Acórdão Nº 5010397-38.2020.8.24.0018 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 09-12-2021

Número do processo5010397-38.2020.8.24.0018
Data09 Dezembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5010397-38.2020.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN

APELANTE: MARIA DE LURDES SEBEN (AUTOR) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

1.1) Da inicial

MARIA DE LURDES SEBEN ajuizou "Ação Declaratória de Ilegalidade de Retenção de Salário c/c Revisão Contratual c/c Pedido de Tutela de Urgência" em face do BANCO DO BRASIL S.A, alegando, em síntese, que é servidora pública aposentado do Estado de Santa Catarina.

Sustentou que as partes firmaram diversos empréstimos consignados, entre eles o de n.º 890944856, os quais ultrapassam o limite de 40% da sua remuneração.

Aduziu, ainda, que o referido contrato não está sendo desconto em sua folha de pagamento, mas sim, diretamente em sua conta corrente, o que não restou autorizado pela parte autora.

Diante desses fatos, requereu a declaração para "proibir o Réu de de realizar os descontos que vêm sendo efetuados na Conta Corrente da autora (agência 0321-2, conta 626122-1), relativos ao contrato de empréstimo consignado de n. 890944856, cuja parcela atual atinge o montante de R$ 1.584,67, pois o valor está sendo descontado é superior à margem de40% que determina a legislação estadual, o que vem colocando em risco a subsistência da Requerente" (evento 1, petição inicial 1, fls. 22/23, alínea "h") e a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais em R$15.000,00.

Ao final, pugnou a condenação do réu ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios e a concessão da justiça gratuita.

Atribuiu valor à causa e juntou documentos (evento 1).

1.2) Da contestação

Devidamente citada, a instituição financeira requerida apresentou resposta, em forma de contestação, alegando preliminarmente a tempestividade, a inviabilidade de concessão da Justiça Gratuita e a ausência dos requisitos da concessão da tutela antecipada. No mérito, sustentou que a autora possui 7 operações ativa, sendo que todas são consignadas. Aduziu que a disponibilização dos recursos só acontecem após a confirmação de existência de margem consignável em folha. Referiu que "após ser depositado em conta corrente do titular, transforma-se em ativo financeiro comum, passível de operações regulares de débito e crédito, inexiste, assim, limitação de desconto" (evento 16, contestação 1, fl. 09). Falou, ainda, do estrito cumprimento das cláusulas contratuais, da ausência do dever de indenizar, da manutenção dos contratos com base no princípio da boa-fé, do exercício regular de direito, da ausência de culpa do réu, da inexistência de danos morais, do mero aborrecimento e da impossibilidade de devolução de valores. Ao final, requereu a improcedência dos pedidos iniciais.

1.3) Do encadernamento processual

Deferido parcialmente o pedido de tutela provisória de urgência e concedido o benefício da justiça gratuita (evento 4).

Manifestação à contestação (evento 23).

1.4) Da sentença

Prestando tutela jurisdicional (evento 35), o Juiz de Direito Marcos Bigolin prolatou sentença resolutiva de mérito para julgar parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos:

36. Isso posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial e, com fulcro no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, resolvo o mérito, pondo fim à fase cognitiva do procedimento, na forma do artigo 203, §1º, do mesmo diploma legal, a fim de: (a) determinar que a parte ré se abstenha de promover o desconto das parcelas dos empréstimo nº 890944856 diretamente da conta corrente de titularidade da autora, autorizado a consignação em folha de pagamento do valor de R$ 99,21 (noventa e nove reais e vinte e um centavos), permitida a gradação; (b) condenar a parte requerida ao pagamento de compensação por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais)

37. Confirmo a tutela de urgência deferida no início da tutela.

38. Condeno a parte requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor do procurador da parte autora, que fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação (CPC, art. 85, §2º).

39. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

40. Após o trânsito em julgado, oficie-se à Secretaria de Estado da Educação, mediante a apresentação do respectivo endereço, a fim de que seja averbada a parcela do empréstimo nº 890944856 no valor referido, autorizada a gradação da quantia, até o limite de R$ 1.762,47 (um mil setecentos e sessenta e dois reais e quarenta e sete centavos), acaso haja liberação da margem consignável da autora, respeitado o limite de 40 % (quarenta por cento) de sua remuneração.

1.5) Dos recursos

1.5.1) Do recurso do banco réu BANCO DO BRASIL S.A. (evento 13)

Inconformada com a prestação jurisdicional, a parte ré BANCO DO BRASIL S.A. interpôs o presente recurso de Apelação Cível, alegando a regularidade da contratação. Sustentou que a parte autora não tinha margem disponível para o desconto do empréstimo, sendo possível nestes casos o desconto da parcela em conta corrente. Referiu que somente a fonte pagadora pode informar ser a autora possui margem. Discorreu sobre o pacta sunt servanda. Destacou que o referido contrato foi firmado sobre os quatro princípios básicos: da autonomia da vontade e da liberdade contratual. Aduziu que os descontos foram realizados no exercício regular de seu direito, por isso, inexiste dano moral a ser indenizado.

Por fim, requereu a reforma na sentença para que a autora também arque com o pagamento dos honorários de sucumbência.

1.5.2) Do recurso da autora MARIA DE LURDES SEBEN (evento 48)

Igualmente inconformada com a prestação jurisdicional, a parte autora também interpôs recurso de Apelação Cível, pugnando pela majoração do quantum indenizatório e dos honorários advocatícios.

1.6) Das contrarrazões

Apresentadas (eventos 51 e 55).

Este é o relatório.

VOTO

2.1) Do objeto recursal

Compulsando os anseios recursais, observa-se que o cerne da celeuma em comento está atrelado a legalidade de se proceder os descontos na conta corrente da autora e os danos morais.

2.2) Do juízo de admissibilidade

Conheço dos recursos, porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, já que ofertado a tempo e modo, recolhido o preparo pelo banco réu e dispensado a parte autora (art. 1.007, §1º, do CPC) , evidenciados o objeto e a legitimação.

2.3) Do mérito.

2.3.1) Da (i)legalidade dos descontos em conta corrente

Dispõe o banco réu a legalidade dos descontos em conta corrente, sob o argumento que a autora não possuía margem disponível para débito em folha de pagamento.

A relação contratual entre os litigante apresenta-se como relação de consumo, uma vez que a autora enquadra-se como consumidor, consoante disposto no art. 2º, c/c art. 17, do Código de Defesa do Consumidor e a instituição financeira por seu turno, figura como fornecedora e prestadora de serviços bancários, conforme preceitua o art. 3º, § 2º, do CDC. Consequentemente esta condição se amolda perfeitamente a Súmula 297 do STJ.

Partindo dessa premissa, a celeuma em debate deve ser necessariamente resolvida a partir dos ditames esculpidos no Código de Defesa do Consumidor, independentemente da vontade das partes, eis que se trata de norma de ordem pública (art. 1º, do CDC).

A instituição financeira insurgiu-se em face da sentença que acolheu parcialmente os pedidos contidos na presente ação declaratória cumulada com danos morais, alegando a legalidade dos descontos praticados na conta corrente da autora, pois realizados no exercício regular de seu direito. Sustenta que a autora não tinha margem disponível para desconto em folha de pagamento.

Asseverou ainda, que o referido contrato firmado respeitou os princípios básicos e que não houve qualquer violação à liberdade de contratar. Aponta à violação do princípio do pacta sunt...

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