Acórdão Nº 5008417-77.2020.8.24.0011 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 20-10-2022

Número do processo5008417-77.2020.8.24.0011
Data20 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5008417-77.2020.8.24.0011/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: CLAUDECIR CARNEIRO (AUTOR) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

RELATÓRIO

Da ação

Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 35), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

Trata-se de ação declaratória de nulidade de negócio jurídico com ressarcimento de danos (materiais e morais) proposta por Claudecir Carneiro contra Banco BMG S.A, na qual aquele defende que é servidor público e que intencionou celebrar com este um empréstimo consignado comum; porém, foi surpreendido com um cartão de crédito consignado, operação na qual, conquanto haja retenção de margem (RMC) em sua folha salarial para pagamento do mútuo, os encargos incidentes são muito mais onerosos.

Em decorrência da prática abusiva e violação ao dever de informação previsto no Código de Defesa do Consumidor, a parte autora pediu pela concessão de tutela de urgência, a fim de suspender os descontos que reputa ilegal, e pela procedência da pretensão inicial para que o negócio seja anulado, com a condenação da instituição financeira ré à devolução dos valores cobrados a maior, em dobro (art. 42 do CDC), além de indenização por danos morais. Subsidiariamente, pede pela conversão da modalidade contratual pactuada para empréstimo consignado comum, hipótese na qual defendeu que os juros remuneratórios devem ser limitados à média de mercado para esta operação (empréstimo comum) na época da contratação.

Pela decisão constante no evento 10, a justiça gratuita foi indeferida. Interposto agravo (nº 5038543-46.2020.8.24.0000), a Terceira Câmara de Direito Comercial do e. TJSC deu-lhe provimento, concedendo a benesse.

Pela decisão constante no evento 23, a tutela de urgência foi indeferida.

Em contestação (evento 7), o banco demandado defendeu a inépcia da inicial. No mérito, a legalidade da contratação em decorrência da ausência de vício de consentimento, pois o contratante tinha plena ciência da operação realizada. Após discorrer sobre a ausência de responsabilidade civil, pediu pela improcedência.

Impugnação à contestação no evento 28.

Da sentença

A Juíza de Direito, Dra. CLARICE ANA LANZARINI, da Vara Comercial da Comarca de Brusque, julgou improcedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (Evento 35):

Na forma do art. 487, inciso I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE a presente ação proposta por Claudinei Carneiro contra Banco BMG S.A.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas, despesas e honorários que, observado o trajeto da actio e as balizadoras qualitativas previstas nos incisos I a IV do art. 85 do CPC, são fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa (R$ 10.000,00), devidamente atualizada.

"Arbitrados os honorários advocatícios em percentual sobre o valor da causa, a correção monetária incide a partir do respectivo ajuizamento" (Súmula nº 14 do STJ). Os juros de mora fluem do trânsito em julgado desta sentença - nesse sentido: STJ: AgInt nos EDcl no REsp nº 1.639.252-RJ, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 21.09.2017; TJSC, Apelação nº 0808372-54.2014.8.24.0038, rel. Des. Selso de Oliveira, j. 29.04.2021, e, Agravo nº 5014429-09.2021.8.24.0000, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. 29.07.2021.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Justiça Gratuita deferida, razão por que a exigibilidade é suspensa, na forma do § 3º do art. 98 do CPC.

Transitada em julgado, arquivem-se os autos.

Da Apelação

Inconformado com a prestação jurisdicional, o Autor, ora Apelante, interpôs recurso de Apelação (Evento 40), no qual reedita os argumentos lançados à petição inicial, ressaltando que, após a celebração do contrato de empréstimo consignado, foi surpreendido com o desconto de reserva de margem consignável (RMC) de cartão de crédito.

Pugna a reforma da decisão recorrida, uma vez que a conduta perpetrada pelo Apelado é contrária às regras de proteção ao consumidor, por violar o direito à informação.

Argumenta que há prática abusiva do Apelado, a qual está comprovada pela ocorrência de onerosidade excessiva, pois as parcelas descontadas mensalmente do seu benefício previdenciário somente pagam os encargos do cartão de crédito, o que ofende a boa-fé contratual.

Por conta disso, pretende o reconhecimento da ilegalidade da contratação, com a consequente nulidade do pacto firmado entre as partes, com a condenação do Apelado a restituição dos valores indevidamente descontados mensalmente, na forma dobrada.

