Acórdão Nº 5010886-32.2020.8.24.0000 do Órgão Especial, 02-03-2022

Número do processo5010886-32.2020.8.24.0000
Data02 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoÓrgão Especial
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial)
Tipo de documentoAcórdão
Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5010886-32.2020.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador ALEXANDRE D'IVANENKO

AUTOR: Procurador Geral - MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis AUTOR: ESTADO DE SANTA CATARINA RÉU: Prefeito - MUNICÍPIO DE JOINVILLE - Joinville RÉU: Câmara de Vereadores - MUNICÍPIO DE JOINVILLE - Joinville

RELATÓRIO

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina em face dos incs. II, III, IV, V, VI e VII do art. 8º da Lei Complementar n. 230, de 10 de abril de 2007, alterada pela Lei Complementar n. 399, do Município de Joinville.

Em síntese, o Parquet argumentou o seguinte: [a] "questiona-se nesta Ação Direta a constitucionalidade das hipóteses trazidas pela lei municipal por não caracterizarem situações excepcionais capazes de autorizar a contratação e recontratação de pessoal em caráter temporário, em desconformidade ao artigo 16, caput e 21, inciso I e § 2º da Constituição do Estado de Santa Catarina, o qual, reproduz o artigo 37, caput e inciso IX da Constituição da República"; [b] "mesmo em situações de emergência e urgência, quando for possível atender aos interesses públicos com os servidores públicos em sentido estrito, seja pelo remanejamento destes seja pela mudança de rotinas de trabalho, não será admissível o recrutamento precário de força de trabalho"; [c] "quando o tempo para a realização de concurso público para preenchimento do quadro efetivo não constituir obstáculo intransponível à consecução de necessidades prementes da comunidade administrada, também estará o gestor público vinculado ao comando constitucional determinante da realização de certame de provas ou de provas e títulos"; [d] "a contratação temporária de servidores públicos não pode fundar-se em norma vaga ou genérica, como restou assentado pelo Pleno do STF no julgamento da ADI n. 3649/RJ"; [e] "a contratação realiza-se respeitando-se o comando constitucional quanto à determinabilidade temporal e a necessidade de excepcional interesse público, de modo a não permitir que, com a escusa de se atender a demandas permanentes e essenciais, desvirtue-se a forma de ingresso no serviço público, tornando o contrato temporário a regra, e o concurso público a exceção"; [f] "o inciso III do art. 2º da Lei Complementar n. 230/2017 autoriza a contratação de pessoal por tempo determinado para "implantação de serviços essenciais, urgentes e inadiáveis, de manifesto interesse público". Trata-se de hipótese de contratação vaga e inespecífica, não sendo possível identificar, pela leitura da norma, qual seria a contingência fática capaz de evidenciar a situação essencial, urgente ou inadiável, de manifesto interesse público, tratada no inciso. Em outras palavras, a forma pela qual o dispositivo se encontra redigido permite abarcar situações que, em tese, não sejam efetivamente de excepcional interesse público, o que confere margem à prática de admissões indevidas pelo ente federativo"; [g] "o inciso II do art. 4º da lei, que excepciona o prazo máximo de duração contratual de 1 (um) ano, prorrogável por, no máximo, mais 1 (um) ano, previsto no caput do art. 4º da lei em apreço, para permitir que a contratação temporária se estenda "durante o período necessário à implantação dos serviços essenciais", desde que não ultrapasse o prazo de 2 (dois) anos, é, também, inconstitucional, na medida em que amplia sem motivo razoável o prazo de duração dos contratos por tempo determinado à situação que não atende ao interesse público pelas razões acima explanadas (ausência do terceiro pressuposto)"; [h] "o incisos V do art. 2º da Lei Complementar n. 230, de 12 de abril de 2007, define como possibilidade de contratação por tempo determinado a "admissão de pesquisador, tecnólogo ou outro profissional visitante, bem como instrutores para ministrarem cursos técnico-profissionalizantes aos servidores públicos ou à comunidade, em caráter temporário e/ou excepcional". Trata-se de previsão inconstitucional, pois a descrição não se infere a necessidade excepcional da contratação capaz de autorizar o recrutamento precário da força de trabalho. As contratações destinam-se, genericamente, à realização de cursos técnico-profissionalizantes aos servidores públicos ou à comunidade, sem que haja caracterização do caráter não ordinário, ainda que minimamente esboçados, dos objetos de tais treinamentos. Está ausente, portanto, o primeiro pressuposto constitucional, pois a norma prevê como contratação temporária de excepcional interesse público a execução de atividade indeterminada e de maneira vaga, sem estabelecer situações fáticas passíveis de enquadramento na exceção constitucional"; [i] "o simples afastamento de servidores públicos - seja para suprir ausências de quaisquer pessoas decorrentes de exoneração, demissão, falecimento, férias ou aposentadoria, seja pelo gozo de licenças legais no seio de todo o funcionalismo público, ou pelo não preenchimento das vagas ofertadas em concurso público, por exemplo - não autoriza, por si só, a utilização imediata do instituto da contratação temporária, que é espécie de provimento precário e excepcional de servidores (ausência do primeiro pressuposto)"; [j] "a contratação temporária de pessoal pela Administração Pública de Joinville, na conjectura ora examinada, somente seria legítima se a lei especificasse as situações consideradas urgentes e o excepcional interesse público derivado do não provimento de todas as vagas efetivas por meio de concurso público, bem como a temporariedade dessa contratação. Na ausência dessa previsão a norma deixa também de preencher o segundo pressuposto constitucional"; [k] "os incisos VI e VII do art. 2º e o inciso III do art. 4º da Lei Complementar n. 230/2017, são inconstitucionais por estabelecerem hipóteses de contratação temporária que não se amoldam ao art. 21, inciso I e §2º, da Constituição Estadual, que reprisam o disposto no art. 37, incisos II e IX, da Constituição da República"; [l] "assim como a hipótese do inciso VI não se ajusta às exigências constitucionais na medida em não se refere a casos determinados de admissão e não corresponde a situações excepcionais, também, por derivação, e inconstitucional a autorização para recontratação".

