Acórdão Nº 5012462-89.2022.8.24.0000 do Quarta Câmara de Direito Público, 02-06-2022
Número do processo | 5012462-89.2022.8.24.0000 |
Data | 02 Junho 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça de Santa Catarina |
Órgão | Quarta Câmara de Direito Público |
Classe processual | Agravo de Instrumento |
Tipo de documento | Acórdão |
Agravo de Instrumento Nº 5012462-89.2022.8.24.0000/SC
RELATOR: Desembargador ODSON CARDOSO FILHO
AGRAVANTE: ANDREIA CRISTINA HEMING RODRIGUES - ME AGRAVADO: ESTADO DE SANTA CATARINA
RELATÓRIO
Na comarca da Capital, o Estado de Santa Catarina ajuizou a Execução Fiscal n. 5019979-47.2020.8.24.0023 em face de Andreia Cristina Heming Rodrigues - ME, mediante apresentação das Certidões de Dívida Ativa (CDAs) ns. 19048463915, 19048464059, 19048464130 e 19047063603, todas emitidas em 2-3-2020 e relativas a ICMS, visando à satisfação de crédito no valor total de R$ 106.750,21 (cento e seis mil, setecentos e cinquenta reais e vinte e um centavos).
A devedora foi citada (Ev. 7 dos autos originários).
Consoante pleito do credor (Ev. 22 dos autos originários), foi determinada a indisponibilidade de ativos financeiros da executada via SISBAJUD (Ev. 24 dos autos originários), com cumprimento parcial da ordem de retenção (Ev. 29-33 dos autos originários).
A executada requereu o desbloqueio dos ativos financeiros constritados em valor inferior a 40 salários mínimos (Ev. 28 dos autos originários), o que foi indeferido (Ev. 35 dos autos originários), decisão que ensejou a interposição do presente agravo de instrumento.
A agravante aduz, em síntese, que é empresária individual e que não há distinção patrimonial entre a pessoa jurídica e a pessoa física, eis que aquela é mera ficção jurídica para fins fiscais; tal circunstância atrai a aplicação do art. 833, X, do CPC; a quantia poupada até o limite de 40 salários mínimos é impenhorável, independentemente da natureza da conta bancária, desde que seja a única reserva do devedor, consoante firme entendimento do Superior Tribunal de Justiça; e, ademais, os recursos financeiros bloqueados na conta da agravante são indispensáveis ao suprimento de suas necessidades, o que evidencia tratar-se de medida extremamente lesiva e desproporcional, ao passo que a lei processual civil garante ao devedor o direito de ser executado pelo meio menos gravoso. Requer, assim, liminarmente, a liberação do numerário constritado e a suspensão da decisão agravada; ao final, pugna pelo provimento do recurso, com a reforma da decisão a quo para reconhecer a inexistência da distinção entre a empresa individual executada e sua titular e a ilegalidade da penhora, com a determinação de imediata liberação dos valores penhorados.
Pelas razões de Evento 3, indeferi a almejada carga suspensiva.
O Estado ofereceu contrarrazões (Ev. 11).
Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça pela ausência de interesse de intervir na causa (Ev. 14).
É o relatório.
VOTO
O recurso é tempestivo, está fundado a partir da natureza do interlocutório combatido (art. 1.015, parágrafo único, do CPC), as hipóteses legais (art. 1.016 e ss. do CPC) foram contempladas e a recorrente efetuou o recolhimento do preparo, razão pela qual o agravo merece ser conhecido.
A agravante busca a reforma da decisão a quo e a liberação do numerário bloqueado, sublinhando, de um lado, a inexistência de distinção patrimonial entre a pessoa jurídica e a pessoa física no caso de empresário individual e, de outro, enfatizando a orientação sedimentada pelo Superior Tribunal de Justiça quanto à impenhorabilidade de montante de até 40 salários mínimos depositados em conta pelo devedor, independentemente da natureza da conta bancária.
Com razão!
Embora tenha registrado na decisão inaugural (Ev. 3) que a agravante não demonstrou o impacto do bloqueio de valores em seu orçamento mensal nem a inviabilidade de suas atividades empresariais ou o prejuízo ao sustento da titular, razão pela qual não se vislumbrava a probabilidade do direito ventilado, cumpre, neste momento, analisar a pretensão da recorrente sob viés distinto.
