Acórdão Nº 5011112-20.2020.8.24.0038 do Quinta Câmara Criminal, 26-05-2022

Número do processo5011112-20.2020.8.24.0038
Data26 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5011112-20.2020.8.24.0038/SC

RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER

APELANTE: LIVALDO JOSE DA ROSA (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Livaldo José da Rosa, imputando-lhe a prática dos crimes dos art. 180, § 1º, do Código Penal, por 7 (sete) vezes, e do art. 311, caput, do Código Penal, por 5 (cinco) vezes, ambos os crimes c/c o artigo 69 do Código Penal, conforme fatos narrados na peça acusatória (evento 1 da ação penal):

1º Fato:

1.1) Entre os dias 19 e 22 de março de 2016, na oficina situada na Rua Rei do Gado, n. 58, Bairro Santa Catarina, neste Município, LIVALDO JOSE DA ROSA, no exercício de atividade comercial, recebeu, em proveito próprio, a motocicleta Honda/CB, placa OHI 1638, que sabia ser produto do crime de furto, pois o denunciado já havia desmontado ela. A referida motocicleta foi furtada, no dia 19 de março de 2016, conforme demonstra o Boletim de Ocorrência de fl. 6 do evento 1. Na mesma ocasião, constatou-se, ainda, que o denunciado recebeu, em proveito próprio:

1.2) a motocicleta Honda/CG 125 Titan ES, placa MAX 3523,

1.3) o motor que pertencia à motocicleta Honda/NXR125 Bros KS, placa MBW 1423,

1.4) o motor correspondente à motocicleta Honda/XR 250 Tornado, placa MFN 7163,

1.5) o motor da motocicleta Honda/CG 125 FAN KS, placa MJO 2919, bem como;

1.6) o motor que pertencia à motocicleta Honda/NXR150BROS MIX ESD, placa MHQ 9569;

1.7) Ainda, o denunciado adquiriu, em proveito próprio, a motocicleta vermelha com carenagem de Yamaha XTZ, contendo elemento identificador de chassi correspondente à motocicleta Honda/XL 125 S, placa LWV 4524, contendo motor com elemento identificador suprimido correspondete à motocicleta Honda/NXR125 BROS KS, placa MBW 1423; Os veículos e motores eram de procedência ilícita e o denunciado sabia ser produtos de crime, pois não soube indicar nem sequer os nomes dos proprietários dos bens e porque adulterou sinal identificador.

2º Fato:

Dando seguimento à empreitada criminosa, com o intuito de ocultar a origem ilícita dos bens, LIVALDO JOSE DA ROSA adulterou sinal identificador:

2.1) da motocicleta Honda/CB 300R, cor vermelha, placa OHI-1638, ao suprimir a placa e ao suprimir o número do chassi do motor (laudo pericial - evento 6).

2.2) da motocicleta Honda/CG Titan, placa MAX-3523, ao suprimir os números do chassi e do motor, por meio de abrasão mecânica e marcas produzidas por objeto contundente (fl. 1 do Laudo Pericial - evento 1);

2.3) da motocicleta Honda/NXR125 BROS KS, placa MBW 1423, ao suprimir o número do motor (fl. 2 do Laudo Pericial - evento 1);

2.4) da motocicleta Honda/XR 250 Tornado, placa MFN 7163, ao suprimir a numeração original do motor e remarcar série falsa (fl. 4 do Laudo Pericial - evento 1).

2.5) da motocicleta Honda/NX 4 FALCON, cor branca, ao suprimir os números do chassi e do motor, por meio de marcas produzidas por objeto contundente e por abrasão mecânica (fl. 2 do Laudo Pericial - evento 1);

A denúncia foi recebida em 30 de março de 2020 (evento 3 da ação penal), o réu foi citado (evento 12 da ação penal) e apresentou defesa (evento 14 da ação penal).

A defesa foi recebida (evento 16 da ação penal), não sendo o caso de absolvição sumária, foi designada audiência de instrução e julgamento.

Na instrução foram inquiridas testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, bem como interrogado o réu (evento 96 da ação penal).

Encerrada a instrução processual e apresentadas as alegações finais orais pelas partes, sobreveio a sentença oral (evento 96 da ação penal) com o seguinte dispositivo:

"(...) julgo procedente a denúncia para condenar LIVALDO JOSÉ DA ROSA ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 9 anos de reclusão, em regime inicial fechado, além do pagamento de 29 dias-multa, já valorados, por infração ao art. 180, §1º, do Código Penal, por 7 vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, e art. 311, caput, do Código Penal, por 5 vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, ambos os crimes em concurso material na forma do art. 69 do Código Penal.

Irresignado, o acusado interpôs recurso de apelação (evento 96 da ação penal). Em suas razões pugna, preliminarmente, pela declaração de nulidade dos laudos periciais. No mérito, requer absolvição e, subsidiariamente, pleiteia pela desclassificação do crime de receptação qualificada para a modalidade culposa com a consequente redução de pena e alteração do regime para o aberto (evento 108 da ação penal).

O Ministério Publico apresentou as contrarrazões (evento 112 da ação penal) e os autos ascenderam este Tribunal.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Jayne Abdala Bandeira manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do apelo (evento 11).

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade os recursos devem ser conhecidos.

