Acórdão Nº 5015074-96.2020.8.24.0023 do Primeira Câmara Criminal, 14-06-2022

Número do processo5015074-96.2020.8.24.0023
Data14 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5015074-96.2020.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

APELANTE: JOSE FERNANDO PIRES DE ANDRADE (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público, com base no incluso Inquérito Policial, ofereceu denúncia em face de José Fernando Pires de Andrade, devidamente qualificado nos autos, dando-o como incurso na sanção do art. 157, § 3º, inciso II, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, por conta dos seguintes fatos narrados na denúncia (Evento 1 dos autos da ação penal):

No dia 12 de fevereiro de 2020, por volta das 18 horas, a vítima Fiona Citra Dewi Hartono, de nacionalidade inglesa, 21 anos, foi sozinha para as dunas da Lagoa da Conceição, nesta Capital, caminhar e meditar.

Chegando lá, enquanto caminhava, a vítima foi abordada pelo denunciado JOSÉ FERNANDO PIRES DE ANDRADE, que começou a lhe seguir e a "puxar papo", mas a vítima não compreendeu direito, eis que o homem não falava inglês.

Em determinado momento, o denunciado puxou-lhe para um arbusto e começou a tentar estrangula-la, sendo que a vítima entrou em luta corporal com o denunciado, que embora a reação da vítima, o denunciado a agrediu violentamente com golpes de mãos e chutes, causando na vítima Hartonio Fiona Citra Dewi escoriações úmidas; no pescoço, equimoses avermelhadas e escoriações úmidas em faixa, com 1 cm de largura em média; nos joelhos e pernas, equimoses arroxeadas; sobre o esterno, escoriações (arrasto) úmidas, no hemitórax esquerdo, dreno (Laudo Pericial, fl. 13, evento 1).

Uma testemunha, que estava passeando nas dunas, presenciou a vítima sendo agredida pelo denunciado JOSÉ FERNANDO PIRES DE ANDRADE, que, quando percebeu que estava sendo observado, se evadiu. Mencionada pessoa que visualizou as agressões, imediatamente buscou auxílio da polícia militar e dos bombeiros, que conduziram a inglesa para o Hospital Celso Ramos.

A vítima ficou internada dias na UTI do nosocômio, com diversas lesões pelo pescoço, corpo, em decorrência das agressões sofridas, sendo que, inclusive, foi submetida a cirurgia na região do tórax, para drenar hemorragia gerada pelos golpes desferidos pelo denunciado, demonstrando que as lesões sofridas pela vítima foram extremamente graves.

A vítima estava apenas com um bolsa de crochê, onde continha o seu celular Iphone X (avaliado em R$ 4.500,00 - fl. 43 do processo relacionado) e o seu cartão de crédito. Esses objetos foram subtraídos pelo denunciado, mediante a violência empregada, após ter agredido a vítima.

Dessa forma, o denunciado JOSÉ FERNANDO PIRES DE ANDRADE, com objetivo de se apropriar do patrimônio da vítima, ao lhe agredir violentamente, atentou contra a vida de Fiona Citra Dewi Hartono, estrangulando-a e a ferindo violentamente com golpes no tórax, sendo que o resultado morte só não se consumou devido ao atendimento feito por populares, polícia, bombeiros e posteriormente no hospital.

Ressalta-se que a vítima reconheceu, emocionada, com plena convicção, o denunciado JOSÉ FERNANDO PIRES DE ANDRADE como o autor do violento crime.

Encerrada a instrução processual, o MM. Juiz a quo julgou procedente a denúncia, a fim de condenar o acusado pela prática do crime previsto no art. 157, § 3º, inciso II, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, imputando-lhe pena privativa de liberdade de 11 (onze) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime fechado, além do pagamento de 05 (cinco) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal, negando-se o direito de recorrer em liberdade. (Evento 240 dos autos da ação penal).

Inconformado, o réu interpôs recurso de apelação criminal, por termo nos autos e por intermédio de sua defesa constituída, pleiteando, nas inclusas razões de insurgência, preliminarmente: a) a declaração de nulidade por ausência de intimação pessoal do acusado; b) a nulidade do reconhecimento realizado na fase policial, sob alegação de desrespeito ao art. 226 do Código de Processo Penal, ausência de plena percepção da vítima durante atendimento hospitalar e não nomeação de intérprete; c) alternativamente, a nulidade calcada em suposta violação ao art. 213 do Código de Processo Penal. No mérito, pugna pela: a) absolvição por insuficiência probatória e, subsidiariamente, desclassificação da conduta para o delito de tentativa de roubo; b) aplicação da fração máxima de 2/3 (dois terços) pela modalidade tentada do crime; c) concessão do direito de recorrer em liberdade; d) prequestionamento de diversos dispositivos legais; e) saneamento de alegado error in procedendo constante na fundamentação da sentença (Evento 293 e Evento 300, carta devolvida 2, dos autos da ação penal).

