Acórdão Nº 5009983-45.2021.8.24.0005 do Primeira Câmara Criminal, 10-11-2022

Número do processo5009983-45.2021.8.24.0005
Data10 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5009983-45.2021.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

APELANTE: ISACK ELYEL DUARTE (RÉU) ADVOGADO: NOEMIA LEONIDA BORGES (OAB SC029759) ADVOGADO: ELEANDRO FELICIO (OAB SC044417) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público da comarca de BALNEÁRIO CAMBORIÚ ofereceu denúncia em face de Isack Elyel Duarte, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, em razão dos seguintes fatos:

No dia 11 de maio de 2021, por volta das 20 horas, em patrulhamento pela rua 1600, Centro, nesta cidade, policiais militares avistaram duas pessoas em atitudes suspeitas, as quais foram abordadas e identificadas como sendo Isack Elyel Duarte e Andressa Gessamine Gomes Sena.

Frisa-se que já existiam informações de tráfico no referido local.

Em revista pessoal, no bolso do casaco de Isack, foram encontradas 4 (quatro) pedras de crack, um celular marca Iphone, a quantia de R$344,00 (trezentos e quarenta e quatro reais) em notas diversas e uma chave de apartamento com o nome "cintia" (fl. 15 - Auto de Exibição de Apreensão - Evento 1 e Laudo de constatação provisório - Evento 2).

Questionado, o denunciado admitiu a prática do tráfico de drogas aos policiais, inclusive admitiu que possuía mais drogas em sua residência, situada na Rua Alvin Bauer, edifício Costa Azul, n. 1402 (possuía a chave), local em que os agentes públicos localizaram 244g (duzentos e quarenta e quatro gramas) de crack uma pedra só, 30,5 g (trinta vírgula cinco gramas) de crack fracionados, uma balança de precisão, um rolo de plástico filme e dois aparelhos celulares (fl. 15 do Auto de Exibição de Apreensão - Evento 1 e Laudo de constatação provisório - Evento 2).

Com Andressa foram localizados um celular, a quantia de R$ 20,00 (vinte reais) e uma porção de cocaína, a qual confessou ter comprado no local, para uso pessoal (vídeo- Evento 1).

Ante o exposto, o denunciado foi preso em flagrante delito e conduzido à Delegacia de Polícia (evento 1/PG - 4-6-2021).

Sentença: o juiz de direito Roque Cerutti julgou parcialmente procedente a denúncia para condenar Isack Elyel Duarte pela prática do crime previsto no art. 33 caput, § 4º, da Lei 11.343/2006, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto; e ao pagamento de 416 (quatrocentos e dezesseis) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, concedendo-lhe o direito de recorrer em liberdade (evento 85/PG - 11-7-2022).

Trânsito em julgado: foi certificado o trânsito em julgado da sentença para o Ministério Público (evento 95/PG - 9-8-2022).

Recurso de apelação de Isack Elyel Duarte: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:

a) a busca e apreensão domiciliar foi realizada "sem mandado judicial e com base unicamente em 'informação de inteligência", portanto, a prova obtida por meio dela é ilícita;

b) inexiste substrato probatório para a condenação pela prática do crime de tráfico de drogas, logo, cabível a absolvição ou, subsidiariamente, a desclassificação para o crime do art. 28, da Lei de Drogas;

c) caso mantida a condenação, impõe-se a fixação da fração de redução prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas em seu patamar máximo.

Requereu o conhecimento e provimento do recurso para ver reconhecida a nulidade das provas, bem como decretada a absolvição, subsidiariamente a desclassificação para a figura penal prevista no art. 28 da Lei de Drogas ou, ainda, minorada a pena (evento 9/SG - 26-8-2022).

Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que:

a) a incursão dos policiais no domicílio foi legal, diante da situação de flagrante delito, portanto, não há falar em nulidade da prova;

b) a condenação deve ser mantida, uma vez que "a tese de negativa de autoria está isolada nos autos, e a versão do apelante está cheia de contradições e incoerências";

c) inviável o pleito de desclassificação, pois a quantidade e a variedade das drogas, bem como os apetrechos apreendidos, demonstram que o entorpecente destinava-se à mercancia espúria;

d) a fração aplicada na concessão do tráfico privilegiado mostrou-se adequada à quantidade e natureza da droga apreendida, logo, a dosimetria da pena deve ser mantida.

Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (evento 12/SG - 13-9-2022).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Rui Arno Richter opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 20/SG - 20-10-2022).

Este é o relatório que passo ao Excelentíssimo Senhor Desembargador Revisor.

