Acórdão Nº 5010862-67.2021.8.24.0000 do Órgão Especial, 16-03-2022

Número do processo5010862-67.2021.8.24.0000
Data16 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoÓrgão Especial
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial)
Tipo de documentoAcórdão
Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5010862-67.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO ROBERTO BAASCH LUZ

AUTOR: ASSOC DOS NOTARIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE S C RÉU: Governador - ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis RÉU: ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SANTA CATARINA RÉU: Presidente - TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis

RELATÓRIO

Trata-se de Ação de Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pela Associação dos Notários e Registradores de Santa Catarina - ANOREG/SC contra o artigo 1º da Lei n. 16.805/2015 que versa sobre a criação do 2º Tabelionato de Notas da comarca de Concórdia.

Inicialmente a parte autora esclarece que a criação de novas serventias extrajudiciais somente é possível para assegurar a eficiência e a qualidade dos serviços prestados à população. Assim, a propositura de um projeto de lei desta natureza demanda estudo prévio com dados objetivos e precisos, sob pena de afronta aos princípios da moralidade, impessoalidade e da eficiência.

Alega, porém, que no caso em análise, o estudo efetuado por este Tribunal de Justiça partiu de critérios técnicos impróprios e insuficientes, em clara violação ao disposto no art. 83, IV, "d", da Constituição Estadual, e do art. 96, II, "d", da Constituição Federal.

Aponta que no processo administrativo que autorizou a remessa do projeto de lei inexiste qualquer dado indicando que os serviços prestados até então não atendiam adequadamente a população. Ao contrário, destaca haver manifestações desfavoráveis à criação de novas serventias, dada a satisfação dos munícipes com o serviço.

Sob outra perspectiva, narra que a outorga de parte das delegações na comarca de Concórdia deu-se com o concurso público realizado em 2010. Pondera que, desde então até a decisão proferida pelo Plenário desta Corte, em 2015, não houve mudanças econômicas e sociais substanciais a justificar o desmembramento das serventias extrajudiciais, o que viola o princípio da segurança jurídica e da confiança legítima, bem como os artigos , e 8º, III, da Constituição Estadual.

Suscita, ainda, a ofensa aos princípios da isonomia, impessoalidade e proporcionalidade, ressaltando que a criação de novas serventias extrajudiciais, além de desconsiderar o livre acesso e o direito à manutenção da outorga das delegações extrajudiciais, não se constitui medida razoável sob o argumento de concretizar a eficiência.

Requer, assim, a procedência da ação para declarar a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei Estadual n. 16.805/2015, elencando como parâmetro de controle de constitucionalidade os artigos 1º, caput, II, III e IV; 5º, caput; 37, caput, I e II, § 2º; 93, X; 96, II, "d"; 150, II; 170, caput, II; e 236 da Constituição Federal, bem como os artigos 1º, caput, III, IV e V; 4º, caput e IV; 8º, III; 16, caput; 21, I, § 1º; 62, II; 78, XI; 83, IV "d"; 128, II; 134 e 194, caput, § 1º, da Constituição Estadual (Evento 1).

Notificada, a Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina informou que a proposição legislativa foi antecedida por estudos efetuados pelo Tribunal de Justiça, refutando qualquer vício de constitucionalidade nas normas (Eventos 22).

Citado, o Estado defendeu a constitucionalidade da norma impugnada, asseverando que o Supremo Tribunal Federal assentou a constitucionalidade de leis que reorganizam as serventias extrajudiciais desde que observado o interesse público e a necessidade de concurso público, o que foi respeitado no presente caso.

Anotou, também, que a Constituição não traz quaisquer requisitos para a deflagração do processo legislativo destinado à reorganização das serventias extrajudiciais, de modo que não procede a alegada inconstitucionalidade. Pontua, ao final, que "o Requerente invoca princípios e, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso, pretende conferir-lhes efeitos incompatíveis com sua estrutura normativa" (Evento 27).

A Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em manifestação subscrita pelo Exmo. Sr. Dr. Paulo de Tarso Brandão, opinou pela improcedência do pedido inicial (Evento 31).

Diante do pedido formulado pela autora, foi reconhecida a conexão deste feito com diversas ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas, sendo determinada a reunião para julgamento conjunto por este relator por prevenção (Eventos 33 e 34).

Notificado, o Presidente deste Tribunal, enquanto autoridade que propôs o projeto de lei, noticiou terem sido observados todos os postulados constitucionais quando da aprovação da criação de novas serventias extrajudiciais, que se pautou no interesse público, assinalando a realização de estudos técnicos e oitiva de todos os interessados (Evento 66).

É o relatório.

VOTO

Em sede de admissibilidade, verifico a legitimidade ativa da ANOREG/SC para a propositura da presente ação direta de inconstitucionalidade, porquanto o art. 85, VI, da Constituição Estadual estabelece que são partes legítimas para tanto as entidades de classe de âmbito estadual.

Igualmente constato a competência deste Tribunal de Justiça para o julgamento do feito, dado que se trata de ação direta de inconstitucionalidade de lei estadual em face de diversos dispositivos reputados violados da Constituição Estadual.

Neste ponto, prudente registrar que embora a lei ora questionada seja oriunda deste Corte, não se aplica o disposto no art. 102, I, "n", da Constituição Federal, dada a inocorrência de impedimento dos Desembargadores que votaram no processo administrativo que resultou no projeto da lei.

Isso porque, conforme entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal, "Os institutos do impedimento e da suspeição restringem-se ao plano exclusivo dos processos subjetivos (em cujo âmbito discutem-se situações individuais e interesses concretos), não se estendendo nem se aplicando, em consequência, ao processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade" (Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2321, relator Min. Celso de Mello, julgado em 25/10/2000).

Destarte, preenchidos os requisitos de admissibilidade, passo à análise do feito.

Superado isso, a Lei Estadual n. 16.805/2015, de iniciativa deste Tribunal de Justiça, como decorre de seu texto, reorganizou as serventias extrajudiciais na comarca de Concórdia mediante a criação do 2º Tabelionato de Notas, sendo assim redigido o dispositivo ora impugnado:

Art. 1º Fica criado o 2º Tabelionato de Notas da comarca de Concórdia, após a vacância do atual Tabelionato de Notas daquela circunscrição judiciária, desde que mantidos os critérios de eficiência, urbanidade e presteza dos serviços de que cuida o art. 30, II, da Lei federal nº 8.935, de 18 de novembro de 1994.

Sobre a questão atinente às serventias extrajudiciais, a Constituição Federal traz as seguintes disposições a respeito no art. 236, a saber:

Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.

§ 1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.

§ 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.

§ 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.

A Constituição Estadual, por sua vez, disciplina a temática no art. 194:

Art. 194. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.

§ 1º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso para provimento ou de remoção, por mais de seis meses.

§ 2º Os valores dos emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro serão fixados de acordo com a lei federal.

Além disso, no art. 83, IV, "d", da Constituição Estadual, consta que compete privativamente ao Tribunal de Justiça a propositura à Assembleia Legislativa de projeto de lei visando a alteração da organização e da divisão judiciárias.

Pertinente destacar, também, que os serviços notariais e de registro foram regulamentados pela Lei Federal n. 8.935/1994, a qual prescreve no art. 38 que:

Art. 38 O juízo competente zelará para que os serviços notariais e de registro sejam prestados com rapidez, qualidade satisfatória e de modo eficiente, podendo sugerir à autoridade competente a elaboração de planos de adequada e melhor prestação desses serviços, observados, também, critérios populacionais e sócio-econômicos, publicados regularmente pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e...

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