Acórdão Nº 5011532-11.2020.8.24.0075 do Segunda Câmara Criminal, 18-05-2021

Número do processo5011532-11.2020.8.24.0075
Data18 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5011532-11.2020.8.24.0075/SC



RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO


APELANTE: GABRIEL DE SOUZA GOMES (ACUSADO) ADVOGADO: THIAGO YUKIO GUENKA CAMPOS (DPE) APELANTE: SALESIO ANTUNES JUNIOR (ACUSADO) ADVOGADO: THIAGO YUKIO GUENKA CAMPOS (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na Comarca de Tubarão, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Gabriel de Souza Gomes e Salésio Antunes Júnior, imputando-lhes a prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, nos seguintes termos:
Consta do incluso Auto de Prisão em Flagrante que os denunciados Gabriel de Souza Gomes e Salésio Antunes Júnior praticaram o nefasto tráfico de drogas, posto que, no dia 18 de outubro de 2020, na rua Júlio Pozza, s/n, bairro São João Margem Esquerda, nesse Município, por volta das 19h30min., uma guarnição do Pelotão de Patrulhamento Tático PPT, após denúncias, se dirigiu ao edifício conhecido por "Parque das Torres", situado no endereço mencionado, e, mediante campana, visualizou o momento em que Salésio Antunes Júnior atendeu dois masculinos.
Na ocasião, o denunciado Salésio era responsável por pegar o dinheiro dos usuários, ir até um interruptor de energia no Bloco D, retirar a "capa" do interruptor e pegar as porções de cocaína para entregar aos compradores. Em seguida, também foi possível vê-lo mexendo em uma caixa de painel telefônico, onde constatou-se que ele escondia uma balança de precisão.
Já o denunciado Gabriel de Souza Gomes ficava próximo a Salésio servindo como apoio. Dessa forma, enquanto Salésio buscava as drogas, Gabriel permanecia no local como "olheiro" observando a movimentação e encaminhando os usuários até Salésio para efetuarem a compra das drogas fornecidas.
Ato seguinte, procedida a abordagem policial, localizou-se a quantia de R$129,00 (cento e vinte e nove reais) no bolso do denunciado Salésio Antunes Júnior, 8 (oito) porções de cocaína no interruptor de luz e 1 (uma) balança de precisão no painel telefônico.
Evidente, portanto, que Gabriel de Souza Gomes e Salésio Antunes Júnior em comum acordo de vontades, venderam, expuseram à venda e guardaram, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, substâncias entorpecentes consideradas tóxicas e capazes de causar dependência física e/ou psíquica, proibidas em todo o Território Nacional, por disposição da Portaria n. 344, de 12.05.1998, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, atualizada pela RDC n. 63, de 27.09.2007, estando enquadradas na Lista F1 (Lista das Substâncias Entorpecentes de uso proscrito no Brasil), da mesma Portaria (Evento 1, doc2).
Concluída a instrução, o Doutor Juiz de Direito julgou procedente a exordial acusatória e condenou, pelo cometimento do delito previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06:
a) Gabriel de Souza Gomes à pena de 5 anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, e 500 dias-multa; e
b) Salésio Antunes Júnior à pena de 6 anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, e 500 dias-multa (Eventos 69 e 75).
Insatisfeitos, Gabriel de Souza Gomes e Salésio Antunes Júnior deflagraram recurso de apelação.
Nas razões de insurgência, Gabriel de Souza Gomes postula que "seja a conduta desclassificada para a prevista no artigo 37 da Lei 11.343/2006 e alternativamente requer a aplicação do § 4º do art. 33, do mesmo diploma legal".
Salésio Antunes Júnior, por sua vez, objetiva que "se opere a compensação integral da agravante da reincidência com a atenuante da confissão" (Evento 79).
O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 83).
A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Carlos Henrique Fernandes, posicionou-se pelo conhecimento do apelo, com exceção do pedido de incidência da figura privilegiada do crime de tráfico de drogas, formulado por Gabriel de Souza Gomes, sob alegação de ofensa ao princípio da dialeticidade; e por seu desprovimento (Evento 10)

VOTO


1. O Excelentíssimo Procurador de Justiça manifestou-se pelo parcial conhecimento do apelo aviado, ao argumento de que o pedido de "reconhecimento da redutora prevista no § 4º do art. 33/Lei nº 11.343/06, com relação ao apelante Gabriel", não confronta os fundamentos lançados na sentença resistida, o que importa em ofensa ao princípio da dialeticidade.
Não se desconhece que uma parcela da jurisprudência partilha do entendimento segundo o qual "o efeito devolutivo do recurso de apelação criminal encontra limites nas razões expostas pelo recorrente, em respeito ao princípio da dialeticidade que rege os recursos no âmbito processual penal pátrio" (STJ, HC 300.161, j. 6.11.14).
Todavia, ousa-se divergir, respeitosamente.
O paradigma constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da individualização da pena (art. 5º, XLVI) culmina na inafastável conclusão de que o princípio da dialeticidade recursal não se aplica ao acusado no âmbito do processo penal.
Tal convicção é reforçada pela possibilidade de se instrumentalizar, a qualquer tempo, revisão criminal (CPP, art. 622) e de garantir-se, enquanto direito fundamental, que "o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença" (CF, art. 5º, LXXV).
Nesse contexto, por exemplo, o apenamento injusto e incorreto, mesmo que a diferença seja de apenas um dia, configura encarceramento arbitrário, a ofender, inclusive, o art. 7º, 3, da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário e cujo texto já se encontra incorporado ao ordenamento pátrio, por força do Decreto 678/92.
Bem por isso que a revisão da condenação e do apenamento em sede recursal pode dar-se até mesmo de ofício, quando houver manifesta injustiça ou impropriedade técnica, consoante reiterados precedentes desta Corte de Justiça (desta Segunda Câmara, verbi gratia, citam-se: Apelações Criminais 2014.065697-2, Rel. Des. Getúlio Corrêa, j. 21.10.14; 2014.016950-3, Relª. Desª. Salete Silva Sommariva, j. 14.10.14; e 2014.024047-0, Rel. Des. Volnei Celso Tomazini, j. 2.9.14).
Assim, o pleito defensivo, ainda que dotado de certa generalidade no tópico, visa a garantir a plenitude da defesa ao jurisdicionado.
Destarte, o recurso preenche os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser integralmente conhecido.
No mérito, a ocorrência material do fato é incontroversa e exsurge do positivado no boletim de ocorrência (Evento 1, doc1, p.6-16, dos autos do inquérito policial) e do laudo pericial, que certificou a apreensão de 8 porções (3,06g) de pedra de cor branca que...

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