Acórdão Nº 5012689-39.2020.8.24.0036 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 20-10-2022

Número do processo5012689-39.2020.8.24.0036
Data20 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5012689-39.2020.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA

APELANTE: ROSELI SCHULZ VIERGUTZ (AUTOR) APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

De pronto, tenho por bem adotar o relatório da sentença, pois além de refletir fielmente a narrativa fática em apreço, garante celeridade ao trâmite processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), in verbis:

Cuida-se de ação movida por ROSELI SCHULZ VIERGUTZ em face de BANCO BMG S.A.

Alegou que assinou contrato de empréstimo consignado junto à parte contrária, com pagamento através de desconto em seu benefício previdenciário.

Todavia, constatou posteriormente que foi induzido em erro, pois não se tratava propriamente do empréstimo consignado desejado, mas sim da aquisição de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), com encargos/retenção de valores não esperados, o que seria ilegal.

Requereu a declaração de inexistência da contratação de empréstimo via cartão de crédito com RMC, igualmente da reserva de margem consignável, com a restituição em dobro do que foi descontado a título do RMC e condenação da parte ré ao pagamento de danos morais.

Citada, a instituição financeira contestou defendendo a higidez do contrato e da validade da reserva de margem consignável por terem sido confeccionados de acordo com a vontade dos envolvidos.

Discorreu sobre a repetição de indébito e sobre danos morais.

Houve réplica. (grifos no original)

Após, sobreveio a parte dispositiva da sentença (evento 39, SENT1), nos seguintes termos:

Ante o exposto, com base no art. 487, inc. I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIAMENTE PROCEDENTES os pedidos para:

1) anular o contrato de empréstimo via cartão de crédito com margem consignável (RMC);

2) determinar que a parte autora devolva o valor creditado em seu favor por força do contrato, com correção monetária pelo INPC desde a data do creditamento;

3) condenar a parte ré à restituição simples do que foi descontado em seu favor com esteio no contrato, com correção monetária pelo INPC desde a data de cada desconto, com juros simples de mora de 1% a.m., desde a citação;

4) As partes são reciprocamente credoras e devedoras, o que autoriza o encontro de contas com a extinção das obrigações na medida em que se compensarem (art. 368 do CC).

Diante da sucumbência mínima da parte autora, condeno a parte ré ao pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% do valor atualizado da condenação.(grifo no original)

Irresignadas, ambas as partes recorreram (evento 43, APELAÇÃO1 e evento 57, APELAÇÃO1).

A parte autora objetiva a majoração do quantum indenizatório fixado na sentença, sugerindo o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais); a condenação da ré a restituir em dobro tudo o que fora indevidamente descontado de seu benefício previdenciário; a aplicação dos juros e correção monetária nos termos das súmulas 54 e 362 do STJ no que tange aos danos morais. Contudo, no evento 46, PET1, requereu a desistência do apelo, o que restou homologado pelo juízo de origem no evento 48, DESPADEC1.

Por sua vez, a instituição financeira interpôs recurso de apelação cível, onde sustenta, preliminarmente, a ocorrência da prescrição dos pedidos de repetição de indébito e danos morais, e ainda, que a parte autora intimada para informar o seu conhecimento quanto ao ajuizamento da ação, ante o reiterado ajuizamento de ações pelo advogado da parte, e caso haja negativa, postula pela condenação do advogado em litigância de má-fé, bem como a expedição de ofícios à OAB/SC, ao Ministério Público e à Autoridade Policial competente, para que apure os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica.

No mérito, defende a ausência de violação ao direito de informação ante a legalidade da contratação em voga, pois a autora anuiu ao "Termo de Adesão Cartão de Crédito Consignado Banco BMG S.A. e Autorização para Desconto em Folha de Pagamento", mostrando-se legítima a contratação, eis que realizada mediante expresso requerimento e ciência da demandante para tanto; que a parte autora não tinha margem de crédito disponível para realizar a contratação na modalidade pretendida, bem como discorreu acerca das especificidade do cartão de crédito consignado.

No mais, argumenta que a parte demandante não se desincumbiu do ônus de provar os fatos constitutivos do seu direito, tornando válido o contrato formalizado entre as partes, inexistindo dano moral a ser indenizado, tampouco valores a serem repetidos, porquanto os descontos promovidos no benefício previdenciário da parte autora são válidos.

Por fim, pugna, pelo provimento do recurso a fim de que seja reformada a sentença objurgada, para que seja julgado totalmente improcedentes os pedidos inaugurais, com a condenação da parte recorrida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, bem como em litigância de má-fé,.

Sucessivamente, pugna pela minoração do quantum indenizatório arbitrado.

Com contrarrazões de ambas as partes (evento 66, CONTRAZAP1 e evento 69, CONTRAZAP2), vieram-me conclusos os autos.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de apelação cível interposta por Banco BMG S.A. contra a sentença que, nos autos da "ação declaratória de nulidade de ato jurídico, devolução de valores cobrados indevidamente em dobro e danos morais", julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial por Roseli Schulz Viergutz.

Preliminarmente, sustenta a instituição financeira ré a ocorrência da prescrição da repetição do indébito e danos morais, pois afirma ter decorrido o lapso trienal para tal desiderato.

Contudo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência n. 1.281.594, em 15/05/2019, pacificou entendimento no sentido da incidência da prescrição decenal para responsabilidade civil contratual, in verbis:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA I - Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência tem como finalidade precípua a uniformização de teses jurídicas divergentes, o que, in casu, consiste em definir o prazo prescricional incidente sobre os casos de responsabilidade civil contratual. II - A prescrição, enquanto corolário da segurança jurídica, constitui, de certo modo, regra restritiva de direitos, não podendo assim comportar interpretação ampliativa das balizas fixadas pelo legislador.III - A unidade lógica do Código Civil permite extrair que a expressão "reparação civil" empregada pelo seu art. 206, § 3º, V, refere-se unicamente à responsabilidade civil aquiliana, de modo a não atingir o presente caso, fundado na responsabilidade civil contratual.IV - Corrobora com tal conclusão a bipartição existente entre a responsabilidade civil contratual e extracontratual, advinda da distinção ontológica, estrutural e funcional entre ambas, que obsta o tratamento isonômico.V - O caráter secundário assumido pelas perdas e danos advindas do inadimplemento contratual, impõe seguir a sorte do principal (obrigação anteriormente assumida). Dessa forma, enquanto não prescrita a pretensão central alusiva à execução da obrigação contratual, sujeita ao prazo de 10 anos (caso não exista previsão de prazo diferenciado), não pode estar fulminado pela prescrição o provimento acessório relativo à responsabilidade civil atrelada ao descumprimento do pactuado.VI - Versando o presente caso sobre responsabilidade civil decorrente de possível descumprimento de contrato de compra e venda e prestação de serviço entre empresas, está sujeito à prescrição decenal (art. 205, do Código Civil).Embargos de divergência providos. (EREsp 1281594/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Rel. p/ Acórdão Ministro FELIX FISCHER, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/05/2019, DJe 23/05/2019).

No mesmo sentido, em casos análogos, é o que entende esta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.PRELIMINAR ALEGADA EM CONTRARRAZÕES. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. MATÉRIA QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO. REJEIÇÃO.PREJUDICIAL AO MÉRITO. PRESCRIÇÃO. CONTRATO DE RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC. BUSCA PELA DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO E PELA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS (REPETIÇÃO DE INDÉBITO). HIPÓTESE QUE NÃO CONFIGURA FATO DE CONSUMO. PRAZO PRESCRICIONAL DO ARTIGO 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR INAPLICÁVEL À ESPÉCIE. PREVALÊNCIA DA REGRA GERAL DA LEI CIVIL. PRAZO...

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