Acórdão Nº 5012121-25.2022.8.24.0045 do Segunda Câmara Criminal, 11-04-2023

Número do processo5012121-25.2022.8.24.0045
Data11 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5012121-25.2022.8.24.0045/SC



RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO


APELANTE: LUAN DOUGLAS BOEFF (RÉU) ADVOGADO(A): EDUARDO DA ROCHA DANIEL (OAB SC055154) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na Comarca de Palhoça, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Luan Douglas Boeff, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, nos seguintes termos:
Em 4 de julho de 2022, por volta das 00h, na Rua São Paulo, bairro Ponte do Imaruim, município de Palhoça, nesta Comarca, o denunciado Luan Douglas Boeff de forma consciente e voluntária, trazia consigo, para fins de comercialização, 52g (cinquenta e dois gramas) da substância entorpecente popularmente conhecida como cocaína, fracionada em 5 (cinco) porções, tudo sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, consoante boletim de ocorrência n. 00669.2022.0000300 de p. 3-6, auto de exibição e apreensão de p. 7 e laudo preliminar de constatação de substância tóxica de p. 8-9, todos acostados no P_Flagrante1 do evento 1 (autos 5010625-58.2022.8.24.0045, apenso).
Referida substância entorpecente (cocaína) é capaz de causar dependência física e/ou psíquica, estando seu uso e comercialização proibidos em todo o território nacional, conforme Portaria n. 344/98 da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde e suas atualizações posteriores.
Na mesma oportunidade foram apreendidos, em poder do denunciado, R$ 38,00 (trinta e oito reais) em espécie, oriundos do comércio de substâncias entorpecentes, conforme se depreende do auto de exibição e apreensão de p. 8-9 presente no P_Flagrante1 do evento 1 dos autos apensos (Evento 1).
Concluída a instrução, a Doutora Juíza de Direito Cintia Werlang julgou procedente a exordial acusatória e condenou Luan Douglas Boeff à pena de 5 anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, e ao pagamento de 500 dias-multa, pelo cometimento do crime descrito no art. 33, caput, da Lei 11.343/06.
Insatisfeito, Luan Douglas Boeff deflagrou recurso de apelação.
Nas razões do inconformismo, almeja a reforma da sentença resistida, a fim de ser absolvido da acusação do cometimento do crime de tráfico de drogas, diante da ilicitude da prova que lastreia sua condenação, "tendo em vista a ausência de fundamentação idônea e concreta para a realização da abordagem e busca pessoal".
De forma sucessiva, pleiteia a absolvição por ausência de prova da autoria delitiva, aplicando-se, como providência necessária, o princípio in dubio pro reo, ou que seja desclassificada sua conduta para a figura pormenorizada no art. 28 da Lei 11.343/06, tendo em vista a inexistência de prova suficiente acerca da destinação comercial do estupefaciente apreendido.
Caso não seja esse o entendimento, pleiteia o reconhecimento da causa especial de diminuição de pena referente ao tráfico privilegiado e sua aplicação no patamar máximo de 2/3; a modificação do regime de cumprimento de pena para o inicialmente aberto; e a substituição da sanção corporal por medidas restritivas de direitos.
Pretende, ainda, a aplicação da detração penal e a concessão do direito de recorrer em liberdade.
Por fim, requer o benefício da justiça gratuita, "pois defendido por Defensor dativo durante todo o processo", e o arbitramento da verba honorária recursal ao Excelentíssimo Defensor nomeado (Evento 6 dos autos em Segundo Grau).
O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões recursais pelo parcial conhecimento do reclamo, pois o pedido de "reconhecimento da detração da pena cumprida enquanto permaneceu preso cautelarmente" é matéria afeta ao Juízo da Execução, e pelo seu desprovimento (Evento 9 dos autos em Segundo Grau).
A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Rui Arno Richter, manifestou-se pelo parcial conhecimento do recurso, uma vez que "não merece ser conhecido o pleito recursal no tocante à isenção do pagamento das custas processuais e concessão da gratuidade de justiça, porquanto ambos os pedidos foram fundamentados na suposta condição de hipossuficiência do réu", e pelo seu desprovimento (Evento 12 dos autos em Segundo Grau)

