Acórdão Nº 5012627-92.2020.8.24.0005 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 18-05-2023

Número do processo5012627-92.2020.8.24.0005
Data18 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5012627-92.2020.8.24.0005/SC



RELATOR: Desembargador JAIME MACHADO JUNIOR


APELANTE: LYDIA MIGUEL MACHADO (AUTOR) ADVOGADO(A): ED ONER PAES SA (OAB SC054126) APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO(A): FELIPE BARRETO TOLENTINO (OAB SC057388A) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


BANCO BMG S.A. interpôs recurso de apelação e LYDIA MIGUEL MACHADO recurso adesivo contra sentença proferida pelo juízo da Vara Regional de Direito Bancário da Comarca de Balneário Camboriú que, nos autos da Ação declaratória de nulidade de desconto em folha de pagamento/ausência do efetivo proveito c/c repetição de indébito e danos morais, ajuizada em face da instituição financeira, julgou procedentes os pedidos iniciais, cujo dispositivo restou assim vertido:
Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE a presente Ação Declaratória de Nulidade de contrato e indenização por Danos Morais proposta por LYDIA MIGUEL MACHADO em face de BANCO BMG SA para declarar a nulidade do contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) e, em consequência:
a) condenar o réu a restituir em favor da parte autora, na forma simples, os descontos indevidamente promovidos do benefício previdenciário do mutuário, acrescidos de juros moratórios de 1% do trânsito em julgado (efeito ex nunc da anulabilidade - art. 177 do Código Civil) e de correção monetária pelo INPC/IBGE a partir de cada desconto (pagamento/desembolso);
b) condenar o réu ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de danos morais em favor da parte autora, acrescido de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação (ilícito contratual) e correção monetária pelo INPC/IBGE a partir da data desta sentença (súmula 362 do STJ);
c) determinar à parte autora a restituição ao réu dos valores sacados e/ou utilizados do limite do cartão de crédito, acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês da data do trânsito em julgado (efeito ex nunc da anulabilidade - art. 177 do Código Civil) e correção monetária pelo INPC/IBGE da data do saque ou utilização do crédito;
d) autorizar a compensação na forma do art. 368 do Código Civil;
e) condenar a instituição financeira ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios à razão de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação - montante dos valores descontados da parte autora e do dano moral, forte no artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. (Evento 18).
Inconformada com a prestação jurisdicional entregue, preliminarmente, defendeu a instituição financeira a aplicação do julgamento paradigma da turma de uniformização dos juizados especiais cíveis, bem como a ausência de margem para contratação de empréstimo consignado.
Quanto ao mérito sustentou, em suma, a validade do pacto e dos descontos efetuados junto ao benefício previdenciário da parte autora, visto que a contratante tinha plena ciência do objeto avençado, aderindo voluntariamente aos serviços de cartão de crédito consignado. Arguiu, também, o descabimento da repetição do indébito na forma dobrada e pleiteou pela devolução ou compensação dos valores disponibilizados à demandante devidamente corrigidos.
Pontuou, ainda, a ausência dos requisitos autorizadores da responsabilidade civil, além da inexistência de danos morais passíveis de indenização, ao passo que agiu no exercício regular de direito. Subsidiariamente, requereu a minoração do montante arbitrado (Evento 26).
A sua vez, a autora, por meio de recurso adesivo, pugnou pela declaração de nulidade do contrato e requereu a restituição dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário na forma dobrada. Insurgiu-se, também, quanto ao total fixado a título de indenização por danos morais, postulando a majoração do montante compensatório. Ao final, pugnou pela majoração dos honorários advocatícios para 20% sobre o valor da condenação, bem como o arbitramento de honorários recursais (Evento 33).
Com contrarrazões pela casa bancária, ascenderam os autos a este egrégio Tribunal de Justiça.
Este é o relatório