No que se refere ao dano moral, sustenta que o ato ilícito está configurado, diante da ilicitude praticada pelo Apelado, sendo o abalo moral, portanto, presumido.

Por fim, requer o provimento do recurso para julgar procedentes os pedidos deduzidos na exordial para o fim de determinar a readequação para a modalidade de empréstimo consignado.

Das contrarrazões

Devidamente intimado, o Apelado apresentou contrarrazões (Evento 44). Aventa a necessidade de intimação da parte Autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, requer a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e à Autoridade Policial para que sejam apurados os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica, além de postular a condenação do causídico em litigância de má-fé.

Ascenderam os autos ao Tribunal de Justiça.

Após a distribuição, vieram-me conclusos para julgamento.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual merece ser conhecido.

II - Das contrarrazões

O BANCO BMG S.A requer a intimação da parte Autora para que informe se tem conhecimento do ajuizamento da ação, sob a alegação de prática de conduta temerária ante o reiterado ajuizamento de ações praticamente idênticas pelo seu procurador. Subsidiariamente, pleiteou a expedição de ofícios à Ordem de Advogados do Brasil, ao Ministério Público e à Autoridade Policial para que sejam apurados os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica, além de postular a condenação do causídico em litigância de má-fé.

Sem razão.

No que se refere ao pleito de intimação da parte Autora para que esta informe o seu conhecimento acerca da propositura da lide, infere-se que tal medida não se revela plausível, notadamente pelo conteúdo genérico da narrativa, que não encontra abrigo em qualquer início de prova.

Conforme já decidiu este Tribunal, eventual desvirtuamento do interesse da parte Autora na propositura da demanda não pode ser reconhecido a partir de meras conjecturas, não cabendo ao juízo, sobretudo em segundo grau de jurisdição, investigar o ânimo da parte (Nesse sentido: Apelação n. 5030238-56.2020.8.24.0038, rel. Mariano do Nascimento, j. 04-02-2021 e Apelação n. 5007736-58.2020.8.24.0092, rel. Guilherme Nunes Born, j. 08-07-2021).

Salienta-se que o instrumento de procuração subscrito pela parte, cuja autenticidade não foi derruída, tem o condão de evidenciar a prévia ciência sobre o pleito vertido em juízo, bem como seu interesse na tutela jurisdicional vindicada.

Igualmente, não merece amparo o pleito de condenação do procurador da parte demandante nas penas de litigância de má-fé, especialmente em virtude de que a aplicação das indigitadas penalidades é dirigida às partes da relação processual instaurada, e não aos seus causídicos.

A propósito, entende-se que "o fato do procurador da parte autora ter ajuizado, supostamente, centenas de ações versando sobre os mesmos pedidos e causas de pedir, não o transforma, por si só, em causídico agressor. Isso porque se trata de seu ofício e, pelo visto, da matéria que, por ora, mais lhe condiz" (TJSC, Apelação n. 0301613-52.2019.8.24.0040, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 30-07-2020).

Em arremate, caso a instituição financeira entenda haver indícios de infrações disciplinares e condutas típicas, poderá buscar diretamente as Autoridades administrativas ou o respectivo órgão de classe competente, se assim julgar necessário (Apelação n. 5001121-83.2021.8.24.0038, rel. Tulio Pinheiro, j. 01-07-2021).

III - Do julgamento do recurso

Trata-se de Apelação Cível interposta por CLAUDECIR CARNEIRO contra a sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na "Ação Declaratória Nulidade de Contrato Bancário c/c Conversão em Avença de Mútuo Consignado, Repetição de Indébito e Indenização por Danos Morais, com pedido de Tutela Provisória de Urgência" ajuizada em desfavor do BANCO BMG S.A, ora Apelado.

a) Do julgamento do mérito

Inicialmente, imperioso destacar que a relação existente entre as partes está sob o albergue do Código de Defesa do Consumidor, subsumindo-se Apelante e Apelado aos conceitos de consumidor e fornecedor prescritos nos artigos 2° e 3°, ambos do Diploma Protetivo.

Ademais, quanto à aplicabilidade das normas consumeristas às instituições financeiras, incide na espécie a Súmula n. 297 do Superior Tribunal...

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