Acórdão Nº 5015289-13.2022.8.24.0020 do Terceira Câmara Criminal, 30-08-2022

Número do processo5015289-13.2022.8.24.0020
Data30 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5015289-13.2022.8.24.0020/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5015289-13.2022.8.24.0020/SC

RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA

AGRAVANTE: JEDIEL DIAS MARTINS ADVOGADO: LUDMILA GRADICI CARVALHO DRUMOND (DPE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de execução penal interposto por Jediel Dias Martins contra decisão do Juízo da Vara de Execuções Penais da Comarca de Criciúma, que indeferiu o pleito de afastamento da equiparação a hediondo do crime de tráfico de drogas, com a retificação do parâmetro exigido para fins de progressão de regime (Seq. 77.1 - autos n. 8003530-35.2021.8.24.0020 - SEEU).

Irresignado, o agravante alega, em síntese, que o crime de tráfico de drogas não é considerado hediondo e que, após a revogação do art. 2º, §2º, da Lei 8.072/90 pela Lei 13.964/2019 (pacote anticrime) "inexiste, assim, no ordenamento jurídico vigente nenhuma legislação que elenque quais os delitos são equiparados a hediondo: CRFB, Lei Crimes Hediondos, LEP ou Lei de Drogas". Acrescenta, haver quanto a matéria "um silêncio eloquente, razão pela qual não cabe ao poder judiciário fazer uma interpretação extensiva ao ponto de se malferir a legalidade e anterioridade". Com isso, requer o afastamento do caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas em relação à condenação n. 0008541-60.2016.8.24.0020, com a conseguinte alteração do parâmetro exigido para fins de progressão de regime, conforme critério adotado aos delitos comuns "fração de 1/6 ao alcance do requisito objetivo" (art. 112 da LEP) (Evento 1 - Petição Inicial).

Foram apresentadas as contrarrazões (Evento 8).

A decisão agravada foi mantida (Evento 10).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Gercino Gerson Gomes Neto, pelo conhecimento e desprovimento do agravo (Evento 10 - 2º Grau).

Em decisão monocrática proferida por esta Relatoria, nos termos do art. 132, XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, negou-se provimento ao recurso (Evento 12).

Em face disso, a defesa interpôs agravo interno, em cujas razões, em síntese, além de apontar dados do sistema prisional brasileiro, sustenta que "não existe a categoria legal dos "crimes equiparados a hediondos" e que não é possível atribuir tal caráter ao crime de tráfico de drogas, a despeito do art. 5º, XLIII, da Constituição Federal e art. 112, §5º, da Lei de Execução Penal. Acrescenta que "com a entrada em vigor da Lei n. 13.964/2019, que revogou o art. 2.º, § 2.º, da Lei n. 8.072/1990, simplesmente deixou de subsistir qualquer dispositivo legal que exija um requisito temporal específico para a progressão de regime dos condenados por tráfico de drogas". Com isso, requer a submissão do caso à análise do Órgão Colegiado, a fim de afastar o caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas, com a conseguinte alteração da fração exigida para fins de progressão de regime (art. 112, I e II, da LEP) (Evento 17).

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os seus pressupostos intrínsecos e extrínsecos, conhece-se do presente recurso.

O agravo interno manejado por Jediel Dias Martins objetiva reformar decisão monocrática proferida por esta Relatoria, nos termos do art. 132, XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que negou provimento ao recurso em agravo em execução por si interposto, no qual se sustenta que o crime de tráfico de drogas, após o advento da Lei 13.964/2019 (pacote anticrime), não poderia ser equiparado a crime hediondo, motivo pelo qual seria devida a alteração da porcentagem exigida para fins de progressão de regime (art. 112, I e II, da LEP).

Não foram levantadas preliminares.

No mérito, a defesa além de apontar dados do sistema prisional brasileiro, sustenta que "não existe a categoria legal dos "crimes equiparados a hediondos" e que não é possível atribuir tal caráter ao crime de tráfico de drogas, a despeito do art. 5º, XLIII, da Constituição Federal e art. 112, §5º, da Lei de Execução Penal. Acrescenta que "com a entrada em vigor da Lei n. 13.964/2019, que revogou o art. 2.º, § 2.º, da Lei n. 8.072/1990, simplesmente deixou de subsistir qualquer dispositivo legal que exija um requisito temporal específico para a progressão de regime dos condenados por tráfico de drogas". Com isso, requer a submissão do caso à análise do Órgão Colegiado, a fim de afastar o caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas, com a conseguinte alteração da fração exigida para fins de progressão de regime (art. 112, I e II, da LEP) (Evento 17).

