Acórdão Nº 5012135-21.2021.8.24.0020 do Segunda Câmara Criminal, 07-06-2022

Número do processo5012135-21.2021.8.24.0020
Data07 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5012135-21.2021.8.24.0020/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO

APELANTE: JULIO CLAUDIO SANTOS (ACUSADO) ADVOGADO: JOSIELE PEREIRA PADILHA CARDOSO (OAB SC034856) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Criciúma, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Júlio Cláudio Santos, imputando-lhe a prática dos crimes previstos nos arts. 33, caput, da Lei 11.343/06 e 163, parágrafo único, III, do Código Penal, nos seguintes termos:

Fato 1

No dia 18 de maio de 2021, por volta das 15h30min., na Rua João Batista Cordeiro, s/n, Bairro Santo André, nesta cidade e comarca de Criciúma/SC, o denunciado Júlio Cláudio Santos mantinha em depósito e guardava numa vala de esgoto, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, para fins de comercialização clandestina, 1 (um) invólucro contendo uma pedra da substância conhecida como "crack".

No mesmo local, data e horário, o denunciado Júlio Cláudio Santos mantinha em depósito e guardava, na residência localizada no mesmo terreno em que se encontra a vala de esgoto, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, para fins de comercialização clandestina, 1 (uma) porção da substância entorpecente conhecida como "crack".

As substâncias apreendidas perfazem o total de 58,6g (cinquenta e oito vírgula seis) gramas de "crack", capaz de causar dependência física e psíquica, cujo uso e comercialização é proibido em todo o território nacional, conforme Portaria SVS/MS n. 344/1998 da Anvisa e subsequentes atualizações.

Segundo consta, naquele dia guarnições da polícia militar faziam rondas no local, conhecido pela prática de tráfico de drogas. Durante os procedimentos, os policiais militares visualizaram um indivíduo que estava de motocicleta e empreendeu fuga ao avistar a viatura policial. Ato contínuo, os policiais iniciaram a busca pela motocicleta, o que os levou até o local onde se encontrava o denunciado Júlio Cláudio Santos, escondido dentro de uma vala de esgoto. No seu interior, os policiais militares lograram localizar e apreender 1 (um) invólucro contendo "crack", o montante de R$ 482,00 (quatrocentos e oitenta e dois reais), além de 1 (uma) balança de precisão.

Ato contínuo, os policiais se deslocaram até uma residência localizada no mesmo terreno em que estava a vala em que o denunciado Júlio Cláudio se escondia. No seu interior, os policiais militares localizaram e apreenderam 1 (uma) pedra de crack, 1 (uma) faca de serra utilizada para fracionar a droga e R$ 1.051,00 (mil e cinquenta e um reais) em notas de pequeno valor.

Fato 2

Na mesma data, horário e local, o denunciado Júlio Cláudio Santos deteriorou o compartimento para transporte de presos da viatura policial, de propriedade do Estado de Santa Catarina, mediante golpe com os pés, causando o dano constante no Laudo 3 do Evento 44 dos Autos 5010309-57.2021.8.24.0020 (Evento 1).

Concluída a instrução, o Doutor Juiz de Direito Guilherme Costa Cesconetto julgou procedente a exordial acusatória e condenou Júlio Cláudio Santos à pena de 6 anos, 3 meses e 25 dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente fechado, 6 meses de detenção, a ser adimplida em regime inicialmente semiaberto, e 642 dias-multa, pelo cometimento dos delitos previstos nos arts. 33, caput, da Lei 11.343/06 e 163, parágrafo único, III do Código Penal (Evento 69).

Insatisfeito, Júlio Cláudio Santos deflagrou recurso de apelação.

Nas razões de inconformismo, em relação ao crime de tráfico de drogas, pugna pela proclamação da sua absolvição, com fundamento no princípio in dubio pro reo, ao argumento de que não existem provas nos autos suficientes para ensejar sua condenação.

De forma subsidiária, almeja a desclassificação de seu agir ao configurador do delito previsto no art. 28 da Lei 11.343/06.

Quanto ao crime de dano qualificado, postula a aplicação do princípio da insignificância, almejando sua absolvição em razão da atipicidade material da conduta.

De forma sucessiva, almeja a exclusão do acréscimo referente à quantidade de droga apreendida, a modificação do regime inicial de cumprimento da pena, a concessão da gratuidade da justiça e o direito de recorrer em liberdade (Evento 7).

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões pelo conhecimento parcial e desprovimento do reclamo (Evento 10).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pela Excelentíssima Procuradora de Justiça Kátia Helena Scheidt Dal Pizzol, manifestou-se pelo "não conhecimento do presente recurso, porquanto intempestivo" e, subsidiariamente, "pelo parcial conhecimento e, nesta extensão, pelo não provimento deste recurso" (Evento 13).

VOTO

1. Sem razão o Ministério Público quando aponta, nas contrarrazões recursais, intempestividade do apelo interposto por Júlio Cláudio Santos, por conta da apresentação extemporânea das razões recursais.

