Acórdão Nº 5013310-28.2021.8.24.0092 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 15-09-2022

Número do processo5013310-28.2021.8.24.0092
Data15 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5013310-28.2021.8.24.0092/SC

RELATOR: Desembargador JAIME MACHADO JUNIOR

APELANTE: VALENTIM NESI (AUTOR) ADVOGADO: DIJORGIANE ZANELATTO JUNKES (OAB SC061933) ADVOGADO: PATRICIA CECHINEL DE ARAUJO (OAB SC034704) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO: SIGISFREDO HOEPERS (OAB SC007478)

RELATÓRIO

VALENTIM NESI interpôs recurso de apelação contra sentença proferida pelo juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário que, nos autos da ação anulatória de contrato de negocio jurídico c/c suspensão de descontos, indenização por danos materiais e morais e antecipação de tutela de urgência ajuizada em face do BANCO BMG S.A, julgou improcedentes os pedidos iniciais, cujo dispositivo restou assim vertido:

ANTE O EXPOSTO, julgam-se improcedentes os pedidos.

Condena-se a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários, estes fixados em 10% do valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa por força da Justiça Gratuita.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se (Evento 15, SENT1).

Inconformado com a prestação jurisdicional entregue, o demandante discorreu acerca da relação contratual estabelecida com o banco e defendeu, em suma, a invalidade do pacto entabulado (cartão de crédito com reserva de margem consignável) e dos descontos efetuados junto ao seu benefício previdenciário. Aduziu que buscou a casa bancária a fim de realizar empréstimo consignado e não contratar cartão de crédito, como de fato ocorreu, partindo-se daí o consentimento equivocado, pois acreditava estar realizando empréstimo e não aderindo a cartão de crédito, com desconto operado diretamente em seus proventos a título de pagamento mínimo de fatura de cartão de crédito que sequer fora utilizado. Requereu, também, a devolução dos valores indevidamente descontados na forma dobrada.

Pontuou, ainda, a presença dos requisitos autorizadores da responsabilidade civil, além da ocorrência de danos morais passíveis de compensação pecuniária, ao passo que a instituição financeira não agiu no exercício regular de direito. Ao final, valeu-se de prequestionamento (Evento 21, APELAÇÃO1).

Com as contrarrazões (Evento 23, CONTRAZAP2), ascenderam os autos a este egrégio Tribunal de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Considerando que o decisum objurgado restou proferido sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, a análise do reclamo ficará a cargo do mencionado diploma legal.

Colhe-se dos autos que o autor, beneficiário do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), alegou que ao pretender firmar contrato de empréstimo consignado pessoal, com parcelas fixas e preestabelecidas, foi-lhe concedido cartão de crédito com reserva de margem consignável - RMC -, modalidade contratual diversa da solicitada.

Pois bem.

A controvérsia cinge-se à análise da (i)legalidade da contratação de empréstimo consignado pela via de cartão de crédito, cuja concessão ocorre mediante reserva de margem consignável em benefício previdenciário.

Examinando a jurisprudência desta Corte, verifica-se que a corrente majoritária converge no sentido de reconhecer a prática abusiva e ilegal perpetrada pelas instituições financeiras quando da contratação da modalidade de crédito supracitada.

A respeito da temática, vale colacionar excerto da decisão proferida pelo Exmo. Des. Robson Luz Varella, ao tempo do julgamento da Apelação Cível n. 5048169-72.2020.8.24.0038 que, em análise de caso análogo, bem pontuou:

[...] esclarece a jurisprudência que, no empréstimo por intermédio de cartão de crédito com margem consignável, "disponibiliza-se ao consumidor um cartão de crédito de fácil acesso ficando reservado certo percentual, dentre os quais poderão ser realizados contratos de empréstimo" (TJMA, Apelação Cível n. 0436332014, rel. Des. Cleones Carvalho Cunha, j. em 14/5/2015, DJe 20/5/2015).

Nessa perspectiva, a concessão de crédito através dessas duas modalidades (empréstimo e cartão de crédito), mesmo na consignação, possui considerável distinção, especialmente em relação às taxas de juros e demais encargos, avistando-se maior onerosidade ao consumidor quando se vale do cartão de crédito em detrimento do empréstimo.

Isso se deve, por vezes, em razão de que "o consumidor firma o negócio jurídico acreditando tratar-se de um contrato de empréstimo consignado, com pagamento em parcelas fixas e por tempo determinado, no entanto, efetuou a contratação de um cartão de crédito, de onde foi realizado um saque imediato e cobrado sobre o valor sacado, juros e encargos bem acima dos praticados na modalidade de empréstimo consignado, gerando assim, descontos por prazo indeterminado" (TJMA, Apelação Cível n. 0436332014, rel. Des. Cleones Carvalho Cunha, j. em 14/5/2015, DJe 20/5/2015).

Inclusive, é sabido que tal prática abusiva e ilegal difundiu-se, atingindo parcela significativa de aposentados e pensionistas, tendo como consequência o ajuizamento de diversas ações visando tutelar o direito dos consumidores coletivamente considerados a fim de reconhecer a nulidade dessa modalidade de desconto realizado a título de Reserva de Margem Consignável (RMC).

Acerca do "modus operandi" utilizado pelas casas bancárias, o Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon), da Defensoria Pública do Estado do Maranhão, para fins de ajuizamento de ação civil pública, bem descreveu como funciona a prática:

O cliente busca o representante do banco com a finalidade de obtenção de empréstimo consignado e a instituição financeira, nitidamente, ludibriando o consumidor, realiza outra operação: a contratação de cartão de crédito com RMC.

Na sua folha de pagamento será descontado apenas o correspondente a 6% do valor obtido por empréstimo e o restante desse valor e mais os acréscimos é enviado para pagamento sob a forma de fatura que chega mensalmente à casa do consumidor.

Se este pagar integralmente o valor da fatura, que é o próprio valor do empréstimo, estará quitada a dívida; se, entretanto, como ocorre em quase todos os casos, o pagamento se restringir ao desconto consignado no contracheque (6% apenas do total devido), sobre a diferença não paga, isto é, 94% do valor...

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