VOTO


Considerando que o decisum objurgado restou proferido sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, a análise do reclamo ficará a cargo do mencionado diploma legal.
Com efeito, colhe-se dos autos que a autora, beneficiária do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), alegou que ao pretender firmar contrato de empréstimo consignado pessoal, com parcelas fixas e preestabelecidas, foi-lhe concedido cartão de crédito com reserva de margem consignável - RMC, modalidade contratual diversa da solicitada.
Inicialmente, a consumidora pugnou pela declaração de nulidade do contrato, entretanto, verifica-se que a decisão combatida já determinou tal medida, o que denota ausência de interesse recursal neste ponto.
De outro viés, preliminarmente, a instituição financeira invocou a aplicação do entendimento sedimentado pela Turma de Uniformização de Decisões, a fim de reconhecer a validade e legalidade dos contratos de cartão de crédito.
Sem razão, uma vez que tal julgado apenas vincula os feitos que tramitam sob o rito dos Juizados Especiais. A propósito, o Grupo de Câmaras de Direito Comercial desta Corte inadmitiu o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas sobre o tema em voga, vejamos:
DIREITO COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL - INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) - CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO VIA CARTÃO DE CRÉDITO E RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE - COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR LITIGANTE - ELEMENTO FÁTICO DECISIVO NO JULGAMENTO DA LIDE - QUESTÃO UNICAMENTE DE DIREITO INOCORRENTE - REQUISITO INDISPENSÁVEL À ADMISSÃO DO IRDR INEXISTENTE - INCIDENTE INADMITIDO Demandando a questão controvertida juízo de valor sobre o comportamento do consumidor litigante, a matéria não envolve questão unicamente de direito, mas também de fato, a afastar a admissibilidade do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de um de seus indispensáveis requisitos de coexistência obrigatória. (TJSC, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 0000507-54.2019.8.24.0000, da Capital, rel. Des. Monteiro Rocha, Grupo de Câmaras de Direito Comercial, j. 12-06-2019).
Neste sentido confira-se: (Apelação Cível n. 0300300-94.2019.8.24.0092, da Capital, rel. Des. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 24-10-2019; Apelação Cível n. 0303091-15.2018.8.24.0175, de Meleiro, rel. Des. Cláudio Barreto Dutra, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 12-03-2020).
Logo, "por não se tratar de matéria unicamente de direito, eis que em ações desse jaez faz-se necessário juízo de valor sobre o comportamento do consumidor litigante, não sendo possível generalizar a validade ou invalidade dos contratos de empréstimo consignado via cartão de crédito e reserva de margem consignável" (TJSC, Apelação Cível n. 0310842-67.2017.8.24.0020, de Meleiro, rel. Des. José Maurício Lisboa, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 27-08-2019), não há falar na aplicação do julgamento paradigma da Turma de Uniformização, de modo que a prefacial deve ser rejeitada.
Quanto à alegada inexistência de margem para contratação de empréstimo consignado ante a suposta utilização de 30% da margem consignável

da parte autora, a preliminar se confunde com o mérito da ação e com este será analisada.
Pois bem, meritoriamente, a controvérsia cinge-se à análise da (i)legalidade da contratação de empréstimo consignado pela via de cartão de crédito, cuja concessão ocorre mediante reserva de margem consignável em benefício previdenciário.
Em cotejo da jurisprudência deste egrégio Tribunal, verifica-se que a corrente majoritária converge no sentido de reconhecer a prática abusiva e ilegal perpetrada pelas instituições financeiras quando da contratação da modalidade de crédito supracitada.
A respeito da temática, vale colacionar excerto da decisão proferida pelo Exmo. Des. Robson Luz Varella, ao tempo do julgamento da Apelação Cível n. 5048169-72.2020.8.24.0038 que, em análise de caso análogo, bem pontuou:
[...] esclarece a jurisprudência que, no empréstimo por intermédio de cartão de crédito com margem consignável, "disponibiliza-se ao consumidor um cartão de crédito de fácil acesso ficando reservado certo percentual, dentre os quais poderão ser realizados contratos de empréstimo" (TJMA, Apelação Cível n. 0436332014, rel. Des. Cleones Carvalho Cunha, j. em 14/5/2015, DJe 20/5/2015).
Nessa perspectiva, a concessão de crédito através dessas duas modalidades (empréstimo e cartão de crédito), mesmo na consignação, possui considerável distinção, especialmente em relação às taxas de juros e demais encargos, avistando-se maior onerosidade ao consumidor quando se vale do cartão de crédito em detrimento do empréstimo.
Isso se deve, por vezes, em...

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