Acórdão Nº 5008244-86.2020.8.24.0000 do Câmara de Recursos Delegados, 29-03-2023

Número do processo5008244-86.2020.8.24.0000
Data29 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoCâmara de Recursos Delegados
Classe processualAção Rescisória (Grupo Público)
Tipo de documentoAcórdão










AGRAVO INTERNO EM Ação Rescisória (Grupo Público) Nº 5008244-86.2020.8.24.0000/



RELATOR: Desembargador GETÚLIO CORRÊA


AGRAVANTE: EDINEI MARCELO ZAMBONETI
ADVOGADO: MAURICIO SOLANO DOS SANTOS AGRAVADO: ESTADO DE SANTA CATARINA MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA


RELATÓRIO


Edinei Marcelo Zamboneti interpôs o presente agravo interno contra a decisão proferida pela 2ª Vice-Presidência desta Corte que, nos termos do art. 1.030, inciso I, "a", do Código de Processo Civil, negou seguimento ao recurso extraordinário por considerar que o decisum objurgado está em consonância com a posição firmada no bojo de recurso representativo da controvérsia - RE 590.809/RS, Tema 136/STF, Rel. Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j. 22.10.2014 - e, quanto às demais assertivas, não o admitiu (Evento 53).
Em suas razões recursais, sustentou o agravante, em síntese, que: (i) "a decisão monocrática deve ser reformada porque: (1) não foi devidamente fundamentada; (2) desconsiderou as decisões do STF e do STJ (Temas 810 e 905) pela inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9.494/97 com redação da pela Lei 11.960/2009, porquanto a TR não é índice de correção monetária idôneo a refletir a inflação, de maneira que a utilização deste índice como forma de atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública pela TR importa em perda do valor aquisitivo da moeda, e consequente ofensa a garantia de propriedade, eis que, ao final do processo (seja de execução seja de conhecimento) a Fazenda Pública se apropriará do patrimônio do cidadão, pelo pagamento de valor com poder aquisitivo inferior ao efetivamente devido; e (3) a fundamentação na Súmula 343/STF seria cabível, em tese, quando inexistente controle concentrado de constitucionalidade para o deslinde da controvérsia"; (ii) "na inicial depreende-se que a ação foi proposta logo após o trânsito em julgado da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5348, ocorrido em 07/12/2019, onde, em controle concentrado de constitucionalidade, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, alterado pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que se estabelece a aplicação dos índices da caderneta de poupança como critério de atualização monetária nas condenações da Fazenda Pública"; (iii) não se aplica a Súmula 343/STF ao caso, pois, "se realmente cabe rescisória apenas se a divergência jurisprudencial foi resolvida em sede de controle concentrado de constitucionalidade, e verificando-se que a solução da divergência quanto a inconstitucionalidade da TR ocorreu, definitivamente, em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI 5348), e não de forma incidental, em sede de controle difuso de constitucionalidade, conforme mencionado no voto, aparentemente há contradição e omissão daquele acórdão quanto a esse fato"; (iv) "não incide o disposto no Tema 136 do STF porque à época do julgado do acórdão rescindendo, a matéria em discussão obviamente não estava em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo".
Ao final, requereu o provimento do reclamo, "para reformar a decisão monocrática, afastando a fundamentação com base no Tema 136 do STF e a Súmula 343 do STF, em virtude de que a divergência quanto a inconstitucionalidade da TR ocorreu, definitivamente, em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI 5348), assim como na época do julgamento do acórdão rescindendo, não havia nenhuma harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo nesse assunto, muito pelo contrário" (Evento 71).
Intimada para apresentar contrarrazões, a parte agravada manifestou-se no sentido do desprovimento do recurso (Evento 76).
Após, vieram os autos conclusos.
É a síntese do essencial

