Acórdão Nº 5008305-39.2023.8.24.0000 do Quinta Câmara Criminal, 11-05-2023

Número do processo5008305-39.2023.8.24.0000
Data11 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualAção Penal - Procedimento Ordinário
Tipo de documentoAcórdão










Petição Criminal Nº 5008305-39.2023.8.24.0000/SC



RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER


REQUERENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA REQUERIDO: ODAIR JOSE MANNRICH REQUERIDO: MARCIO PIRES DE MORAES REQUERIDO: JONES RODRIGO GAUGER REQUERIDO: FELIPE SCHROEDER DOS ANJOS REQUERIDO: ERONI DELFES RODRIGUES REQUERIDO: DAVID DO PRADO REQUERIDO: CRISTIANE RUON DOS SANTOS REQUERIDO: ANTONIO CERON REQUERIDO: ALTEVIR SEIDEL REQUERIDO: KELLER SCHULZE SANTOS BACCI REQUERIDO: ANTONIO CESAR ALVES DE ARRUDA


VOTO


1. Antonio Ceron alega inicialmente a incompetência deste Juízo, devido ao seu sentir a investigação contra o alcaide ter sido realizado por prevenção a esta relatoria, sem motivação, acarretando assim num juízo universal de competência.
Alega que o Superior Tribunal de Justiça acolheu pedido defensivo no bojo do HC nº 802.261/SC, relacionado à Operação Mensageiro, até então de relatoria da Ministra Laurita Vaz, para determinar a redistribuição livre do feito ao Ministro Jesuíno Rissato da 6ª Turma.
Diz ainda que a incompetência é matéria de ordem pública e que por isto pode ser alegada a qualquer tempo.
Por tais motivos, requer o acolhimento da preliminar de incompetência, com a consequente remessa dos autos à Presidência da Corte para que se determine a sua livre distribuição na forma regimental.
A questão não merece acolhimento.
Em 30/11/2021 restaram distribuídos por sorteio para esta relatoria os autos n. 5063871-41.2021.8.24.0000.
No referido procedimento restou apontado que o então prefeito de Bela Vista do Toldo, Adelmo Alberti, no bojo da Operação Et Pater Filium contou detalhes de um esquema envolvendo a empresa Serrana Engenharia Ltda e alguns prefeitos de Santa Catarina, àquele tempo inicialmente se investigavam quatro prefeitos municipais.
Com o passar das investigações foram aportando diversos outros prefeitos municipais e dezenas de outros agentes públicos como investigados, em mesmo contexto fático e mesmo modus operandi.
A situação, em face de todos os agentes públicos, em tese, seria a seguinte.
Supostamente, as empresas do grupo Serrana, por meio de funcionários e/ou prepostos, mantém contatos espúrios com o alto escalão agentes públicos de dezenas de prefeituras catarinenses, e negociam a prévia vitória em procedimentos licitatórios, antes mesmo da própria realização dos certames, em valores superfaturados na casa dos milhões de reais, em troca do pagamento de propina para principalmente prefeitos e secretários municipais.
Mais especificamente, desde o ano de 2014, o Grupo Serrana integrado com agentes públicos de diversas cidades catarinenses, de maneira estável, permanente, estruturada e com divisão de tarefas estaria em conluio para assegurar, manter e perpetuar contratações públicas, supostamente superfaturadas, em troca de pagamento de vantagens indevidas ("propina") para agentes públicos de Santa Catarina.
Segundo se apontam indiciariamente, Odair José Mannrich, sócio-administrador da Serrana Engenharia Ltda e de várias outras empresas do grupo seria um dos mentores e líderes da suposta organização criminosa, responsável por negociar pagamentos de propina com agentes públicos do estado de Santa Catarina, dar ordens de pagamento de propina e controle de planilhamento destas, além de, em tese, se encontrar com diversos agentes públicos para discutir benefícios indevidos às empresas do Grupo Serrana em troca de pagamento de propinas para agentes públicos.
Odair José Mannrich possui como sócio Márcio André Savi em várias das empresas do Grupo, o qual também atua como diretor operacional de águas e saneamento da Serrana Engenharia Ltda.
Segundo apontam os elementos indiciários, Márcio André Savi, conjuntamente com Felipe Schroeder dos Anjos e Márcio Velho da Silva, seriam pessoas de extrema confiança de Odair José Mannrich e de elevada infiltração na organização criminosa, com a tarefa delegada de convidar agentes públicos para integrar o esquema criminoso consistente em favorecer o Grupo Serrana, por meio de contratos superfaturados em troca de pagamento de propina, inicialmente de forma velada para aferir o potencial interesse principalmente de prefeitos e secretários municipais.
Márcio André Savi, Felipe Schroeder dos Anjos e Márcio Velho da Silva tinham, segundo apontado indiciariamente, elevada autonomia para a busca de prática de novos integrantes da organização criminosa, por meio do oferecimento de vantagens indevidas (artigo 333 do Código Penal) aos agentes públicos de todo o estado em troca de favorecimento da Serrana Engenharia em contratos ativos ou futuros certames licitatórios, inclusive com fornecimento de editais.
Também, em tese, possuiriam função de aproximação com agentes públicos para vantagens e benefícios nos contratos públicos, em menor proporção os funcionários da Serrana: Diego Borges (gerente operacional do setor de águas), (Joel Alves, gerente operacional do Município de Três Barras - resíduos), Diohn do Prado, gerente operacional do Município de Mafra (SELUMA) e Keller Schulze Santos Bacci (gerente do Município de Lages).
Além disso, haveria um organização de logística financeira para o pagamento de propinas aos agentes públicos, após os empenhos pelos municípios, com a produção de notas fiscais frias para a volta de partes dos valores empenhados para os agentes públicos, em forma de propina.
Nesse sentido, competiria à David do Prado (irmão de Diohn do Prado), desde 2014, e a Jones Rodrigo Gauger, a partir de 2019, auxiliar na obtenção do dinheiro em espécie para o pagamento da propina aos agentes públicos.
Em suma, teriam estes dois a função de comprar notas fiscais "frias" que simulavam a aquisição de produtos/prestação de serviços regulares da Serrana (pneus, peças, óleos e combustíveis, locação de caminhões e equipamentos, serviços e peças de informática etc.), as quais eram liquidadas e pagas por Cristiane Ruon dos Santos, contadora do Grupo Serrana e pessoa de extrema confiança de Odair José Mannrich.
Os fornecedores, em tese, então devolviam a David do Prado e Jones Rodrigo Gauger os valores recebidos - descontados os impostos e certo percentual, como remuneração pela atividade ilícita - sempre em espécie e preferencialmente em notas R$ 50,00 (cinquenta reais), R$ 100,00 (cem reais) ou R$ 200,00 (duzentos reais) para facilitar a posterior entrega aos agentes públicos.
Recebidos os valores em "dinheiro vivo" por David do Prado e Jones Rodrigo Gauger, estes, em tese, repassavam as quantias pecuniárias para Márcio Pires de Moraes que posteriormente entregava à Cristiane Ruon dos Santos.
Ao mesmo tempo, em tese, Odair José Mannrich, após negociação de valores com os agentes públicos, avisava para Cristiane Ruon dos Santos quanto seria pago de propina mensalmente e mandava que esta alimentasse uma planilha sigilosa de valores de propinas e as respectivas notas fiscais frias utilizadas para tal.
À título de exemplo, planilha de suposta negociação de propina recuperada, com indicação de "prefeito" de Lages:

