Acórdão Nº 5016791-77.2020.8.24.0045 do Segunda Câmara Criminal, 08-02-2022

Número do processo5016791-77.2020.8.24.0045
Data08 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5016791-77.2020.8.24.0045/SC

RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL

APELANTE: JOSE ABDO ALI JUNIOR (RÉU) ADVOGADO: WANDERSON BORGES DE OLIVEIRA (OAB MG121106) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Palhoça, o Ministério Público ofereceu Denúncia contra José Abdo Ali Junior, dando-o como incurso nas sanções dos artigos 171, caput, e 307, do Código Penal, em concurso material (artigo 69, do Código Penal), em razão dos fatos assim descritos:

[...] Segundo se infere dos autos, o denunciado JOSÉ ABDO ALI JÚNIOR, visando obter vantagem em proveito próprio e atribuindo-se a falsa identidade de "Fabricio Simon", iniciou, no dia 19 de março de 2020, através do site "OLX", a negociação de um celular marca Iphone XS MAX, com a vítima EDUARDO DECKER FELIPE.

No dia 20 de março de 2020, foi definida a compra e ajustado que o pagamento seria efetivado através da transferência bancária do valor de R$ 3.300,00 (três mil e trezentos reais), para a conta corrente n. 0011374-4, agência 6520, do Banco do Brasil/SA, pertencente a THAISE BITTENCOURT, companheira da vítima EDUARDO DECKER FELIPE, bem como que a entrega seria na residência desta, situada na Rua Inácio Paulo Dalri, n. 222, Pachecos, neste município e comarca.

Assim, na mesma data em que foi acertada a compra (20/03/2020), o denunciado JOSÉ ABDO ALI JÚNIOR se dirigiu até a residência da vítima EDUARDO DECKER FELIPE, apresentado a esta um falso comprovante de transferência bancária do valor ajustado.

A vítima EDUARDO DECKER FELIPE, acreditando na efetiva transferência do valor, entregou o celular marca Iphone XS MAX ao denunciado JOSÉ ABDO ALI JÚNIOR, que obteve, assim, mediante fraude, vantagem ilícita em prejuízo daquela.

E diante das notícias de que o denunciado JOSÉ ABDO ALI JÚNIOR vinha aplicando diversos golpes na região da grande Florianópolis e fazendo da prática de crimes de estelionato seu meio de vida, em 16 de junho de 2020, foi decretada por esse juízo, nos autos n. 5007198-24.2020.8.24.0045, a prisão preventiva do mesmo para garantia da ordem pública. (Evento 1).

Encerrada a instrução, foi julgada procedente a Exordial para condenar José Abdo Ali Junior à pena à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa, cada qual no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos pela prática do crime descrito no art. 171, caput, do Código Penal e 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção, pelo cometimento do crime previsto no art. 307 do Código Penal, na forma do art. 69 do mesmo Diploma Legal.

Inconformada, a Defesa interpôs recurso de Apelação, em cujas Razões (evento 153), pugna, pela absolvição do acusado, argumentando, em relação ao crime de estelionato, que ele praticou um mero ilícito civil, e no tocante ao delito de falsa identidade, que a conduta de mentir sobre sua identificação não configura crime, e sim direito de autodefesa.

No tocante à dosimetria, pleiteia a fixação da pena no mínimo legal, desconsiderando os processos em andamento na primeira fase do cálculo para fins de "antecedentes criminais", e a aplicação da detração.

Apresentadas as Contrarrazões (Evento 158 do processo de origem), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. a Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso (Evento 08).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso deve ser conhecido, por próprio e tempestivo.

Do pleito absolutório

A Defesa pugna pela absolvição do acusado, argumentando, em relação ao crime de estelionato, que ele praticou um mero ilícito civil, e no tocante ao delito de falsa identidade, que a conduta de mentir sobre sua identificação configura direito de autodefesa, não caracterizando crime.

Contudo, sem razão.

Considerando que os delitos de estelionato e falsa identidade foram praticados em um mesmo contexto fático, as insurgências defensivas serão analisadas em conjunto.

A materialidade e autoria defluem dos documentos que instruem o inquérito policial nº 5008729-48.2020.8.24.0045, notadamente do Boletim de ocorrência de fl. 3, mensagens de celular de p. 8-24; boletins de ocorrência de p. 27-51, todos do evento 1 daqueles autos; além dos depoimentos colhidos em ambas as fases da persecução penal.

