Acórdão Nº 5008245-81.2019.8.24.0008 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 30-06-2022

Número do processo5008245-81.2019.8.24.0008
Data30 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5008245-81.2019.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: DENISE CONTI (AUTOR) APELADO: BANCO ITAU CONSIGNADO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

DENISE CONTI interpôs recurso de apelação contra a sentença proferida pela magistrada de primeiro grau Cintia Gonçalves Costi, nos autos da ação anulatória c/c indenizatória proposta contra BANCO ITAU CONSIGNADO S.A., em curso perante o juízo da Vara de Direito Bancário da Comarca de Blumenau, que julgou improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, nestes termos:

RELATÓRIO

DENISE CONTI, devidamente qualificado(a) nos autos em epígrafe, ajuizou Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais em face de BANCO ITAU CONSIGNADO S.A., igualmente qualificado(a).

A parte autora requereu a declaração de nulidade do contrato com a consequente liberação da margem consignável, cumulando com pedido de indenização por danos morais e repetição do indébito dos valores pagos a maior.

Alegou, em apertada síntese, que foi induzida a erro quando celebrou com a parte ré contrato de empréstimo consignado, desconhecendo o correto teor das cláusulas pactuadas, notadamente, por se tratar, em verdade, de empréstimo rotativo na modalidade cartão de crédito.

Após o regular trâmite, os autos vieram conclusos.

FUNDAMENTAÇÃO

Considerando que para o exame do presente processo não é necessária a produção de nenhuma outra prova além da já constante dos autos, o julgamento antecipado é medida que se impõe, na forma do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

Da perda do objeto dos aclaratórios de evento 14.

Os embargos de declaração interpostos em face da decisão que antecipou os efeitos da tutela não comportam conhecimento.

Isso porque a superveniência da sentença absorve os seus efeitos, ou seja, o provimento antecipatório não mais subsiste.

Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERIU O PEDIDO LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA - SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA DENEGANDO A ORDEM - PERDA DO OBJETO - ALEGADA PREVALÊNCIA DO QUE RESTOU DECIDIDO POR ESTA CORTE, QUANDO DEFERIU ANTECIPAÇÃO DA TUTELA RECURSAL, ANTE O CRITÉRIO DA HIERARQUIA - INAPLICABILIDADE, EM RAZÃO DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DOMINANTE DE QUE PREVALECE O CRITÉRIO DA COGNIÇÃO - RECURSO PREJUDICADO. "1. A tutela antecipada pelo Tribunal a quo, ao julgar Agravo de Instrumento contra decisão interlocutória que indefere a medida, não tem efeitos prolongados até o trânsito em julgado da demanda, tornando-se prejudicada, caso a decisão do juízo monocrático seja de improcedência. "2. A eficácia das medidas liminares - as quais são fruto de juízo de mera verossimilhança e dotadas de natureza temporária - esgota-se com a superveniência de sentença cuja cognição exauriente venha a dar tratamento definitivo à controvérsia. Precedentes do STJ." (REsp 1179115/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/05/2010, DJe 12/11/2010). "Tendo o juízo singular decidido o feito originário, substituindo, com a sentença, a interlocutória agravada, não há mais sentido para o exame do agravo de instrumento contra ela manejado, que, inobjetavelmente, remanesce prejudicado." (Agravo de Instrumento n. 2012.031739-7, de Joinville, rel. Des. João Henrique Blasi, j. 16-04-2013). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2013.005471-1, da Capital, rel. Des. Cid Goulart, Segunda Câmara de Direito Público, j. 28-05-2013).

Portanto, ficam prejudicados os embargos de declaração opostos em face da decisão que antecipou os efeitos da tutela, em virtude da superverniência da presente sentença.

Da ilegitimidade passiva

Quanto à ilegitimidade passiva arguida pelo réu, sabe-se que propor ou contestar uma ação, é pressuposto essencial a existência de legitimidade, ou seja, essa condição deve estar presente na relação de direito material que teria sido violada em razão da inobservância do direito positivo, fazendo surgir o conflito de interesses a ser dirimido pelo Judiciário.

Sobre o assunto, ensinam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:

Parte, em sentido processual, é aquela que pede (parte ativa) e aquela em face de quem se pede (parte passiva) a tutela jurisdicional. Os demais participantes da relação processual (juiz) ou do processo lato sensu (advogado, MP, auxiliares da justiça etc.) não são partes. [...] Quando existe coincidência entre a legitimação entre o direito material que se quer discutir em juízo e a titularidade do direito de ação, diz-se que se trata de legitimação ordinária para a causa, que é a regra geral: aquele que se afirma titular do direito material tem legitimidade para, como parte processual (autor e réu), discuti-lo em juízo (Código de processo civil comentado. 17. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2018. p. 1.276).

Com efeito, em que pese os argumentos lançados pelo réu, a questão deve ser resolvida com base na teoria da aparência, pois o Banco BMG e o Banco Itaú BMG Consignado se apresentavam ao público como única empresa pertencente ao mesmo conglomerado econômico, à época em que iniciaram os descontos no benefício previdenciário da autora.

Importante destacar que não se desconhece a informação de que, atualmente, o Banco BMG pertence ao conglomerado BMG e o Banco Itaú BMG Consignado S.A. pertence ao Itaú Unibanco Holding S.A. Contudo, os Bancos BMG S.A. e Itaú BMG Consignado S.A. pertenciam ao mesmo grupo econômico até 28 de dezembro de 2016, momento em Itaú Unibanco Holding S.A. passou a controlar o Banco Itaú BMG Consignado S.A. (https://www.itau.com.br/relacoes-com-investidores/Download.aspx?Arquivo=TNZR6gj61cR1/Zs7Gj3xog==, consulta em 7-1-2021).

Diante desse quadro, as duas instituições financeiras pertenciam ao mesmo conglomerado econômico, apresentando-se ao consumidor como única empresa, embora tivessem CNPJs diversos, sendo acertada a aplicação da teoria da aparência.

Nesse passo, tem-se que a teoria da aparência tem por fim preservar a "ordem social, de se conferir segurança às operações jurídicas, dando amparo, concomitantemente, aos interesses legítimos daqueles agentes que procedem de modo correto num dado negócio" (BORGUI, Hélio. Teoria da aparência no direito brasileiro. São Paulo: Lejus, 1999. p. 43).

Em caso análogo, decidiu o TJSC:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO COM DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. INSCRIÇÃO INDEVIDA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ. SUSCITADA A ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO BANCO BMG. ALEGADA LEGITIMIDADE DE ITAÚ BMG CONSIGNADO PARA FIGURAR NO POLO PASSIVO DA LIDE. DESCONTOS PROMOVIDOS NA FOLHA DE PAGAMENTO DA AUTORA DESTINADOS AO PAGAMENTO DA OBRIGAÇÃO. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS PERTENCENTES AO MESMO CONGLOMERADO ECONÔMICO QUANDO DA CELEBRAÇÃO DO CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. TEORIA DA APARÊNCIA. OBSERVÂNCIA DA BOA-FÉ NAS RELAÇÕES DE CONSUMO. TESE RECHAÇADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0311672-10.2016.8.24.0039, de Lages, rel. Luiz Felipe Schuch, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 16-07-2020).

Dessa feita, por pertencerem à época dos descontos ao mesmo grupo econômico, circunstância que leva o consumidor a acreditar que se trata de uma única empresa, não há falar em ilegitimidade passiva do banco réu para figurar no polo passivo do feito.

Do mérito

Aduz a parte autora que o contrato celebrado é nulo, posto que foi induzida em erro, ao desconhecer o real teor das cláusulas pactuadas.

O erro substancial é um defeito do negócio jurídico e, nos termos do artigo 138 do Código Civil, é causa de sua anulação.

A respeito do erro, cabe transcrever a lições de Fábio Ulhoa Coelho:

O conceito de erro é o da decisão tomada em função de falsa representação da realidade. [...]. Nem todo erro compromete a validade do negócio jurídico. Há erros sem importância, referentes a aspectos acidentais do negócio ou de seu objeto, que não são fatos jurídicos. Quando alguém incorre num erro assim, nada aconteceu para o direito. Há, também, erros indesculpáveis, que decorrem da culpa do sujeito que errou. Nesses casos, anular o negócio jurídico seria estimular negligências e subtrair das pessoas a responsabilidade por seus atos.[...]Para configurara-se como defeito de consentimento, assim, o erro deve ser substancial e escusável. Considera-se substancial o erro se a pessoa não teria praticado o negócio jurídico em questão caso o tivesse percebido a tempo; escusável, por sua vez, é o erro imperceptível às pessoas com diligência normal. [...]É substancial o erro, em primeiro lugar, quando interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração ou a alguma das qualidades a ele essenciais. Desse modo, se uma parte considerava estar contratando a doação de um bem como donatária, mas, a rigor, estava participando de contrato de compra e venda deste, o erro é substancial. [...].Também define a lei como substancial o erro concernente à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha...

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