É pacífico na jurisprudência o entendimento de que, ajuizado o apelo no prazo de 5 dias (CPP, art. 593, caput), como ocorreu no caso (Evento 78), há de ser reconhecida sua tempestividade. O atraso no oferecimento das razões da insurgência não passa de mera irregularidade (vide STF, HC 112.355, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 26.6.12; STJ, HC 358.217, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 23.8.16; e TJSC, Ap. Crim. 0002699-30.2011.8.24.0035, Rel. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho, j. 18.7.17), não impedindo seu conhecimento.

2. A Excelentíssima Procuradora de Justiça manifestou-se pelo parcial conhecimento do apelo ao argumento de que os pedidos de gratuidade da justiça e para recorrer em liberdade não confrontaram os fundamentos lançados na sentença resistida, o que importa em ofensa ao princípio da dialeticidade.

O argumento não procede. O paradigma constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da individualização da pena (art. 5º, XLVI) culmina na inafastável conclusão de que o princípio da dialeticidade recursal não se aplica ao acusado no âmbito do processo penal.

Tal convicção é reforçada pela possibilidade de se instrumentalizar, a qualquer tempo, revisão criminal (CPP, art. 622) e de garantir-se, enquanto direito fundamental, que "o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença" (CF, art. 5º, LXXV).

Nesse contexto, por exemplo, o apenamento injusto e incorreto, mesmo que a diferença seja de apenas um dia, configura encarceramento arbitrário, a ofender, inclusive, o art. 7º, 3, da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário e cujo texto já se encontra incorporado ao ordenamento pátrio, por força do Decreto 678/92.

Bem por isso que a revisão da condenação e do apenamento em sede recursal pode dar-se até mesmo de ofício, quando houver manifesta injustiça ou impropriedade técnica, consoante reiterados precedentes desta Corte de Justiça (desta Segunda Câmara, verbi gratia, citam-se: Apelações Criminais 2014.065697-2, Rel. Des. Getúlio Corrêa, j. 21.10.14; 2014.016950-3, Relª. Desª. Salete Silva Sommariva, j. 14.10.14; e 2014.024047-0, Rel. Des. Volnei Celso Tomazini, j. 2.9.14).

Assim, o pleito defensivo, ainda que dotado de certa generalidade nos tópicos, visa a garantir a plenitude da defesa ao jurisdicionado, e deve ser admitido, como o Superior Tribunal de Justiça reiterada e monocraticamente determina (HC 599378, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 26.4.21; e HC 611896, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 10.9.20).

Destarte, o recurso preenche os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser integralmente conhecido.

3. No mérito, é inviável acolher o pleito absolutório.

A existência material do crime encontra-se positivada no conteúdo do boletim de ocorrência; no auto de exibição e apreensão; no laudo de constatação (Evento 4, dos autos 5010309-57.2021.8.24.0020); e no laudo pericial das drogas (Evento 44, dos autos 5010309-57.2021.8.24.0020), o qual certificou a apreensão da substância química cocaína (forma básica, crack), capaz de causar dependência física e/ou psíquica, de uso proibido em todo o território nacional, de acordo com a Portaria 344/98 da Secretaria de Vigilância Sanitária.

A autoria deflui das circunstâncias da apreensão do material tóxico e da prova oral coligida ao longo da instrução processual.

Ao noticiar como ocorreu a diligência, o Policial Militar Hedelberto Hobold relatou, na fase judicial:

a guarnição estava em rondas na área do São Sebastião, Santo André, por ali e uma motocicleta passou em alta velocidade pela guarnição; que nesse momento o condutor começou a olhar diversas vezes para trás para ver se a viatura estava acompanhando ele; que começou a fazer a ultrapassagem e a guarnição resolveu abordar, diante da fundada suspeita; que nisso a guarnição já verificou que ele começou a empreender fuga para não ser realizada a abordagem; [...] que nisso ele saiu da Av. Universitária e começou a entrar nas ruas do bairro ali; [...] que fizeram o acompanhamento até uma rua sem saída, conhecida, se não se engana, como favelinha ali no Santo André; [...] que ele pulou da motocicleta ainda em movimento; [...] que o depoente saiu da viatura e correu atrás dele; [...] que nisso já tinham passado no rádio o acompanhamento; que chegou outra guarnição; [...] que o condutor correu para trás de uma residência; que o depoente correu atrás dele; [...] que a guarnição relatou que ele apontou uma arma para a guarnição; [...] que adentraram em uma residência, em um terreno que era todo aberto, que dava para ver que também era usada para tráfico, o depoente entrou com mais cautela; que viu uma vala e viu esse masculino; [...] que pediu para ele sair; que no que ele saiu tinha crack, tinha uma balança e várias notas de dinheiro no valo; [...] que viu na residência que tinha uma bancada, tinha nota de dinheiro no chão, tinha uma faca em cima da bancada e tinha crack em cima da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT