Acórdão Nº 5008362-11.2021.8.24.0038 do Quarta Câmara de Direito Civil, 08-12-2022

Número do processo5008362-11.2021.8.24.0038
Data08 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5008362-11.2021.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH

APELANTE: EGON TANNER FILHO (AUTOR) APELANTE: BANCO C6 CONSIGNADO S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Acolho o relatório da sentença (evento 67 dos autos de primeiro grau), de lavra do Juiz de Direito Luis Paulo Dal Pont Lodetti, por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos, ipsis litteris:

EGON TANNER FILHO ajuizou a presente ação pelo procedimento comum contra BANCO C6 CONSIGNADO S.A., aduzindo, em síntese, que tomou conhecimento do desconto em seu benefício previdenciário de valores de empréstimo consignado pelo réu. Disse que não efetuou a contratação respectiva, razão pela qual devem ser devolvidos em dobro os valores cobrados. Argumentou, ainda, dada a privação no recebimento de verba alimentar, a configuração de abalo moral passível de compensação financeira. Daí os pedidos deduzidos para a declaração de inexistência do débito e a condenação do réu a devolver em dobro os valores indevidamente recebidos, mais o pagamento de indenização por danos morais. Procuração e documentos vieram aos autos.

Citado, o réu ofereceu resposta em forma de contestação e nela defendeu a regularidade da contratação e a legitimidade da dívida para, ao final, clamar a improcedência.

Houve réplica.

Em saneador, determinou-se a produção de prova pericial grafotécnica, mas a perita nomeada, após intimada para se manifestar acerca da possibilidade de realização do exame sobre a cópia acostada no evento 21.2 sustentou que o documento "não possui o padrão mínimo de digitalização exigido pelo Banco Central, vez que tratar-se de digitalização com baixa resolução, torta e desalinhada, conforme imagem da assinatura que segue abaixo" (f. 02 do evento 61), tornando inviável a realizado do exame pericial em razão do descarte do contrato original pelo réu.

O Magistrado julgou parcialmente procedente o pedido exordial, nos seguintes termos:

Diante do exposto, julgo procedente em parte o pedido para declarar a nulidade do contrato nº 010012574596 e a inexistência da dívida por ele representada e, em consequência, condenar o réu à restituição em dobro em favor do autor dos valores indevidamente recebidos, além do pagamento de indenização por danos morais quantificada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), esta monetariamente corrigida pelo INPC a partir desta data (v. Súmula nº 362 do STJ), enquanto aquela desde cada desembolso (v. Súmula nº 43 do STJ), e ambas acrescidas de juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, a contar do evento danoso, aqui considerada a data apontada para a suposta contratação (v. Súmula nº 54 do STJ), autorizada a compensação do valor do empréstimo de R$ 2.821,44 (dois mil, oitocentos e vinte e um reais e quarenta e quatro centavos), atualizado pelo INPC desde a data do depósito e acrescido de juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, contados do trânsito em julgado. Majoritariamente sucumbente o réu (art. 86, parágrafo único, do CPC), arcará ele, sozinho, com as custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) do proveito econômico obtido pelo autor (art. 85, § 2º do CPC).

Irresignado com a prestação jurisdicional entregue, o autor interpôs apelação. Busca a majoração dos danos morais para o montante de R$ 15.000,00 e dos honorários advocatícios sucumbenciais para valor correspondente a 20% (vinte por cento) do total da condenação (evento 71 dos autos de origem).

O banco réu também recorreu. Defende a regularidade do contrato de empréstimo consignado. Não vislumbra má-fé ensejadora da repetição de indébito em dobro. Alega ser vítima de eventual ação fraudulenta por parte de terceiro. Salienta ter apresentado contrato devidamente assinado e prova da transferência do crédito em favor do apelado em conta bancária de sua titularidade. Considera legítimos os descontos no benefício previdenciário do demandante. Aduz que o dano moral não foi suficientemente demonstrado no feito. Busca a minoração do montante indenizatório e a devolução do valor creditado na conta do recorrido (evento 81 dos autos de primeiro grau).

Contrarrazões nos eventos 87 e 88 dos autos de primeira instância.

VOTO

Os recursos preenchem os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual devem ser conhecidos.

1 MÉRITO

1.1 Ato ilícito

O banco recorrente almeja o reconhecimento da legitimidade da contratação a fim de julgar improcedentes os pleitos autorais.

Pois bem.

Sobre a questão, importa trazer excerto da fundamentação da magistrada sentenciante, o qual se adota como razão de decidir:

Assentada a premissa, no que releva, observo que, de acordo com o extrato de empréstimos consignados carreado pelo autor no evento 1.5, no campo "Contratos de Empréstimos", consta a informação do contrato nº 010012574596, celebrado com o banco FICSA, com data de inclusão em 20.10.2020, valor emprestado de R$ 2.821,44 (dois mil, oitocentos e vinte e um reais e quarenta e quatro centavos) e valor da parcela de R$ 70,00 (setenta reais) .

Mas, segundo se retira da petição inicial, "a parte Autora não se recorda de qualquer contratação dos empréstimos supracitados e/ou autorização dando anuência para que a parte Ré realizasse os descontos das parcelas em seu benefício previdenciário" (f. 03 do evento 1.7).

A partir daí, "observadas as normas insertas no art. 373, inc. II, do CPC e no art. 6º, inc. VIII, do CDC, incumbe à instituição financeira a comprovação da pactuação e da prestação de informações claras acerca do ajuste firmado entre as partes" (TJSC, AI nº 5030417-07.2020.8.24.0000, da Capital, Rel. Des. Sebastião César Evangelista).

No ponto, o réu trouxe aos autos o contrato digitalizado, apontado como assinado pelo autor, e informou inexistência da via física, casos em que "diante da inviabilidade de acesso ao original, deve ser oportunizada a realização da prova grafotécnica, cabendo ao expert concluir pela impossibilidade ou não da perícia em documento xerocopiado ou fotocopiado" (TJMG, AC nº 1.0134.13.008117-4/001, de Caratinga, Rel. Des. João Cancio).

E, aqui, a louvada declarou expressamente a impossibilidade de realização do exame naquele contrato anexado em cópia do evento 21.2 em razão da baixa qualidade da resolução do documento - do qual apenas com muita dificuldade se consegue visualizar as assinaturas, as quais com a aplicação do zoom ficam totalmente desfocadas -, valendo o registro então de que com o descarte do original assumiu a instituição financeira o risco da impossibilidade da perícia e as suas consequências (art. 429, II do CPC c/c art. 10, § 2º da Resolução nº 4474/16 do BACEN).

Em outras palavras, "assume-se, assim, as consequências da não comprovação do alegado" (TJSC, AC nº 0003419-06.2003.8.24.0058, de São Bento do Sul, Rel. Des. Pedro Manoel Abreu).

Logo, frente a esse cenário, a única conclusão possível é a da efetiva inexistência da contratação da cédula de crédito bancário nº 010012574596, como insiste o autor.

Nesse sentido:

EXECUÇÃO - ALUGUEL - FIADOR - CONTRATO ESCRITO - DOCUMENTO ILEGÍVEL. Quando os executados negam a existência da fiança e impugnam a autenticidade das assinaturas apostas no contrato de locação, compete ao locador apresentar o original do documento ou cópia que permita a realização de perícia grafotécnica. Não o fazendo no prazo assinado, presume-se verdadeira a alegação de falsidade das firmas. (TJSC, AC nº 1997.009515-5, de Jaraguá do Sul, Rel. Des. Newton Trisotto).

A sentença não merece reparo neste particular, pois se encontra em sintonia com a Súmula 31 desta Corte de Justiça:

É dever do fornecedor de produtos ou serviços demonstrar documentalmente, estreme de dúvidas, a efetiva contratação do produto/serviço pelo consumidor, com o fito de afastar eventual ação ilícita de terceiros, sob pena de responder objetivamente pelos danos oriundos da contratação fraudulenta.

Em complemento à conclusão alcançada pelo Juízo singular, cabia à acionada demonstrar a regularidade da relação jurídica, consoante art. 373, II, do CPC, o que não ocorreu.

Nos autos, a requerida exibiu o contrato supostamente subscrito pelo requerente (evento 21).

Todavia, a parte autora impugnou a assinatura, por considerar que havia indícios (evento 26).

Designada perícia grafotécnica, a expert asseverou que (i) a avaliação foi realizada "sobre a cópia do contrato acostado aos autos, haja vista a Resolução n. 4474/2016 do Banco Central do Brasil autorizar o descarte definitivo dos documentos pelas instituições financeiras"; (ii) "os documentos apresentados pelo banco réu não possuem o padrão mínimo de digitalização exigido pelo Banco Central, vez tratar-se de digitalização com baixa resolução, torta e desalinhada". Por esse motivo, postulou a exibição da via original do ajuste (evento 61).

Em resposta, o banco demandado postulou o prosseguimento do litígio, "reafirmando a autenticidade dos contratos [...], o que, por certo, culminará no julgamento de total improcedência da pretensão autoral" (evento 64).

Ocorre que cabia ao banco demandado comprovar que a assinatura aposta no contrato partiu do punho do autor, com base no art. 429, II, do CPC, segundo o qual incumbe...

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