Acórdão Nº 5014757-46.2020.8.24.0008 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 03-05-2022

Número do processo5014757-46.2020.8.24.0008
Data03 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5014757-46.2020.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ CARLOS CARSTENS KOHLER

APELANTE: FABIO HENRIQUE NOBLE FIALHO (AUTOR) APELADO: BANCO DIGIMAIS S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Fábio Henrique Noble Fialho interpôs Apelação Cível (Evento 60) contra a sentença prolatada pelo Magistrado oficiante na Unidade Estadual de Direito Bancário - doutor Marlon Negri - que, nos autos da "ação de revisional de juros com pedido de tutela de urgência antecipada e produção antecipada de prova" n. 5014757-46.2020.8.24.0008, detonada pelo ora Apelante em face de Banco A.J. Renner S.A., julgou parcialmente procedente a pretensão inaugural, cuja parte dispositiva restou vazada nos seguintes termos:

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE os pedidos iniciais (art. 487, inciso I, do CPC), para determinar a revisão do contrato e, assim:

a) afastar a cobrança da tarifa de registro;

b) determinar a repetição simples de eventual indébito, corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do pagamento, acrescida a diferença verificada em favor do autor de juros de 1% ao mês a contar da citação.

Os valores apurados deverão ser compensados/descontados do saldo devedor em aberto e, caso quitado o contrato, restituídos em parcela única.

Diante da sucumbência mínima, condeno a parte autora ao pagamento integral das custas e dos honorários, estes fixados em 15% do valor atualizado da condenação (art. 86, par. ún., do CPC), cuja exigibilidade suspendo por força da justiça gratuita.

(Evento 47, negrito no original).

O Inconformado sustenta, em epítome, que: a) "os juros remuneratórios devem ser limitados com base no chamado período da normalidade, taxa média de mercado estipulada pelo BACEN, ou seja, são consideradas abusivas as taxas de juros remuneratórios pactuada em percentual superior à média de mercado e outros encargos em dissonância com a jurisprudência dominante acerca do tema"; b) "No caso concreto, O CONTRATO DE FINANCIAMENTO firmado prevê taxa de 34,17% AO ANO - CET 46,04., quando o BACEN, para o período de assinatura do contrato (18/12/2019), informa taxa média de 17,64% a.a., ou seja, a taxa cobrada está mais de 15 (quinze) pontos percentuais acima da média estipulada pelo BACEN OU 10% SUPERIOR AO LIMITE, CONFORME SENTENÇA, o que demonstra a abusividade de acordo com entendimento de diversos Tribunais, como do TJRS, que considera abusiva taxa acima de 05 pontos percentuais acima da taxa média, e, do TJSC, que considera abusiva taxa acima de 10 (dez) pontos percentuais acima da taxa média"; c) "a permanência da Capitalização Mensal Juros nos contratos superiores a 01 (um) ano, consubstancia em notória afronta à Lei e sua constância causar contundente prejuízo ao Demandante. Sendo assim, a fim de evitar mais um artifício doloso da Instituição Financeira para angariar lucros e, evitar o Sepulcro Familiar da parte autora, mister se faz, a exclusão imediata da Capitalização Mensal dos juros no contrato em apreço"; d) "O contrato prevê a cobrança a título de "Tarifa de cadastro no valor de R$ 900,00 (novecentos reais), Tarifa de Avaliação do bem no valor de R$ 392,00 (trezentos e noventa e dois reais). Nota-se, Excelências, que a instituição apelada não trouxe aos autos quaisquer documentos que comprovem as despesas supra, tendo embutido no contrato a bel prazer, sem qualquer satisfação plausível" logo, "devem ser anuladas e afastadas as cobranças relativas a "Tarifa de cadastro no valor de R$ 900,00 (novecentos reais), Tarifa de Avaliação do bem no valor de R$ 392,00 (trezentos e noventa e dois reais, ante a ausência de previsão legal, com a restituição do valor cobrado, na sua forma dobrada, qual seja, R$ 2.440,00 (dois mil, quatrocentos e quarenta reais)"; e) "no momento da negociação a Instituição Ré não permitiu o pagamento avista do Imposto, nem informou a parte autora desta possibilidade, simplesmente embutiu junto ao financiamento o Imposto gerando assim uma cobrança abusiva de juros sobre juros" desta forma, "diante a má-fé da Instituição Ré em não permitir à possibilidade do pagamento do IOF a vista, requer a devolução em dobro dos valores cobrados à maior"; e f) "No que se refere à possibilidade de compensação de valores e repetição indébito, totalmente viável é seu deferimento, diante do reconhecimento da abusividade das cláusulas contratuais, tratando-se de consequência lógica da revisão contratual"; e g) "as quantias pagas indevidamente pelo consumidor DEVERÃO SER RESTITUÍDAS EM DOBRO, e devidamente atualizadas segundo índices de correção monetária e juros legais desde a sua cobrança até o efetivo pagamento"

Empós, vertidas as contrarrazões (Evento 64), os autos ascenderam a este grau de jurisdição e foram distribuídos a esta relatoria por sorteio, na data de 3-3-22 (Evento 1, segundo grau).

É o necessário escorço.

VOTO

Primeiramente gizo que, uma vez preenchidos os requisitos de admissibilidade, o Recurso é conhecido.

