Acórdão Nº 5009834-38.2020.8.24.0020 do Segundo Grupo de Direito Criminal, 29-09-2021

Número do processo5009834-38.2020.8.24.0020
Data29 Setembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegundo Grupo de Direito Criminal
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Tipo de documentoAcórdão
Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5009834-38.2020.8.24.0020/SC

RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER

EMBARGANTE: CARLOS EDUARDO CRUZ (RÉU) EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Carlos Eduardo Cruz aforou o presente recurso de embargos infringentes contra acórdão da Apelação Criminal nº 5009834-38.2020.8.24.0020, originado da egrégia Terceira Câmara Criminal (evento 21), que, por maioria, decidiu conhecer do recurso e dar-lhe provimento, vencido o Exmo. Sr. Des. Júlio César Machado Ferreira de Melo.

O embargante busca, em síntese, a prevalência do voto vencido exarado pelo Exmo. Sr. Desembargador Júlio César Machado Ferreira de Melo, que mantinha a compensação integral entre a reincidência e a confissão espontânea na segunda fase da dosimetria do crime de furto, realizada pelo juízo de primeiro grau, bem como a fixação do regime inicial semiaberto (evento 28).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. JAYNE ABDALA BANDEIRA, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 33).

Este é o relatório.

VOTO

O recuso deve ser conhecido, visto que presentes os requisitos de admissibilidade.

Como sumariado, o embargante busca, em síntese, a prevalência do voto vencido exarado pelo Exmo. Sr. Desembargador Júlio César Machado Ferreira de Melo, que mantinha a compensação integral entre a reincidência e a confissão espontânea na segunda fase da dosimetria do crime de furto, realizada pelo juízo de primeiro grau, bem como a fixação do regime inicial semiaberto (evento 28).

Estes foram os fundamentos apresentados no voto vencido pelo Exmo. Sr. Desembargador Júlio César Machado Ferreira de Melo:

Ousei discordar da douta maioria por entender que a decisão emanada pelo Juízo de primeiro grau, Rodrigo Francisco Cozer, está correta, quando aplicou devidamente a compensação integral entre a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea, bem como fixou o regime inicial de cumprimento de pena o semiaberto, in verbis (evento 131 dos autos de origem):

[...]

Assim, passo a discutir a dosimetria da pena.

No que tange a atenuante da confissão espontânea, reconheço-a, especialmente porque, além de confessar o crime, o acusado apresentou riqueza de detalhes quanto à dinâmica dos fatos, circunstância que deve ser valorada em seu benefício.

Presente também a multrirreincidência (autos do inquérito policial - 57225820138240020, ev. 6 - certidão 2; 371620168240004, ev. 6 - certidão 5).

Neste ponto, esclareço que a condenação nos autos n. 57225820138240020 será utilizada como maus antecedentes, enquanto que a outra será valorada na segunda fase.

Em relação a majorante de repouso noturno entendo que plenamente cabível.

Isso porque é entendimento consolidado, inclusive no Superior Tribunal de Justiça, que para configuração da aludida majorante basta que a conduta delitiva tenha sido praticada durante o repouso noturno, em razão da maior precariedade da vigilância e defesa do patrimônio durante tal período e, por consectário, a maior probabilidade de êxito na empreitada criminosa (v. STJ, Min. Ribeiro Dantas, j. 23/08/2018).

Ademais, ficou comprovado (inclusive por confissão do réu) que o delito aconteceu próximo à meia noite, durante o período de mais vulnerabilidade do patrimônio, requisito essencial da causa de aumento.

Portanto, entendo que devidamente configurada a majorante prevista no art. 155, § 1º do Código Penal e consequentemente a pena será aumentada em 1/3.

Quanto à qualificadora de rompimento de obstáculo, tenho que, igualmente, ficam demonstradas tanto pela confissão do acusado, quanto pelas palavras da vítima e das testemunhas.

Tanto é assim que, em juízo, o acusado afirmou que utilizou um pedaço de madeira para abrir a porta de vidro do estabelecimento comercial. Além disso, os policiais e a vítima afirmaram que chegaram no local e porta estava arrombada. A circunstância também foi constatada no laudo pericial n. 9113.20.001231 (ev. 68), onde verifica-se que existem sinais de amassamento característico de forçamento com instrumento rígido.

Assim, considerando que o conjunto probatório amealhado aos autos é harmônico e demonstrou com suficiência o arrombamento da porta do estabelecimento comercial, reconheço a qualificadora de rompimento de obstáculo prevista no § 4º, I, do art. 155 do Código Penal.

No que tange à tentativa vislumbro que o réu arrombou a porta do estabelecimento comercial e nele ingressou. Quando os policiais chegaram o acusado estava pegando chocolates e colocando dentro da mochila, a qual já estava também com outros objetos subtraídos do local. Portanto, considerando o iter criminis percorrido, foi ultrapassada a fase inicial da tentativa, sendo que o réu encontrava-se na fase intermediária, ainda subtraindo os objetos e bens. Diante disso, considerando que não é possível inferir que os atos executórios haviam se esgotado, reconheço a diminuição da pena na fração intermediária de 2/5. No caso, não cabe a diminuição na fração máxima conforme sustentado pela defesa porque o réu já havia subtraído outros objetos e bens do local. Também não cabe a diminuição mínima defendida pelo Ministério Público porque o acusado ainda estava dentro do estabelecimento furtando chocolates (não saindo, como sustentado).