Na fase administrativa, a vítima Eduardo Decker Felipe narrou:

[...] anunciou no site OLX a venda de seu aparelho celular, um iphone XS MAX em meados do mês de março do corrente ano; Que, então, o senhor José Abdo Junior, interessado na compra, se apresentou como Fabricio Simon, ainda, dizendo ser policial civil e passaram a trocar mensagens pelo aplicativo OLX e, posteriormente pelo Whatsapp, autor utilizando o numeral 4891401356; que após lhe ter passado confiança, apresentando-se como policial, dia 20 de março de 2020 (sábado), por volta das 13h00min, marcaram de se encontrar na casa do declarante; Que o indivíduo esteve em sua residência em um veículo de cor verde, conduzido por uma outra pessoa, a qual não saiu do carro, sendo assim, não sabe passar maiores características do segundo envolvido; Que após a negociação, o senhor José, que se apresentou como Fabrício, mostrou uma transferência bancária no valor de R$ 3.000,00 (Três mil reais), em favor da conta de titularidade da esposa do declarante; Que, desse modo, o declarante acreditando que o senhor José (Fabrício) teria efetuado o pagamento por meio da referida transferência bancária, e acreditando que o dinheiro cairia na conta em até 30 minutos, entregou o aparelho telefone em mãos ao autor, que foi embora logo em seguida; que, após 30 minutos do ocorrido, o declarante percebeu que ainda não havia sido creditado o valor em conta e então tentou manter contato telefônico com o senhor José (Fabrício), porém, sem sucesso. Que, então, percebeu que teria sido vítima de um golpe; Que diante da situação, o declarante deslocou-se até esta Delegacia de Polícia, ainda sem saber o nome correto do autor, tomou ciência de que não existia nenhum policial chamado Fabrício Simon nesta unidade policial; Que após passado mais de 02 meses do ocorrido, em conversa com seu amigo Henrique (48991172912) que também teria sido vítima de golpe, recebeu a informação de que o homem que aplicou o golpe em seu amigo teria sido preso no dia 27/05/2020, em ação conjunta entre a Diretoria de Inteligência da Polícia Civil -DIPC e Divisão de Inteligência Criminal - DIC de São José; Que na oportunidade visualizou a foto do homem preso, reconhecendo prontamente como sendo o indivíduo que se identificou à época como "Fabrício Simon" e que levou seu aparelho telefônico, verificando, assim, o nome verídico do autor como sendo José Abdo Ali Júnior; Que Henrique registrou o ocorrido no Município de São José, onde está sendo apurado o fato; [...]; Que o declarante apresenta neste ato as cópias das conversas efetuadas com o autor e manifesta seu desejo de representar criminalmente; Que, neste ato, o declarante reconhece o autor em termo apartado através de fotografias apresentadas. (Evento 1, autos do INQ anexo).

Em Juízo, o Ofendido ratificou a narrativa apresentada anteriormente, asseverando:

[...] (indagado sobre os fatos em que teria sido vítima, e sobre onde foi feito o anúncio do celular, respondeu) o anúncio foi feio pela OLX, eu precisava vender para cortar alguns custos, e o único meio que eu achei que poderia vender era a OLX, ele se passou por Fabrício, era policial civil, recebeu na minha casa, mostrei ele para a minha esposa e para a minha filha, e no ato do pagamento ele me mandou os comprovantes e eu por infantilidade acabei aceitando e liberei ele, aí depois de uns quatro dias não caiu o valor, não caiu o valor, e a gente se deu conta de que era um golpe; (indagado se colocou o celular para venda no OLX, respondeu) isso, (perguntado qual celular era e quanto valia, respondeu) um iphone XS, valia em torno de R$ 3.800,00 mais ou menos, na época, (indagado se esse Fabrício entrou em contato com o declarante, respondeu) entrou em contato comigo, começamos a conversar pelo OLX e depois foi tudo pelo whatsapp, só o custo mesmo foi negociado, ele tinha informado que era policial civil e eu não tinha muito o porquê entrar em detalhes, e ele acabou pedindo para eu diminuir o valor, e eu necessitando muito na época, eu me juntei com a minha esposa, e tinha uma filha pequena, então eu acabei reduzindo o valor para R$ 3.300,00, (indagado se ele foi na casa do declarante para negociarem, respondeu) não, ele só foi lá em casa para poder retirar o celular e poder fazer o pagamento, né, (perguntado se o réu fez o pagamento na frente do declarante, respondeu) ele fez na minha fren... na realidade ele sentou na minha mesa, um de frente para o outro, e ele com o celualr fez a transferência, enviou os comprovantes para o whatsapp da minha esposa, e aí a gente acabou, por infantilidade minha, liberdando ele sem o valor cair, então eu tentei entrar em contato novamente, mandei mensagem e ele não respondeu [...] aí não tinha muito o que fazer, eu pensei "perdi o celular", não tem o que fazer, o que eu fiz foi ir para a delegacia de polícia para tentar encontrar o tal Fabrício [...] e consegui depois essas informações com outro amigo meu que acabou caindo no mesmo golpe e me mostrou as fotos: "por acaso é esse fulano?", eu disse " é ele mesmo" [...] eu reuni as informações e descobri justamente com o meu amigo, almoçando assim, sem nenhuma pretensão...

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