Acórdão Nº 5017416-07.2021.8.24.0036 do Primeira Câmara Criminal, 27-03-2024

Número do processo5017416-07.2021.8.24.0036
Data27 Março 2024
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5017416-07.2021.8.24.0036/SC



RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO


APELANTE: JORGE LUIZ VIEIRA (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na 1ª Vara Criminal da Comarca de Jaraguá do Sul, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de Jorge Luiz Vieira, pelo cometimento, em tese, do crime previsto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990, em razão dos fatos assim narrados na peça acusatória (Evento 1, dos autos da Ação Penal):
"1O denunciado, na condição de titular de 'BELLA PIZZA RESTAURANTE E EVENTOS EIRELI', CNPJ n. 05.918.217/0001-07 e Inscrição Estadual n. 25.466.995-6, estabelecida na Rua Prefeito Waldemar Grubba, n. 2633, Bairro Vila Lalau, em Jaraguá do Sul, deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 34.394,36 (trinta e quatro mil trezentos e noventa e quatro reais e trinta e seis centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores2, locupletando-se ilicitamente mediante esse tipo de apropriação de valores em prejuízo ao estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação em DIMEs (Declarações do ICMS e do Movimento Econômico) dos meses de fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro e outubro de 2019, documentos geradores da Dívida Ativa n. 200002222100, inscrita em 07/05/2020.
Assim agindo, o denunciado infringiu o disposto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, por 9 (nove) vezes, na forma do art. 71 do Código Penal3".
O acusado foi citado por edital (Evento 12), não apresentando defesa nem constituindo Defensor, motivo pelo qual se determinou a suspensão do processo e do prazo prescricional, nos termos do art. 366 do CPP, na data do dia 31 de março de 2022 (Evento 18).
Localizado, foi então citado pessoalmente no dia 31 de janeiro de 2023 (Evento 55).
Encerrada a instrução e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio a sentença com o seguinte dispositivo (Evento 92, idem):
"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a denúncia para CONDENAR JORGE LUIZ VIEIRA, já qualificado, como incurso nas sanções do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90, por 9 vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime aberto, substituída na forma acima mencionada, e ao pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, no valor individual de 1/30 do salário mínimo.
Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação, nos termos do artigo 600, § 4º, do Código de Processo Penal.
Preliminarmente, em suas razões recursais (Evento 12, do presente processo), suscitou a nulidade da sentença pela contradição concernente à fundamentação, uma vez que se utilizou da legislação de Santa Catarina, enquanto a decisão dos embargos de declaração reconheceu a inaplicabilidade da norma estadual.
Ventilou, ainda, de forma genérica e confusa, unicamente no campo destinados aos requerimentos finais, que "o presente recurso seja conhecido e ao final provido, com a decretação de nulidade da sentença em razão da contradição existente ou, caso não se entenda por isso, seja reformada para declarar a absolvição do Acusado, diante da excludente de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa (art. 397, inc. II, do CPP); bem como, em face da inépcia da denúncia por atipicidade do delito, posto que o caso em tela tratar-se de mera inadimplência fiscal e não apropriação indébita".
No mérito, sustentou a atipicidade da conduta praticada, sob o argumento de que não houve apropriação de valores cobrados ou descontados do consumidor final, alegando que o fato de ter deixado de recolher o tributo não configura o crime previsto no art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90, porquanto o ICMS não se enquadra ao dispositivo legal.
Ainda, argumentou em torno da aplicação da excludente de culpabilidade de inexigibilidade de conduta diversa, visto que a empresa enfrentou crise financeira, o que impossibilitou o recolhimento dos tributos.
Apresentadas contrarrazões pela acusação em prol da manutenção incólume da sentença recorrida (Evento 15, idem).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes, que se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto; porém, em prol da redução, ex officio, do valor da prestação pecuniária substitutiva para apenas um salário mínimo (Evento 18, idem).
Este é o relatório

