Acórdão Nº 5012699-96.2020.8.24.0064 do Primeira Câmara Criminal, 10-06-2021

Número do processo5012699-96.2020.8.24.0064
Data10 Junho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5012699-96.2020.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

APELANTE: LUIZ EDUARDO SILVA DE ABREU (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com base no incluso caderno indiciário, ofereceu denúncia em face de Luiz Eduardo Silva de Abreu, devidamente qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções do art. 155, § 4º, inciso IV, do Código Penal, por conta do seguinte fato narrado na denúncia, in verbis (Evento 01 dos autos da Ação Penal):

No dia 1º de agosto de 2020, por volta das 18h40min, no interior do supermercado Atacadista Líder, localizado na BR 101, Distrito Industrial, nesta Cidade e Comarca de São José/SC, o denunciado LUIZ EDUARDO SILVA DE ABREU e uma segunda pessoa não identificada, em comunhão de desígnios, com manifesto animus furandi, adentraram ao estabelecimento e subtraíram para si coisa alheia móvel, consistente em 1 (um) uísque Jhonny Walker Black Label, 1 (um) uísque Jhonny Walker Red Label, 2 Coca-Colas de 2,5 litros, 1 (um) Guaraná Kuat de 2 litros, 1 (um) desodorante marca Dove, 24 (vinte e quatro) latas de energético Red Bull de 250ml, 1 (um) Amorizante Veicular e 5 (cinco) pacotes de picanha embaladas a vácuo, marca Friboi, avaliados em R$ 672,84 (seiscentos e setenta e dois reais e oitenta e quatro centavos).

A equipe de segurança e o responsável pelo estabelecimento acompanharam os agentes através do monitoramento de câmeras do local e procederam a abordagem dos indivíduos após eles terem saído da loja, no estacionamento, sendo que a pessoa não identificada conseguiu se evadir e o denunciado foi detido conduzido à Delegacia de Polícia pela Guarda Municipal. (Grifo original).

Encerrada a instrução processual, o MM. Juiz a quo, ao final da audiência de instrução e julgamento, julgou procedente a denúncia, a fim de condenar o acusado Luiz Eduardo Silva de Abreu à pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, bem como ao pagamento de 12 (doze) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal, pela prática do crime do art. 155, § 4º, inciso IV, do Código Penal, negando-lhe o direito de recorrer em liberdade (Eventos 43 e 44, ambos dos autos da Ação Penal).

Inconformado, o réu, por intermédio de seu defensor constituído, interpôs recurso de apelação criminal, manifestando o causídico o interesse de arrazoar o reclamo nesta Superior Instância, na forma do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal (Evento 45 dos autos da Ação Penal).

Com a ascensão dos autos a esta Superior Instância, e após devidamente intimados os causídicos (Eventos 07 e 08), sobrevieram as razões de insurgência, nas quais, almejando-se a absolvição do acusado, aventou-se o princípio da insignificância, com o reconhecimento da atipicidade material da conduta praticada. Por outro lado, como argumento adicional à absolvição, sustentou que a conduta era de consumação impossível, nos termos do art. 17 do Código Penal. Subsidiariamente, pugnou pelo afastamento da qualificadora do § 4º, inciso IV, do art. 155 do Código Penal. Em sede de dosimetria, pretendeu a fixação da pena-base no mínimo legal, afastando-se ambas as majorações levadas a efeito na sentença. Na etapa intermediária do cômputo, pugnou pelo reconhecimento da atenuante do art. 65, inciso III, alínea ''d'', do Código Penal. Na etapa derradeira, por fim, pleiteou o reconhecimento das causas de diminuição atinentes à tentativa, nos termos do art. 14, inciso II, do Código Penal, e ao privilégio do furto, previsto no § 2º do art. 155 do mesmo Diploma. Por fim, pugnou pelo abrandamento do regime prisional, do semiaberto para o aberto, bem como pela substituição da reprimenda corporal por penas restritivas de direitos, nos termos do art. 44 do Código Penal (Evento 13).

O representante do Ministério Público, em contrarrazões, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 19).

Após, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em manifestação da lavra do Exmo. Dr. Rui Arno Richter, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 22).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por PAULO ROBERTO SARTORATO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 815066v27 e do código CRC be9e8438.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): PAULO ROBERTO SARTORATOData e Hora: 29/4/2021, às 20:49:13





Apelação Criminal Nº 5012699-96.2020.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

APELANTE: LUIZ EDUARDO SILVA DE ABREU (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto em face de sentença que, ao julgar procedente a denúncia, condenou o acusado Luiz Eduardo Silva de Abreu pela prática do crime do art. 155, § 4º, inciso IV, do Código Penal.

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido, passando-se à análise de seu objeto.