Concluiu requerendo a procedência do pedido, "a fim de se declarar a inconstitucionalidade dos incisos II, III, IV, V, VI e VII do artigo 2º; dos incisos II e III e § 2º do art. 4º; e, por arrastamento, dos incisos I, III e IV do art. 8º, todos da Lei Complementar n. 230, de 10 de abril de 2007, alterada pela Lei Complementar n. 399, do Município de Joinville, por afronta ao artigo 16, caput e artigo 21, inciso I e § 2º da Constituição do Estado de Santa Catarina, que guardam consonância com os artigos 37, caput e inciso IX da Constituição da República, afastando-se os efeitos repristinatórios" (Evento 1 - INC1).

A petição inicial veio instruída com documentos (Evento 1 - PORT2, ANEXO3 e ANEXO4).

Prestadas as informações pela Câmara Municipal e pelo Prefeito Municipal do Município de Joinville (Eventos 16 e 18), colheu-se manifestação do Procurador-Geral de Joinville (Evento 22) e oportunamente parecer da Procuradoria-Geral de Justiça (Evento 25).

VOTO

De saída, convém registrar que, em controle de compatibilidade, "cabe ao Poder Judiciário verificar a regularidade dos atos normativos e de administração do Poder Público em relação às causas, aos motivos e à finalidade que os ensejam" (STF - RE 365.368/SC-AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 29-6-2007).

Na hipótese, a controvérsia posta consiste em verificar se as disposições municipais combatidas estão em harmonia ou em desacordo aos preceitos constitucionais à admissão de pessoal, pela administração pública direta e indireta, por tempo determinado, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do art. 37, inc. IX da Constituição da República e reproduzido no art. 21, inc. I e § 2º, da Constituição do Estado de Santa Catarina.

Ou melhor, como bem explicitou o autor a respeito do objeto da presente ADI: "questiona-se nesta Ação Direta a constitucionalidade das hipóteses trazidas pela lei municipal por não caracterizarem situações excepcionais capazes de autorizar a contratação e recontratação de pessoal em caráter temporário, em desconformidade ao artigo 16, caput e 21, inciso I e § 2º da Constituição do Estado de Santa Catarina, o qual, reproduz o artigo 37, caput e inciso IX da Constituição da República".

Pois bem.

A Constituição Federal e a Estadual estabelecem que a investidura nos cargos ou empregos públicos deva se dar mediante concurso público, respectivamente:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

[...]

IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público

Art. 21. Os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei, observado o seguinte:

I - a investidura em cargo ou a admissão em emprego da administração pública depende da aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargos em comissão, declarados em lei de livre nomeação e exoneração;

[...

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