Acórdão Nº 5011345-86.2021.8.24.0036 do Terceira Câmara Criminal, 24-05-2022

Número do processo5011345-86.2021.8.24.0036
Data24 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5011345-86.2021.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador RICARDO ROESLER

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: JAILSON VICENTE FREIRE (RÉU)

APELADO: MARTA DOS SANTOS (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Constou no relatório da sentença (Evento 104):

O Ministério Público, no uso das suas atribuições, denunciou JAILSON VICENTE FREIRE, devidamente qualificado, pela prática dos crimes descritos nos arts. 171, 304 c/c 297 e 307, todos do Código Penal, e MARTA DOS SANTOS, igualmente qualificada, pela prática do crime descrito no art. 171 do Código Penal, em decorrência dos seguintes fatos:

FATO 01 - estelionato:

No dia 12 de julho de 2021, por volta das 15h30min, os denunciados Jailson Vicente Freire e Marta dos Santos, em união de desígnios e comunhão de esforços, induziram em erro a vítima Maria de Fátima Pimentel, mediante fraude, com o propósito de se locupletarem ilicitamente em prejuízo dela.

A fraude consistiu em a denunciada Marta inicialmente abordar a vítima em um ponto de ônibus, no bairro Barra do Rio Molha, em Jaraguá do Sul/SC, indagando-a se sabia onde ficava um determinado escritório de advocacia e contando a ela uma história sobre ter um valor de R$2.000,000,00 (dois milhões de reais) para receber nesta cidade, referente a uma ação judicial movida por seu falecido pai.

Nesse momento, previamente mancomunado com Marta, o denunciado Jailson chegou e se ofereceu para ajudá-la, simulando uma conversa ao telefone em que confirmava a narrativa dela de que poderia receber a vultosa quantia naquele dia, desde que comparecesse a algum local acompanhada de duas testemunhas.

Dando continuidade ao golpe, a denunciada Marta solicitou que Jailson e a vítima figurassem como suas testemunhas naquele ato, prometendo-lhes que, como recompensa, entregaria 10% daquele valor a cada um, atraindo, assim, o interesse da vítima, que os acompanhou no veículo Renault/Sandero branco, de placas AYT4250, conduzido pelo denunciado.

No caminho, visando manter a vítima em erro, a denunciada Marta pediu que ela lhe mostrasse que tinha algum dinheiro como uma forma de "garantia", solicitando a mesma coisa a Jailson que, então, parou nas proximidades da Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul, foi até a agência bancária lá existente e voltou com o que pareciam ser maços de dinheiro em espécie, os quais, na verdade, eram um artifício, consistente em duas notas de 100 reais e algumas notas de dólar envoltas de modo que o montante parecia muito maior.

Após não terem êxito em utilizar os cartões de crédito da vítima em uma máquina de pagamentos, os denunciados convenceram-na a sacar o valor de R$1.900,00 (mil e novecentos reais) em espécie no Banco do Brasil da Avenida Marechal Floriano Peixoto, Centro, nesta urbe, tendo ela feito isso, por acreditar que também precisava prestar a tal "garantia", e entregado o dinheiro aos dois, destacando-se que a posse do numerário foi invertida quando os denunciados receberam-no da vítima e colocaram-no no porta-malas do veículo Renault/Sandero.

Os três, na sequência, embarcaram no automóvel, quando então foram abordados pela Polícia Militar, que já havia recebido denúncias de que o veículo estava sendo utilizado em estelionatos na cidade, prendendo os dois denunciados em flagrante.

FATO 02 - falsa identidade:

Durante sua abordagem, o denunciado Jailson atribuiu-se falsa identidade perante os Policiais Militares, dizendo se chamar "Jailson da Silva", com o propósito de obter vantagem em proveito próprio, isto é, para se furtar de ter o registro do crime anterior em seu nome.

FATO 03 - uso de documento falso:

No mesmo ato, o denunciado Jailson fez uso de um documento público falso, consistente em uma carteira de identidade falsificada, no todo, com o nome "Jailson da Silva", entregando-a aos agentes públicos.

Recebida a denúncia (ev. 9), foi feita a citação e apresentada resposta à acusação nos evs. 24 e 25.

No ev. 74, o Ministério Público ofereceu aditamento à denúncia, para "incluir a narrativa quanto à obtenção, pelos denunciados, de vantagem ilícita também com o uso de um cartão de crédito da vítima Maria de Fátima durante a ação criminosa".

Em audiência de instrução e julgamento, o aditamento foi recebido, as defesas se manifestaram, foram ouvidas testemunhas e interrogada a parte ré (ev. 77 e 80).

Nas alegações finais, o Ministério Público requereu a condenação dos acusados nos moldes da denúncia (ev. 93).

A defesa de Jailson, por sua vez, em suas alegações finais, pugnou, em relação ao crime de estelionato, pelo reconhecimento da atenuante da confissão. Quanto ao crime de falsa identidade, aduziu ter havido arrependimento eficaz, e argumentou pela atipicidade do delito de uso de documento falso. Requereu, ainda, a aplicação do princípio da subsidiariedade entre esses crimes (ev. 101).

