Acórdão Nº 5013998-15.2021.8.24.0019 do Quinta Câmara de Direito Comercial, 22-09-2022

Número do processo5013998-15.2021.8.24.0019
Data22 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5013998-15.2021.8.24.0019/SC

RELATORA: Desembargadora SORAYA NUNES LINS

APELANTE: NADIR TERESINHA WALGINSKI ALTHAUS (AUTOR) APELADO: BANCO BMG S.A (RÉU)

RELATÓRIO

NADIR TERESINHA WALGINSKI ALTHAUS ajuizou "ação anulatória de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável, cumulada com obrigação de fazer, restituição de valores e compensação por danos morais" contra BANCO BMG S.A, na qual sustenta que formalizou contrato de empréstimo consignado com o banco réu e, assim, concluiu que o pagamento seria realizado com os descontos mensais diretamente do seu benefício, conforme sistemática de pagamento de empréstimos consignados. No entanto, a instituição financeira realizou operação bancária diversa, com reserva de margem de cartão de crédito, em nítida falha na prestação do serviço, de modo que a instituição financeira não poderia cobrar ou descontar valores da autora a título de RMC.

Pugnou, dessa maneira, pela declaração da inexistência da relação jurídica relativa ao empréstimo via cartão de crédito, bem como da reserva de margem consignável (RMC), com a condenação da ré à restituição na forma simples os valores cobrados indevidamente.

Além disso, pleiteou pela condenação do banco réu ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a concessão da assistência judiciária gratuita e a inversão do ônus da prova. Alternativamente, requereu ainda a readequação/conversão do empréstimo de cartão de crédito consignado (RMC) para empréstimo consignado (evento 1, INIC1 - autos de origem).

Recebida a petição inicial, deferiu-se a gratuidade da justiça e a inversão do ônus da prova (evento 4, DESPADEC1).

Citada, a instituição financeira apresentou contestação (evento 11, CONT1) e juntou documentos.

Houve réplica (evento 14, RÉPLICA1).

Sentenciando (evento 18, SENT1), o Juízo a quo julgou improcedentes os pedidos formulados na exordial, nos seguintes termos:

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos veiculados na petição inicial, resolvendo o mérito, com fulcro no art. 487, I do CPC.

Condeno a parte autora, ainda, ao pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% sobre o valor da causa, com espeque no art. 85, §2º do CPC. Fica suspensa a exigibilidade das verbas sucumbenciais, haja vista a concessão do benefício da justiça gratuita no evento 4.

Inconformada com a prestação jurisdicional, a parte autora interpôs recurso de apelação (evento 23, APELAÇÃO1), no qual postula a reforma da sentença, e, consequentemente, o provimento do recurso para julgar procedentes os pedidos deduzidos na exordial.

Intimado, o apelado apresentou contrarrazões (evento 30, CONTRAZAP2).

Após, vieram os autos conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

Cuida-se de recurso de apelação cível interposto por NADIR TERESINHA WALGINSKI ALTHAUS contra a sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Concórdia que, nos autos da "ação anulatória de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável, cumulada com obrigação de fazer, restituição de valores e compensação por danos morais", julgou improcedentes os pedidos exordiais.

Presentes os requisitos de admissibilidade, passa-se à análise da quaestio.

1 - Da preliminar de prescrição arguida em contrarrazões

A instituição financeira alega a ocorrência de prescrição da pretensão da parte autora, tanto para repetição do indébito, quanto para indenização por danos morais, sob o argumento de que entre a data da contratação e o ajuizamento da ação transcorreu prazo superior a 3 (três) anos.

