Acórdão Nº 5017254-37.2020.8.24.0039 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 10-11-2022

Número do processo5017254-37.2020.8.24.0039
Data10 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5017254-37.2020.8.24.0039/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5017254-37.2020.8.24.0039/SC

RELATOR: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA

APELANTE: MARCIELLE APARECIDA SANTOS MORAIS CRIZOSTOMO (AUTOR) ADVOGADO: LETICIA MARIOTTI (OAB SC050200) ADVOGADO: DIOGO MENDES GODOIS (OAB SC048542) APELANTE: BANCO VOTORANTIM S.A. ADVOGADO: MAURI MARCELO BEVERVANÇO JUNIOR (OAB SC046689) ADVOGADO: LUIZ RODRIGUES WAMBIER (OAB SC023516) APELADO: OS MESMOS INTERESSADO: BV FINANCEIRA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por ambas as partes, da sentença, de lavra do Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da comarca de Lages (Dr. Antônio Carlos Junckes dos Santos), que, nos autos da ação de revisão de cláusulas contratuais, proposta pela demandante, Marcielle Aparecida Santos Morais Crizostomo, em face do demandado, Banco Votorantim S.A. julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na exordial.

Em suas razões recursais, a autora, ora apelante, alegou, em síntese, que os juros remuneratórios fixados no contrato firmado entre as partes se mostram abusivos, porque superiores aqueles fixados pelo BACEN à época da contratação.

Pautou-se pelo provimento do recurso.

Contrarrazões.

Já o banco demandando discorreu, em síntese, quanto a licitude da cobrança de registro do contrato; seguro prestamista; capitalização da parcela premiável; e seguro RCF. No mais, pediu pela aplicação da taxa selic para fins de correção monetária.

Pautou-se, pelo provimento.

Contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

I. Tempestividade e preparo recursal

Porque presentes os requisitos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação.

II. Caso concreto

Trata-se de ação de revisão de cláusulas contratuais em alienação fiduciária, proposta pela demandante, Marcielle Aparecida Santos Morais Crizostomo, em face do demandado, Banco Votorantim S.A.

O magistrado de origem julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na exordial.

Ambas as partes apelaram. Passa-se, então, à análise das teses arguidas separadasmente.

II. apelo da demandante

Alega, a demandante, que os juros remuneratórios previstos no contrato se mostram abusivos, vez que superiores a taxa indicada pelo BACEN à época da contratação.

Razão, entretanto, não lhe assiste.

Acerca da temática concernente à fixação de juros remuneratórios em contratos bancários, tal como a hipótese dos autos, a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça assentou entendimento de que "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade".

Ademais, no que tange à possibilidade de revisão da taxa pactuada, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de Recursos Especiais Repetitivos (REsp. n. 1.112.879 e REsp. n. 1.112.880), firmou o seguinte entendimento:

Nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser consignado no respectivo instrumento. Ausente a fixação da taxa no contrato, o juiz deve limitar os juros à média de mercado nas operações na espécie, divulgada pelo Bacen, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente.

Em qualquer hipótese, é possível a correção para a taxa média se for verificada abusividade nos juros remuneratórios.

(REsp. n 1.112.879/PR. Relª. Minª. Nancy Andrighi, j. em 12.05.2010).

Com efeito, a jurisprudência admite a revisão da cláusula que estabelece o percentual dos juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que aplicável o Código de Defesa do Consumidor ao caso e a exista abusividade no pacto, nos termos do entendimento fixado pelo o Superior Tribunal de justiça, em julgamento de Recurso Especial, afeto ao rito dos recursos repetitivos:

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

(REsp. N. 1.061.530/RS. Relª Minª Nancy Andrighi, j. em 22.10.2008).

Colhe-se do teor do aludido acórdão os esclarecimentos acerca dos parâmetros a serem utilizados pelo julgador ao apreciar a questão atinente à revisão da cláusula contratual dos juros remuneratórios:

[...] conclui-se que é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada.

Necessário tecer, ainda, algumas considerações sobre parâmetros que podem ser utilizados pelo julgador para, diante do caso concreto, perquirir a existência ou não de flagrante abusividade.

Inicialmente, destaque-se que, para este exame, a meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional para a Selic - taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo, ou um dos menores custos, para a captação de recursos pelas instituições que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de abusividade elimina o 'spread' e não resolve as intrincadas questões inerentes ao preço do empréstimo.

Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos precedentes tem afastado a taxa Selic como parâmetro de limitação de juros. Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro. Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de 30.12.1999).

As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadores (conforme http://www.bcb.gov.br/?ecoimpom - no quadro XLVIII da nota anexa; ou http://www.bcb.gov.br/?TXCREDMES, acesso em 06.10.2008), são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal, entre outros).

A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de...

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