3. Pedido de reparação dos danos

O Ministério Público requereu, por ocasião do oferecimento da denúncia, a fixação de valor mínimo para reparação dos danos suportados pela vítima.

Acerca do tema, preceitua o art. 387, IV, do CPP, que "O juiz, ao proferir sentença condenatória, [...] fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido".

No entanto, entendo que o pedido não comporta deferimento, porquanto, embora se tenha notícia dos danos realizados pelo réu no estabelecimento da vítima, não é possível saber, ainda que minimamente, a extensão financeira suportada pela vítima, uma vez que não houve prova documental acerca do dano.

No mais, todos os objetos inicialmente subtraídos foram devolvidos para o estabelecimento, tal como faz prova o termo de entrega juntado nos autos do inquérito policial (ev. 01, P_FLAGRANTE1, fl. 18, dos autos n. 5009273-14.2020.8.24.0020).

Portanto, inviável a fixação de valor mínimo de indenização.

DOSIMETRIA DA PENA

Na primeira fase da dosimetria, vislumbro que a culpabilidade, compreendida como o grau de reprovabilidade da conduta, parece normal ao tipo. Como já fundamentado, há registro de maus antecedentes. Não existem elementos nos autos que desabonem sua conduta social. Inexistente exame técnico no feito para análise da sua personalidade. Os motivos e as circunstâncias foram normais à espécie. As consequências foram todas inerentes ao tipo. O comportamento da vítima não contribuiu para a prática do crime.

No mais, quanto à qualificadora de rompimento de obstáculo aplico-a como fundamento para partir do mínimo legal (2 anos).

Desta feita, na primeira fase, fixo a pena base em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa.

Na segunda fase presente a incidência da atenuante da confissão espontânea prevista no art. 65, III, "d", do CP, assim como a agravante da reincidência, prevista no art. 61, I, do CP. Compenso-as, mantendo a pena da fase anterior.

Por derradeiro, na terceira fase reconheço a majorante prevista no art. 155, §1º do Código Penal, razão pena qual aumento a pena na fração de 1/3, considerando que o crime se deu durante o repouso noturno.

Reconheço também a causa de diminuição decorrente da tentativa (art. 14, II, do CP) e diminuo a pena em 2/5 conforme fundamentação.

Desta forma, fixo a pena em 11 (meses) e 6 (seis) dias de reclusão e 5 dias multa.

O valor de cada dia-multa é estabelecido em 1/30 do salário mínimo nacional vigente na época dos fatos, considerando a capacidade financeira do réu, a qual é presumidamente reduzida.

Fixo ao réu o regime semiaberto para cumprimento da pena privativa de liberdade, com base no art. 33, § 2º, "b", do Código Penal, haja vista que o réu é reincidente específico.

Sem necessidade de realizar a detração diante do regime inicialmente fixado.

A substituição por pena restritiva de direitos (art. 44 do CP) é inviável, haja vista que o denunciado é reincidente.

A suspensão condicional da pena (sursis do art. 77 do CP) é inviável na espécie pelo mesmo motivo (réu reincidente).

A estas minudentes razões, pouco há de se acrescentar.

Em complemento, apenas para reforçar os pontos de insurgência recursal, anoto que o tema é polêmico, no entanto, observo que deve prevalecer o entendimento firmado pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça que estabeleceu que a reincidência, inclusive a específica, deve ser compensada integralmente com a atenuante da confissão, considerando que ambas as circunstâncias são igualmente preponderantes.

Consta nas anotações inseridas ao "Tema 585", em que a Terceira Sessão discutiu, sob o procedimento previsto para os recursos repetitivos no âmbito do STJ, sobre "a possibilidade de compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência, com exceção dos réus multirreincidentes".

Veja-se:

Anotações Nugep: O relator do TEMA 585/STJ proferiu decisão no REsp 1.738.994/PA (DJE 06/08/2018), integrante da controvérsia n. 53, decidindo:

"Outrossim, recentemente, em 11/10/2017, a Terceira Seção, no julgamento do Habeas Corpus n. 365.963/SP, firmou a jurisprudência no sentido que a especificidade da reincidência não obstacutaliza sua compensação com a atenuante da confissão espontânea. Ou seja, a reincidência, ainda que específica, deve ser compensada integralmente com a atenuante da confissão, demonstrando, assim, que não deve ser ofertado maior desvalor à conduta do réu que ostente outra condenação pelo mesmo delito. Todavia, tratando-se de réu multirreincidente, deve ser reconhecida a preponderância da agravante prevista no art. 61, I, do Código Penal...

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