De saída, observo que "a impenhorabilidade inserida no art. 833, X, do CPC/2015, reprodução da norma contida no art. 649, X, do CPC/1973, não alcança, em regra, as pessoas jurídicas, visto que direcionada a garantir um mínimo existencial ao devedor (pessoa física). Nesse sentido: '[...] a intenção do legislador foi proteger a poupança familiar e não a pessoa jurídica, mesmo que mantenha poupança como única conta bancária' (AREsp 873.585/SC, Rel. Ministro Raul Araújo, DJe 8/3/2017)" (cf. STJ, Agravo Interno no Recurso Especial n. 1.878.944/RS, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 24-2-2021; grifei).
É aresto que ratifica essa posição:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA AGRAVANTE.1. A impenhorabilidade inserida no art. 833, X, do CPC/2015 não alcança as pessoas jurídicas, visto que direcionada a garantir um mínimo existencial ao devedor pessoa física.2. Constituída a EIRELI, por meio do registro de seu ato constitutivo na Junta Comercial, não mais entrelaçadas estarão as esferas patrimoniais da empresa e do empresário, como explicitamente prescreve o art. 980-A, § 7º, do CC/02.3. Agravo interno desprovido. (STJ, Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial n. 1.916.001/RS, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 22-11-2021)
Impossível olvidar, porém, que, de acordo com a íntegra do primeiro julgado acima referido, lá se tratava de sociedade empresária limitada, girando a controvérsia, no segundo caso, em torno de EIRELI, isto é, empresa individual de responsabilidade limitada, figura introduzida no ordenamento jurídico nacional justamente com a finalidade de garantir a separação do patrimônio e da responsabilidade entre a pessoa jurídica e a pessoa natural que lhe titularizava (hoje extinta por força do previsto no art. 41 da Lei n. 14.195/2021, bem como em razão da revogação do Título I-A do Livro II da Parte Especial do Código Civil pela MP n. 1.085/2021).
No caso vertente, por outro lado, a executada Andreia Cristina Heming Rodrigues, ora agravante, é empresária individual (CNPJ: 19.799.650/0001-77), sendo titular a pessoa natural de mesmo nome (CPF...
RELATOR: Desembargador ODSON CARDOSO FILHO
AGRAVANTE: ANDREIA CRISTINA HEMING RODRIGUES - ME AGRAVADO: ESTADO DE SANTA CATARINA
RELATÓRIO
Na comarca da Capital, o Estado de Santa Catarina ajuizou a Execução Fiscal n. 5019979-47.2020.8.24.0023 em face de Andreia Cristina Heming Rodrigues - ME, mediante apresentação das Certidões de Dívida Ativa (CDAs) ns. 19048463915, 19048464059, 19048464130 e 19047063603, todas emitidas em 2-3-2020 e relativas a ICMS, visando à satisfação de crédito no valor total de R$ 106.750,21 (cento e seis mil, setecentos e cinquenta reais e vinte e um centavos).
A devedora foi citada (Ev. 7 dos autos originários).
Consoante pleito do credor (Ev. 22 dos autos originários), foi determinada a indisponibilidade de ativos financeiros da executada via SISBAJUD (Ev. 24 dos autos originários), com cumprimento parcial da ordem de retenção (Ev. 29-33 dos autos originários).
A executada requereu o desbloqueio dos ativos financeiros constritados em valor inferior a 40 salários mínimos (Ev. 28 dos autos originários), o que foi indeferido (Ev. 35 dos autos originários), decisão que ensejou a interposição do presente agravo de instrumento.