Cuida-se de recurso de apelação criminal interposto por Livaldo José da Rosa, o qual busca a reforma da sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Joinville, que o condenou a pena privativa de liberdade de 9 (nove) anos de reclusão, em regime fechado, além do pagamento de 29 (vinte e nove) dias-multa, por infração ao art. 180, §1º, do Código Penal, por 7 vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, e art. 311, caput, do Código Penal, por 5 vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, ambos os crimes em concurso material na forma do art. 69 do Código Penal.

1. Preliminar

O réu busca a declaração de nulidade dos laudos periciais realizados em sede de inquérito policial, em razão do alegado cerceamento de defesa, eis que o advogado do acusado não foi devidamente intimado acerca da realização das perícias, pois entende que poderia apresentar quesitos, impugnações e solicitar complementações.

Sem razão.

O pleito foi analisado na origem, sendo afastada a preliminar sob o seguinte fundamento (evento 16 da ação penal):

É certo que "o inquérito policial é peça meramente informativa, de modo que o exercício do contraditório e da ampla defesa, garantias que tornam devido o processo legal, não subsistem no âmbito do procedimento administrativo inquisitorial" (STJ, RHC nº 70909/RJ, Rel. Min. Felix Fischer).

Fora isso, merece realce que a prova pericial reveste-se da característica da irrepetibilidade (art. 155, caput, do CPP), razão pela qual não tem cabimento realizar novas perícias, valendo o registro de que "é pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que fica postergada para a fase judicial o contraditório relativo às provas cautelares produzidas no curso do inquérito policial" (STJ, HC nº 413104/PA, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik).

Da atenta análise do Inquérito Policial autuado sob o n. 5002805-77.2020.8.24.0038 e da ação penal, verifica-se que, o acusado teve acesso ao laudo pericial desde a fase inquisitiva. Após, arguiu a referida nulidade como preliminar na defesa prévia, sendo rejeitada na origem. Em sede de alegações finais, o acusado ventilou mais uma vez a referida nulidade, sendo que o magistrado novamente citou: "Inicialmente, registro que a preliminar de nulidade já foi apreciada por ocasião da decisão do evento 16, sendo aqui repisada, mas sem novo enfrentamento".

Assim, nota-se que o acusado teve amplo acesso às provas dos autos e em momento algum trouxe qualquer prova do prejuízo causado pela não participação na perícia realizada.

O entendimento do Supremo Tribunal Federal é o de que, "para o reconhecimento de eventual nulidade, ainda que absoluta, faz-se necessária a demonstração do prejuízo. Nesse sentido, o Tribunal tem reafirmado que essa demonstração, a teor do art. 563 do CPP, é essencial à alegação de nulidade, seja ela relativa ou absoluta, eis que [...] o âmbito normativo do dogma fundamental da disciplina das nulidades pas de nullité sans grief compreende as nulidades absolutas (HC 85.155/SP, Rel. Min. Ellen Gracie)" (RHC 172854 AgR, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, julgado em 11/11/2019, DJe-260 divulgado 27-11-2019, publicado 28-11-2019).

Ademais, é cediço que o inquérito policial é peça meramente informativa, com contraditório diferido, sendo prescindível a participação da defesa no ato, como já decidiu esta Corte:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRIBUNAL DO JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO (ART. 121, § 2º, I, C/C O ART. 14, II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). DECISÃO DE PRONÚNCIA. RECURSO DA DEFESA. PRELIMINARES. NULIDADE DO FEITO POR CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. DEFESA QUE TEVE ACESSO A TODO O CADERNO INDICIÁRIO. INQUÉRITO POLICIAL, ADEMAIS, QUE É PROCEDIMENTO QUE NÃO SE SUBMETE AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA, JÁ QUE CONSTITUI PEÇA MERAMENTE INFORMATIVA. RÉU COM PLENA CIÊNCIA DAS IMPUTAÇÕES QUE CONTRA SI RECAEM. IMPEDIMENTO DE INGRESSO DO CAUSÍDICO NA UNIDADE PRISIONAL PORTANDO EQUIPAMENTOS ELETRÔNICOS. DELIBERAÇÃO QUE NÃO COMPETE A ESTA CORTE DE JUSTIÇA. 1 Tendo a defesa pleno acesso aos autos, não há que se falar em nulidade do feito por cerceamento de defesa. 2 Impossível falar em ausência de ciência acerca das imputações quando a denúncia preenche os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal e o réu foi devidamente citado. [...] RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA EXTENSÃO, NÃO PROVIDO. (TJSC, Recurso em Sentido Estrito n. 5000704-14.2020.8.24.0088, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Sidney Eloy Dalabrida, Quarta Câmara Criminal, j. 29-04-2021).

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. POSTULADA A CONVERSÃO EM DILIGÊNCIA PARA BUSCA E APREENSÃO DA LATA QUE CONTINHA A DROGA. PROVA DESNECESSÁRIA. INDEFERIMENTO. Conquanto seja possível que o Tribunal determine a realização de diligências, poderão ser indeferidas as provas consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias, como na espécie (arts. 400, § 1º, e 616, ambos do Código de Processo Penal). PRELIMINARES. FALTA DE INTIMAÇÃO DA DEFESA SOBRE O LAUDO...

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