VOTO


1. Consigna-se, desde já, que, embora o Ministério Público tenha se manifestado, em contrarrazões recursais, pelo não conhecimento do pleito de detração formulado pelo Apelante, por ser matéria afeta ao Juízo da Execução, tem-se compreensão diversa no ponto.
Renato Brasileiro de Lima esclarece:
Antes da Lei n. 12.736/12, a detração era realizada apenas no momento da execução da pena, recaindo a competência sobre o juízo das execuções penais, nos termos do art. 66, III, "c", da Lei n. 7.210/84 (LEP). Com o advento da Lei n. 12.736/12, e a nova redação do art. 387, § 2º, do CPP, a detração deverá ser considerada pelo juiz que proferir a sentença condenatória, pelo menos em regra. Isso significa dizer que, a partir da entrada em vigor da Lei n. 12.736/12, o regime prisional inicial deixa de ser estabelecido com base na pena definitiva e passa a ser fixado levando-se em conta o quantum de pena resultante do desconto do tempo de prisão cautelar ou internação provisória a que o acusado foi submetido durante o processo (Código de processo penal comentado. 2. ed. Salvador: Juspodvim, 2017. p. 1.084).
Aclara o Superior Tribunal de Justiça:
Há manifesta confusão feita pelo Juízo de origem entre os institutos da detração penal e da progressão de regime. Aquele, aplicado no processo de conhecimento, determina que seja levada em consideração qualquer fração de tempo de prisão provisória para a fixação do regime inicial da pena privativa de liberdade. Ou seja, ao realizar a dosimetria, deve o juiz descontar da pena fixada o tempo de prisão provisória antes de fixar o regime. O resultado dessa subtração é que deve ser utilizado como parâmetro para fixação do regime inicial, aliado a outros critérios, como reincidência e circunstâncias desfavoráveis, em observância ao disposto no art. 33 do Código Penal. Após o início do cumprimento da pena definitiva, é que se fala em progressão de regime, embora excepcionalmente se tenha admitido a aplicação do instituto antes mesmo do trânsito em julgado da sentença, razão pela qual a competência para aplicação do instituto é do Juízo da execução. Na progressão, são observados critérios legais objetivos e subjetivos, dentre eles o tempo de cumprimento da pena, o que conduz à modificação do regime após determinado lapso temporal. Portanto, ao refazer a dosimetria, deveria o Juízo de origem ter descontado o tempo de prisão provisória antes de fixar o regime inicial, e não calcular o tempo necessário para a progressão de regime (Rcl 18.324, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 13.8.14).
Por essa razão, entende-se que a detração penal prevista no art. 387, § 2º, do Código de Processo Penal deve ser cotejada na análise da dosimetria da pena, o que cabe ao Juízo do processo de conhecimento empreender, motivo pelo qual é devido o conhecimento do reclamo nesse particular.
2. Ainda, em que pese o exposto no parecer do Excelentíssimo Procurador de Justiça Criminal, nada obsta o conhecimento do reclamo no que diz respeito ao pedido de justiça gratuita.
A questão encontra solução no positivado na parte final do art. 99 do Novo Código de Processo Civil, que estabelece que "o pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso".
O Superior Tribunal de Justiça orienta que o pleito pode ser feito em grau recursal:
O STJ orienta-se no sentido de que o benefício da justiça gratuita, consonante o artigo 99 do CPC/2015, pode ser formulado na própria petição inicial, na contestação, na petição de ingresso de terceiro no processo ou em recurso, exigindo-se, contudo, requerimento expresso da parte interessada, sendo vedado sua concessão de ofício (AREsp 1.516.810, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 10.9.19).
Tem-se, então, que é viável a realização do referido pedido no momento processual presente.
Logo, diante de expressa previsão legal, o recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser inteiramente conhecido.
3. O Recorrente Luan Douglas Boeff sustenta a ilicitude da prova que lastreia sua condenação, "tendo em vista a ausência de fundamentação idônea e concreta para a realização da abordagem e busca pessoal".
A pretensão não convence.
Prescreve o art. 244 do Código de Processo Penal que "a busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar", sem que tal prática viole direitos fundamentais da intimidade, da honra e da imagem da pessoa, assegurados pelo art. 5º, X, da Constituição Federal.
O Supremo Tribunal Federal delibera que a fundada suspeita "não pode fundar-se em parâmetros unicamente subjetivos, exigindo elementos concretos que indiquem a necessidade da revista, em face do constrangimento que causa" (HC 81.305, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 13.11.01).
No caso dos autos, ao contrário do alegado pela Defesa, circunstâncias objetivas levaram os Policiais Militares a abordar Luan Douglas Boeff.
Consta no boletim de ocorrência que "a guarnição 3573 Tático, em rondas pela Rua São Paulo, Ponte do Imaruim, local este conhecido pela intensa prática de tráfico, foi abordado o masculino Luan Douglas Boeff, sendo que com o mesmo foi encontrado R$ 38,00 em notas trocadas, que Luan no...

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