Acórdão Nº 5009060-34.2021.8.24.0000 do Segunda Câmara de Direito Público, 09-11-2021

Número do processo5009060-34.2021.8.24.0000
Data09 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5009060-34.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO ROBERTO BAASCH LUZ

AGRAVANTE: COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN AGRAVADO: COMERCIO DE COMBUSTIVEIS JRJ EIRELI

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por COMPANHIA CATARINENSE DE ÁGUAS E SANEAMENTO - CASAN contra decisão interlocutória que, no CUMPRIMENTO DE SENTENÇA n. 5003225502020824008, promovido por COMERCIO DE COMBUSTIVEIS JRJ EIRELI em face da agravante, indeferiu o pedido de suspensão da execução aviado por meio da exceção de pré-executividade oposta pela agravante, nos seguintes termos:

1. INDEFIRO o pedido de suspensão da execução aduzido na exceção de pré-executividade, tendo em vista a inexistência de exposição de motivos e fundamentação a respeito do pedido na referida peça, em analogia ao previsto no art. 919, §1º do CPC.

2. Aguarde-se o decurso do prazo do ato ordinatório do ev. 18, e após retornem conclusos para decisão.

Aponta a agravante, em síntese, que há entendimento consolidado no âmbito do STF, segundo o qual é permitido o pagamento pelo regime de precatório, na hipótese em que o credor, ainda que tratando-se de sociedade de economia mista, atuar em setor não concorrencial.

Assevera, a respeito, que enquadra-se em tal hipótese, o saneamento básico, atividade desenvolvida pela recorrente, diante da exclusividade da atuação nos municípios em que obtém a respectiva concessão, notadamente pelo fato de não distribuir lucros, tendo como maior acionista o Estado de Santa Catarina, acrescentando, ainda, que desenvolve atividade típica estatal, de modo que não participa de certames licitatórios.

Assere, ademais, que 99,99% das ações, são de propriedade do Estado, razão pela qual a obtenção de lucro depende de uma boa gestão, sendo que sempre são revertidos em favor da coletividade, o que torna ainda mais cristalino a partir da política tarifária praticada, qual seja, a de subsídio cruzado, em muitos casos trazendo-lhe resultados negativos, revelando ainda mais seu caráter público, em detrimento do privado.

Por fim, aponta precedentes respeitantes ao tema, e pugna pela antecipação dos efeitos da tutela recursal, a fim de que seja concedida a tutela provisória de urgência pleiteada na inicial, e o provimento do recurso.

Sem contrarrazões (Evento 28).

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado pelo Excelentíssimo Senhor Rogê Macedo Neves, conferiu à manifestação, caráter meramente formal (Evento 31).

É o relatório.

VOTO



Pretende a agravante a reforma da decisão interlocutória que rejeitou a exceção de pré-executividade por ela ofertada, por meio da qual almeja seja promovida a adequação do rito do cumprimento de sentença para aquele estabelecido no art. 534 e seguintes do CPC, a fim de sujeitar-se ao regime de precatórios.

Em sede de análise de efeito suspensivo, em decisão unipessoal, consignei que, em caso análogo, houve pronunciamento a respeito do tema, por parte do Preclaro Desembargador Hélio do Valle Pereira, nos seguintes termos:

[...]

2. Há uma compreensão tranquila no STF, bem ressaltada pela recorrente, de que "as empresas públicas prestadoras de serviço público distinguem-se das que exercem atividade econômica" (RE 407.099/RS). Solidificou-se, inclusive, que a primeira classe estava dispensada do regime de precatórios (RE 220906/DF). Mais recentemente a mesma Corte passou a estender a interpretação também para as sociedades de economia mista prestadoras de serviço público - em especial quando se tratar de atividade voltada ao saneamento básico:

A) ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. FINANCEIRO. DECISÕES JUDICIAIS DE BLOQUEIO, PENHORA, ARESTO E SEQUESTRO DE RECURSOS PÚBLICOS DA COMPANHIA DE ÁGUAS E ESGOTOS DO RIO GRANDE DO NORTE - CAERN. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. APLICABILIDADE DO REGIME DE PRECATÓRIOS. PRECEDENTES. INDEPENDÊNCIA ENTRE OS PODERES. LEGALIDADE ORÇAMENTÁRIA. ARGUIÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA PARTE, JULGADA PROCEDENTE.