Sem razão, no entanto.

Ingressando no mérito, de acordo com o Relatório da Situação Processual Executória, infere-se que o apenado Jediel Dias Martins cumpre pena total de 5 (cinco) anos de reclusão, pela prática do delito de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei 11.343/06 - autos n. 5000880-59.2022.8.24.0011), encontrando-se atualmente recolhido em regime semiaberto:

Após pedido formulado pelo apenado (Seq. 69.1 - SEEU), e manifestação desfavorável do Ministério Público (Seq. 74.1 - SEEU), a Magistrada de origem negou o pretenso afastamento do caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas, o que fez nos seguintes termos (Seq. 77.1 - SEEU) (grifou-se):

Trata-se do processo de execução penal de JEDIEL DIAS MARTINS, cujos autos sobem conclusos para análise.

À vista do petitório da seq. 69.1, verifico que almeja a defesa o tratamento de crime comum ao delito de tráfico de drogas, ao argumento de que a equiparação do tráfico com a hediondez para fins de progressão de regime se dava - única e exclusivamente - pela redação do §2º, do artigo 2º, da Lei 8072/90, dispositivo este que foi revogado pela Lei n.º 13.964/19. Sem maiores delongas, saliento que a hediondez equiparada do crime de tráfico de drogas decorre de mandamento constitucional (art. 5º, XLIII) e se encontra materializada no vigente art. 2º da Lei n.º 8.072/90.

A partir daí, resta evidente o tratamento isonômico a ser dispensado ao tráfico de drogas e às demais figuras correlatas, notadamente no que se refere às regras para a progressão de regime.

A propósito, mirando a argumentação defensiva, pondero que longe de se tratar de exclusão do tráfico de drogas do rol dos crimes equiparados a hediondo, o que aliás, em razão da norma constitucional, seria impossível, está-se diante de mera transmudação de regramento execucional para normativo próprio, isto é, da Lei dos crimes hediondos para a Lei de Execuções Penais.

Em outras palavras, tudo continua como dantes, sendo que apenas as regras para a progressão de regime relacionadas a tais crimes passaram a figurar em outro normativo. Isso significa que, doravante, progressão de regime, seja para crimes comuns, seja para crimes hediondos e equiparados, se regula pelo art. 112, I a VIII, da LEP.

De mais a mais, a retirada do art. 2º, § 2º, do bojo da Lei n.º 8.072/90, jamais teria o condão de desfazer a equiparação cabal inserta no caput e seus incisos, dos quais se extrai de forma cristalina a igualdade de tratamento a ser dispensada entre as figuras penais ali elencadas. Em casos análogos, já decidiu o Egrégio TJSC: [...] Ante o exposto, INDEFIRO o pedido defensivo. Intimem-se. Cumpra-se.

E nenhum reparo merece a referida decisão, tal como declinado na decisão monocrática combatida (evento 12).

Isso porque, o caráter de equiparado ao crime hediondo atribuído ao crime de tráfico de drogas advém do próprio mandado de criminalização constitucional, no qual é oferecido ao referido delito o mesmo tratamento dispensado aos crimes hediondos (inafiançáveis e insuscetível de graça ou anistia), estes sim a serem definidos por lei.

De acordo com o art. 5º, XLIII, da Constituição Federal:

art. 5º [...]

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

Não há e nunca houve no âmbito constitucional ou legal elenco expresso dos crimes que se considerariam, não hediondos, mas "equiparados hediondos". Este último conceito, repisa-se, advém unicamente do tratamento constitucional - e, posteriormente, legal - equivalente a crime hediondo que algumas espécies de crime receberam (tráfico de drogas, tortura e terrorismo). Inexiste interpretação extensiva nesse caso, mas sistemática, o que torna compreensível o motivo pelo qual o art. 33 da Lei 11.343/06 é tratado, tanto na doutrina como na jurisprudência, como equiparado a hediondo.

O advento da Lei 13.964/2019 (pacote anticrime) em nada alterou essa sistemática.

Pelo contrário, a mesma lógica passou encampada pela Lei de Execução Penal em seu art. 112, que trouxe para o âmbito legal a concepção de "equiparado a hediondo", que, como visto, advém da própria disposição do art. 5º, XLIII, da Constituição Federal. Nessa linha:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência)

[...]

V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência)

VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência)

a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência)

b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência)

[...]

VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT