Acórdão Nº 5011840-10.2022.8.24.0000 do Órgão Especial, 03-08-2022

Número do processo5011840-10.2022.8.24.0000
Data03 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoÓrgão Especial
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial)
Tipo de documentoAcórdão
Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5011840-10.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador FERNANDO CARIONI

AUTOR: Procurador Geral - MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis RÉU: Prefeito - MUNICÍPIO DE JOINVILLE - Joinville RÉU: Câmara de Vereadores - MUNICÍPIO DE JOINVILLE - Joinville

RELATÓRIO

O Procurador-Geral de Justiça, representado pelo Coordenador do Centro de Apoio Operacional do Controle de Constitucionalidade - CECCON, ajuizou ação direta de inconstitucionalidade em face da Lei n. 9.077, de 20 de dezembro de 2021, do Município de Joinville, que "veda expressamente a utilização de linguagem estranha à Língua Portuguesa em utilização de flexão de gênero no âmbito da administração pública municipal".

Sustenta, em linhas gerais, que, ao proibir a utilização da denominada "linguagem neutra" no ambiente educacional, em documentos oficiais e em editais de concursos públicos, e impor sanções pelo seu descumprimento, o Município de Joinville violou o disposto nos artigos 13 e 22, inciso XXIV, da Constituição de República Federativa do Brasil de 1988, incorporados pelo artigo 4º, caput, da Constituição do Estado de Santa Catarina de 1989, pois invadiu competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e normas gerais atinentes à educação e sobre a Língua Portuguesa.

Requer, diante desse contexto, cautelarmente, a suspensão imediata dos efeitos da Lei n. 7.510, de 22 de julho de 2021, do Município de Chapecó, evidenciando a probabilidade do direito e o perigo de dano; e, ao final, a declaração da sua inconstitucionalidade.

Foi determinado o processamento da ação na forma do art. 12 da Lei n. 12.069/2001 e a notificação das autoridades municipais (Evento 2).

Notificado, o Presidente da Câmara Municipal de Vereadores de Joinville apresentou informações relativas ao processo legislativo que deu origem à norma atacada, bem como defendeu a constitucionalidade do diploma, sustentando que "a norma do seu artigo 2º, proíbe, expressamente, no Município de Joinville, a adoção da 'inguagem neutra' nos ambientes formais de ensino e educação. Ao veicular essa vedação, o legislador municipal estabeleceu regra específica sobre o modo de utilização da língua portuguesa, de modo a alcançar não apenas a extensão, como o modo de ensino do idioma oficial da República Federativa do Brasil naquele território." Assim, "por adentrar tema que - de acordo com ampla e já consolidada jurisprudência - deve ser tratado de maneira homogênea em todo o território nacional, a proibição veiculada no artigo 2º da norma sob invectiva invade a competência constitucional legislativa atribuída à União." Asseverou, no mais, que "os fundamentos expostos na inicial não se mostram consistentes a evidenciar contrariedade aos comandos inscritos no artigo 4º, da Constituição do Estado de Santa Catarina [...]", pois "em verdade, a ruptura de categorias gramaticais geraria uma distorção linguística estrutural, em contrariedade ao uso consagrado da língua portuguesa como idioma oficial do País [...]". Requereu a procedência parcial do pedido para reconhecer a inconstitucionalidade formal apenas do artigo 2º da Lei n. 9.077/2021 (Evento 8).

O Prefeito de Joinville, por sua vez, também defendeu a constitucionalidade da norma, afirmando que "o conteúdo material da norma impugnada não viola o art. 13 da Constituição Federal ou o art. 4º, caput, da Constituição do Estado de Santa Catarina, mas previne alterações no idioma de forma arbitrária e artificial, considerando que as mutações linguísticas devem advir de um processo natural de desenvolvimento da língua". Quanto ao pedido cautelar, afirmou que "não há justificativas para se obstar a vigência da lei local, visto que a manutenção da medida não ofende pontualmente as competências legislativas, podendo inclusive gerar um reflexo negativo, caso haja manutenção do entendimento vigente na legislação municipal". Postulou o indeferimento da medida cautelar e, no mérito, a improcedência do pedido (Evento 11).

A Procuradora-Geral do Município de Joinville apresentou defesa da norma, oportunidade em que consignou que "a violação arguida ao art. 22, XXIV, da CF/88 não encontra guarida justamente por se amoldar às disposições quanto ao dever de legislar dos entes municipais em matérias de cunho local, inclusive educação (CF/88, art. 30, inciso I), assim como o dever de suplementação da legislação federal ou estadual nesse ponto (CF/88, art. 30, inciso II)". Alegou que "medidas deflagradas, ainda que em âmbito local, tendentes a dar cumprimento e concretude às disposições federais e constitucionais (CF/88, art. 13 e art. 210, §2º) não podem ser interpretadas como expressões discriminatórias de movimentos sociais e culturais; buscam regulamentar e liminar a eventual atuação dissonante que porventura possa ocorrer no ensino municipal, reforçando o processo histórico, cultural e normativo da própria língua positivado nas legislações nacionais aplicáveis". Pugnou pelo indeferimento do pedido liminar e, no mérito, pela improcedência do pedido. Subsidiariamente, "objetivando dar interpretação conforme ao texto constitucional estadual e às normas de replicação obrigatória [...]", requereu o reconhecimento de "parcial constitucionalidade às disposições normativas da Lei Municipal n. 9.077/2021, no que tange às normas do art. 1º, caput e § 1º, e do art. 3º e art. 5º, porquanto essa última de previsão obrigatória, validando-se a regulação, no âmbito municipal, do uso e emprego de linguagem oficial nos órgãos municipais, excluída a abrangência do ensino público obrigatório de âmbito municipal (art. 2º)" (Evento 15).

Lavrou parecer, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça, o Excelentíssimo Procurador de Justiça Paulo de Tarso Brandão, que opinou no sentido da concessão da liminar e da procedência do pedido (Evento 19).

Este é o relatório.



VOTO

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral de Justiça, representado pelo Coordenador do Centro de Apoio Operacional do Controle de Constitucionalidade - CECCON, objetivando a declaração...

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