Acórdão Nº 5011925-62.2021.8.24.0054 do Primeira Câmara de Direito Civil, 27-04-2023

Número do processo5011925-62.2021.8.24.0054
Data27 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5011925-62.2021.8.24.0054/SC



RELATOR: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM


APELANTE: ELIRIA GUCKY (AUTOR) ADVOGADO: GUILHERME RAITZ (OAB SC055934) ADVOGADO: GUSTAVO PISETTA (OAB SC053475) APELADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. (RÉU)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de apelação interposto por ELIRIA GUCKY, contra sentença prolatada pelo juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Rio do Sul , que nos autos da "AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE DANOS MATERIAIS" n. 50119256220218240054, ajuizada contra CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A., julgou improcedentes os pedidos, nos seguintes termos (evento 62, da origem):
(...)
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, extinguindo o processo na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Arca a parte autora com as custas e despesas processais. Arbitro em favor da ré honorários advocatícios de 15% sobre o valor da causa, observados os critérios do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Ressalvo que a exigibilidade dos encargos de sucumbência fica suspensa em relação à parte autora, porquanto beneficiária da gratuidade (ev. 9).
Fica autorizado o levantamento de eventuais honorários periciais ainda pendentes.
Com o trânsito em julgado, arquive-se.
Inconformada, a apelante sustentou a incontroversa acerca da interrupção do fornecimento de energia, cuja consequência foi a ocorrência de dano material a ser indenizado, atestado no laudo técnico apresentado junto à inicial. Pugnou pelo provimento do recurso a fim de que a sentença de mérito seja inteiramente reformada ao aduzir: Nesse cenário, ante o evidente equívoco interpretavo do respeitável Juízo concluindo pela improcedência da presente ação, interpõe o autor o presente recurso de apelação visando a reforma da sentença proferida para condenar a Celesc Distribuição S.A. a indenizar os danos materiais causados pela prestação deficitária de seus serviços. (evento 70 - APELAÇÃO1, página 5).
Com as contrarrazões (evento 77, da origem), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.
É o relatório

VOTO


1. Da ocorrência do evento danoso
Inicialmente, há que se ressaltar que o caderno processual indica não haver controvérsia acerca da interrupção de fornecimento de energia elétrica, tendo em vista que a própria apelada trouxe o relatório das interrupções que atingiram o apelante, no dia 18 de janeiro de 2021 (evento 16 - anexo2).
Neste particular, imperioso esclarecer que o tema enfrentado neste apelo já possui respaldo na jurisprudência desta Corte de Justiça que, em casos análogos, reconhece a responsabilidade objetiva da concessionária decorrente de interrupção de fornecimento de energia elétrica e os danos ocasionados em safra de fumo, veja-se um exemplo:
CIVIL - RESPONSABILIDADE CIVIL - CELESC - FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA - INTERRUPÇÃO - PRODUTOR DE FUMO - FENÔMENO CLIMÁTICO PREVISÍVEL - EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE AFASTADA - DANOS MATERIAIS - DEVER DE INDENIZAR APENAS O PREJUÍZO EFETIVAMENTE COMPROVADO1 Presentes os elementos identificadores da relação de consumo, a responsabilidade civil da concessionária de serviço público de abastecimento de energia elétrica é objetiva, com fundamento na lei de proteção ao consumidor.2 As intempéries não associadas a eventos climáticos surpreendentes e catastróficos, malgrado possam figurar como incontroláveis, encontram-se na esfera de previsibilidade do empreendedor, fazendo, portanto, parte do risco assumido ao desenvolver uma atividade no setor de consumo (TJSC, Súm. n. 33).3 A indenização por danos materiais imprescinde da prova do efetivo prejuízo, de modo que o produtor rural deve ser indenizado apenas pelo total de fumo que comprovadamente foi prejudicado pela injustificada interrupção do serviço de energia elétrica prestado pela concessionária de serviço público. (TJSC, Apelação n. 0301355-57.2019.8.24.0035, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Cézar Medeiros, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 29-06-2021).
Ou seja, a jurisprudência deste Sodalício orientou-se no sentido de que o afastamento da obrigação de indenizar pela ruptura do nexo causal diante da ocorrência de evento imprevisível não admite alegações simplistas no sentido de que a queda no fornecimento deu-se por conta de intempéries comuns à mudança climática cotidiana. Há necessidade de que se trate de eventos naturais incomuns, catastróficos e anormais, capazes de ocasionar prejuízos de larga extensão em residências, estabelecimentos comerciais, lugares públicos, etc, fatos não encontrados nos autos e que a Celesc não comprovou.
Neste particular, o julgamento de mérito pelo juízo de piso diferiu da solução jurídica adotada na miríade de ações correlatas já apreciadas por esta Corte essencialmente fundamentado na seguintes razões:
É irrealista entender o contrário.
O que se espera, dentro dos princípios da eficiência e continuidade dos serviços públicos, é o fornecimento de energia nos termos daquilo que é exigido pelo órgão regulador.
Qualquer atividade econômica traz exigências e riscos que devem ser suportados por aquele que se dispõe exercê-la com objetivo de lucro, de modo que, em hipótese alguma, tais dificuldades podem ser transferidas à coletividade.
Ora, se a produção do fumo é uma atividade sensível e, como outras, exige fornecimento de energia elétrica permanente e em qualidade superior à média, trata-se de uma particularidade que deve onerar exclusivamente os produtores.
A energia elétrica, como é sabido por todos os fumicultores, não é utilizada somente para fins domésticos, mas também em uma atividade de beneficiamento/secagem do fumo, que, dada sua natureza, imprescinde de ininterrupta utilização de energia, de modo que não se pode conceber a ausência do emprego de mecanismos alternativos - geradores - com a finalidade de prevenir prejuízos diante de falha ocorrida no sistema oficial do fornecimento de energia elétrica.
E, apesar de não se poder exigir do consumidor comum que adquira um aparelho desse tipo, há uma série de fatores que permitem exigi-lo do fumicultor.
Primeiro, o produtor de fumo é conhecedor de seu ofício e bem sabe que as folhas de fumo são sensíveis, de modo que bastam duas horas de interrupção da energia para que haja perda de qualidade no produto depositado na estufa.
Em segundo lugar, tem-se que o preço do gerador no-break, capaz de suprir a falta de energia em curto espaço de tempo, revela-se módico em comparação ao prejuízo material experimentado em razão da perda de qualidade do fumo.
Vale dizer, é mais econômico investir na prevenção do dano do que suportar o dano e buscar indenização judicialmente, mesmo porque é grande a probabilidade de o evento...

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