Acórdão Nº 5008598-17.2021.8.24.0020 do Quinta Câmara de Direito Civil, 13-09-2022

Número do processo5008598-17.2021.8.24.0020
Data13 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5008598-17.2021.8.24.0020/SC

RELATORA: Desembargadora CLÁUDIA LAMBERT DE FARIA

APELANTE: BANCO ITAU CONSIGNADO S.A. (RÉU) APELADO: ALINE PEREIRA MARTINS (Sucessor) (AUTOR) APELADO: TATIANA PEREIRA MARTINS (Sucessor) (AUTOR) APELADO: PEDRO FERMINIO MARTINS (Sucessão) (AUTOR)

RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença por retratar com fidelidade os atos processuais (evento 133):

PEDRO FERMINIO MARTINS ajuizou ação declaratória e indenizatória contra BANCO ITAU CONSIGNADO S.A., ambos devidamente qualificados, aduzindo não ter formalizado o contrato de empréstimo consignado n. 623642674 com o Réu, o que estaria a macular os descontos promovidos em seu benefício previdenciário. Sob tal fundamento, requereu a declaração da nulidade do negócio jurídico, o ressarcimento em dobro dos valores descontados e o pagamento de indenização por danos morais.

Com o recebimento da inicial (ev. 9), deferida a gratuidade judiciária e a antecipação de tutela para fins de imediata suspensão dos débitos.

Citado, o Réu contestou no ev. 21. No mérito, sustentou a regularidade da contratação e pleiteou a improcedência da demanda.

A parte Autora replicou (ev. 24).

Saneado o feito no ev. 26, determinou-se a realização de prova pericial.

Aportou aos autos notícia do óbito do Demandante, oportunidade em que se procedeu a habilitação de suas sucessoras (ev. 38).

Laudo pericial juntado no ev. 106, seguido de manifestação das partes (ev. 107 e 111).

Vieram os autos conclusos.

Sobreveio sentença de procedência dos pedidos iniciais, constando no dispositivo:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos articulados na inicial, com fundamento no art. 487, I, do CPC, para:

a) DECLARAR nulo o contrato de empréstimo consignado de n. 623642674, retornando as partes ao status quo ante e assim incumbindo à parte Autora efetuar a devolução ao Réu do valor recebido (R$ 1.501,20);

b) CONDENAR o Requerido a restituir à parte Requerente, em dobro, os valores descontados do benefício previdenciário (relativos ao indigitado contrato de empréstimo consignado), corrigidos monetariamente pelo INPC desde cada pagamento, e acrescidos de juros de mora no importe de 1% ao mês, desde a citação;

c) CONDENAR o Réu ao pagamento em favor da parte Autora de compensação pecuniária pelos danos morais por ela experimentados, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), corrigido monetariamente pelo INPC a partir desta data (Enunciado n. 362 da Súmula do STJ), e acrescido de juros de mora de 1% ao mês desde o evento danoso (data da suposta contratação), nos termos do Enunciado n. 54 da Súmula do STJ;

d) CONFIRMAR os efeitos da antecipação de tutela (ev. 9).

e) CONDENAR o Réu, diante da sucumbência (Súmula n. 326 do STJ), ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, os quais, com fundamento no art. 85, § 2º, do CPC, fixo em 15% sobre o valor da condenação.

Autorizo a compensação entre os débitos e créditos da parte Autora e da parte Ré relativos aos presentes autos.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado e cumpridas as formalidades, arquivem-se.

Inconformada, a requerida interpôs recurso de apelação (evento 141), sustentando, em suma, que a contratação foi regular, havendo comprovação do repasse do valor à parte autora. Alegou, também, que a perícia grafotécnica é falível e que é visível a olho nu a correspondência entre as assinaturas dos contratos e as dos autos. Ademais, sustentou a inaplicabilidade da repetição de indébito e a ausência de dano moral indenizável. Diante disso, requereu a reforma da sentença atacada para que sejam julgados improcedentes os pedidos formulados na inicial ou, subsidiariamente, que o quantum da indenização por danos morais seja minorado.

