Acórdão Nº 5009916-98.2020.8.24.0075 do Terceira Câmara Criminal, 08-02-2022

Número do processo5009916-98.2020.8.24.0075
Data08 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5009916-98.2020.8.24.0075/SC

RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN

APELANTE: ALEXSSANDRO CARVALHO (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Tubarão, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Alexssandro Carvalho, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:

Consta no incluso caderno indiciário que, no dia 14 de setembro de 2020 (terça-feira), por volta das 20h30min, na Rua Álvaro Antônio Fermiano, s/n., Bairro Humaitá, Tubarão-SC, Policiais Militares efetuavam rondas pela localidade "Capão", onde há notícias sobre a prática do tráfico de drogas, ocasião em que avistaram o denunciado ALEXSSANDRO CARVALHO parado em frente à sua residência, sendo que na ocasião segurava um pote de cor branca, que em seu interior continha aproximadamente 2,8g de substância semelhante a "crack", dividida em embalada em 20 porções (Laudo Preliminar de p. 9 - IP 1, Evento 1), droga essa que ele trazia consigo para comércio, tudo sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Na ocasião, o denunciado recebeu ordem legal de parada, momento em que dispensou o pote branco para dentro do terreno e esboçou fuga e reação passiva à abordagem, mas foi contido e, descoberta a droga no pote, recebeu voz de prisão, sendo que em revista ao pátio da residência, os agentes apreenderam um penal contendo em seu interior a importância de R$ 18,00 em notas de pequeno valor, oriundas das vendas espúrias.

[...] (ev. 1)

Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar o acusado às penas de 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 666 (seiscentos e sessenta e seis dias) dias-multa, por infração ao disposto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06. Foi-lhe negado o direito de apelar em liberdade (ev. 129).

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação e arguiu, preliminarmente, a nulidade das provas face à ilicitude da busca pessoal. No mérito, pugnou pela desclassificação do crime desscrito na inicial para aquele do art. 28 da Lei de Drogas. Se mantida a condenação pelo tráfico, requereu o afastamento do art. 42 da Lei n. 11.343/2006 e dos maus antecedentes como circunstâncias judiciais negativa (ev. 144).

Juntadas as contrarrazões (ev. 149), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (ev. 9).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação contra decisão que julgou procedente a denúncia e condenou o acusado às sanções previstas no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006.

O apelo é de ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

Da nulidade da busca pessoal

A defesa arguiu a nulidade da diligência, porque realizada de modo ilegal, tendo em vista que não havia fundadas suspeitas para sua realização, conforme exigência prevista no art. 240, § 2º, do CPP.

Sem razão.

Não se desconhece que a medida probatória de busca pessoal, prevista nos arts. 240, § 2º, e 244 ambos do Código de Processo Penal, exige, desde que não decorrente de cumprimento de ordem judicial, a demonstração de fundada suspeita de que a pessoa esteja de posse de objetos que constituam exame de corpo de delito.

Todavia, in casu, o acusado estava parado em frente à sua residência - esta localizada em localidade conhecida pelo intenso tráfico de drogas - às 20:30h, segurando um pote branco.

Ao receber ordem de parada, dispensou o volume e esboçou reação de fuga.

Logo, legítima é a abordagem policial realizada em local de intensa criminalidade, com vistas a reduzir o número de delitos ocorridos na região e, assim, salvaguardar a ordem pública.

De mais a mais, tanto foi legítima a suspeita dos agentes que culminou na prisão em flagrante do acusado, em razão da posse de entorpecentes destinados à venda, conforme se verá adiante - crime, como é sabido, de natureza permanente.

Neste sentido, colhe-se de julgado desta Corte:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT E §4º, DA LEI N. 11.343/06). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PRELIMINARES. NULIDADE DA REVISTA PESSOAL. ILEGALIDADE NÃO VERIFICADA. POLICIAIS MILITARES EM PATRULHAMENTO. OPERAÇÃO EFETUADA EM CONHECIDO PONTO DE VENDA DE ENTORPECENTES. RÉU QUE TENTOU EVADIR-SE QUANDO VISUALIZOU A CHEGADA DA GUARNIÇÃO. ABORDAGEM EFETUADA EM TODOS OS INDIVÍDUOS QUE ESTAVAM NO LOCAL. EXISTÊNCIA DE FUNDADA SUSPEITA A JUSTIFICAR A BUSCA PESSOAL. LEGALIDADE DA ATUAÇÃO DOS POLICIAIS MILITARES. INTELIGÊNCIA DO ART. 240, §2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. [...] (Apelação Criminal Nº 5020770-87.2020.8.24.0064, rel. Des. Hildemar Meneguzzi de Carvalho, Segunda Câmara Criminal, j. 19/10/2021) [grifei].

Portanto, não há nulidade a ser reconhecida na diligência realizada pelos agentes públicos.

Da desclassificação para o art. 28 da Lei de Drogas

Pretende a defesa a desclassificação do delito grafado na inicial para o art. 28 da Lei n. 11.343/2006, ao argumento de que o entorpecente apreendido não era destinado à venda.

No entanto, sem razão.

Consta na denúncia, em síntese, que o acusado foi preso em flagrante após dispensar um pote contendo 2,8g (dois gramas e oito decigramas) de crack, divididas em 20 (vinte) porções

Pois bem.

Textua o art. 33, caput, da Lei de Drogas:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

Anote-se, de início, que o crime de tráfico é de ação múltipla, com diversos verbos em seu corpo, os quais compõem uma única figura típica, pelo que a caracterização de apenas um deles tipifica o crime em questão, seja pela aquisição, venda, guarda, fornecimento, transporte, trazer consigo, manutenção em depósito, entrega a consumo de terceiros, etc.

Com efeito, a materialidade restou demonstrada pelos documentos constantes no auto de prisão em flagrante (ev. 1, autos n. 5009480-42.2020.8.24.0075), tais como o boletim de ocorrência, auto de apreensão, laudo de constatação provisório e laudo pericial definitivo (ev. 42 destes autos).

A autoria, de igual modo, restou comprovada e recai sobre a pessoa do apelante.

Para elucidar tal entendimento, pertinente percorrer a prova oral produzida, cujas algumas transcrições, muito bem elaboradas pelo togado, passarão a integrar este voto, evitando desnecessária tautologia.

Durante seu interrogatório, em Juízo (ev. 65, vídeo 1), o acionado negou a prática delitiva, tendo declarado, em resumo, [...] que estava catando reciclagem, tem carrinho de catar reciclagem; que não é verdadeira a acusação do Ministério Público; que não estava na frente de casa, estava dentro do cercado sentado num banco usando droga; que seu cachimbo estava do seu lado; que estava usando droga pois é dependente químico; que tinha 20 (vinte) pedras mesmo; que havia pego 22 (vinte e duas) pedras e já havia fumado 2 (duas) e ficou com 20 (vinte); que tinha R$ 130,00 (cento e trinta reais); que pegou essa quantidade toda pra não ir toda hora na boca, pois está na condicional e não era nem para estar ali usando droga; que, como fica muito nervoso quando usa droga, por causa da dependência e por causa do álcool que estava bebendo, colocou a droga num potinho de remédio da "minha senhora" (35min00s); que pediu um potinho e colocou dentro, para ir guardando e não perder, pois era de noite e o local é escuro; que sua casa não tem denúncia de droga, de tráfico; que não tem denúncia de tráfico, nunca vendeu droga; que estava dentro do cercado fumando e foi onde os policiais abordaram; que os policiais entraram no cercado dizendo "fica quieto, fica quieto, fica quieto" (35min24s); que se apavorou porque está na condicional; que reconhece que discutiu com os policiais, reconhece que se alterou; que confirma que o cercado que fala é dentro de seu quintal da casa; que estava com 20 (vinte) pedras de "crack" na mão porque havia recém "dado uma bola" (35min48s); que tinha pego as pedras cerca de 2h (duas horas) antes; que estava "quietinho" fumando ali, para não fumar dentro de casa na frente dos parentes; que quem é dependente químico sabe que 20 (vinte) pedras vão rapidinho, cerca de uma hora, uma hora e meia, vão as 20 (vinte); que adquire cada pedra por R$ 5,00 (cinco reais); que tinha R$ 120,00 (cento e vinte reais), então pegou 22 (vinte e duas), 23 (vinte e três); que pegou 23 (vinte e três) e fumou 3 (três); que comprou uma "cachacinha com limãozinho" (36min54s) e sobrou os R$ 18,00 (dezoito reais), R$ 18,80 (dezoito reais e oitenta centavos), R$ 18,70 (dezoito reais e setenta centavos), uma coisa assim; que também não estava atrás de pedra, estava dentro de casa, embaixo do colchão, pois guarda ali para sua mulher não pegar; que, quando a polícia chegou, estava sozinho, sentado num banquinho fumando; que não tem conhecimento que naquela região costuma ter tráfico; que os policiais entraram no cercado e já disseram "mão na cabeça, mão na cabeça" (37min39s); que ficou nervoso com os policiais e comentou que não tinham mandado para entrar no cercado; que os policiais disseram para ficar quieto; que seu cachimbo estava do lado; que falou para os policiais que o cachimbo estava do lado, mas eles disseram não tinha nada a ver com o cachimbo; que os policiais falaram que o depoente gostava muito de colocar a irmã de um companheiro deles na droga; que, na hora, como estava viajando na...

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