Acórdão Nº 5013610-48.2021.8.24.0008 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 06-12-2022

Número do processo5013610-48.2021.8.24.0008
Data06 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5013610-48.2021.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ CARLOS CARSTENS KOHLER

APELANTE: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (RÉU) APELADO: BRUNO ALVES GOMES DA SILVA (AUTOR)

RELATÓRIO

Aymore Credito, Financiamento e Investimento S.A. interpôs Recurso de Apelação (Evento 29, APELAÇÃO1) contra a sentença prolatada pelo Magistrado - Doutor Leandro Katscharowski Aguiar - oficiante na Unidade Estadual de Direito Bancário nos autos da ação revisional ajuizada por Bruno Alves Gomes da Silva, ora Apelado, contra o Banco Apelante, que julgou parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na exordial, nos seguintes termos:

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil:

3.1 JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido revisional deduzido por Bruno Alves Gomes de Araujo em face de Aymore Credito, Financiamento e Investimento S.A. e, por conseguinte:

a) DECLARO a nulidade da tarifa de avaliação prevista na cláusula "D.2" do instrumento;

b) DECLARO a nulidade da taxa de registro do contrato estipulada na cláusula "B.9" do contrato;

c) DECLARO a nulidade da contratação do seguro previsto na cláusula "B.6" do pacto.

3.2 JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido de repetição do indébito formulado por Bruno Alves Gomes de Araujo em face de Aymore Credito, Financiamento e Investimento S.A. e, via de consequência, CONDENO a instituição financeira ré à compensação ou à repetição dos valores pagos indevidamente pela parte autora, conforme o capítulo anterior desta sentença, os quais deverão ser corrigidos pelo INPC/IBGE (Provimento CGJ nº 13/1995), desde o desembolso, e acrescidos de juros moratórios de 1% ao mês (CC, art. 406, c/c CTN, art. 161, § 1º), a contar da citação (CC, art. 405).

Havendo sucumbência recíproca, arcam as partes com as despesas processuais, à razão de 50% para a autora e 50% para a instituição financeira ré (CPC, art. 86, caput). Condeno-as, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios, sendo os devidos pela parte autora fixados, por equidade, em R$ 1.000,00 (CPC, art. 85, §§ 8º e 16); ao passo que os devidos pela parte ré, em 10% do valor atualizado da ação, tendo em vista o grau de zelo profissional, a simplicidade da causa e a ausência de atos processuais mais complexos (CPC, art. 85, § 2º); vedada, em qualquer hipótese, a compensação (CPC, art. 85, § 14). Suspendo, contudo a exigibilidade em relação à parte autora, porque beneficiária da gratuidade da justiça (CPC, art. 98, § 3º).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Certificado o trânsito em julgado, cobradas as custas, arquivem-se.

(Evento 22, SENT1)

Inconformada a Instituição Financeira intepôs o presente recurso e, em suas razões recursais, defendeu, em síntese, que: (a) "o contrato foi celebrado por mera liberalidade da parte autora, subscritos por agentes plenamente capazes e sem nenhum vício de consentimento."; (b) "Com relação a tarifa de avaliação do bem, não há ilegalidade de sua cobrança por essa Instituição, desde que haja a efetiva prestação do serviço por parte da Instituição, o que ocorreu no presente caso."; (c) "a cobrança da tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira é legal e o valor cobrado não pode se limitar à taxa média apurada pelo Banco Central do Brasil. É completamente válida a cobrança da tarifa de cadastro, desde que expressamente contratada e exigida tão somente no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira."; (d) "O SIMPLES FATO DE O SEGURO CONSTAR NO MESMO INSTRUMENTO DO MÚTUO POR SI SÓ NÃO É SUFICIENTE PARA QUE SE PRESUMA A VENDA CASADA, POIS EM SE TRATANDO DE SEGURO PRESTAMISTA, QUE É JUSTAMENTE AQUELE QUE SE DESTINA A GARANTIR O PAGAMENTO DE UMA DÍVIDA DO SEGURADO, CONSTAR O SEGURO NO INSTRUMENTO DE CRÉDITO SOMENTE DEMONSTRA QUE O SEGURO SE VINCULA À REFERIDA OPERAÇÃO"; (e) "o que quer a parte autora é uma alteração unilateral das condições contratuais que pactuou com esta instituição. Referida contratação entabulada, foi lícita e isenta de vícios, onde o Banco Réu disponibilizou o crédito à parte autora e este se comprometeu a pagar"; (f) "No que concerne aos "danos materiais", ou seja, a restituição, a r. sentença deve ser reformada, eis que primeiro, não houve cobrança indevida, trata-se de cobrança legitimamente contratada, conforme anteriormente exposto."; (g) "Apesar, do recorrente entender que é caso de improcedência da ação, ou no caso de procedência, entendemos que o douto juízo, ao determinar a condenação destas verbas no patamar questionado, agiu com certo excesso, pois, o caso em testilha não havia necessidade da condenação no patamar máximo, como foi fixado."; e, por fim, prequestionou os dispositivos trazidos em seu recurso.

Ato contínuo, sem a apresentação das contrarrazões, os autos ascenderam a este grau de jurisdição e foram distribuídos a esta relatoria por sorteio (evento 6, INF1).

É o necessário escorço.

VOTO

Esclareço, por oportuno, que a decisão recorrida se subsome ao regramento processual contido no Novo Código de Processo Civil, porquanto a publicidade do comando judicial prolatado pelo Estado-Juiz de origem se deu na vigência do CPC/15.

1 Do inconformismo

1.1 Da revisão contratual e o Código de Defesa do Consumidor

De início impende gizar ser inconteste a aplicação do Código de Defesa do Consumidor às relações de consumo que envolvam instituições financeiras, restando a matéria inclusive sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, através do verbete n. 297, in verbis: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

Em face dessa aplicabilidade, tem-se a possibilidade da revisão das cláusulas contratuais abusivas ou que coloquem em situação amplamente desfavorável o consumidor, conforme preceitua o art. 51, inciso IV, da Lei n. 8.078/90, merecendo frisar-se que essa revisão não viola os princípios do pacta sunt servanda, autonomia da vontade e ato jurídico perfeito que, por serem genéricos, cedem espaço à norma específica prevista no art. 6º, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor.

Nesse diapasão, cai por terra o argumento de que o cumprimento do contrato seria obrigatório por ter sido firmado livremente pelas Partes, sem qualquer erro, coação ou abuso.

Impende enfatizar, por outro lado, que a viabilidade de modificação das cláusulas pelo juiz não significa que tal tarefa possa ser realizada de ofício, conclusão que se extrai da leitura conjunta dos arts. 2º, 128, 460 e 515, todos do Cânone Processual Civil.

Aceitar o inverso, ou seja, que o magistrado analise a validade de cláusulas contratuais sem provocação dos contratantes fora das hipóteses legais, é permitir que ele atue como procurador de uma das partes, o que é inconcebível e afronta os princípios da inércia - art. 2º, do CPC - e dispositivo - arts. 128, 460 e 515, todos do Diploma Adjetivo.

Esse entendimento é o atualmente esposado pelo Superior Tribunal de Justiça, senão confira-se:

"[...] Em homenagem ao método dispositivo (CPC, Art. 2º), é defeso ao juiz rever de ofício o contrato para, com base no Art. 51, IV, do CDC anular cláusulas que considere abusivas (EREsp 702.524/RS)." (REsp n. 767052/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 14-6-07).

Colocando uma pá de cal na quaestio, a "Corte da...

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