policial, fls. 13-17, de onde é possível constatar que o corpo da vítima foi encontrado na calçada, com ferimentos no crânio.
Esses elementos, morte por golpe contundente na cabeça, aliada ao encontro do corpo na calçada de uma via pública, dão-me a certeza da ocorrência de crime violento.
Os indícios de autoria, da mesma forma, estão satisfatoriamente demonstrados.
O policial civil Saulo Cardoso Stelczyk, ouvido na delegacia, atribuiu a prática do crime ao acusado Ilson Carlos Schüler Sobrinho, nos seguintes termos:
QUE, na presente data, pela manhã, sua equipe foi acionada para atender o local de homicídio na Avenida José Juvenal Mafra, n. 2140, Centro, em frente a oficina 'ARAZÃO'; Que no local a vítima foi identificada como Fábio Alexandre da Silva e foram iniciadas diligências para busca da autoria do crime; Que o Policial Civil Luciano Vieira recordou-se que perto de tal local havia uma residência que era utilizada por vários usuários, de propriedade de Ilson Carlos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT