Acórdão Nº 5013282-82.2021.8.24.0020 do Primeira Câmara Criminal, 04-11-2021

Número do processo5013282-82.2021.8.24.0020
Data04 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5013282-82.2021.8.24.0020/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

AGRAVANTE: FABIANO MEDEIROS ROSA (AGRAVANTE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (MP)

RELATÓRIO

Trata-se de Agravo em Execução Penal interposto pelo apenado Fabiano Medeiros Rosa contra a decisão proferida pela MMa. Juíza de Direito da Vara de Execuções Penais da Comarca de Criciúma, que, nos autos da Execução Penal n. 0800328-03.2014.8.24.0020 (já em trâmite no Sistema Eletrônico de Execução Unificado - SEEU), revogou a decisão de Seq. 47.1 - na qual readequara, para o patamar de 2/5 (dois quintos), a fração referente à progressão de regime do apenado, em relação ao crime equiparado a hediondo pelo qual fora condenado, compreendendo a viabilidade da retroação dos efeitos da Lei n. 13.964/2019, bem como, em virtude da impossibilidade de combinação de leis, aplicara a referida Lei às demais condenações por crimes comuns -, readequando os requisitos temporais necessários para a progressão de regime, em virtude da retroação ter culminado em prejuízo ao réu, determinando, nessa linha, a ultra-atividade do regramento anterior à referida novel legislação (Seq. 63.1 dos autos do PEC no SEEU).

Nas razões de insurgência, a defesa afirma que a interpretação a ser dada às previsões contidas no art. 112 da Lei de Execução Penal, com as alterações promovidas pela Lei n. 13.964/19, é a de que a exigência de cumprimento da fração de 3/5 (três quintos) da pena - ou 60% (sessenta por cento) - deve ser aplicada aos apenados reincidentes em crime hediondo ou equiparado, contanto que a reincidência seja de natureza específica, situação que não abrange o agravante.

Sustenta que o patamar de 40% (quarenta por cento), estabelecido no inciso V do art. 112 da Lei de Execução Penal, é aplicável ao caso em tela, mormente ao delito de tráfico de drogas pelo qual o agravante foi condenado, face à reincidência genérica do apenado, inclusive, invocando a pacificação do entendimento deste Sodalício acerca do tema.

Por tais razões, almeja a reforma parcial da decisão recorrida, para que, na prática, seja reanalisada, individualmente por condenação, a retroatividade das alterações da Lei n. 13.964/2019 à Lei de Execução Penal, de forma que a progressão de regime para o crime equiparado a hediondo pelo qual o agravante fora condenado seja fixada no patamar de 2/5 (dois quintos) (Evento 1 dos autos do agravo).

Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso (Evento 10 dos autos do agravo).

Mantida a decisão recorrida (Evento 12 dos autos do agravo), os autos ascenderam a esta Superior Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. José Eduardo Orofino da Luz Fontes, opinado pelo conhecimento e provimento do recurso (Evento 10 dos presentes autos).

Este é o relatório.

VOTO

Cuida-se de agravo em execução penal interposto pelo apenado Fabiano Medeiros Rosa, inconformado com a decisão que revogou o decisum que havia determinado a retroação das alterações trazidas pela Lei n. 13.964/2019 e retificou a fração utilizada para a análise do requisito temporal necessário ao benefício da progressão de regime.

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, o agravo de execução em tela merece conhecimento. Todavia, o pedido não comporta provimento, conforme se verá a seguir.

A defesa almeja a modificação da decisão recorrida, para que, no prognóstico dos cálculos exigidos à progressão de regime, seja consignada a fração de 2/5 (dois quintos) em relação ao crime hediondo pelo qual fora o reeducando condenado, devendo-se, no entanto, quanto aos delitos de natureza comum, serem mantidas as anteriores frações exigidas à progressão.

Pois bem.

In casu, compulsando-se os autos, vê-se que o PEC n. 0800328-03.2014.8.24.0020, que originou o presente recurso de agravo, trata da condenação do agravado às reprimendas de:

- nos autos n. 0000000-02.8210.0.06.9150 (282.09.001799-4), 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão, pela prática do delito tipificado no art. 155, § 4º, IV, c/c o art. 71, ambos do Código Penal, ocorrido em 28/06/2009 (transitada em julgado em 07/04/2010) (Seq. 1, arquivo 1.183, dos autos do PEC no SEEU);

- nos autos n. 0001424-37.2018.8.24.0282, 10 (dez) anos, 03 (três) meses e 12 (doze) dias de reclusão, em decorrência do cometimento dos crimes previstos no art. 157, § 2º-A e § 2º-A (por 3 vezes), um deles na modalidade tentada, em continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), e no art. 244-B, caput, do Estatuto da Criança e do Adolescente, ocorridos em 30/07/2018 (transitada em julgado em 06/05/2019) (Evento 707 dos autos do PEC no e-Proc);

- nos autos n. 0000000-00.2821.2.00.3242 (282.12.003242-2), 08 (oito) anos e 02 (dois) meses de reclusão, em decorrência do cometimento do crime previsto no art. 33, caput, c/c o art. 40, VI, ambos da Lei n. 11.343/06, ocorrido em 10/10/2012 (transitada em julgado em 13/05/2014) (Seq. 1, arquivo 1.183, dos autos do PEC no SEEU).

Portanto, o apenado fora condenado pela prática de crimes comuns (um deles cometido com violência e/ou grave ameaça à pessoa) e hediondo, e ostenta a condição de reincidente - não de natureza específica em relação a hediondez.

Acerca do requisito objetivo exigido à progressão de regime no cumprimento da reprimenda, o art. 112 da Lei de Execução Penal, na redação anterior à Lei n. 13.964/19, prescrevia que "A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão".

A Lei n. 11.464/07, que deu nova redação ao art. 2º, § 2º, da Lei n. 8.072/90 (Lei de Crimes Hediondos), introduziu regramento específico para a progressão de regime aos condenados por crimes hediondos e equiparados, atribuindo como critério objetivo o cumprimento da fração de 2/5 (dois quintos) da pena ao apenado primário e 3/5 (três quintos) ao reincidente.

A esse respeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça afirmava, ainda, que "[...] a reincidência é circunstância pessoal que interfere na execução como um todo. Sendo assim, a condição de reincidente, uma vez adquirida pelo sentenciado, estende-se sobre a totalidade das penas somadas, não se justificando a consideração isolada de cada condenação e tampouco a aplicação de percentuais diferentes para cada uma das reprimendas (HC n. 307.180/RS, Ministro Felix Fisher, Quinta Turma, DJe 13/5/2015)". (AgRg no Habeas Corpus n. 506.275/MG, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. em 04/02/2020).

A Lei n. 13.964/19, ao editar tanto a Lei de Crimes Hediondos quanto o art. 112 da Lei de Execução Penal, trouxe novo tratamento à matéria, prevendo novos requisitos de ordem objetiva ao deferimento do benefício, a saber:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:

I - 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;

II - 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;

III - 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;

IV - 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;

V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;

VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:

a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;

b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou

c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;

VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;

VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional (grifos não originais).

Segundo argumenta a defesa, a nova norma garantiria ao apenado a progressão de regime com o cumprimento de apenas 40% (quarenta por cento), ou 2/5 (dois quintos), da pena, já que a previsão contida no inciso VII do art. 112 da Lei de Execução Penal seria destinada somente àqueles que ostentem a condição de reincidentes na prática de crimes hediondos (ou seja, seria aplicável apenas às hipóteses de reincidência específica).

De fato, com o advento das alterações promovidas pela Lei n. 13.964/19, diferentes posicionamentos passaram a ser sufragados tanto na doutrina quanto na jurisprudência pátrias.

Este Relator, considerando a lacuna existente na atual redação dos incisos do art. 112 da Lei de Execução Penal e realizando uma interpretação sistemática e teleológica da nova legislação, partilhava, até então, da compreensão de que, tratando-se de réu reincidente e condenado pela prática de delito hediondo ou equiparado, o requisito objetivo à progressão, fosse à luz do regramento antigo, fosse com base na nova lei, só seria alcançado com o cumprimento de 60% (sessenta por cento), ou 3/5 (três quintos), da reprimenda.

Entendia que o...

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