Acórdão Nº 5015611-33.2022.8.24.0020 do Terceira Câmara Criminal, 23-08-2022

Número do processo5015611-33.2022.8.24.0020
Data23 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5015611-33.2022.8.24.0020/SC

RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA

AGRAVANTE: FILLIPE DARLAN FLOR ADVOGADO: LUDMILA GRADICI CARVALHO DRUMOND (DPE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)

RELATÓRIO

Fillipe Darlan Flor interpôs agravo em execução penal contra decisão da Vara de Execuções Penais da Comarca de Criciúma, que indeferiu o pedido de afastar o caráter de crime equiparado a hediondo da conduta prevista no art. 33 da Lei 11.343/06 e a consequente adequação da fração para fins de progressão de regime (Seq. 110.1 dos autos n. 8003357-11.2021.8.24.0020).

Irresignado, o agravante alega, em síntese, com a revogação do art. 2º, §2º, da Lei 8.072/90 pela Lei 13.964/2019 (pacote anticrime), "não há uma determinação legal vigente que EQUIPARE tráfico ao delito hediondo". Com isso, requer o afastamento do caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas e a observância da fração dos novos parâmetros estabelecidos no art. 112 da Lei de Execução Penal para a progressão, aplicando-se de forma retroativa a Lei 13.964/2019 (Evento 1).

Foram apresentadas as contrarrazões (Evento 8).

A decisão agravada foi mantida (Evento 10).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Pedro Sérgio Steil, pelo conhecimento e desprovimento do agravo (Evento 10 - segundo grau).

Em decisão monocrática proferida por esta Relatoria, nos termos do art. 132, XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, negou-se provimento ao recurso (Evento 12).

Em face disso, a defesa interpôs agravo interno, em cujas razões, em síntese, além de apontar dados do sistema prisional brasileiro, sustenta que "não existe a categoria legal dos 'crimes equiparados a hediondos'" e que não é possível atribuir tal caráter ao crime de tráfico de drogas, a despeito da redação do art. 5º, XLIII, da Constituição Federal e do art. 112, §5º, da Lei de Execução Penal. Acrescenta que "com a entrada em vigor da Lei n. 13.964/2019, que revogou o art. 2.º, § 2.º, da Lei n. 8.072/1990, simplesmente deixou de subsistir qualquer dispositivo legal que exija um requisito temporal específico para a progressão de regime dos condenados por tráfico de drogas". Com isso, requer a submissão do caso à análise do Órgão Colegiado, a fim de afastar o caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas e adequar a fração para fins de progressão de regime (art. 112 da LEP) (Evento 17).

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os seus pressupostos intrínsecos e extrínsecos, conhece-se do presente recurso.

O agravo interno manejado por Fillipe Darlan Flor objetiva reformar decisão monocrática proferida por esta Relatoria que, nos termos do art. 132, XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, negou provimento ao recurso de agravo em execução por si interposto, no qual se sustenta que o crime de tráfico de drogas, após o advento da Lei 13.964/2019 (pacote anticrime), não poderia ser equiparado a crime hediondo, motivo pelo qual seria necessário adequar a fração para fins de progressão de regime (art. 112 da LEP).

Não foram levantadas preliminares.

No mérito, a defesa, além de apontar dados do sistema prisional brasileiro, sustenta que "não existe a categoria legal dos 'crimes equiparados a hediondos'" e que não é possível atribuir tal caráter ao crime de tráfico de drogas, a despeito do art. 5º, XLIII, da Constituição Federal e art. 112, §5º, da Lei de Execução Penal. Acrescenta que "com a entrada em vigor da Lei n. 13.964/2019, que revogou o art. 2.º, § 2.º, da Lei n. 8.072/1990, simplesmente deixou de subsistir qualquer dispositivo legal que exija um requisito temporal específico para a progressão de regime dos condenados por tráfico de drogas". Com isso, requer a submissão do caso à análise do Órgão Colegiado, a fim de afastar o caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas e adequar a fração para fins de progressão de regime (art. 112 da LEP) (Evento 17).

Sem razão, no entanto.

Ingressando no mérito, de acordo com o Relatório da Situação Processual Executória, infere-se que o apenado Fillipe Darlan Flor cumpre pena total de 05 (cinco) anos de reclusão, pela prática do delito de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei 11.343/06 - autos n. 0002332-75.2016.8.24.0020), encontrando-se atualmente recolhido em regime semiaberto.

Após pedido formulado pelo apenado (Seq. 99.1), o Magistrado de origem negou o pretenso afastamento do caráter equiparado a hediondo do crime de tráfico de drogas, o que fez nos seguintes termos (Seq. 110.1):

Sem maiores delongas, saliento que a hediondez equiparada do crime de tráfico de drogas decorre de mandamento constitucional (art. 5º, XLIII) e se encontra materializada no vigente art. 2º da Lei n.º 8.072/90.

A partir daí, resta evidente o tratamento isonômico a ser dispensado ao tráfico de drogas e às demais figuras correlatas, notadamente no que se refere às regras para a progressão de regime.

