Acórdão Nº 5014081-54.2022.8.24.0000 do Órgão Especial, 20-07-2022

Número do processo5014081-54.2022.8.24.0000
Data20 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoÓrgão Especial
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial)
Tipo de documentoAcórdão
Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5014081-54.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

AUTOR: PROCURADOR-GERAL - MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA - FLORIANÓPOLIS RÉU: Prefeito - MUNICÍPIO DE VARGEM - Vargem RÉU: CAMARA MUNICIPAL DE VEREADORES DE VARGEM

RELATÓRIO

O Procurador-Geral de Justiça, representado pelo Coordenador do Centro de Apoio Operacional do Controle de Constitucionalidade (CECCON), a quem foram delegadas atribuições por meio da Portaria n. 1.133/2021/PGJ, e a Promotora de Justiça da Comarca de Campos Novos, com base no art. 85, incisos III e VII, da Constituição do Estado de Santa Catarina, e na Lei Estadual n. 12.069/2001, propuseram a presente ação direta de inconstitucionalidade, com pedido liminar, pretendendo suspender e, ao final, declarar a inconstitucionalidade do art. 25, da Lei Complementar n. 72, de 18/1/2017, do Município de Vargem, que instituiu o Plano de Carreira dos Servidores Públicos da Câmara Municipal, por ofensa aos arts. 16, "caput" e 118, § 1º, incisos I e II, da Constituição Estadual, haja vista que dispositivo legal questionado prevê a possibilidade de "despedida voluntária" dos servidores do Poder Legislativo nos seguintes termos:

"Art. 25. A critério da Mesa Diretora, fica concedida ao servidor da Câmara Municipal estável ou efetivo, a despedida voluntária, a razão de um vencimento mensal, por ano de efetivo exercício no quadro dos funcionários da Câmara, bem como em caso de morte, invalidez permanente ou aposentadoria.

"Parágrafo Único - Para a despedida voluntária, fração igual ou superior a 6 meses será computada com 1 (um) ano".

Alegam que há inconstitucionalidade material porque o art. 25 da Lei Complementar n. 72/2017, do Município de Vargem, "silencia quanto aos pressupostos e requisitos objetivos para a concessão do benefício da despedida voluntária, deixando-o à livre disposição da Mesa Diretora da Câmara Legislativa Municipal", o que malfere os princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade administrativas previstos no art. 16, "caput", da Constituição Estadual.

Sustentam que o art. 25, da Lei Complementar n. 72/2017, do Município de Vargem, também padece de inconstitucionalidade formal, mormente porque "permite que qualquer servidor público municipal, a qualquer tempo, possa, voluntariamente, pedir seu desligamento e perceber uma indenização equivalente a um mês de remuneração para cada ano efetivamente trabalhado, além do privilégio da fração igual ou superior a seis meses", sem estabelecer o número de demissões que poderão ser concedidas, "o prazo para adesão ao programa ou critério sobre quais categorias serão alcançadas pela norma", e também não "prevê prévia dotação e autorização orçamentária específica", daí por que há ofensa ao art. 118, § 1º, incisos I e II, da Constituição Estadual.

Requereram:

a) "o deferimento do pedido cautelar para suspender a eficácia do artigo 25 da Lei Complementar n. 72, de 18 de janeiro de 2017, do Município de Vargem, até o julgamento final da ação;

b) diante da possibilidade de existirem "normas anteriores que porventura regulem a mesma matéria ou contenham as mesmas inconstitucionalidades, devem ser afastados os efeitos repristinatórios, de modo a evitar o ressurgimento dos vícios ora apontados"; e

c) "a procedência do pedido para declarar a inconstitucionalidade do artigo 25 da Lei Complementar n. 72, de 18 de janeiro de 2017, do Município de Vargem, por violação aos artigos 16, caput, e 118, § 1º, incisos I e II, da Constituição do Estado de Santa Catarina de 1989".

Indeferida a medida cautelar pleiteada, o Presidente da Câmara de Vereadores do Município de Vargem prestou informações dizendo que até o momento nenhum pagamento foi efetuado com base no art. 25 da Lei Complementar n. 72/2017; que, a respeito do dispositivo impugnado, foi realizada uma consulta ao Tribunal de Contas do Estado, que reformou o Prejulgado 1773 (@CON 20/00355336); que, no ano de 2021, a Câmara de Vereadores expediu a Portaria n. 02/2021, suspendendo todo e qualquer pagamento aos servidores daquela Casa Legislativa, que tenham por fundamento a norma questionada nesta ação direta de inconstitucionalidade.

A Prefeita do Município de Vargem e a respectiva Procuradoria-Geral, embora tenham sido notificados, não prestaram informações.

Com vista dos autos, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, com base em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Paulo de Tarso Brandão, opinou pela "procedência do pedido, para que seja declarado inconstitucional o artigo 25 da Lei Complementar n. 72, de 17 de janeiro de 2017, do Município de Vargem, por violação aos artigos 16, caput, e 118, § 1º, incisos I e II, da Constituição do Estado de Santa Catarina de 1989".

VOTO

Impende registrar, antes de adentrar no mérito, que o fato de o Procurador-Geral do Município de Vargem não ter promovido a defesa do dispositivo legal impugnado não configura nulidade, nem impõe a nomeação de curador especial, sobretudo porque lhe foi dada a oportunidade de ingressar no feito, garantindo-se, assim, o seu direito à manifestação.

Nesse sentido:

"AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL PARA REALIZAR A DEFESA DA NORMA IMPUGNADA. DESNECESSIDADE. PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO QUE FOI NOTIFICADO, SENDO ASSEGURADO O SEU DIREITO À MANIFESTAÇÃO. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO § 4º DO ARTIGO 85 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL, CONFORME O QUE FOI DECIDIDO PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL AO REJEITAR QUESTÃO DE ORDEM SUSCITADA EM RAZÃO DO ARTIGO 103, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL (...) (TJSC - Direta de Inconstitucionalidade n. 8000150-06.2017.8.24.0000, da Capital, Rel. Des. Jânio Machado, Órgão Especial, julgada em 4/10/2017).

O eminente Relator, nos fundamentos do voto, inscreveu:

"A inexistência de defesa do dispositivo legal impugnado (fl. 75), embora o procurador-geral do Município de Passos Maia tenha sido notificado para os fins do artigo 8º da Lei n. 12.069/2001 (fl. 73), não justifica a nomeação de curador especial. Afinal, o procurador-geral do município não tem a obrigação de defender a lei submetida ao controle abstrato de constitucionalidade, pois ele pode, inclusive, anuir ao pedido inicial, notadamente se lei semelhante já houver sido declarada inconstitucional pela Corte ou pelo Supremo Tribunal Federal:

"'Assinale-se, ainda, quanto à manifestação do Advogado-Geral da União, que, diferentemente do que decorre da literalidade do art. 103, § 3º - citação para defesa do ato impugnado -, não está ele obrigado a fazer a defesa do ato questionado, especialmente se o Supremo Tribunal Federal já se tiver manifestado em caso semelhante pela inconstitucionalidade'. (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 1251).

"O tema, a propósito, foi objeto da questão de ordem suscitada pelo ministro Marco Aurélio no julgamento da ação direta de inconstitucionalidade n. 3.916, do Distrito Federal, na sessão de 3.2.2010, sendo rejeitada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal:

"'Decisão: O Tribunal, por maioria, rejeitou a questão de ordem no sentido de suspender o julgamento para determinar ao Advogado-Geral da União que apresente defesa da lei impugnada, nos termos do artigo 103, § 3º, da Constituição Federal, vencidos os Senhores Ministros Marco Aurélio (suscitante) e Joaquim Barbosa. Votou o Presidente. (...)' (o grifo está no original).

"Naquela ocasião, prevaleceu a interpretação sistemática do § 3º do artigo 103 da Constituição Federal, no sentido de não se exigir que o advogado-geral da União defenda, efetivamente, 'o ato ou texto impugnado', bastando que lhe seja assegurada a oportunidade para manifestação.

"O ministro Gilmar Mendes assim asseverou:

"'(...) parece-me que aqui - embora o texto seja expresso, claro, tal como sustentou o ministro Marco Aurélio - nós temos que, para fazermos uma interpretação adequada, optar por uma interpretação sistêmica, que concede ao Advogado-Geral da União um direito de manifestação. Não há uma obrigatoriedade de fazer a defesa do ato impugnado, até porque, em muitos casos, nós podemos ter uma situação de quase que de conflito. O Advogado-Geral da União poderá eventualmente suscitar uma ação direta em nome do Presidente da República e, depois, ter que defender em relação ao ato estatal'.

"E foi acompanhado pelo ministro Ayres Britto:

"'Agora, Senhor Presidente, estou muito impressionado com a argumentação de Vossa Excelência no sentido de que o Advogado-Geral da União, tendo vista do processo, tendo a oportunidade de se manifestar, já realizou o desígnio do § 3º, ou seja, a norma constitucional incide também quando o Advogado tem oportunidade e não defende o ato, no sentido rigoroso da expressão, porque não podemos colocar o Advogado-Geral da União numa situação constrangedora.

"'(...) O meu esforço aqui é de superar a literalidade. E, aí, temos de buscar todos o métodos, e o ponto de arremate é o sistemático. E me parece que o método sistemático de alguma forma prestigia a interpretação que deu o Presidente.

"'Por isso peço vênia ao Ministro Marco Aurélio, para resolver a questão de ordem no sentido de interpretar esse texto como satisfeito com a oportunidade de manifestação, nos autos, dada ao Advogado-Geral da União'.

"O ministro Cezar Peluso acrescentou:

"'Assento que se trata de uma norma a cuja inobservância não corresponde nenhuma sanção de caráter processual. Noutras palavras, se o Advogado-Geral da União não se manifesta em defesa da norma impugnada, isso não acarreta nulidade processual nem impede o julgamento'.

"No caso, repita-se, a oportunidade de manifestação foi assegurada ao procurador-geral do município (fl.73), o que basta, a luz da interpretação dada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal ao § 3º do artigo 103 da Constituição Federal e por simetria, para que se tenha por satisfeita a exigência contida no § 4º do artigo 85 da Constituição Estadual.

"Não se...

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