Acórdão Nº 5014341-85.2020.8.24.0038 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 25-03-2021

Número do processo5014341-85.2020.8.24.0038
Data25 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5014341-85.2020.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA

APELANTE: SEBASTIAO MARIO SOARES (AUTOR) APELADO: BANCO BMG SA (RÉU)

RELATÓRIO

De pronto, tenho por bem adotar o relatório da sentença, pois além de refletir fielmente a narrativa fática em apreço, garante celeridade ao trâmite processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), in verbis:

Trata-se de "AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL, COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA" ajuizada por SEBASTIAO MARIO SOARES em face de BANCO BMG SA.

A parte autora sustenta, em apertada síntese, que pretendia firmar com a instituição financeira ré um contrato de empréstimo consignado, porém, acabou contratando sem saber um cartão de crédito com reserva de margem consignada (RMC) em sua pensão/aposentadoria.

Afirma que jamais solicitou tal cartão de crédito e que sequer fez uso dele, tendo sido vítima de uma fraude.

Pleiteia, ao final, a declaração de nulidade da contratação do RMC e do cartão de crédito, a devolução dos valores descontados em seu benefício previdenciário sob a rubrica de RMC e a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais.

Decisão deferindo a justiça gratuita ao autor (evento 4).

Embora ausente a determinação de citação, a ré compareceu espontaneamente ao feito.

Contestação no evento 9, através da qual a instituição financeira ré sustenta que a parte autora realizou a contratação do RMC vinculado a cartão de crédito e, por isso, refutou integralmente os argumentos contidos na inicial e os pedidos nela formulados.

Réplica no evento 20.

Realizei incidente de resolução de demandas repetitivas suscitado nos autos nº 0302728-51.2018.8.24.0038.

Decisão do TJSC não admitindo o IRDR suscitado (autos nº 0000507-54.2019.8.24.0000).

Após, sobreveio a parte dispositiva da sentença (Evento 22, SENT1), nos seguintes termos:

PELO EXPOSTO, com fulcro no art. 487, I, do NCPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos constantes nesta ação eletrônica aforada por SEBASTIAO MARIO SOARES em face de BANCO BMG SA.

Custas e honorários pela parte autora, sendo estes fixados em 15% (quinze por cento) do valor atualizado dado à causa, na forma do art. 85, §§ 1º e 2º, do NCPC. Fica, porém, nos moldes do art. 98, § 3º, do NCPC, suspensa a exigibilidade de tais quantias, eis que já deferida a justiça gratuita ao autor (evento 4).

Publique-se. Registre. Intimem-se.

Transitado em julgado, nada mais sendo requerido, ARQUIVEM-SE.

Cumpra-se.

Irresignada, a parte autora interpôs recurso de apelação cível (Evento 31, APELAÇÃO1), onde defende a nulidade do contrato, eis que os documentos acostados aos autos demonstram que não houve utilização do cartão de crédito via RMC, tampouco o seu desbloqueio, aduzindo, ademais, que se houveram saques complementares ao valor inicialmente contratado, referida "transferência em favor do consumidor se traduz em "amostra grátis" pois em nenhum momento o consumidor solicitou tal pecúnia" (Evento 31, APELAÇÃO1, p. 5).

Alega, ainda, que o banco réu praticou venda casada e violou o direito de informação, porquanto, em verdade, pretendia a contratação de empréstimo consignado pessoal e não um cartão de crédito com reserva de margem de crédito, de modo que deve ser reconhecida a ilegalidade do pacto, com a consequente condenação em indenização por danos morais.

Em sede de contrarrazões (Evento 38, CONTRAZ1), a instituição financeira apelada sustenta, preliminarmente, a necessidade de intimação da parte autora para informar o seu conhecimento quanto ao ajuizamento da ação, ante o reiterado ajuizamento de ações pelo advogado da parte, e caso haja negativa, postula pela condenação do advogado em litigância de má-fé, bem como a expedição de ofícios à OAB/SC, ao Ministério Público e à Autoridade Policial competente, para que apure os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica. Aduz, ainda, em prefacial, a ocorrência da prescrição trienal e a ausência de interesse de agir.

Após, vieram-me os autos conclusos.

Este é o voto.

VOTO

Trata-se de apelação cível interposta por Sebastião Mario Soares contra a sentença que, nos autos da "Ação de Restituição de Valores c/c Indenização por Dano Moral, com pedido de Tutela Provisória de Urgência Antecipada", julgou improcedentes os pedidos por si formulados em face do Banco BMG S.A.

Contrarrazões do Banco Réu.

Aponta o banco apelado a prefacial da prescrição da repetição de indébito e danos morais ,em sede de contrarrazões, pois afirma ter decorrido o lapso trienal para tal desiderato.

Contudo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência n. 1.281.594, em 15/05/2019, pacificou entendimento reconhecendo a incidência da prescrição decenal para os casos que envolvem responsabilidade civil contratual, in verbis:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA

I - Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência tem como finalidade precípua a uniformização de teses jurídicas divergentes, o que, in casu, consiste em definir o prazo prescricional incidente sobre os casos de responsabilidade civil contratual.

II - A prescrição, enquanto corolário da segurança jurídica, constitui, de certo modo, regra restritiva de direitos, não podendo assim comportar interpretação ampliativa das balizas fixadas pelo legislador.

III - A unidade lógica do Código Civil permite extrair que a expressão "reparação civil" empregada pelo seu art. 206, § 3º, V, refere-se unicamente à responsabilidade civil aquiliana, de modo a não atingir o presente caso, fundado na responsabilidade civil contratual.

IV - Corrobora com tal conclusão a bipartição existente entre a responsabilidade civil contratual e extracontratual, advinda da distinção ontológica, estrutural e funcional entre ambas, que obsta o tratamento isonômico.

V - O caráter secundário assumido pelas perdas e danos advindas do inadimplemento contratual, impõe seguir a sorte do principal (obrigação anteriormente assumida). Dessa forma, enquanto não prescrita a pretensão central alusiva à execução da obrigação contratual, sujeita ao prazo de 10 anos (caso não exista previsão de prazo diferenciado), não pode estar fulminado pela prescrição o provimento acessório relativo à responsabilidade civil atrelada ao descumprimento do pactuado.

VI - Versando o presente caso sobre responsabilidade civil decorrente de possível descumprimento de contrato de compra e venda e prestação de serviço entre empresas, está sujeito à prescrição decenal (art. 205, do Código Civil).Embargos de divergência providos. (EREsp 1281594/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Rel. p/ Acórdão Ministro FELIX FISCHER, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/05/2019, DJe 23/05/2019).

No mesmo sentido, em casos análogos, é o que entende esta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.PRELIMINAR ALEGADA EM CONTRARRAZÕES. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. MATÉRIA QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO. REJEIÇÃO.PREJUDICIAL AO MÉRITO. PRESCRIÇÃO. CONTRATO DE RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL - RMC. BUSCA PELA DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO E PELA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS (REPETIÇÃO DE INDÉBITO). HIPÓTESE QUE NÃO CONFIGURA FATO DE CONSUMO. PRAZO PRESCRICIONAL DO ARTIGO 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR INAPLICÁVEL À ESPÉCIE. PREVALÊNCIA DA REGRA GERAL DA LEI CIVIL. PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL TANTO PARA A PRETENSÃO DECLARATÓRIA, QUANTO PARA O PEDIDO CONDENATÓRIO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE. TERMO INICIAL QUE SE DÁ COM A ASSINATURA DA AVENÇA.1. O prazo prescricional quinquenal do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor restringe-se às ações de reparação de danos decorrentes de fato do produto ou do serviço, o que não é o caso dos autos.2. Segundo decidido por esta Corte Superior, 'O prazo de prescrição de pretensão fundamentada em inadimplemento contratual, não havendo regra especial para o tipo de contrato em causa, é o decenal, previsto no art. 205 do Código Civil' (AgInt no AREsp 459.926/MG, Rel. Ministra...

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