A agravante aduz, em síntese, que é empresária individual e que não há distinção patrimonial entre a pessoa jurídica e a pessoa física, eis que aquela é mera ficção jurídica para fins fiscais; tal circunstância atrai a aplicação do art. 833, X, do CPC; a quantia poupada até o limite de 40 salários mínimos é impenhorável, independentemente da natureza da conta bancária, desde que seja a única reserva do devedor, consoante firme entendimento do Superior Tribunal de Justiça; e, ademais, os recursos financeiros bloqueados na conta da agravante são indispensáveis ao suprimento de suas necessidades, o que evidencia tratar-se de medida extremamente lesiva e desproporcional, ao passo que a lei processual civil garante ao devedor o direito de ser executado pelo meio menos gravoso. Requer, assim, liminarmente, a liberação do numerário constritado e a suspensão da decisão agravada; ao final, pugna pelo provimento do recurso, com a reforma da decisão a quo para reconhecer a inexistência da distinção entre a empresa individual executada e sua titular e a ilegalidade da penhora, com a determinação de imediata liberação dos valores penhorados.
Pelas razões de Evento 3, indeferi a almejada carga suspensiva.
O Estado ofereceu contrarrazões (Ev. 11).
Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça pela ausência de interesse de intervir na causa (Ev. 14).
É o relatório.
VOTO
O recurso é tempestivo, está fundado a partir da natureza do interlocutório combatido (art. 1.015, parágrafo único, do CPC), as hipóteses legais (art. 1.016 e ss. do CPC) foram contempladas e a recorrente efetuou o recolhimento do preparo, razão pela qual o agravo merece ser conhecido.
A agravante busca a reforma da decisão a quo e a liberação do numerário bloqueado, sublinhando, de um lado, a inexistência de distinção patrimonial entre a pessoa jurídica e a pessoa física no caso de empresário individual e, de outro, enfatizando a orientação sedimentada pelo Superior Tribunal de Justiça quanto à impenhorabilidade de montante de até 40 salários mínimos depositados em conta pelo devedor, independentemente da natureza da conta bancária.
Com razão!
Embora tenha registrado na decisão inaugural (Ev. 3) que a agravante não demonstrou o impacto do bloqueio de valores em seu orçamento mensal nem a inviabilidade de suas atividades empresariais ou o prejuízo ao sustento da titular, razão pela qual não se vislumbrava a probabilidade do direito ventilado, cumpre, neste momento, analisar a pretensão da recorrente sob viés distinto.
De saída, observo que "a impenhorabilidade inserida no art. 833, X, do CPC/2015, reprodução da norma contida no art. 649, X, do CPC/1973, não alcança, em regra, as pessoas jurídicas, visto que direcionada a garantir um mínimo existencial ao devedor (pessoa física). Nesse sentido: '[...] a intenção do legislador foi proteger a poupança familiar e não a pessoa jurídica, mesmo que mantenha poupança como única conta bancária' (AREsp 873.585/SC, Rel. Ministro Raul Araújo, DJe 8/3/2017)" (cf. STJ, Agravo Interno no Recurso Especial n. 1.878.944/RS, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 24-2-2021; grifei).
É aresto que ratifica essa posição:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA AGRAVANTE.1. A impenhorabilidade inserida no art. 833, X, do CPC/2015 não alcança as pessoas jurídicas, visto que direcionada a garantir um mínimo existencial ao devedor pessoa física.2. Constituída a EIRELI, por meio do registro de seu ato constitutivo na Junta Comercial, não mais entrelaçadas estarão as esferas patrimoniais da empresa e do empresário, como explicitamente prescreve o art. 980-A, § 7º, do CC/02.3. Agravo interno desprovido. (STJ, Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial n. 1.916.001/RS, rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 22-11-2021)
Impossível olvidar, porém, que, de acordo com a íntegra do primeiro julgado acima referido, lá se tratava de sociedade empresária limitada, girando a controvérsia, no segundo caso, em torno de EIRELI, isto é, empresa individual de responsabilidade limitada, figura introduzida no ordenamento jurídico nacional justamente com a finalidade de garantir a separação do patrimônio e da responsabilidade entre a pessoa jurídica e a pessoa natural que lhe titularizava (hoje extinta por força do previsto no art. 41 da Lei n. 14.195/2021, bem como em razão da revogação do Título I-A do Livro II da Parte Especial do Código Civil pela MP n. 1.085/2021).
No caso vertente, por outro lado, a executada Andreia Cristina Heming Rodrigues, ora agravante, é empresária individual (CNPJ: 19.799.650/0001-77), sendo titular a pessoa natural de mesmo nome (CPF...
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