Acórdão Nº 5008908-30.2019.8.24.0008 do Primeira Câmara de Direito Civil, 11-11-2021

Número do processo5008908-30.2019.8.24.0008
Data11 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5008908-30.2019.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM

APELANTE: MARIA DE LOURDES LEIRIA (AUTOR) ADVOGADO: EDUARDO HIRT (OAB SC027532) ADVOGADO: Pedro Cascaes Neto (OAB SC026536) APELADO: UNIMED CAMPINAS COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO (RÉU) ADVOGADO: RAPHAEL BARROS ANDRADE LIMA (OAB SP306529)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Maria de Lourdes Leiria, contra sentença prolatada pelo juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Blumenau que, nos autos da Ação de obrigação de fazer n. 5008908-30.2019.8.24.0008, ajuizada contra a Unimed Campinas Cooperativa de Trabalho Médico, julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos (evento 77/EPROC1):

Ante o exposto, resolvo o mérito nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido deduzido por MARIA DE LOURDES LEIRIA em face de UNIMED CAMPINAS COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO, a fim de condenar a ré ao cumprimento de obrigação de fazer consistente na autorização e realização do exame requerido (PET-CT ou PET SCAN) à luz da prescrição médica especializada

Confirmo a decisão que concedeu a tutela provisória (evento 5).

Diante da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das despesas processuais, na proporção de metade para cada uma, bem como de honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, ante a brevidade e baixa complexidade do feito, vedada a compensação (arts. 86 e 85, §2º e §14, do CPC).

Inconformada, a autora requereu a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, ao argumento de que "A conduta ilegal perpetrada pela operadora do plano de saúde resultou em evidente risco à saúde da beneficiária e, se não fosse o deferimento da medida cautelar, resultaria em evidente prejuízo, porquanto além de suportar com toda dor, angústia e sofrimento inerente ao tratamento oncológico, a Apelante ainda teria que custear os valores para a realização do exame PET-SCAN, haja vista que o referido procedimento era de suma importância para o acompanhamento do quadro clínico" (evento 89/Apelação 1 - E1).

Contra-arrazoado apenas o recurso (evento 95/E1), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

Recebo-os conclusos.

É o relatório.

VOTO

O recurso de apelação interposto é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele se conhece.

Ultrapassada a quaestio, Maria de Lourdes Leiria sustenta, em síntese, ser devida a condenação da ré à reparação pelos danos morais suportados diante da recusa administrativa, porquanto o exame prescrito era imprescindível para a continuidade do tratamento médico oncológico que já vinha sendo realizado.

A parte apelada, de seu turno, apresentou contrarrazões, aduzindo a inocorrência de abalo moral indenizável, vez que não demonstrada qualquer tipo de lesão física ou psicológica à recorrente.

O reclamo, adianta-se, comporta provimento.

1. Dos danos morais

De início, registre-se serem desnecessárias maiores digressões sobre a obrigação de fornecimento do exame postulado na inicial, na medida em que, como visto, não houve qualquer irresignação da empresa demandada quanto ao ponto, permanecendo incontroverso, pois, o dever de cobertura.

Dito isso, sustenta a autora ter sofrido abalo moral indenizável, diante da importância do exame postulado para continuidade do tratamento de sua patologia, qual seja, neoplasia maligna de glândula tireoide.

No caso concreto, diante dos fatos narrados na petição inicial e dos elementos de prova carreados, indiscutível o sofrimento suportado pela demandante, vez que os documentos médicos coligidos ao caderno processual evidenciam que conduta praticada pela demandada ensejou o dano afirmado.

Isso porque, conforme afirmado anteriormente, a autora fora diagnosticada com grave doença (câncer de tireóide), sendo submetida a diversos tratamentos - cirúrgicos e adjuvantes - desde o ano de 2003 para conter o avanço da patologia e, embora tenha havido prescrição fundamentada para a realização do exame denominado Pet-FGD, a operadora do plano de saúde não promoveu administrativamente a cobertura ao argumento de que não contemplado pelo anexo II da Resolução Normativa n. 428/2017 da ANS.

A propósito, extrai-se do relatório médico a justificativa para solicitação do procedimento (evento 1/outros 6 - fl. 04), in verbis:

EM RESUMO:A paciente Maria de Lourdes Leiria, submetida em 2013 a uma tireoidectomia total por carcinoma papilífero de tireóide (CPT) e a uma dose terapêutica de 100mCi de iodo radioativo, vem apresentando desde esta época anticorpos antitireoglobulina (AATG) positivos.Os AATG normalmente diminuem após a retirada da tireóide e o uso do iodo radioativo e finalmente negativam em prazos variáveis, até 5 anos após a cirúrgia.Em março de 2019se observou uma ascenção dos AATG para 1435.0 UI/L, coincidindo com a localização de um linfonodo metastático em região servical E, que foi submetido a duas sessões de escleroterapia (alcoolização). Foi observada uma queda dos AATG para 1050 UI/L. Uma PAAF de linfonofo em julho de 2009 foi negativa.Nos anos seguintes os AATG estabilizaram e se observou uma queda dos mesmo até valores de 155.2 UI/L em maio 2016. Em setembro 2016 a paciente foi submetida a um PET-CT com FDG, encontrando-se linfonodos microscópicos (8 e 7 mm) com baixa atividade metabólica, com SUV de 3.27 e 2.4, respectivamente, sem indicação de intervenção.Em janeiro deste ano houve uma importante elevação dos AATG (>1500UI/L). Este aumento dos AATG pode significar o aparecimento de lesões metabolicamente ativas em outros sítios extra-tireoidianos, além dos microscópicos encontrados em região cervical E há 3 anos.Neste momento o exame do PET-FDG de corpo inteiro é extremamente importante para confirmar ou afastar lesões metastáticas de um CPT e fornecer informações importantes sobre uma eventual reintervenção cirúrgica ou com iodo radioativo.

Nessa esteira, certo que a realidade apresentada suplanta o mero dissabor, vez que a autora, como visto, há muitos anos encontra-se em tratamento de câncer e necessitava naquele momento do exame requerido pelo médico assistente para confirmar ou afastar lesões metastáticas e inclusive escolher a melhor e mais adequada intervenção médica - reintervenção cirúrgica ou com iodo radioativo - e amenizar a sua dor, tanto física quanto psicológica.

Logo, indiscutível que a recusa importou em intenso sofrimento e angústias à Maria de Lourdes Leiria em período de extrema fragilidade emocional, correndo risco até mesmo de agravar sua condição física em caso de eventual demora na realização do exame, de modo que, com a devida vênia ao entendimento do douto sentenciante, evidente o dever da ré de indenizar a consumidora pelos danos morais suportados.

Sob esta ótica, apesar da Unimed ter sustentado que a negativa está devidamente fundamentada no contrato entabulado entre as partes, pelo fato do exame não constar no anexo II da Resolução Normativa n. 428/2017 da ANS e, em que pese consabido que os pactos firmados com as operadoras de planos de saúde sejam de prestação de serviços na área...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT