Acórdão Nº 5009215-81.2019.8.24.0008 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 18-08-2022

Número do processo5009215-81.2019.8.24.0008
Data18 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5009215-81.2019.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: EUNICE GREGORIO (AUTOR) APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Eunice Gregorio interpôs recurso de apelação da sentença proferida pelo magistrado de primeiro grau, Marlon Negri, nos autos da ação de anulatória de contrato de cartão de crédito cumulada com repetição de indébito e indenizatória proposta contra Banco BMG S.A, em curso perante o juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário, que julgou improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, nestes termos (evento 58, autos do 1º grau):

I - RELATÓRIO

Trata-se de ação ajuizada por EUNICE GREGORIO em face de BANCO PAN S.A., na qual aduziu, em resumo, que celebrou contrato de empréstimo com a parte ré, entretanto, foi induzida em erro, pois efetivado em modalidade diversa da pretendida, qual seja, empréstimo por meio de cartão de crédito consignado com RMC (Reserva de Margem Consignável), com encargos/retenção de valores indevidos.

A gratuidade da justiça foi indeferida (evento 10 ).

Conforme decisão do agravo de instrumento n. 5003548-41.2019.8.24.0000/SC, foi determinada a intimação da autora para apresentar documentos comprobatórios da sua insuficiência financeira (evento 21).

O pedido de gratuidade da justiça foi negado (evento 26).

Conforme decisão do agravo de instrumento n. 5023373-97.2021.8.24.0000, a gratuidade da justiça foi concedida (evento 29).

A tutela de urgência e a inversão do ônus da prova (evento 32).

Citada, a instituição financeira contestou (evento 45), opondo resistência à pretensão da parte autora.

Houve réplica (evento 55).

É o breve relatório.

II - FUNDAMENTAÇÃO

Do julgamento antecipado da lide.

Julgo antecipadamente a lide, com base no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, porque desnecessária a produção de outras provas além daquelas já existentes nos autos.

Da aplicação do Código de Defesa do Consumidor.

Em se tratando de contrato bancário, incidente o Código de Defesa do Consumidor, figurando a parte autora, pessoa física ou jurídica, como consumidora e a instituição financeira como prestadora de serviços.

Na mesma linha, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 297, que enuncia:

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Assim, o contrato será apreciado à luz dos princípios norteadores do direito consumerista, situação que viabiliza a revisão das cláusulas eivadas de nulidade (arts. 6º, inciso V, e 51, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor), sem que se possa cogitar a ocorrência de violação ao princípio "pacta sunt servanda".

Do mérito

Cinge-se a controvérsia acerca da (ir)regularidade da contratação de mútuo e das consequências jurídicas decorrentes dessa conclusão.

Infere-se que a modalidade de contratação questionada - cujo devedor, agora, meses após a contratação, entende abusiva - encontra expresso amparo legal, conforme disposto na Lei n. 10.820/2003:

Art. 6° Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1º e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)[...] § 5o Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor dos benefícios, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (sublinhei e destaquei).

Assim, a procedência dos requerimentos está atrelada à demonstração de abusividades praticadas pela instituição financeira, com desvantagem exagerada suportada pelo consumidor, ou ilicitude contratual, caso contrário, deve prevalecer a avença livremente firmada.

No caso em apreço, verifica-se que foram juntados pelo requerido os contratos pactuados entre as partes, denominados "planilha de proposta de cartão'', ''termo de adesão ao regulamento para utilização do cartão de crédito consignado PAN'' e ''solicitação de saque via cartão de crédito - transferência de recursos do cartão de crédito PAN'' (evento 45, anexo 6), devidamente assinados pela parte autora.

A assinatura constante no arquivo, aliás, não foi impugnada de maneira idônea, não havendo a indicação e a apresentação de argumentação específica capaz de ilidir a presunção legal de veracidade (art. 408 do CPC).

O instrumento foi redigido de modo claro quanto ao seu objeto, além de mencionar de maneira expressa e em destaque quanto à modalidade da contratação.

Assim, em decorrência da autorização legal e da expressa contratação, não se evidencia qualquer irregularidade ou abusividade no ajuste, além do que não se classifica como venda casada (art. 39, inciso I, Código de Defesa do Consumidor) porque não há evidência que existiu qualquer condicionamento da concessão de empréstimo consignado à contratação do cartão de crédito.

No tocante à legalidade do pacto, inclusive, a Turma de Uniformização dos Juizados de Santa Catarina (Enunciado n. XIV) reconheceu a validade do contrato de cartão de crédito consignado com autorização para desconto, nos seguintes termos:

XIV - Observados os termos da Lei n. 10.820/03 a da Instrução Normativa n.28/2008-INSS, é válido o contrato de cartão de crédito consignado com autorização para desconto em benefício previdenciário, não havendo dano moral presumível no caso de sua contratação com inobservância daquelas regras.

Portanto, não havendo qualquer irregularidade na contratação, inviável a declaração de inexistência da contratação ou a restituição dos valores cobrados, tampouco a pretensão alternativa de "conversão" do ajuste para empréstimo consignado.

Igualmente, em decorrência da higidez da contratação, afasta-se a pretensão de indenização por danos morais, uma vez que não caracterizada a prática de qualquer ato ilícito.

Acerca do tema, colhe-se do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

1) Apelação n. 5012386-68.2020.8.24.0054, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Mariano do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 08-07-2021:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO NA MODALIDADE DE DESCONTO DA RESERVA DA MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. AVENTADA ILEGALIDADE DO CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM CARTÃO DE CRÉDITO, POR AUSÊNCIA DE EXPRESSO CONSENTIMENTO COM A REALIZAÇÃO DAQUELE TIPO DE OPERAÇÃO. TESE REJEITADA. NOVO ENTENDIMENTO DESTA CÂMARA ACERCA DO TEMA. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNÁVEL COM SAQUE EM CARTÃO DE CRÉDITO (RMC) AUTORIZADO PELO ART. 6º, §5º, II, DA LEI N. 10.820/2003 E DO ART. 3º, §1º DA INSTRUÇÃO NORMATIVA DO INSS N. 28/2008. CASO CONCRETO EM QUE A PARTE TEVE CIÊNCIA DA NATUREZA DAQUELA OPERAÇÃO, JÁ QUE, À ÉPOCA DA CELEBRAÇÃO DA AVENÇA, NÃO POSSUÍA MARGEM CONSIGNÁVEL DISPONÍVEL (30%), VALENDO-SE, ENTÃO, DO LIMITE ADICIONAL DE 5% (CINCO POR CENTO), DISPONIBILIZADO PARA USO DO CARTÃO DE CRÉDITO. AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO. DEVER DE INDENIZAR INEXISTENTE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

2) Apelação n. 5003178-82.2020.8.24.0079, do Tribunal de Justiça de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT