Acórdão Nº 5013321-10.2022.8.24.0064 do Terceira Câmara Criminal, 23-08-2022

Número do processo5013321-10.2022.8.24.0064
Data23 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5013321-10.2022.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA

AGRAVANTE: JOAO CARLOS LUBIAN (AGRAVANTE) ADVOGADO: LUDMILA GRADICI CARVALHO DRUMOND (DPE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)

RELATÓRIO

João Carlos Lubian interpôs agravo em execução penal contra decisão da Vara de Execuções Penais da Comarca de São José, que indeferiu o pedido de afastar o caráter de crime equiparado a hediondo da conduta prevista no art. 33 da Lei 11.343/06, pela qual o apenado foi condenado nos autos ns. 0006461-43.2019.8.24.004 e 0501162-39.4202.0.82.400, e a consequente adequação da fração para fins de progressão de regime (Seq. 106.1 dos autos n. 0007653-11.2019.8.24.0045).

Irresignado, o agravante alega, em síntese, que com a revogação do art. 2º, §2º, da Lei 8.072/90 pela Lei 13.964/2019 (pacote anticrime), "não há nenhum dispositivo legal que "equipara" o tráfico de drogas aos crimes hediondos ou que preveja a aplicação de fração específica para progressão de regime em relação a este delito". Com isso, requer o afastamento do caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas e a observância da fração dos novos parâmetros estabelecidos no art. 112 da Lei de Execução Penal para a progressão, aplicando-se de forma retroativa a Lei 13.964/2019, com a observância daqueles previstos para crimes comuns, assim como das frações estabelecidas para o livramento condicional para delitos desta natureza (Evento 1).

A decisão agravada foi mantida (Evento 5).

Foram apresentadas as contrarrazões (Evento 11).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. José Eduardo Orofino da Luz Fontes, pelo conhecimento e desprovimento do agravo (Evento 8 - segundo grau).

Em decisão monocrática proferida por esta Relatoria, nos termos do art. 132, XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, negou-se provimento ao recurso (Evento 10).

Em face disso, a defesa interpôs agravo interno, em cujas razões, em síntese, além de apontar dados do sistema prisional brasileiro, sustenta que "não existe a categoria legal dos 'crimes equiparados a hediondos'" e que não é possível atribuir tal caráter ao crime de tráfico de drogas, a despeito da redação do art. 5º, XLIII, da Constituição Federal e do art. 112, §5º, da Lei de Execução Penal. Acrescenta que "com a entrada em vigor da Lei n. 13.964/2019, que revogou o art. 2.º, § 2.º, da Lei n. 8.072/1990, simplesmente deixou de subsistir qualquer dispositivo legal que exija um requisito temporal específico para a progressão de regime dos condenados por tráfico de drogas". Com isso, requer a submissão do caso à análise do Órgão Colegiado, a fim de afastar o caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas e adequar a fração para fins de progressão de regime (art. 112 da LEP) e livramento condicional (Evento 14).

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os seus pressupostos intrínsecos e extrínsecos, conhece-se do presente recurso.

O agravo interno manejado por João Carlos Lubian objetiva reformar decisão monocrática proferida por esta Relatoria que, nos termos do art. 132, XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, negou provimento ao recurso de agravo em execução por si interposto, no qual se sustenta que o crime de tráfico de drogas, após o advento da Lei 13.964/2019 (pacote anticrime), não poderia ser equiparado a crime hediondo, motivo pelo qual seria necessário adequar a fração para fins de progressão de regime (art. 112 da LEP) e do livramento condicional.

Não foram levantadas preliminares.

No mérito, a defesa, além de apontar dados do sistema prisional brasileiro, sustenta que "não existe a categoria legal dos 'crimes equiparados a hediondos'" e que não é possível atribuir tal caráter ao crime de tráfico de drogas, a despeito do art. 5º, XLIII, da Constituição Federal e art. 112, §5º, da Lei de Execução Penal. Acrescenta que "com a entrada em vigor da Lei n. 13.964/2019, que revogou o art. 2.º, § 2.º, da Lei n. 8.072/1990, simplesmente deixou de subsistir qualquer dispositivo legal que exija um requisito temporal específico para a progressão de regime dos condenados por tráfico de drogas". Com isso, requer a submissão do caso à análise do Órgão Colegiado, a fim de afastar o caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas e adequar a fração para fins de progressão de regime (art. 112 da LEP) e de livramento condicional (Evento 14).

Sem razão, no entanto.

Ingressando no mérito, de acordo com o Relatório da Situação Processual Executória, infere-se que o apenado João Carlos Lubian cumpre pena total de 13 (treze) anos e 08 (oito) meses de reclusão, pela prática do delito de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei 11.343/06 - autos ns. 0006461-43.2019.8.24.0045 e 0501162-39.4202.0.82.4004), encontrando-se atualmente recolhido em regime fechado.

Após pedido formulado pelo apenado (Seq. 92.1), o Magistrado de origem negou o pretenso afastamento do caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas, o que fez nos seguintes termos (Seq. 106.1):

A entrada em vigor da Lei n. 13.964/2019, popularmente denominada como "Pacote Anticrime", trouxe uma série de significativas mudanças para ordenamento jurídico brasileiro. Algumas delas com aplicação retroativa, em razão de seu favorecimento aos réus/apenados, outras com aplicação apenas a partir da entrada em vigor, já que notoriamente prejudiciais aos apenados/réus.

In casu, a defesa argumenta que, com a entrada em vigor da Lei n. 13.964/2019, o tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, deixou de ser crime equiparado a hediondo para fins de progressão de regime, razão pela qual deve ser aplicada retroativamente a novel legislação, alterando-se os percentuais até então aplicados.

Ocorre que, a despeito da revogação parcial do art. 2º da Lei n. 8.072/1990, especificamente o § 2º do artigo mencionado, que estabelecia os percentuais para progressão de regime dos crimes hediondos e equiparados, verifica-se que previsão do caput, que além da Constituição Federal, equipara o crime de tráfico de drogas aos crimes hediondos, permanece intacta.

Assim, ainda que a novel legislação tenha modificado o local de previsão do percentual necessário para progressão de regime, em momento algum revogou, expressa ou tacitamente, a equiparação do crime de tráfico de drogas aos crimes hediondos, que está prevista no caput do dito artigo.

Gize-se, por oportuno, que sequer poderia, porquanto a equiparação decorre do previsto na Constituição Federal, que em seu art. 5º, inciso XLIII, estabelece que "a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;"

Sobre o tema, colhe-se da doutrina

"A justificativa para o constituinte originário ter separado os crimes hediondos dos equiparados a hediondos está diretamente relacionada à necessidade de assegurar maior estabilidade na consideração destes últimos como crimes mais severamente punidos. Em outras palavras, a Constituição Federal autoriza expressamente que uma simples Lei Ordinária defina e indique quais crimes serão considerados hediondos. No entanto, para os crimes equiparados a hediondos, o constituinte não deixou qualquer margem de discricionariedade para o legislador ordinário, na medida em que a própria Constituição Federal já impõe tratamento mais severo à tortura, ao tráfico de drogas e ao terrorismo. (LIMA, 2015, p. 55)"

Assim, evidenciada a não revogação da equiparação do crime de tráfico de drogas aos crimes hediondos, cabe registrar que é inviável a alteração do montante necessário para progressão de regime, já que o art. 112 da LEP, com a redação dada pela Lei n. 13.964/2019, estabeleceu patamares específicos para os condenados para crimes hediondos e equiparados (incisos V e VII), in verbis

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:

[...]

V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;

[...]

VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;"

Acerca do assunto, colhe-se da mais recente jurisprudência:

"AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. INSURGÊNCIA DA DEFESA CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO DE RETIFICAÇÃO DO PATAMAR DE PROGRESSÃO DE REGIME DE 2/5 PARA 1/6 EM RELAÇÃO À CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DE DELITO EQUIPARADO A HEDIONDO. ALEGAÇÃO DE QUE O REEDUCANDO FAZ JUS AO PATAMAR MAIS BRANDO, PORQUANTO AS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI N. 13.964/19 (PACOTE ANTICRIME) TERIAM AFASTADO A HEDIONDEZ DO DELITO DE TRÁFICO DE DROGAS. NÃO ACOLHIMENTO. NATUREZA EQUIPARADA A HEDIONDA DO CRIME QUE DECORRE DE PREVISÃO CONSTITUCIONAL. ADEMAIS, RESSALVA PREVISTA NO §5º, DO ART. 112, DA LEP, QUE TAMBÉM APONTA PARA A HEDIONDEZ DA FIGURA DO "CAPUT", DO ART. 33, DA LEI 11.343/06. PRECEDENTES. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE ORIGEM QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJSC, Agravo de Execução Penal n. 5025745- 56.2021.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Norival Acácio Engel, Segunda Câmara Criminal, j. 22-02-2022)."

Quanto ao pedido de modificação das frações para fins de livramento condicional, cabe registrar que tampouco merece procedência a irresignação defensiva. A uma pelos motivos antes elencados. A duas porque as frações para concessão do livramento condicional, em relação ao delito de tráfico de drogas, estão previstas expressamente no art. 44, parágrafo único, da Lei n. 11.343/2006:

"Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º , e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e...

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