Acórdão Nº 5011540-29.2019.8.24.0008 do Quarta Câmara de Direito Público, 01-12-2022

Número do processo5011540-29.2019.8.24.0008
Data01 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5011540-29.2019.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA

APELANTE: TRANSPOTECH PECAS E SERVICOS LTDA (IMPETRANTE) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Na comarca de Blumenau, Transpotech Peças e Serviços Ltda. impetrou mandado de segurança contra ato atribuído ao Gerente da Secretaria de Estado da Fazenda de Blumenau.

À luz dos princípios da economia e celeridade processual, por sintetizar de forma fidedigna, adoto o relatório da sentença (Evento 37, 1G):

Trata-se de mandado de segurança impetrado por Transpotech Peças e Serviços Ltda contra ato do Gerente - Secretaria de Estado da Fazenda - Blumenau, ambos devidamente qualificados, onde se discute o ICMS.

Alega, em síntese, que atua no comércio varejista de combustíveis, lubrificantes, gás natural, conveniência e outros; que o ICMS é recolhido antecipadamente por substituição tributária calculado sobre a margem de valor agregado que, normalmente, é superior ao de venda ao consumidor; que isso gera créditos compensáveis.

Liminar indeferida (Evento 13, DESPADEC1).

Também, aduz o impetrado preliminarmente que o mandado de segurança deve ser extinto por falta de prova pré-constituída; no mérito que foi arguida a legitimidade de exigir a complementação do ICMS/ST, uma vez que já foram analisados pelos tribunais superiores, estando as normas estaduais, federais e a Constituição Federal em plena harmonia; que não pode haver compensação pelo mandado de segurança.

O Ministério Público manifestou-se pela denegação da segurança (Evento 35, PROMOÇÃO1).

É o relatório.

A lide foi julgada nos termos adjacentes (Evento 37, 1G):

Pelo exposto, denego a segurança.

Custas pelo impetrante.

Sem honorários (art. 25 da Lei Federal n. 12.016/2009; Súmula 512 do Supremo Tribunal Federal; Súmula 105 do Superior Tribunal de Justiça).

Os embargos aclaratórios da impetrante (Evento 42, 1G) foram rejeitados (Evento 49, 1G).

Irresignada, a impetrante recorreu (Evento 65, 1G). Argumentou que: a) "não há qualquer autorização para que o fisco exija o recolhimento de eventuais diferenças de ICMS/ST quando a saída for realizada pro valor inferior à base de cálculo presumida do ICMS"; b) "o Convênio ICMS nº 13/1997, do qual é integrante o Estado de Santa Catarina, não permite essa complementação"; c) "o STF possibilitou a restituição do ICMS/ST quando o valor de venda final for inferior ao presumido, mantendo a vedação à complementação deste tributo, conforme definido na ADI nº 1.851"; d) "No entanto, em que pese essa decisão com efeito vinculante, que não foi reformada nesse ponto pelo RE nº 593.849, o Estado de Santa Catarina, passou a exigir a complementação quando a base presumida for inferior ao preço efetivo, nos termos do § 3º do artigo 40 da Lei Estadual nº 10.297/1996"; e e) "não se está buscando qualquer efeito patrimonial, uma vez que não está sendo pleiteada qualquer restituição, mas apenas que seja declarado o direito de a Apelante compensar eventuais valores pagos indevidamente nos últimos cinco anos".

Em síntese, requereu (Evento 65, 1G):

Ante o exposto, requer, após apreciação da integralidade dos pedidos, nos termos do artigo 489 do CPC, seja provido este recurso para reformar a sentença, a fim de:

a) Reconhecer a ilegalidade e a inconstitucionalidade da exigência da complementação do ICMS/ST prevista no artigo 40, § 3º, inciso II, da Lei Estadual nº 10.297/1996 e no artigo 25, inciso III, do Anexo III, do RICMS/SC, por afronta aos artigos 102, § 2º, e 150, §7º, da CRFB, ao artigo 10 da LC nº 87/1996 e ao artigo 11, inciso III, alínea "c", da LC nº 95/1998;

b) Consequentemente, impossibilitar que o Apelado exija a complementação do ICMS-ST em qualquer hipótese;

c) Reconhecer que o mandado de segurança é via própria para a compensação de valores recolhidos indevidamente em períodos pretéritos, com fulcro na Súmula 213 do STJ e, por consequência, autorizar a compensação dos valores porventura pagos indevidamente desde os 5 anos anteriores ao ajuizamento do processo;

d) Determinar o ressarcimento das custas processuais despendidas pela Impetrante.

Com contrarrazões (Evento 77, 1G), os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do reclamo (Evento 9, 2G).

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual merece conhecimento.

Recebo-o em seus efeitos legais.

O âmago da questão consiste em averiguar a ilegalidade, ou não, da cobrança de valor complementar de ICMS-ST nas hipóteses em que a efetiva base de cálculo da operação for superior à presumida, nos termos do artigo 40, § 3º, II, da Lei n. 17.538/2018, pugnando o apelante pela impossibilidade da exação.

A propósito, é o entendimento ser "devida a restituição da diferença do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para frente se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida" (STF, RE 593.849, Rel. Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, j. 19-10-2016, Tema n. 201).