O representante do Ministério Público, em contrarrazões, requereu o conhecimento e desprovimento do recurso defensivo (Evento 304 dos autos da ação penal).

Após, os autos ascenderam a esta Superior Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra do Exmo. Dr. Fábio Strecker Schmitt, opinado pelo parcial conhecimento e desprovimento do recurso (Evento 15).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por PAULO ROBERTO SARTORATO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2385660v4 e do código CRC 78b334d2.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): PAULO ROBERTO SARTORATOData e Hora: 10/6/2022, às 16:11:59





Apelação Criminal Nº 5015074-96.2020.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

APELANTE: JOSE FERNANDO PIRES DE ANDRADE (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Trata-se de recurso de apelação criminal interposto em face de sentença que, ao julgar procedente a denúncia, condenou o acusado José Fernando Pires de Andrade pela prática da infração tipificada no art. 157, § 3º, inciso II, c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal.

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido, embora parcialmente, conforme se verá, passando-se à análise de seu objeto.

I - Das preliminares aventadas

a) Da nulidade por ausência de intimação pessoal

Ab initio, a defesa formula pleito de nulidade por ausência de intimação pessoal do acusado da sentença, o qual encontrava-se preso, sob argumento de cerceamento de defesa e violação ao art. 392, inciso I, do Código de Processo Penal.

Observo, entretanto, que no momento de apresentação das referidas razões recursais pela defesa recém constituída do acusado, estava em diligência carta precatória para intimação pessoal do acusado acerca do decreto condenatório no Estado do Rio Grande do Sul, a qual posteriormente retornou como cumprida (Evento 300, carta devolvida 2, dos autos da ação penal).

Além disso, em que pese a Defensoria Pública do Estado tenha em um primeiro momento interposto recurso de apelação criminal em favor do acusado, considerando que o representava até então, não se evidencia nos autos prejuízo ao apelante, pois posteriormente houve nova interposição pela sua defesa então constituída, com revogação pelo MM. Juiz a quo da decisão que recebeu o primeiro recurso (Evento 301 dos autos da ação penal).

Assim, devidamente respeitada a previsão do art. 392, inciso I, do Código de Processo Penal, e não evidenciado qualquer prejuízo ao acusado à luz do art. 563 da referida norma, afasto a prefacial.

b) Da nulidade do reconhecimento fotográfico

Também em sede preliminar, aduz a defesa a nulidade do reconhecimento fotográfico realizado na seara policial, sob argumento de desrespeito às disposições constantes no art. 226 do Código de Processo Penal. Outrossim, alega a defesa que o reconhecimento foi realizado pela vítima em momento de alteração de sua percepção, pois ainda estava se recuperando dos traumas e lesões no hospital, além de estar desacompanhada de tradutor, conforme exigência do art. 223 do Código de Processo Penal.

Referido pedido, contudo, não comporta acolhimento.

Depreende-se do inquérito policial que o reconhecimento foi colhido após apresentação de fotografia do réu, juntamente com fotos de outros três masculinos alheios ao processo, com indicação da vítima Fiona Citra Dewi Hartono da fotografia do acusado como sendo o autor do delito, com absoluta certeza (Evento 1, fl. 42, dos autos do inquérito policial).

O reconhecimento foi ainda ratificado pela ofendida em seu depoimento judicial (Evento 1, vídeo 2, dos autos da produção antecipada de provas n. 5019172-27.2020.8.24.0023).

Sabe-se que no sistema processual penal pátrio, vige o princípio do livre convencimento, que confere aos julgadores a prerrogativa de sopesar os indícios, provas e argumentos trazidos à baila e, à luz do ordenamento jurídico, proferir decisão conforme sua particular convicção. Não vige, pois, sistema de provas tarifadas, no qual pré-concebido o valor de cada elemento probatório.

Nesse contexto, entende-se que o reconhecimento livremente efetuado por vítima, testemunha ou informante, mesmo aquele realizado ao arrepio do procedimento previsto no art. 226 do Código de Processo Penal, é elemento de convicção plenamente válido, perfeitamente capaz de subsidiar o entendimento alcançado pelo julgador, ainda que não ostente o mesmo status que a prova nominada regida pelo aludido dispositivo legal.

A jurisprudência desta Corte não destoa:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE FALSIDADE IDEOLÓGICA (CP, ART. 299, CAPUT) E DE FALSA IDENTIDADE (CP, ART. 307). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO ACUSADO. 1. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO. VALIDADE. PROCEDIMENTO (CPP, ART. 226). NULIDADE. VALOR PROBATÓRIO. [...] 1. A inobservância do procedimento previsto nos arts. 226 e seguintes do Código de Processo Penal no reconhecimento fotográfico, que se trata de prova inominada válida, não implica a nulidade do elemento probatório...

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