(...)

2. A Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte - CAERN é sociedade de economia mista, prestadora de serviço público em regime não concorrencial e sem intuito primário de lucro: aplicação do regime de precatórios (art. 100 da Constituição da República). Precedentes.

3. Decisões judiciais de bloqueio, penhora, aresto e outras formas de constrição do patrimônio público de empresa estatal prestadora de serviço público em regime não concorrencial: ofensa à legalidade orçamentária (inc. VI do art. 167 da Constituição), à separação funcional de poderes (art. 2º da Constituição) e à continuidade da prestação dos serviços públicos (art. 175 da Constituição). Precedentes.

4. Arguição parcialmente conhecida e, nesta parte, julgada procedente para determinar a suspensão das decisões judiciais que promoveram constrições patrimoniais por bloqueio, penhora, arresto, sequestro e determinar a sujeição ao regime de precatórios à Companhia de Água e Esgoto do Rio Grande do Norte - CAERN (ADPF 556/RN, rel. Min. Cármen Lúcia)

B) Agravo regimental no recurso extraordinário. Constitucional. Sociedade de economia mista. Regime de precatório. Possibilidade. Prestação de serviço público próprio do Estado. Natureza não concorrencial. Precedentes.

1. A jurisprudência da Suprema Corte é no sentido da aplicabilidade do regime de precatório às sociedades de economia mista prestadoras de serviço público próprio do Estado e de natureza não concorrencial.

2. A CASAL, sociedade de economia mista prestadora de serviços de abastecimento de água e saneamento no Estado do Alagoas, presta serviço público primário e em regime de exclusividade, o qual corresponde à própria atuação do estado, haja vista não visar à obtenção de lucro e deter capital social majoritariamente estatal. Precedentes.

3. Agravo regimental não provido. (RE 852.302/AL, rel. Min. Dias Toffoli)

Tais precedentes, de todo modo, externaram, por assim dizer, balizas; requisitos para que referidas pessoas jurídicas de direito privado possam ficar submetidas àquele tratamento constitucional. Mais do que prestar serviço público essencial, elas não poderão atuar em regime concorrencial ou ter intuito apriorístico de distribuir lucros entre seus sócios.

3. No caso concreto, a Casan atende, aparentemente, estes pressupostos - afirmação que faço neste primeiro contato com a causa, em que pese às alegações dos agravados.

É sociedade de economia mista prestadora de serviços públicos considerados essenciais - única em nível estadual -, sendo o Estado de Santa Catarina seu controlador (é detentor direto de 61,93% do capital votante da CIA, alcançando 99,99% quando consideradas as participações das demais entidades públicas). Seus ganhos, assim, retornam quase que integralmente à Administração, podendo-se admitir que seu objetivo primordial é essencialmente voltado à coletividade.

Suas características, portanto, aproximam-se de forma eloquente daquelas consideradas pelo Pretório Excelso nos julgados colacionados há pouco, tornando-se plausível sua acomodação à disciplina de submissão ao precatório e intuitivo o risco de continuidade da execução nos termos em que até aqui processada.

4. Assim, defiro a antecipação de tutela recursal a fim de determinar que o cumprimento de sentença seja readequado ao rito do art. 534 e seguintes do CPC. (AI n. 4005567-03.2020.8.24.0000, Capital, j. 05.08.2020)

Posteriormente, no mérito, houve confirmação da referida intelecção:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - CUMPRIMENTO (EXECUÇÃO) DE SENTENÇA POR QUANTIA CERTA - SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA - PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO - SUBMISSÃO A PRECATÓRIO - POSIÇÃO CONVERGENTE DO STF - EXECUCIONAL, PORÉM, EM CURSO HÁ MUITOS ANOS - PENHORA CONCRETIZADA - TEMA SÓ AGORA TRAZIDO - ILOGICIDADE QUANTO À ALTERAÇÃO DO RITO - DESPROVIMENTO.1. Com a ressalva do posicionamento do subscritor, adere-se à posição do STF no sentido de que, atendidas a certas condições, sociedades de economia mista prestadoras de serviço público podem ser beneficiadas pelo regime de requisição de pagamentos (os precatórios).2. O pensamento, todavia, só surgiu mais recentemente, muito antes do início da fase executiva agora discutida, nunca sendo antes trazida. Houve penhora e...

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