A ratio decidendi da decisão, que teve repercussão geral reconhecida, é no sentido de que o fato gerador presumido possui caráter provisório, de modo que, em respeito isonomia no tratamento tributário, deve ser aplicável tanto em favor do Estado quanto do contribuinte.

Nesse sentir, a Corte Suprema "fixou entendimento no sentido de que a ficção jurídica criada pela substituição tributária no recolhimento antecipado do ICMS, não se qualifica como presunção absoluta e nem se reveste de caráter definitivo, devendo ceder a realidade do processo econômico, em respeito aos princípios da igualdade, da capacidade contributiva e da vedação ao confisco. Nesse contexto, concluiu a Corte que, nessa sistemática de recolhimento, o imposto pago previamente por presunção deve ser equalizado de acordo com a base de cálculo real da operação. É a orientação que se extrai do julgamento do RE 593.849, pelo Plenário, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 3/10/2017" (STF, RE n. 552.478/SP, rel. Min. Luiz Fux, j. 18-10-2019)

Sendo assim, é pacífico que, quando o valor de venda for superior à base de cálculo presumida, o contribuinte deve compensar o recolhimento a menor realizado na fase antecedente.

É firme a orientação no Supremo Tribunal Federal:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ICMS/ST. DIFERENÇA ENTRE O VALOR EFETIVAMENTE DESIGNADO E A QUANTIA PRESUMIDA DO TRIBUTO. COMPLEMENTAÇÃO. ORIENTAÇÃO DO RE Nº 593.849/MG-RG. DECRETO ESTADUAL Nº 38.104/96 E DO RICMS/96. VIOLAÇÃO REFLEXA.1. Em respeito à vedação do enriquecimento sem causa, deve-se complementar o ICMS diante da existência de diferença entre o valor do tributo designado no momento do cálculo do ICMS/ST e o montante efetivamente praticado na relação jurídica tributária, conforme orientação firmada no julgamento do RE nº 593.849/MG-RG.2. É incabível, em sede de recurso extraordinário, reexaminar o entendimento do Tribunal de origem acerca da aplicabilidade, no presente feito, do Decreto Estadual nº 38.104/96 e do RICMS/96 para fins de complementação do recolhimento do ICMS em substituição tributária. A ofensa ao texto constitucional seria, caso ocorresse, apenas indireta ou reflexa, o que é insuficiente para amparar o apelo extremo.3. Agravo regimental não provido. 4. Majoração da verba honorária em valor equivalente a 10% (dez por cento) do total daquela já fixada (art. 85, §§ 2º, 3º e 11, do CPC), observada a eventual concessão do benefício da gratuidade da justiça.(STF, RE 1097998 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, j. 7-8-2018)

E, como não poderia deixar de ser, a jurisprudência deste Sodalício, em casos similares, ecoa as premissas julgadoras da Corte Suprema:

APELAÇÃO. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS EM SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. OBJETIVADO AFASTAMENTO DA EXIGÊNCIA DE COMPLEMENTAÇÃO DO TRIBUTO, NAS HIPÓTESES EM QUE REALIZADAS VENDAS POR VALOR SUPERIOR AO PRESUMIDO. VEREDICTO DENEGANDO A ORDEM. INSURGÊNCIA DE SUPERMERCADO SCHMOLLER LTDA. (IMPETRANTE). DEFENDIDA ILEGALIDADE DA COBRANÇA DO ICMS COMPLEMENTAR. ELOCUÇÃO INCONGRUENTE. ESCOPO ABDUZIDO. BASE DE CÁLCULO PRESUMIDA QUE NÃO DEVE SER DISSONANTE DO VALOR REAL DA OPERAÇÃO. RATIO DECIDENDI DA TESE FIRMADA PELO STF NO JULGAMENTO DO TEMA N. 201. COMPLEMENTAÇÃO DO IMPOSTO QUE SE AFIGURA EXIGÍVEL, A FIM DE SALVAGUARDAR A ISONOMIA E VEDAR O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL CONTRIBUINTE. ADEMAIS, AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE E ANTERIORIDADE NONAGESIMAL. PRECEDENTES. "É constitucional a substituição tributária para frente e constatado adiante que a base de cálculo projetada é superior à real, o contribuinte tem direito de restituição do recolhido em excesso (art. 150, § 7º, da CF; Tema 201 da Repercussão Geral do STF). Da mesma forma é possível que o Fisco lance a diferença no caso inverso (base de cálculo inferior à real). O que venta lá, venta cá, disse a propósito o Ministro Luís Roberto Barroso" [...] (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5033756-03.2022.8.24.0000, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. em 09/08/2022). SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5006016-06.2019.8.24.0023, rel. Des. Luiz Fernando Boller, Primeira Câmara de Direito Público, j. 18-10-2022).

MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO - ICMS - COMBUSTÍVEL - SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PARA FRENTE - BASE PROJETADA INFERIOR À REAL - EXIGÊNCIA DA COMPLEMENTAÇÃO DO IMPOSTO - POSSIBILIDADE - SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO INVIÁVEL - INDEFERIMENTO DA LIMINAR RATIFICADO.1. É constitucional a substituição tributária para frente e constatado adiante que a base de cálculo projetada é superior à real, o contribuinte tem direito de restituição do recolhido em excesso (art. 150, § 7º, da CF; Tema 201 da Repercussão Geral do STF). Da mesma forma é possível que o Fisco lance a diferença no caso...

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