Acórdão Nº 5009184-60.2021.8.24.0018 do Primeira Câmara de Direito Civil, 07-07-2022

Número do processo5009184-60.2021.8.24.0018
Data07 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5009184-60.2021.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTO

APELANTE: JUSSANE DOS SANTOS (AUTOR) ADVOGADO: WILSON JAIR GERHARD (OAB sc008468) ADVOGADO: KARINA BLANCO FERNANDES (OAB SC019019) ADVOGADO: SUELEN BAYERL (OAB SC046843) APELANTE: REGIS VINICIOS COLOMBELLI (RÉU) ADVOGADO: ALEXANDRE BENIN (OAB SC025871) APELANTE: MARCELO LEMES (RÉU) ADVOGADO: ALEXANDRE BENIN (OAB SC025871) APELANTE: CRISTIANE DE QUEIROZ LEMES (RÉU) ADVOGADO: ALEXANDRE BENIN (OAB SC025871) APELANTE: TAISA SOUZA COLOMBELLI (RÉU) ADVOGADO: ALEXANDRE BENIN (OAB SC025871) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por R. V. C., M. L., C. de Q. L. e T. S. C. em face da sentença proferida pelo juízo da 4ª Vara Cível da comarca de Chapecó que, nos autos da Ação de Rescisão Contratual e Perdas e Danos n. 5009184-60.2021.8.24.0018 ajuizada por J. dos S., julgou procedentes os pedidos, nos seguintes termos (Evento 43 - autos de origem):

DISPOSITIVO

Assim sendo e com fundamento no inciso I do artigo 487 do Código de Processo Civil, acolho os pedidos iniciais para o fim de:

a) declarar rescindido, por culpa exclusiva dos réus, o contrato de compra e venda cuja cópia repousa no evento 1, CONTR4, condenando-os, por consequência, à perda das arras então entregues à autora, conforme tópico estabelecido no corpo da sentença;

b) condenar os réus, solidariamente, ao pagamento, em favor da parte autora, do valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) mensais a título de aluguéis pelo uso precário e indevido do imóvel, cuja correção monetária, pelo índice INPC/IBGE, acrescido de juros de mora de 1% ao mês, devem obedecer aos critérios e parâmetros também fixados ao longo da fundamentação supra, inclusive com a ressalva de suspensão da exigibilidade após os sessenta dias após o trânsito em julgado da presente, autorizada, ainda, a compensação referida.

c) determinar a reintegração da posse no imóvel, pela autora, e com prazo de desocupação de 30 (trinta) dias, somente depois de depositar o saldo do crédito apurado em benefício dos réus, o que deverá ser igualmente feito com a observância de todos os direitos de retenção e compensação acima reconhecidos, na forma da fundamentação lançada.

Condeno os réus, ainda solidariamente, ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, estes últimos que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, com esteio no § 2º do artigo 85 do CPC, porque o feito foi julgado antecipadamente e não contém complexidade que desborde de sua própria natureza, além de estar tramitando há pouco menos de um ano.

Inconformados, os apelantes arguiram, preliminarmente, a ocorrência de nulidade do decisum, sobretudo em razão da necessidade de realização de perícia no imóvel adquirido, pois a apelada teria vendido o bem conjuntamente com uma estrada municipal. No mérito, sublinharam que a inclusão pela recorrida de uma estrada Municipal de 739,993m² no contrato entabulado mostra-se objeto ilícito e justifica o manejo da exceptio non adimplenti contractus. Destacaram, ainda, que o contrato protege única e exclusivamente a recorrida, infringindo claramente princípios como o da boa-fé, do equilíbrio financeiro e da função social em evidente favorecimento daquela, mediante onerosidade excessiva ao compradores/apelantes em decorrência das penalidades fixadas.

Subsidiariamente, requereram que sejam restituídos no montante de R$ 192.000,00, em razão das benfeitorias realizadas no imóvel, bem como seja reconhecida a ocorrência de fato superveniente/força maior em razão da pandemia Covid-19, não devendo ocorrer a rescisão, pois o contrato firmado está garantido por fiança e hipoteca, além de ter ocorrido o adimplemento substancial.

Em resposta, a apelada apresentou contrarrazões, pugnando pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação (Evento 62- autos de origem)

Por sua vez, J. dos S. interpôs Recurso Adesivo (Evento 60 - autos de origem), requerendo, em suma, que seja determinado que o valor fixado a título de aluguel seja corrigido monetariamente pelo INCC ou IGPM, conforme previsão contratual. Tocante aos honorários de sucumbência, ressaltou que estes devem ser fixados em percentual sobre o valor da causa (a qual reflete a efetiva pretensão econômica dos pedidos acolhidos no julgamento do processo).

Embora intimados, os recorridos deixaram de apresentar contrarrazões ao recurso adesivo (Evento 70 - autos de origem).

Após, ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

1. Recurso de Apelação

1.1 Admissibilidade recursal

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

1.2 Preliminar de mérito

Preliminarmente, os apelantes sustentaram a ocorrência de nulidade do decisum, em razão da necessidade de realização de perícia no imóvel por eles adquirido, pois segundo o alegado, a apelada teria vendido o bem conjuntamente com uma estrada municipal.