A propósito, mirando a argumentação defensiva, pondero que longe de se tratar de exclusão do tráfico de drogas do rol dos crimes equiparados a hediondo, o que aliás, em razão da norma constitucional, seria impossível, está-se diante de mera transmudação de regramento execucional para normativo próprio, isto é, da Lei dos crimes hediondos para a Lei de Execuções Penais. Em outras palavras, tudo continua como dantes, sendo que apenas as regras para a progressão de regime relacionadas a tais crimes passaram a figurar em outro normativo. Isso significa que, doravante, progressão de regime, seja para crimes comuns, seja para crimes hediondos e equiparados, se regula pelo art. 112, I a VIII, da LEP.

De mais a mais, a retirada do art. 2º, § 2º, do bojo da Lei n.º 8.072/90, jamais teria o condão de desfazer a equiparação cabal inserta no caput e seus incisos, dos quais se extrai de forma cristalina a igualdade de tratamento a ser dispensada entre as figuras penais ali elencadas.

Em casos análogos, já decidiu o Egrégio TJSC

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. DECISÃO DE INDEFERIMENTO DO PLEITO DE APLICAÇÃO DA FRAÇÃO DE PROGRESSÃO DE REGIME NO PATAMAR DE 20% (VINTE POR CENTO). RECURSO DO APENADO. ALMEJADO O AFASTAMENTO DA EQUIPARAÇÃO À HEDIONDEZ DO DELITO DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES (ART. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/06). INVIABILIDADE. CRIME ANÁLOGO A HEDIONDO, POR FORÇA DO ART. 5º, XLIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E DO ART. 2º, I E II, DA LEI N. 8.072/90. INEXISTÊNCIA DE REVOGAÇÃO DO INSTITUITO POR PARTE DA LEI N. 13.964/19 (PACOTE ANTICRIME). REGRAS ATINENTES À PROGRESSÃO DE REGIME TRANSMUDADAS PARA O ART. 112 DA LEP. REEDUCANDO REINCIDENTE NÃO ESPECÍFICO. APLICAÇÃO DO PATAMAR DE 40% (QUARENTA POR CENTO) ESCORREITA. DECISÃO MANTIDA. "O crime de tráfico de drogas é, por força de previsão constitucional e legal, equiparado a hediondo, e o requisito objetivo para a progressão de regime referente a delito dessa natureza, quando se tratar de condenado primário ou não reincidente específico em crimes hediondos ou equiparados sem resultado morte, é de 40% da pena, nos termos do art. 112, caput, V, da Lei de Execução Penal" ( TJSC, Agravo de Execução Penal n. 5004564-41.2021.8.24.0006, rel. Des. Sérgio Rizelo, Segunda Câmara Criminal, j. em 9/11/2021). RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Execução Penal n. 5018647-69.2021.8.24.0036, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Sidney Eloy Dalabrida, Quarta Câmara Criminal, j. 10-02-2022).

E:

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. RECURSO DA DEFESA. INSURGÊNCIA CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU AFASTAR A HEDIONDEZ DO TRÁFICO DE DROGAS. DESPROVIMENTO. CRIME HEDIONDO POR EQUIPARAÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 5º, XLIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DO ART. 2º, CAPUT, DA LEI N. 8.072/1990). PROGRESSÃO DE REGIME QUE DEVE OBEDECER AOS PERCENTUAIS PREVISTOS NOS INCISOS V E VII DO ART. 112 DA LEI PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. DECISÃODE EXECUÇÕES PENAIS. MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Execução Penal n. 5018648-54.2021.8.24.0036, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. José Everaldo Silva, Quarta Câmara Criminal, j. 10 -02-2022)

Ainda:

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO DE AFASTAMENTO DA HEDIONDEZ POR EQUIPARAÇÃO DO TRÁFICO DE DROGAS. INSURGÊNCIA DEFENSIVA. ALEGADA OMISSÃO LEGISLATIVA. INSUBSISTÊNCIA. ATUAL REDAÇÃO DO ART. 112, V, DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL QUE ESTABELECE, CATEGORICAMENTE, O PERCENTUAL DE 40% PARA A PROGRESSÃO DE REGIME PRISIONAL NA HIPÓTESE DE CRIME EQUIPARADO A HEDIONDO. HEDIONDEZ DA NARCOTRAFICÂNCIA QUE DECORRE DA PREVISÃO CONSTITUCIONAL CONSUBSTANCIADA NO ART. 5º, XLIII. CONSTITUIÇÃO FEDERAL QUE DETERMINOU A NECESSIDADE DE MAIOR RIGOR NO TRATAMENTO PENAL DOS CRIMES DE TORTURA, TERRORISMO E TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. ADEMAIS, AUSÊNCIA DE ALTERAÇÃO NO ART. 2º, CAPUT, DA LEI N. 8.072/90, DISPOSITIVO LEGAL QUE REPISOU O COMANDO CONSTITUCIONAL. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS QUE É, POR FORÇA CONSTITUCIONAL E LEGAL, EQUIPARADO A HEDIONDO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Execução Penal n . 5018206-88.2021.8.24.0036, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Ana Lia Moura Lisboa Carneiro, Primeira Câmara Criminal, j. 03-02-2022).

E nenhum reparo merece referida decisão, tal como declinado na decisão monocrática combatida.

Isso porque, o caráter de equiparado ao crime hediondo atribuído ao crime de tráfico de drogas advém do próprio mandado de criminalização constitucional, no qual é oferecido ao referido delito o mesmo tratamento dispensado aos crimes hediondos (inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia), estes sim a serem definidos por lei.

De acordo com o art. 5º, XLIII, da Constituição Federal:

art. 5º [...]

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo...

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