I - Do pleito absolutório pautado nas teses de atipicidade material da conduta e de crime impossível

Inicialmente, cabe ressaltar que, inexistindo quaisquer questionamentos recursais no que tange à materialidade e à autoria delitiva do crime pelo qual o acusado foi condenado - o qual, a propósito, restou suficientemente comprovado pelo acervo probatório coligido, contando até mesmo com a confissão do réu (que, inclusive, será objeto de análise posteriormente) -, proceder-se-á diretamente ao estrito exame das matérias constantes das razões recursais, em homenagem à celeridade e economia processuais.

Dito isso, almejando a absolvição do réu, argumenta a defesa, em suma, que a subtração perpetrada fora penalmente insignificante, seja por conta do valor irrisório dos bens furtados, seja porque foram prontamente recuperados pelo proprietário.

Por outro lado, também aventa a defesa que o fato de o réu ter sido vigiado por sistema de videomonitoramento enquanto se apoderava dos objetos tornaria absolutamente impossível o sucesso da empreitada, nos termos do art. 17 do Código Penal.

Da detida análise dos autos, no entanto, vejo que descabidos tais argumentos.

Inicialmente, quanto à aventada insignificância penal da conduta em averiguação, sabe-se que o princípio da insignificância ou bagatela, sabe-se, repousa na ideia de que não pode haver crime sem ofensa jurídica - nullum crimen sine iniuria -, e deve ser invocado quando verificada a inexpressividade de uma determinada lesão a um bem jurídico tutelado pelo ordenamento legal.

Sobre o tema, é o ensinamento de Fernando Capez:

O direito penal não cuida de bagatelas, nem admite tipos incriminadores que descrevam condutas incapazes de lesar o bem jurídico. Se a finalidade do tipo penal é tutelar bem jurídico, se a lesão, de tão insignificante, torna-se imperceptível, não é possível proceder-se ao enquadramento, por absoluta falta de correspondência entre o fato narrado na lei e o comportamento iníquo realizado. Por essa razão, os danos de nenhuma monta devem ser considerados atípicos. Tal não se confunde com o furto privilegiado, em que a coisa furtada é de pequeno valor, mas não é de valor insignificante, ínfimo. Somente a coisa de valor ínfimo autoriza a incidência do princípio da insignificância, o qual acarreta a atipicidade da conduta. (In Curso de direito penal, volume 2: parte especial. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 389).

Segundo a jurisprudência dos Tribunais Superiores, "[...] a incidência do princípio da insignificância pressupõe a concomitância de quatro vetores: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada". (STJ - AgRg no Habeas Corpus n. 495964/SP, Sexta Turma, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. em 16/05/2019).

Por outro lado, certo que referido princípio deve ser utilizado moderadamente pelo julgador, visto que sua aplicação descomedida ocasionaria a banalização e incentivo ao cometimento de delitos de pequeno porte.

No caso em tela, verifica-se que o acusado Luiz Eduardo Silva de Abreu, em comunhão de esforços e de desígnios com uma comparsa não identificado, deslocou-se até o supermercado Atacadista Líder, localizado na BR 101, Distrito Industrial, no município de São José, e de lá subtraiu, em proveito próprio, 01 (um) uísque Jhonnie Walker Black Label, 01 (um) uísque Jhonnie Walker Red Label, 02 (duas) garrafas de Coca-Colas de 2,5 litros, 01 (um) garrafa de guaraná Kuat de 02 litros, 01 (um) desodorante da marca Dove, 24 (vinte e quatro) latas de energético Red Bull de 250ml, 01 (um) Aromatizante Veicular e 05 (cinco) pacotes de carne bovina (picanha) embaladas a vácuo, marca Friboi, conjuntamente avaliados em R$ 672,84 (seiscentos e setenta e dois reais e oitenta e quatro centavos), conforme o Auto de Exibição e Apreensão e o Auto de Avaliação acostados ao Auto de Prisão em Flagrante (Evento 01 dos autos do Inquérito Policial).

A conduta praticada pelo acusado, com efeito, adéqua-se perfeitamente à previsão abstrata disposta pelo art. 155 do Código Penal - subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel -, na modalidade qualificada, em razão da comunhão de esforços e desígnios com terceiro agente (§ 4º, inciso IV, do art. 155 do Código Penal), recaindo, por isso, em tipicidade formal. Por outro lado, os objetos materiais do delito, acima discriminados, diversamente do que argumenta a defesa, não possuem importância irrelevante a ponto de seu espólio constituir insignificância e, consequentemente, fato materialmente atípico.

Destaca-se que, à época do crime (ano de 2020), o salário mínimo estava fixado no patamar de R$ 1.045,00 (mil...

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