Esclareço, por oportuno, que a decisão recorrida se subsome ao regramento processual contido no CPC/2015, porquanto a publicidade do comando judicial prolatado pelo Estado-Juiz se deu já na vigência do novel Código Adjetivo Civil.

1 Dos juros remuneratórios

Defende o Apelante que: a) "os juros remuneratórios devem ser limitados com base no chamado período da normalidade, taxa média de mercado estipulada pelo BACEN, ou seja, são consideradas abusivas as taxas de juros remuneratórios pactuada em percentual superior à média de mercado e outros encargos em dissonância com a jurisprudência dominante acerca do tema"; e b) "No caso concreto, O CONTRATO DE FINANCIAMENTO firmado prevê taxa de 34,17% AO ANO - CET 46,04., quando o BACEN, para o período de assinatura do contrato (18/12/2019), informa taxa média de 17,64% a.a., ou seja, a taxa cobrada está mais de 15 (quinze) pontos percentuais acima da média estipulada pelo BACEN OU 10% SUPERIOR AO LIMITE, CONFORME SENTENÇA, o que demonstra a abusividade de acordo com entendimento de diversos Tribunais, como do TJRS, que considera abusiva taxa acima de 05 pontos percentuais acima da taxa média, e, do TJSC, que considera abusiva taxa acima de 10 (dez) pontos percentuais acima da taxa média".

A sorte lhe abraça em parte. Explico.

De antemão, verifico que na sentença, apesar de não constar expressamente o reconhecimento da ilegalidade dos juros remuneratórios, verifico na íntegra da fundamentação o quanto segue:

Para a aferição da legalidade ou abusividade dos juros remuneratórios, portanto, deve ser utilizada como parâmetro a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil, considerando o tipo de operação bancária, a qual não se limita ao percentual de 12% ao ano.

Assim, como critério objetivo, adoto como parâmetro para se verificar a abusividade a flexibilização da taxa de juros remuneratórios até o percentual de 10% (dez por cento) acima da taxa média divulgada pelo Banco Central.

Nesse sentido, colhe-se do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

1) Apelação Cível n. 5037404-42.2020.8.24.0038/SC, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 16-09-2021:

EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. REVISÃO. IMPROCEDÊNCIA. APELO DA DEMANDANTE.JUROS REMUNERATÓRIOS. VERIFICAÇÃO DA ABUSIVIDADE QUE SE PAUTA NA TAXA MÉDIA DE MERCADO, ADMITIDA CERTA VARIAÇÃO. ORIENTAÇÃO DO STJ. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. ABUSIVIDADE NÃO EVIDENCIADA NA HIPÓTESE. INCIDÊNCIA DA TAXA DE JUROS PREVISTA NO CONTRATO.Na esteira do entendimento delineado pelo STJ - que admite a revisão do percentual dos juros remuneratórios quando aplicável o CDC ao caso e quando exista abusividade no pacto -, esta Câmara julgadora tem admitido como parâmetro para aferir a abusividade a flexibilização da taxa de juros remuneratórios até o percentual de 10% (dez por cento) acima da taxa média divulgada pelo Banco Central.Não extrapolada tal margem, deve incidir na hipótese a taxa de juros prevista no contrato. [....]APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

2) Apelação Cível n. 0301551-91.2018.8.24.0025, rel. Des. Torres Marques, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 04-05-2021:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. JUROS REMUNERATÓRIOS. TAXA PACTUADA ACIMA DE 10% DA MÉDIA DE MERCADO ANUNCIADA PELO BACEN. EXCESSO EVIDENCIADO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO POR ESTE COLEGIADO. SENTENÇA REFORMADA NO PONTO. TARIFA DE AVALIAÇÃO DE BEM. COBRANÇA CABÍVEL DESDE QUE COMPROVADA A EFETIVA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO E INEXISTA ONEROSIDADE EXCESSIVA. POSIÇÃO FIRMADA PELO STJ EM RECURSO REPETITIVO. RESP. 1.578.553/SP (TEMA 958). AUSÊNCIA DE PROVA DA REALIZAÇÃO DA ATIVIDADE. ABUSIVIDADE RECONHECIDA. RECLAMO ACOLHIDO. RECURSO PROVIDO. (grifou-se)

Cabe ressaltar que o custo efetivo total (CET) não é parâmetro de comparação com a taxa média de mercado, pois engloba, além da taxa de juros, todos os demais encargos e despesas incidentes na operação, inclusive IOF, ex vi do disposto na Resolução n. 4.881/2020, do Conselho Monetário Nacional.

Na data da celebração do pacto (18-12-2019 - evento 1, contrato 7), conforme informações disponibilizadas no sítio do Banco Central do Brasil, a média anual de mercado para esta espécie de operação (pessoas físicas - aquisição de veículos) era de 19,15% e a média mensal era de 1,47%, razão pela qual vislumbro ilegalidade ou abusividade da taxa remuneratória contratada, que foi de 34,17% ao ano e 2,48% ao mês, superior, portanto, do limite de até 10% (dez por cento) da taxa média informada, o que recomenda a sua revisão.

(Evento 47).

Com efeito, deve ser mantida a sentença no tocante à impossibilidade de verificação de abusividade com base no Custo Efetivo Total, tendo em vista que este não representa apenas os juros remuneratórios, mas também outras despesas - como tributos, tarifas administrativas, etc -.

Nessa toada, colho de atuais julgados desta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.ABUSIVIDADE DO CUSTO EFETIVO TOTAL (CET)...

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