Documento eletrônico assinado por CARLOS ALBERTO CIVINSKI, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2723394v21 e do código CRC e7b52401.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ALBERTO CIVINSKIData e Hora: 10/11/2022, às 17:10:20





Apelação Criminal Nº 5009983-45.2021.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

APELANTE: ISACK ELYEL DUARTE (RÉU) ADVOGADO: NOEMIA LEONIDA BORGES (OAB SC029759) ADVOGADO: ELEANDRO FELICIO (OAB SC044417) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Do juízo de admissibilidade

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

A questão preliminar, na compreensão deste relator, não preenche os requisitos de admissibilidade, o que ensejaria o seu não conhecimento por manifesta ofensa ao princípio da dialética recursal, porém, como se verá adiante, deve ser conhecida em sintonia com os precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

Isso porque, ao pugnar pelo reconhecimento da ilicitude da prova obtida através da busca e apreensão domiciliar, a defesa reproduziu literalmente os fundamentos constantes das alegações finais, de modo que não houve insurgência acerca dos argumentos expostos na sentença condenatória.

Ainda que uma ou outra tese apresentada anteriormente à sentença de mérito possa ser eventualmente reiterada em sede de apelação, é imprescindível que a parte recorrente exponha os motivos pelos quais não concordou com a sentença, discutindo as conclusões adotadas pelo magistrado, rebatendo cada um dos argumentos lá apresentados.

A simples reiteração, em sede recursal, dos argumentos invocados nas alegações finais, sem especificamente contrastar os fundamentos da sentença, ofende diretamente o princípio da dialeticidade recursal.

Eventual entendimento em sentido contrário importaria mero reexame necessário da decisão judicial, tornando irrelevante ou, no mínimo, de somenos importância a atuação do causídico em segundo grau.

O art. 1.010, II, do Novo Código de Processo Civil, ao reprisar o art. 514, II, do Código de 1973 estabelece que a apelação deverá conter a "exposição do fato e do direito." Consequentemente, a insurgência deve demonstrar o claro embate com o pronunciamento contra o qual se insurge, ou seja, os motivos pelos quais as provas e fundamentos produzidos pela acusação e defesa, desenvolvido durante toda a instrução, não foram, na visão do recorrente, interpretados de forma adequada pela decisão de primeiro grau.

A respeito, colhe-se da doutrina de Daniel Amorim Assumpção Neves:

Costuma-se afirmar que o recurso é composto por dois elementos: o volitivo (referente à vontade da parte em recorrer) e o descritivo (consubstanciado nos fundamentos e pedido constantes do recurso). O princípio da dialeticidade diz respeito ao segundo elemento, exigindo do recorrente a exposição da fundamentação recursal (causa de pedir: error in judicando e error in procedendo) e do pedido (que poderá ser a anulação, reforma, esclarecimento ou integração). Tal necessidade se ampara em duas motivações: permitir ao recorrido a elaboração das contrarrazões e fixar os limites de atuação do Tribunal no julgamento do recurso. O princípio do contraditório exige do recorrente a exposição de seus fundamentos recursais, indicando precisamente qual a injustiça ou ilegalidade da decisão impugnada. Essa exigência permite que o recurso tenha efetivamente uma característica dialética, porque somente diante dos argumentos do recorrente o recorrido poderá rebatê-los, o que fará nas contrarrazões recursais. É de fato impossível ao recorrido rebater alegações que não existam, ainda que sabidamente as contrarrazões se prestem a defender a legalidade e a justiça da decisão impugnada (Manual de direito processual civil. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 599/600)

O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, em recente decisão monocrática, proferida no Habeas Corpus 205.448/SC, da lavra do ministro Roberto Barroso, seguindo entendimento pacificado naquela Corte (RE 681888-AgR, Rel. Luiz Fux) reconheceu o acerto de decisão que não conheceu de recurso que deixou de atacar os fundamentos inseridos na sentença, limitando-se a reprisar o conteúdo das alegações finais, de onde se colaciona excerto:

As instâncias de origem estão alinhadas com a orientação deste Supremo Tribunal Federal no sentido de que o "princípio da dialeticidade recursal impõe ao recorrente o ônus de evidenciar os motivos de fato e de direito suficientes à reforma da decisão objurgada, trazendo à baila novas argumentações capazes de infirmar todos os fundamentos do decisum que se pretende modificar, sob pena de vê-lo mantido por seus próprios fundamentos" (ARE 681888-AgR, Rel. Luiz Fux) (STF, decisão monocrática proferida 24-9-2021)

Contudo, o Superior Tribunal de Justiça, muito embora tenha em inúmeras decisões concluído pela impossibilidade de conhecimento da pretensão recursal por ofensa à dialeticidade, firmou posição em sentindo contrário.

Nesse sentido...

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