Acórdão Nº 5011390-44.2021.8.24.0019 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 17-11-2022

Número do processo5011390-44.2021.8.24.0019
Data17 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5011390-44.2021.8.24.0019/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: ERSSI DAHMER MARTINS (AUTOR) APELADO: BANCO CETELEM S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Erssi Dahmer Martins interpôs recurso de apelação cível em face da sentença, proferida pelo magistrado Joao Bastos Nazareno dos Anjos do juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Concórdia, que julgou improcedentes os pedidos da "ação declaratória de nulidade de desconto em folha de pagamento/ausencia de efetivo proveito c/c indenização" aforada contra Banco Cetelem SA, o que se deu nos seguintes termos (evento 19, autos do 1º grau):

ERSSI DAHMER MARTINS ajuizou demanda contra BANCO CETELEM S.A. com o fito de obter provimento jurisdicional que declare a inexistência da relação jurídica, bem como condene a parte ré ao pagamento de compensação por danos morais.

Narrou que contratou empréstimo consignado com o requerido, mas que, de forma diversa da pactuada, estão sendo lançados descontos a título de "reserva de margem consignável" via cartão de crédito. Frisou ter solicitado apenas o empréstimo e que os descontos em seu benefício previdenciário limitam-se aos encargos financeiros.

Devidamente citado (evento 10, AR1), o requerido apresentou contestação, oportunidade em que, preliminarmente, alegou litispendência e conexão com os autos n. 5011391-29.2021.8.24.0019 e a prejudicial de mérito da decadência. Ademais, defendeu a legalidade da contratação e a inexistência de dano moral indenizável. Rogou, ao final, pela improcedência dos pedidos deduzidos na inicial. (evento 12, CONT1).

Houve réplica (evento 16, RÉPLICA1).

[...]

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos veiculados na petição inicial, resolvendo o mérito, com fulcro no art. 487, I do CPC.

Condeno a parte autora, ainda, ao pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% sobre o valor da causa, com espeque no art. 85, §2º do CPC. Fica suspensa a exigibilidade das verbas sucumbenciais, haja vista a concessão do benefício da justiça gratuita no evento 4.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, arquive-se.

Em suas razões recursais (evento 25, autos do 1º grau), sustenta o demandante, em suma: (a) a invalidade do contrato firmado entre as partes. Neste sentido, informa que foi ludibriado pela casa bancária, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada, operação com natureza e sujeita a encargos diversos, e superiores, aos do empréstimo pretendido. Alega que, diante de vício na vontade, não pode ser considerada contratada a operação de crédito na forma efetuada, tendo em vista que apenas pretendia a contratação de empréstimo e não fornecimento de cartão, o qual alega nunca ter solicitado e, muito menos utilizado. Pugna, assim, pela conversão do negócio jurídico para empréstimo pessoal consignado com a devolução da quantia que entende indevidamente cobrada. Defende, por fim, (b) a condenação da parte demandada ao pagamento de danos morais decorrentes do abalo sofrido em relação à suposta atitude fraudulenta e aos descontos irregulares perpetrados pela casa bancária. Requer o provimento do recurso com a reforma da decisão objurgada.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 30, autos do 1º grau).

Os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça e foram distribuídos por sorteio a este relator.

Este é o relatório.

VOTO

1. Do exame de admissibilidade do recurso

Inicialmente, registra-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Dito isto, tem-se que o recurso deve ser conhecido porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.

2. Da (ir)regularidade da operação contratada entre as partes

Sustenta o autor, inicialmente em seu recurso, a invalidade da operação pactuada com a casa bancária, na medida em que teria sido por ela ludibriado, pois pretendia contratar unicamente empréstimo pessoal consignado, e não saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada.

Analisados os autos, verifica-se, todavia, que sem razão a parte demandante.

A princípio, necessário destacar que o próprio autor, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).

As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):

Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.

[...]

Art. 6o Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1o Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre:

I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1o;

II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento;

III - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei;

IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias;

V - o valor dos encargos a serem cobrados para ressarcimento dos custos operacionais a ele acarretados pelas operações; e

VI - as demais normas que se fizerem necessárias.

[...]

§ 5o Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor dos benefícios, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 6o A instituição financeira que proceder à retenção de valor superior ao limite estabelecido no § 5o deste artigo perderá todas as garantias que lhe são conferidas por esta Lei. (Incluído pela Lei nº 10.953, de 2004)

Em relação aos aposentados e pensionistas do INSS, tais operações ainda se encontram reguladas pela Instrução Normativa INSS/PRES n. 28/08, que, ao tempo da contratação, estabelecia da seguinte forma:

[...]

Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que: (Alterado pela IN INSS/PRESS nº 39, de 18/06/2009).

[...] § 1º Os descontos de que tratam o caput não poderão exceder o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor da renda mensal do benefício, considerando que o somatório dos descontos e/ou retenções não exceda, no momento da contratação, após a dedução das consignações obrigatórias e voluntárias: (Nova redação dada pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015)

I - até 30% (trinta por cento) para as operações de empréstimo pessoal; e (Incluído pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015)

II - até 5% (trinta por cento) para as operações de cartão de crédito. (Incluído pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015)

[...]

Art. 12. A identificação do limite de 35% (trinta e cinco por cento) de que trata o § 1º do art. 3º dar-se-á após a apuração das seguintes deduções: (Nova redação dada pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015)

I - consignações obrigatórias: contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social; pagamento de benefícios além do devido; imposto de renda; e pensão alimentícia judicial;

II - consignações voluntárias: mensalidades de associações e demais entidades de...

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