Sequencialmente, Cristiane Ruon dos Santos, em tese, devolvia os valores para Márcio Pires de Moraes, com a respectiva quantia que deveria ser paga e para quem, o qual então se encontrava com Altevir Seidel para a entrega dos valores, num envelope pardo.
À título de exemplo, envelope pardo, com as inicias LGS, apreendido na residência do codenunciado Eroni Delfes Rodrigues, Secretário de Serviços Públicos e Meio Ambiente de Lages :

Então, Altevir Seidel supostamente viajava para a cidade dos agentes públicos, fazendo entregas de valores pecuniários preponderantemente aos prefeitos e secretários municipais que, em trocam, favoreceria o grupo empresarial em seus respectivos municípios.
À título de exemplo, encontro do "Mensageiro" da propina com Milton José Matias Filho, diretor de resíduos sólidos da SEMASA de Lages:

Tudo isto precisa ser dito para deixar claro uma simples questão: o modus operandi, em todas as cidades, é absolutamente idêntico, em mesmo contexto fático, com suposto pagamento de propina feito pelo mesmo "Mensageiro", negociado pela mesma pessoa (Odair José Mannrich), com controle contábil pela mesma funcionária e realizado sempre pelo Grupo Serrana.
A conexão entre os supostos delitos praticados é evidente.
O esquema criminoso seria o mesmo, praticado pela mesma empresa, da mesma forma, com o mesmo distribuidor de propina.
Apontamentos indiciários dão conta de que o mesmo, em tese, entregaria pessoalmente vantagens indevidas em "dinheiro vivo" para mais de uma centena de prefeitos de Santa Catarina.
Além disso, em tese, igualmente entregaria para secretários, gerentes e outros agentes públicos/políticos do alto escalão das prefeituras.
Nessa toada, é evidente a conexão intersubjetiva e probatória, sendo necessário que o autos tramitem por prevenção para esta relatoria.
O artigo 76, Inciso III, do Código de Processo Penal, aponta que a competência será determinada pela conexão quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração.
In casu, elementos indiciários dão conta de que as condutas criminosas seriam equânimes, ou seja, prepostos da empresa, a mando de ao menos dois sócios, efetuariam negociações espúrias de contratos públicos e acerto de propina com prefeitos municipais, vice-prefeitos, secretários e gerentes municipais.
Ou seja, a apuração das condutas e processamento dos autos necessita ser realizada de maneira conjunta, pois é a única forma de trazer uma melhor compreensão da amplitude das práticas, eventuais responsabilizações penais e também para uma melhor investigação destas.
É absolutamente impossível que ocorram tramitações e investigações separadas, porquanto o suposto principal distribuidor da propina, por exemplo, em uma única semana, deslocar-se-ia para diversas cidades de Santa Catarina, para efetuar o pagamento de propina para prefeitos e outros...

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