Isso porque a presente demanda visa à reparação dos danos decorrentes dos descontos indevidamente lançados em benefício previdenciário, sujeita ao Código de Defesa do Consumidor, de modo que se aplica ao caso o prazo quinquenal, consoante o disposto no art. 27 do referido diploma legal, in verbis:

Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

O prazo prescricional, nas ações declaratórias de inexistência de débito cumuladas com pedidos de repetição de indébito e indenização por danos morais, tem como termo inicial a data do último desconto realizado no benefício previdenciário da consumidora, visto que se trata de contrato de prestações continuadas. Ademais, aplica-se aos referidos casos o prazo quinquenal supracitado. Nesse sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido. Precedentes (AgInt no AREsp n. 1.412.088/MS, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 27-8-2019).(grifou-se)

E desta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. RELAÇÃO DE CONSUMO. PRAZO QUINQUENAL QUE SE INICIA NA DATA EM QUE OCORRIDO O ÚLTIMO DESCONTO. EXEGESE DO ARTIGO 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E ENTENDIMENTO ADOTADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONSUMIDOR QUE PRETENDIA OBTER EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EFETIVAÇÃO DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DESTINADOS AO PAGAMENTO MÍNIMO INDICADO NA FATURA DO CARTÃO, RESULTANDO NA CONTRATAÇÃO DE CRÉDITO ROTATIVO. FORMA DE ADIMPLEMENTO E TAXA DE JUROS INCOMPATÍVEIS COM A MODALIDADE CONSIGNADA. PRÁTICA ABUSIVA. ADEQUAÇÃO DO CONTRATO QUE SE IMPÕE. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR. MINORAÇÃO DO QUANTUM. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5002480-15.2021.8.24.0282, rel. Des. Cláudio Barreto Dutra, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 10-02-2022). (grifou-se).

Desta feita, considerando que entre a data do ajuizamento da ação, 21.12.2021, e a data do último desconto mencionado nos autos, 10.01.2022 (evento 11, ANEXO3), não transcorreu prazo superior a 5 (cinco) anos, rejeita-se a pretensão da instituição financeira.

2. Contrato de cartão de crédito consignado com margem consignável

No caso em análise, denota-se da narrativa inicial que a autora pretendia firmar contrato de empréstimo consignado com o banco réu mediante descontos mensais em seu benefício previdenciário. Entretanto, foi-lhe concedido cartão de crédito consignado, por meio do qual foram promovidos descontos no seu benefício previdenciário, realizados a título de reserva de margem consignável (RMC), os quais são indevidos, pois não autorizados.

Inicialmente, cumpre registrar que se trata induvidosamente de relação de consumo, sujeita à aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor, com a inversão do ônus da prova para a facilitação dos direitos da autora, uma vez que configurada a hipossuficiência técnica e financeira em relação à instituição financeira (art. 6º VIII, CDC).

Da análise dos documentos acostados aos autos, é possível constatar que a apelante firmou, em 16.11.2015, com o Banco "Termo de Adesão Cartão Crédito Consignado Emitido pelo Banco BMG e Autorização para Desconto em Folha", sob o nº adesão 40230426 (evento 11, CONTR2), da qual se originou a reserva de margem para cartão de crédito nº 10752722, cuja data de inclusão ocorreu em 17.02.2017 (evento 1, EXTR11).

Ademais, faturas acostadas ao feito demonstram que o cartão de crédito cedido à recorrente jamais fora utilizado na sua função precípua, qual seja, aquisição de produtos e serviços de consumo, visto que os únicos lançamentos deduzidos se referem, justamente, aos saques disponibilizados via "TED"(evento 11, ANEXO4), bem como aos demais encargos de refinanciamento (evento 11, ANEXO3). Resta evidente, portanto, na verdade, tinha a intenção de contratar um empréstimo consignado e não o serviço de cartão de crédito com reserva de margem consignável.

Assim, embora o Banco tenha apresentado o contrato firmado entre as partes, bem como haja cláusula expressa autorizando a reserva de margem consignável, tal fato, por si só, não confere legitimidade à avença, tampouco permite inferir-se extreme de dúvidas que, efetivamente, a parte autora possuía conhecimento sobre as características da avença celebrada.

Verifica-se, outrossim, que o pagamento do valor sacado é exigido de uma única vez, no primeiro vencimento do cartão - o que não se assemelha aos contratos consignados...

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