Acórdão Nº 5017384-15.2021.8.24.0064 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 26-01-2023

Número do processo5017384-15.2021.8.24.0064
Data26 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5017384-15.2021.8.24.0064/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: VERONICA HOLDIZ (AUTOR) APELADO: BANCO DAYCOVAL S.A. (RÉU)


RELATÓRIO


VERONICA HOLDIZ interpôs recurso de apelação da sentença proferida pelo juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário, nos autos da ação anulatória c/c indenizatória proposta contra BANCO DAYCOVAL S.A., que julgou improcedentes os pedidos formulados na petição inicial, nestes termos:
Trata-se de ação de procedimento comum ajuizada por VERONICA HOLDIZ em face de BANCO DAYCOVAL S.A., ambos qualificados nos autos supra epigrafados, na qual a parte autora objetiva, em resumo, a declaração da inexistência da contratação da modalidade cartão de crédito consignado (RMC), sob alegação de que contratou um empréstimo consignado "normal", sem solicitação do refalado cartão, bem como indenização por dano material e moral em razão do desconto da margem de 5% sobre o valor de seu benefício previdenciário. Por fim, requereu a tutela de urgência para suspensão dos descontos, a inversão do ônus da prova para que o banco junte o contrato e o benefício da justiça gratuita. Juntou procuração e documentos (evento 1).
Indeferido o pedido de tutela de urgência e deferidos os demais requerimentos, notadamente a exibição de documentos, sob as penas do art. 400 do CPC (evento 11), a parte ré foi citada e ofereceu contestação, defendendo legalidade dos descontos a título de RMC, uma vez que embasados em contrato de cartão de crédito consignado assinado pela parte autora, de modo que são descabidos os pedidos formulados na exordial. Ao final, postulou a improcedência da pretensão. Carreou aos autos procuração e documentos (eventos 16 e 19).
Houve réplica (evento 24).
É o relatório. Fundamento e decido.
O feito comporta julgamento antecipado, porquanto as provas documentais já coligidas bastam para a formação de um juízo seguro de convicção acerca de demanda que reclama tutela jurisdicional imediata, nos termos do art. 355, I, do CPC.
Inicialmente, deixa-se de analisar qualquer preliminar, porquanto o julgamento favorece o réu. Ressalta-se, ainda, que em observância ao princípio da estabilização objetiva da lide, qualquer novação de tese, após contestada a ação, não poderá ser apreciada, como eventual alegação de falsidade de assinatura.
Nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS AJUIZADA NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. CRÉDITO OBTIDO POR MEIO DE SAQUE EM CARTÃO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNADA. AUTOR QUE PRETENDE A DECLARAÇÃO DE INVALIDADE DA OPERAÇÃO COM BASE EM VÍCIO NA AUTONOMIA DA VONTADE, SUSTENTANDO, PARA TANTO, TER SIDO LUDIBRIADO COM A PACTUAÇÃO DE CARTÃO, QUANDO PRETENDIA APENAS A CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS INAUGURAIS. RECURSO DO AUTOR. AFIRMAÇÃO DE QUE A ASSINATURA APOSTA NO CONTRATO FOI FRAUDADA. AUTOR QUE, NA PETIÇÃO INICIAL, RECONHECEU EXPRESSAMENTE A CONTRATAÇÃO COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ, TENDO QUESTIONADO APENAS A MODALIDADE DA CONTRATAÇÃO FIRMADA, UMA VEZ QUE PRETENDIA OBTER UM EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO E, POR VÍCIO EM SUA AUTONOMIA DE VONTADE, FORMALIZOU-SE EMPRÉSTIMO POR SAQUE EM CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. DÚVIDA QUANTO A AUTENTICIDADE DE SUA ASSINATURA CONTIDA NO CONTRATO EXTERNADA PELO DEMANDANTE APÓS RESPOSTA DO RÉU. INEXISTÊNCIA DE DIREITO OU FATO SUPERVENIENTE À CONTESTAÇÃO QUE IMPEDE A MODIFICAÇÃO DOS LIMITES OBJETIVOS DA LIDE. [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5002568-11.2020.8.24.0081, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Luiz Zanelato, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 04-11-2021). [Destacou-se].
Prejudicial: Prescrição
Como prejudicial de mérito, a instituição financeira arguiu a prescrição.
No entanto, equivocada a alegação da prescrição da pretensão da parte autora, uma vez que por se tratar de discussão acerca de contrato de cartão de crédito consignado, o qual é de trato sucessivo, pelo que o prazo inicial daquela é o da última parcela.
A propósito, conforme já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, "Esta Corte pacificou o entendimento no sentido de que, mesmo diante do vencimento antecipado da dívida, subsiste inalterado o termo inicial do prazo de prescrição - no caso, o dia do vencimento da última parcela" (REsp n. 1.292.757, Min. Mauro Campbell Marques).
E ainda:
