Acórdão Nº 5012964-51.2021.8.24.0036 do Segunda Câmara Criminal, 16-08-2022

Número do processo5012964-51.2021.8.24.0036
Data16 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5012964-51.2021.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO

APELANTE: GABRIEL DA SILVA (RÉU) ADVOGADO: MATTHEUS DA SILVA NEVES (OAB SC050016) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Jaraguá do Sul, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Gabriel da Silva, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, nos seguintes termos:

No dia 13 de agosto de 2021, por volta das 20h06min., Policiais Militares, em atividade de policiamento ostensivo no Bairro São Luís, neste Município e Comarca de Jaraguá do Sul, visualizaram o denunciado Gabriel da Silva em atitude suspeita, próximo a uma padaria, motivo pelo qual realizaram a abordagem.

Durante a revista pessoal, os agentes públicos localizaram uma porção de "maconha" na posse do denunciado, pesando aproximadamente 23g (vinte e três gramas).

Em entrevista pessoal, Gabriel confessou aos milicianos que estava realizando o tráfico ilícito de entorpecentes e que possuía mais uma quantidade de drogas em sua residência, autorizando os policiais a realizarem buscas no imóvel.

Ato contínuo, em diligências na casa do denunciado, os agentes policiais apreenderam sementes de "maconha", uma porção da droga, 22 (vinte e dois) micropontos de "LSD", uma balança de precisão, um aparelho de telefone celular Motorola e cerca de R$ 289,00 (duzentos e oitenta e nove reais) em espécie.

Ressalte-se que os Policiais Militares já tinham informações acerca do tráfico de drogas realizado pelo denunciado, inclusive por intermédio da rede social Instagram, tendo Gabriel confirmado aos agentes policiais que vendia as sementes de "maconha" pelo perfil seeds_poderosoz.

Ainda durante o trajeto até a Delegacia de Polícia, o denunciado informou aos Policiais Militares que havia deixado uma porção de "maconha" na residência de um amigo seu. Diante disso, os agentes diligenciaram até o local e apreenderam mais uma porção da droga (cerca de trinta e oito gramas).

Verificou-se, assim, que o denunciado Gabriel da Silva tinha em depósito, com o intuito de venda, um total de aproximadamente 276g (duzentos e setenta e seis gramas) de "maconha" e 22 (vinte e dois) micropontos de "LSD", tudo sem autorização e em desacordo com a determinação legal e regulamentar (Portaria n. 344/98/Anvisa) (Evento 1).

Concluída a instrução, o Doutor Juiz de Direito Samuel Andreis julgou procedente a exordial acusatória e condenou Gabriel da Silva à pena de 5 anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, e 500 dias-multa, pelo cometimento do delito previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06 (Evento 65).

Insatisfeito, Gabriel da Silva deflagrou recurso de apelação.

Nas razões do inconformismo, almeja o reconhecimento da minorante prevista no art. 33, § 4°, da Lei de Drogas em grau máximo, porque preenchidos os requisitos legais, com a consequente modificação do regime inicial de cumprimento de pena para o aberto e a substituição da privativa de liberdade por restritivas de direitos.

Por fim, pugna pelo direito de recorrer em liberdade (Evento 13).

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões recursais pelo conhecimento parcial e desprovimento do reclamo (Evento 17).

A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pela Excelentíssima Procuradora de Justiça Margaret Gayer Gubert Rotta, manifestou-se pelo "não conhecimento do recurso interposto, mantendo-se a sentença em todos os seus fundamentos" (Evento 20).

VOTO

1. A Excelentíssima Procuradora de Justiça Criminal manifestou-se pelo parcial conhecimento do apelo, ao argumento de que os pedidos de Gabriel da Silva não confrontaram os fundamentos lançados na sentença resistida, o que importa em ofensa ao princípio da dialeticidade.

O argumento não procede. O paradigma constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e da individualização da pena (art. 5º, XLVI) culmina na inafastável conclusão de que o princípio da dialeticidade recursal não se aplica ao acusado no âmbito do processo penal.

Tal convicção é reforçada pela possibilidade de se instrumentalizar, a qualquer tempo, revisão criminal (CPP, art. 622) e de garantir-se, enquanto direito fundamental, que "o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença" (CF, art. 5º, LXXV).

Nesse contexto, por exemplo, o apenamento injusto e incorreto, mesmo que a diferença seja de apenas um dia, configura encarceramento arbitrário, a ofender, inclusive, o art. 7º, 3, da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário e cujo texto já se encontra incorporado ao ordenamento pátrio, por força do Decreto 678/92.

Bem por isso que a revisão da condenação e do apenamento em sede recursal pode dar-se até mesmo de ofício, quando houver manifesta injustiça ou impropriedade técnica, consoante reiterados precedentes desta Corte de Justiça (desta Segunda Câmara, verbi gratia, citam-se: Apelações Criminais 2014.065697-2, Rel. Des. Getúlio Corrêa, j. 21.10.14; 2014.016950-3, Relª. Desª. Salete Silva Sommariva, j. 14.10.14; e 2014.024047-0, Rel. Des. Volnei Celso Tomazini, j. 2.9.14).

Assim, o pleito defensivo, ainda que dotado de certa generalidade nos tópicos, visa a garantir a plenitude da defesa ao jurisdicionado, e deve ser admitido, como o Superior Tribunal de Justiça reiterada e monocraticamente determina (HC 599.378, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 26.4.21; e HC 611.896, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 10.9.20).

2. Ainda assim, o Apelante Gabriel da Silva não tem interesse recursal no que diz respeito ao pedido para recorrer em liberdade, porquanto a pretensão foi atendida na sentença resistida, nos seguintes termos: "Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade (art. 387, parágrafo único, do CPP), pois assim permaneceu no curso do feito" (Evento 65).

Exceto isto, o recurso preenche os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido.

3. Embora não contestadas, tanto a ocorrência material do fato quanto a autoria apontada ao Recorrente são incontroversas e exsurgem do positivado no boletim de ocorrência; no termo de apreensão; no laudo de constatação; no laudo pericial de extração de dados do celular apreendido; nos laudos periciais (Eventos 1, 28 e 29, dos autos 5012656-15.2021.8.24.0036), os quais certificaram o confisco de 260,7g de maconha, 22 micropontos contendo 25E-NBOH (semelhante ao LSD), capazes de causar dependência física e/ou psíquica, de uso proscrito em todo o território nacional, de acordo com a Portaria 344/98 da Agência de Vigilância em Saúde, além de 14 pacotes contendo sementes de Cannabis sativa; e na prova oral colhida durante a instrução processual.

O Apelante Gabriel da Silva almeja, em síntese, o reconhecimento da causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, porque entende que os requisitos legais estão preenchidos.

Sem razão o anseio.

A pena-base foi elevada em 1/6 e fixada em 5 anos e 10 meses de reclusão e 583 dias-multa, diante da variedade da droga apreendida, bem como em razão da elevada quantidade de sementes de Cannabis sativa confiscadas, o que deve ser mantido.

Os fundamentos são idôneos e a providência não configura bis in idem, pois, conforme será analisado, a negativa de concessão do tráfico privilegiado justifica-se pelas circunstâncias do caso concreto, que certificam a dedicação ao tráfico do...

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