Com as contrarrazões do evento 148, vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

Inicialmente, cumpre esclarecer que o caso em tela é regido pelas normas do Código de Defesa do Consumidor. A parte autora enquadra-se perfeitamente no conceito de consumidor (CDC, art. 2º). O banco demandado, por seu turno, subsume-se na definição legal de fornecedor, a teor do art. 3º daquele Códex.

Ademais, conforme preconiza o enunciado de Súmula n. 297 do STJ: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras."

Por ser incontroversa a relação de consumo que envolve as partes, incidem as regras previstas no Código de Defesa do Consumidor, destacando-se, para o caso concreto, o art. 14 do referido diploma legal:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. [...]

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: [...]

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Portanto, a responsabilidade do requerido é objetiva, necessitando, para a sua configuração, apenas a prova do dano e do nexo de causalidade entre os serviços prestados e o prejuízo suportado pelo consumidor. No entanto, demonstrada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, não haverá qualquer responsabilização da prestadora.

Na espécie, infere-se que a parte autora teve atrelado ao seu benefício previdenciário o empréstimo consignado nº 623642674, incluído em 10/10/2020, com valor de R$ 1.501,20 a ser devolvido em 84 parcelas de R$ 37,38 cada, com a primeira dedução prevista para fevereiro/2021 e última em janeiro/2028 (ev. 1, comprovantes 3). Aduz que jamais solicitou ou firmou contrato com o réu, motivo pelo qual desconhece a origem do negócio jurídico.

O demandado, por sua vez, apresenta narrativa divergente. Defendeu a legalidade da contratação e, para corroborar, acostou instrumento contratual referente ao negócio jurídico questionado.

A questão cinge-se, portanto, quanto à realização ou não do contrato de empréstimo consignado entre as partes e possíveis danos materiais e morais sofridos em decorrência desse.

É o que se passa a analisar.

Inexistência da relação contratual

A parte autora, por aduzir que desconhece a origem da transação financeira, encontra-se impossibilitada de comprovar a não contratação, visto que não é possível produzir prova negativa. Isto é, não há como comprovar que não contraiu o empréstimo consignado que originou os descontos em seu benefício previdenciário.

Já em sede de contestação, o réu apresentou "cédula de crédito bancário - limite de crédito para empréstimo com desconto em folha de pagamento" relativo ao negócio jurídico impugnado nos autos, documento este que está no nome do autor e possui assinatura atribuída a ele (ev. 21, contrato 2). Não obstante, em réplica, o demandante impugnou a assinatura constante no contrato acostado, sustentando não reconhecer a sua veracidade.

Embora o requerente tenha vindo a óbito no curso da ação, tendo as sucessoras do falecido se habilitado no processo (ev. 38), o perito nomeado pelo juízo informou a possibilidade de realização de exame pericial indireto (ev. 67). Dessa forma, concluiu o expert o seguinte (ev. 106):

Assim, com base no exame pericial realizado, conclui-se de forma clara que o lançamento realizado no contrato sob nº 623642674 não partiu do punho do (falecido) Sr. Pedro Ferminio Martins.

Entretanto, apesar do exame pericial ter assentado a inautenticidade da assinatura questionada quando comparada com as escritas saídas do punho do autor, o réu insiste na tese da contratação. Aventa que a perícia é falível, que é visível a olho nu a correspondência entre as assinaturas do contrato e as constantes nos autos e que o laudo pericial não vincula o magistrado.

Pois bem.

É sabido que cumpre ao juiz analisar as provas produzidas nos autos, indicando as razões de seu convencimento (art. 371, CPC) e que, especificamente no caso de perícia, apreciará a prova assinalando os motivos que o levou a considerar ou desconsiderar as conclusões do laudo (art. 479, CPC). Isso porque não há vinculação automática da decisão com o resultado do exame pericial, de forma que cabe ao magistrado a análise de toda carga probatória aportada aos autos em confronto com as teses levantadas pelas partes na fase postulatória.

Não obstante, não se pode perder de vista que determinadas matérias exigem um conhecimento técnico especializado, de forma que se faz necessário o auxílio de profissional capacitado para a compreensão e solução do litígio. É que o magistrado não possui - e nem poderia possuir - total domínio sobre todas as ciências, de forma que se torna imprescindível a atuação de um perito para o deslinde de determinados casos.

Na situação em comento, o réu refuta a conclusão do exame grafotécnico ao argumento de que seria visível a...

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