"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. PRESCRIÇÃO. PRETENSÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS PELO CONSUMIDOR QUE SE EXTINGUE EM CINCO ANOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 27 DO CDC. QUINQUÊNIO NÃO ESCOADO. TESE AFASTADA. MÉRITO. CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). SUSTENTADO EFETIVO DESBLOQUEIO E UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO PELA PARTE AUTORA. TESE ACOLHIDA. FATURAS QUE DEMONSTRAM O USO DO CARTÃO DE CRÉDITO EM DIVERSAS COMPRAS NO COMÉRCIO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE CONTRATUAL. DEVER DE RESSARCIR INEXISTENTE. REFORMA DA SENTENÇA. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. CABIMENTO DOS HONORÁRIOS RECURSAIS, NOS TERMOS DO ART. 85, § 11, DO CPC/2015. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO." (TJSC, AC n. 0303183-90.2018.8.24.0175, j. 24.09.2019)
Nestes termos, na hipótese, não há que se falar em prescrição.
Prejudicial: Decadência
Sobre a decadência, já decidiu o nosso tribunal:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO declaratória de nulidade de desconto em folha de pagamento/ausência do efetivo proveito cumulada com repetição de indébito e danos morais. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA ante o reconhecimento da decadÊncia do direito de anular o pacto, nos termos do artigo 178, inciso ii, do código civil. inaplicabilidade do instituto no caso. ausência de vício do negócio jurídico. discussão acerca de falha na prestação do serviço. reforma da sentença. (TJSC, Apelação n. 5003625-35.2019.8.24.0005, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Cláudio Barreto Dutra, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 23-07-2020).
Assim, não sendo o art. 178 do CC aplicável ao caso, rejeita-se.
Mérito:
Busca, a parte autora, por meio da presente ação, a declaração da nulidade do contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável - RMC, além da restituição em dobro dos valores descontados mensalmente em seu benefício previdenciário e indenização por dano moral. Para tanto, alega que tal contratação foi realizada sem sua autorização, já que o pretendido sempre foi a modalidade de empréstimo consignado.
Por sua vez, a parte ré assevera que restou comprovado que a parte autora aderiu voluntariamente ao cartão, assinando o contrato, tendo inclusive recebido o valor do limite do cartão, autorizando o crédito e os respectivos descontos e a reserva de margem (RMC).
Para o deslinde da questão trazida aos autos, cumpre salientar a aplicação das normas contidas no Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela, sendo a responsabilidade da demandada objetiva, como se verifica no art. 14 da Lei 8.078/90: "O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos".
Por esta disposição legal pode-se concluir que o fornecedor tem responsabilidade objetiva por danos causados ao consumidor. Neste âmbito, faz-se oportuna a lição de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery:
"Responsabilidade objetiva. A norma estabelece a responsabilidade objetiva como sendo o sistema geral da responsabilidade do CDC. Assim, toda indenização derivada de relação de consumo, sujeita-se ao regime da responsabilidade objetiva, salvo quando o Código expressamente disponha em contrário. (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante em Vigor. 3ª ed., RT, 1997, p. 1353).
Portanto, para a concretização do dever de ressarcir da parte ré, há que se levar em conta os seguintes requisitos: existência de um dano e do nexo de causalidade, ou seja, que o resultado lesivo tenha sido produzido em virtude de atitude da parte ré.
Em vista disso, no caso vertente, a responsabilidade civil da instituição financeira é objetiva. Somado a isso, a norma do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, dispõe, in verbis: "Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem".
Segundo se infere dos autos, tem-se que as partes celebraram termo/contrato de cartão de crédito consignado (evento 19, documentação 3), o qual contém cláusula autorizando o desconto mensal da reserva de margem consignável do refalado cartão (RMC) da remuneração/salário/benefício da parte autora. O instrumento está devidamente assinado pela parte autora, razão pela qual não pode alegar o desconhecimento da modalidade contratada.
Importante esclarecer que o número averbado pelo INSS (52-0051133/15_01) se refere ao controle de reserva de margem vinculada ao benefício informado (127.363.658-6).
Além disso, a parte autora não nega que usufruiu do valor obtido com o(s) empréstimo(s).
Somando-se a isso, esta modalidade contratual possui duas linhas de crédito, quais sejam, saque (que pode ser por meio de transferência) e/ou utilização do cartão em estabelecimentos comerciais. Logo, tendo a parte autora realizado os saques, está autorizado o desconto em folha de pagamento, sendo irrelevante o recebimento e/ou utilização do cartão de crédito.
Ato contínuo, em diversas demandas desta natureza constatou-se que o número lançado pelo INSS em seu sistema interno se refere à reserva de margem consignável e não corresponde ao número do contrato firmado com a instituição financeira, razão pela qual eventual divergência de numeração não induz a...

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