VOTO


Afigura-se cabível a presente insurgência, dado que tempestiva e preenchidos os requisitos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecida.
Superado esse intróito, procedo à análise das razões declinadas na presente insurgência recursal.
Primeiramente, alega o agravante que, ao contrário do consolidado na decisão recorrida, o acórdão objeto de recurso extraordinário aplicou de maneira equivocada a tese cristalizada no recurso representativo da controvérsia - RE 590.809/RS -, porquanto a matéria em debate não estava em concordância com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no momento do julgamento do acórdão rescindendo.
Nesse passo, deduz que a Suprema Corte declarou a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997 mediante controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 5348), o que afasta a aplicação da Súmula 343/STF e, consequentemente, viabiliza a interposição de ação rescisória.
Embora o esforço argumentativo, a tese articulada pela parte agravante não merece prosperar.
Por ocasião do julgamento do recurso-piloto acoimado, o Supremo Tribunal Federal fixou a seguinte tese: "Não cabe ação rescisória quando o julgado estiver em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo à época da formalização do acórdão rescindendo, ainda que ocorra posterior superação do precedente".
Transcreve-se a ementa do julgado paradigmático:
AÇÃO RESCISÓRIA VERSUS UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. O Direito possui princípios, institutos, expressões e vocábulos com sentido próprio, não cabendo colar a sinonímia às expressões "ação rescisória" e "uniformização da jurisprudência". AÇÃO RESCISÓRIA - VERBETE Nº 343 DA SÚMULA DO SUPREMO. O Verbete nº 343 da Súmula do Supremo deve de ser observado em situação jurídica na qual, inexistente controle concentrado de constitucionalidade, haja entendimentos diversos sobre o alcance da norma, mormente quando o Supremo tenha sinalizado, num primeiro passo, óptica coincidente com a revelada na decisão rescindenda.
No caso concreto, o órgão julgador originário julgou improcedente o pleito rescisório, sob o fundamento de se tratar o caso dos autos de notória divergência jurisprudencial à época do pronunciamento judicial, e, por isso, o preceito trazido pela Súmula 343, reiterado pelo Tema 136, tem a sua aplicação inafastável, levando em conta sua força vinculante, inerente à matéria que é submetida à repercussão geral.
Para melhor elucidar a questão, convém transcrever a ementa do aresto de origem (Evento 30 - ACOR1):
AÇÃO RESCISÓRIA. PENSÃO GRACIOSA. ARTS. 966, INCISO V, 525, §§ 12 E 15, E 535, §§ 5° E 8º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECADÊNCIA NÃO EVIDENCIADA. ANÁLISE DO MÉRITO. PRETENSÃO DE RESCINDIR CAPÍTULO DA DECISÃO QUE DEFINIU CORREÇÃO MONETÁRIA PELOS ÍNDICES DA TR, ALMEJANDO A INCIDÊNCIA DO IPCA-E. TEMÁTICA CONTROVERTIDA NOS TRIBUNAIS À ÉPOCA DO LANÇAMENTO DO ACÓRDÃO. PACIFICAÇÃO DA MATÉRIA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (TEMA N. 810) E SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (TEMA 905) SOMENTE APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO RESCINDENDA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 343 DO STF E TEMA 136 DO STF. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO GRUPO DE CÂMARAS. IMPROCEDÊNCIA DO PLEITO RESCISÓRIO.
"Desta forma, se preponderava nos tribunais divergência de entendimento a respeito de determinado dispositivo legal é porque o mesmo comportava mais de uma interpretação, a significar que não se pode qualificar qualquer uma dessas interpretações, como ofensiva ao teor literal da norma interpretada. Em virtude da segurança jurídica e da coisa julgada justifica-se a manutenção de sentenças/acórdãos que deram interpretação razoável aos preceitos normativos" (STJ - REsp n. 1.980.169/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques), razão pela qual, em tais casos, incide a Súmula 343, do Supremo Tribunal Federal." (TJSC, Ação Rescisória (Grupo Público) n. 5009249-75.2022.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jaime Ramos, Grupo de Câmaras de Direito Público, j. 27-04-2022).
Em virtude da pacificação da temática somente em data posterior ao trânsito em julgado da decisão rescindenda, com a definição do Tema 810 do STF (RE 870.947) e Tema 905 do STJ, incabível o manejo da Ação Rescisória, nos termos do disposto na Súmula 343 do STF ("Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos Tribunais") e do Tema 136 do STF ("Não cabe ação rescisória quando o julgado estiver em harmonia com o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo à época da formalização do acórdão rescindendo, ainda que ocorra posterior superação do precedente").
Como se vê, a decisão impugnada elucidou de maneira concisa as questões trazidas à baila pelo agravante: aplica-se o estatuído na Súmula 343/STF ao caso, uma vez que existia divergência, pelos tribunais, na interpretação do alcance da regra de atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública prevista no art. 1º-F da Lei n. 11.960/09, não havendo posicionamento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça que vinculasse os orgãos julgadores.
Vale dizer, ainda, que a ressalva feita pelo STF relativamente à aplicação da Súmula 343, a qual ocorre nas hipóteses em que há controle concentrado de constitucionalidade não se configurou no caso concreto. Isto é, o leading case - RE n. 870.947 - que dirimiu a controvérsia existente sobre o direito material aqui tratado foi efetuado em sede de controle difuso de constitucionalidade, portanto, de forma incidental.
De conseguinte, "chega-se a duas conclusões: 1) não cabe rescisória se tinha divergência; e 2) se havia divergência cabe rescisória apenas se a mesma fora resolvida em sede de controle concentrado de constitucionalidade. Aplicando-se essas assertivas ao caso concreto, constata-se que, à época da sentença/acórdão rescindendos, existia divergência acerca da matéria, a qual foi resolvida no controle difuso, motivo pelo qual, aplica-se a regra geral de que não cabe a rescisória, por força do verbete sumular n. 343 do STF, reafirmado na tese fixada no Tema n. 136 do STF, em sede...

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