Já a defesa de Marta, em sede de alegações finais, pugnou pela absolvição da ré ante a aplicação do princípio da insignificância ou pela aplicação do privilégio previsto no §1º do art. 171 do Código Penal (ev. 102).

Ao final, o pedido contido na denúncia foi julgado procedente nos seguintes termos:

a) condenar JAILSON VICENTE FREIRE ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 4 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão, a ser cumprida no regime inicialmente fechado, e ao pagamento de 34 dias-multa, no valor unitário descrito na fundamentação, por infração aos arts. 171, §4º e 304 do Código Penal; e

b) condenar MARTA DOS SANTOS ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 1 ano e 4 meses de reclusão, a ser cumprida no regime inicialmente aberto, e ao pagamento de 13 dias-multa, no valor unitário descrito na fundamentação, por infração ao art. 171, §4º do Código Penal

A pena privativa de liberdade de Marta fica substituída por restritiva de direitos na forma da fundamentação.

Fixado o regime inicial aberto, concedo a ela também o direito de recorrer em liberdade (art. 387, parágrafo único, do CPP).

Em relação ao acusado Jailson, permanecem presentes os motivos ensejadores da prisão preventiva (ev. 17, autos n. 5010727-44.2021.8.24.0036). Assim, nego a ele o direito de recorrer em liberdade.

Expeça-se o PEC provisório.

O tempo em que o réu permaneceu preso cautelarmente (desde 12/07/2021), deve ser considerado para fins de detração. Entretanto, não é possível, por ora, a alteração do regime inicial de cumprimento de pena, nos termos do art. 387, § 2º, do CPP.

Custas pela parte ré, na proporção de 70% para Jailson e 30% para Marta.

Em atenção ao que determina o art. 387, inc. IV, do CPP, nos termos em que requerido pelo Ministério Público em suas alegações finais, e tendo havido instrução específica sobre o tema, oportunizado o devido contraditório aos réus, fixo como valor mínimo indenizatório o valor do prejuízo material suportado pela vítima, condenando os réus solidariamente ao pagamento do valor de R$ 1.600, com juros de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC a incidir desde a data dos fatos (12/07/2021).

Irresignados, o Ministério Público e o réu Jailson interpuseram recursos de apelação criminal, no qual a insurgência da acusação se restringiu à dosimetria dos acusados, porquanto buscou a valoração negativa do vetor da "culpabilidade", na primeira fase da dosimetria do delito de estelionato de ambos os réus. Ainda buscou, tão somente quanto à condenada Marta, o reconhecimento da circunstância judicial negativa dos "maus antecedentes", na primeira fase dosimétrica, e, na segunda fase da dosimetria, o afastamento da atenuante da confissão espontânea, com a consequente fixação do regime inicial semiaberto para o cumprimento da reprimenda e a exclusão da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e da concessão da suspensão condicional da pena (Evento 118).

Por sua vez, a defesa do acusado Jailson requereu a sua absolvição quanto ao delito de uso de documento falso, em razão da atipicidade da conduta e, ainda, por entender se tratar de falsificação grosseira. Subsidiariamente, requereu a valoração positiva da conduta social, na primeira fase dosimétrica (Evento 140).

Após a apresentação das contrarrazões (Evento 135 - Jailson, Evento 136 - Marta e Evento 145 - Ministério Público), lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Marcílio de Novaes Costa, que opinou pelo conhecimento dos recursos e pelo provimento tão somente do apelo da acusação (Evento 10).

VOTO

Trato de recursos de apelação criminal interpostos pelo Ministério Público e pela defesa do acusado Jailson em desfavor da sentença que condenou os acusados, este pela prática do disposto nos arts. 171, § 4º, e 304, ambos do Código Penal, e a requerida Marta pela violação ao previsto no art. 171, § 4º, também do estatuto opressor.

1 Das teses absolutórias

1.1 A defesa aduz ser devida a absolvição do recorrente Jailson em relação ao delito previsto no art. 304 do Código Penal, diante da atipicidade da conduta, por entender não ter se configurado o tipo penal, porquanto o acusado não teria apresentado o documento falso aos militares

Destaco, pois, que a autoria e a materialidade quanto aos delitos pelos quais os acusados foram condenados estão amplamente demonstradas nos autos, conforme o boletim de ocorrência (Evento 1, fls. 3-8, autos n. 5010727-44.2021.8.24.0036), o auto de exibição e apreensão (Evento 1, fl. 12, autos n. 5010727-44.2021.8.24.0036), o documento falsificado para a retirada de valor no banco SICOOB (Evento 1, fl. 14, autos n. 5010727-44.2021.8.24.0036), o laudo pericial (Evento 75, autos n. 5010727-44.2021.8.24.0036) e os depoimentos prestados em ambos os procedimentos.

Assim prevê o art. 304:

Art. 304 - Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:

Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.

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