A prefacia deve, pois, ser afastada.

Para melhor compreensão do caso, adota-se o relatório da sentença (Evento 43 - autos de origem):

Trata-se de ação de rescisão contratual c/c perdas e danos, em que são partes as acima indicadas, todas devidamente qualificadas.

Como fundamento da pretensão, aduziu a parte autora, em suma: a) é proprietária e possuidora de parte ideal de uma área de terras situada na Linha Sete de Setembro, Fazenda Campina do Gregório, neste município de Chapecó, com 15.586,925 m², matriculada sob nº 98.915 junto ao CRI local; b) a propriedade é exercida em conjunto com C. A. e V. T. P. P.; c) desta fração ideal de sua propriedade e posse, vendeu aos primeiros réus uma fração de 9.057,10 m², cuja localização fora ajustada com a compra e venda celebrada (conforme mapa com traçado das linhas divisórias efetivado pela parte compradora); d) as partes contratantes declararam expressamente tratar-se de uma compra e venda na modalidade ad corpus, isto é, que eventual diferença na área delimitada não seria invocada como fundamento para busca do abatimento de preço ou para complemento de área (CC, art. 500, § 3º); e) ainda, de forma muito clara, ajustaram o seguinte: i) a regularização das edificações existentes no imóvel adquirido seria de responsabilidade dos compradores réus (inclusive tendo estes a necessidade de contratar os profissionais para promover a averbação respectiva), sem que isto pudesse implicar em abatimento do preço ajustado; ii) os compradores réus declararam - expressamente - ter conhecimento de que o imóvel adquirido integrava um condomínio e todo o procedimento de individualização (inclusive todos os custos) da área com abertura de nova matrícula (extinguindo o condomínio na forma do Decreto Federal 62504), seria de sua responsabilidade, sem possibilidade de abatimento do preço; iii) além disso, se eventualmente não fosse possível o desmembramento da área e correspondente manutenção do condomínio, nada poderiam reclamar da parte autora, inclusive sujeitando-se os réus no pagamento das penalidades ajustadas; f) em função do negócio entabulado, a autora transferiu a posse precária (provisória) da área adquirida aos primeiros réus (que estão residindo na benfeitoria existente no imóvel alienado); g) o título para transferência da propriedade seria outorgado após o pagamento da segunda parcela do preço (R$ 900.000,00), inclusive com anotação de cláusula resolutiva expressa, condicionando a definitividade do negócio ao pagamento do saldo remanescente (cláusula décima do contrato); h) pelo pacto de compra e venda do imóvel restou acordado o preço total de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais), cujo pagamento dar-se-ia da seguinte forma: i) R$ 100.000,00 (cem mil reais) pagos na assinatura do contrato, ou seja, 03/03/2020; ii) R$ 900.000,00 (novecentos mil reais) seriam pagos até 10/10/2020; iii) R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) seriam pagos em 14 parcelas mensais, iguais e consecutivas de R$ 35.714,28 (trinta e cinco mil, setecentos e catorze reais, com vinte e oito centavos), vencendo a primeira em 10/11/2020 e a última em 10/12/2021; i) merece destaque o ajuste de que o não pagamento de qualquer das parcelas implicaria na interpretação como manifestação tácita dos réus adquirentes pela opção do exercício da cláusula de arras penitencial; j) restou ajustada cláusula de arrependimento (CC, art. 420), a qual teria incidência na hipótese de não pagamento do preço do negócio e, para tanto, o valor inicialmente pago (entrada de R$ 100.000,00) teria esta finalidade; k) no caso de rescisão (por qualquer motivo, inclusive o não pagamento do preço do negócio), a posse transmitida de forma precária aos réus compradores deveria ser imediatamente restituída à autora, sujeitando aqueles ao pagamento do preço da locação já expressamente ajustada, na ordem de 1% (um por cento) do valor do imóvel por mensalidade de ocupação; l) os compradores deram em garantia real (hipoteca) dois imóveis de sua propriedade à vendedora/autora, por conta das obrigações assumidas com a compra (inclusive as que eventualmente seriam decorrentes do inadimplemento); m) os demandados Marcelo e Cristiane compareceram ao negócio e assumiram responsabilidade solidária - na modalidade de fiança - no pagamento das obrigações assumidas (principal e acessórios) pelos compradores, inclusive as decorrentes de eventual inadimplemento contratual, renunciando ao benefício de ordem (CC, artigos 827 e 828); n) a autora cumpriu com sua fração obrigacional, transferindo aos réus adquirentes a posse precária do imóvel (parte ideal) vendido, sendo que a escritura pública somente seria outorgada (contemplando cláusula condição resolutiva expressa) após o pagamento da segunda parcela, não podendo os réus reclamar da eventual individualização da área e, menos ainda, da eventual diferença apurada por se tratar de compra e venda ad corpus; o) os réus adquirentes, por sua vez, efetivaram o pagamento da parcela inicial...

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