VOTO


1. Do recurso
Trata-se de recurso de apelação interposto pela defesa em face da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Jaraguá do Sul que, julgando procedente a pretensão acusatória, condenou Jorge Luiz Vieira ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime aberto, substituída por uma pena restritiva de direitos - pagamento de dois salários mínimos à entidade cadastrada junto à Execução Penal -, e ao pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, no valor individual de 1/30 do salário mínimo, pela prática da infração prevista no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990 (por 9 vezes), em continuidade delitiva (art. 71, caput, do CP). O acusado foi condenado, ainda, ao pagamento das despesas processuais.
2. Dos fatos sob recurso
Conforme consta do incluso caderno processual, Jorge Luiz Vieira, na qualidade de titular de 'BELLA PIZZA RESTAURANTE E EVENTOS EIRELI', CNPJ n. 05.918.217/0001-07 e Inscrição Estadual n. 25.466.995-6, estabelecida na Rua Prefeito Waldemar Grubba, n. 2633, Bairro Vila Lalau, em Jaraguá do Sul, deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 34.394,36 (trinta e quatro mil trezentos e noventa e quatro reais e trinta e seis centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS - cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente de valores em prejuízo ao estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação em DIMEs (Declarações do ICMS e do Movimento Econômico) dos meses de fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro e outubro de 2019, documentos geradores da Dívida Ativa n. 200002222100, inscrita em 07/05/2020.
3. Da admissibilidade recursal
Inicialmente, denota-se dos autos que o pleito referente à inépcia da denúncia não comporta conhecimento.
A questão foi descrita de maneira genérica e confusa, presente apenas no campo destinados aos requerimentos finais, como se vê: "o presente recurso seja conhecido e ao final provido, com a decretação de nulidade da sentença em razão da contradição existente ou, caso não se entenda por isso, seja reformada para declarar a absolvição do Acusado, diante da excludente de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa (art. 397, inc. II, do CPP); bem como, em face da inépcia da denúncia por atipicidade do delito, posto que o caso em tela tratar-se de mera inadimplência fiscal e não apropriação indébita" (Evento 12 do presente feito).
O apelante, desse modo, não logrou explorar, de forma suficientemente fundamentada, qual seria a alegada deficiência da peça vestibular, o que bastaria para ensejar o não conhecimento do pedido, pois em violação ao princípio da dialeticidade.
De mais a mais, referido pleito, já formulado na origem (evento 20, DOC2), restou refutado pelo juízo singular em decisão interlocutória (Evento 65, autos de origem), contra a qual não se insurgiu o acusado em tempo oportuno, operando-se, portanto, a preclusão quanto à matéria.
De todo modo, consoante sólida posição das Cortes Superiores, a superveniência de sentença condenatória, cuja análise acerca da pretensão inicial enfrenta a matéria de defesa em cognição exauriente, supera, necessariamente, a objeção de eventual inépcia da denúncia.
Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
Sobre a alegada inépcia da exordial, é importante lembrar que, consoante o entendimento deste STJ, a superveniência de sentença condenatória torna prejudicada a discussão quanto a essa específica tese defensiva. Afinal, quando já há acolhimento da pretensão acusatória por sentença tendente à definitividade, em cognição exauriente, não há mais sentido prático em se aferir a viabilidade formal da denúncia, porquanto já deflagrada a ação penal e conduzida pelo magistrado singular até seu desfecho (Ministro Ribeiro Dantas em seu Voto Vista). (EDcl no AgRg no REsp n. 1.856.938/PR, relator Ministro João Batista Moreira (Desembargador Convocado do TRF1), relator para acórdão Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 14/2/2023, DJe de 17/3/2023.).
Não discrepa a Corte Catarinense:
Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, acolhida por esta Câmara: 'a superveniência da sentença penal condenatória torna esvaída a análise do pretendido reconhecimento de inépcia da denúncia, isso porque o exercício do contraditório e da ampla defesa foi viabilizado em sua plenitude durante a instrução criminal' (AgRg no AREsp n. 537.770/SP, DJe 18/8/2015). (TJSC, Apelação Criminal n. 5001197-74.2021.8.24.0049, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Júlio César Machado Ferreira de Melo, Terceira Câmara Criminal, j. 25-04-2023).
Para mais, caso fosse conhecida, a tese de inépcia da denúncia não comportaria provimento.
Isso porque, conforme se depreende da peça acusatória (Evento 1, autos de origem), houve pleno respeito aos requisitos essenciais da denúncia, dentre os quais a descrição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias e a individualização do acusado, conforme preconiza o artigo 41 do Código de Processo Penal.
A exordial alinhavou, de forma clara e subsistente, que o acusado, na condição de gestor da pessoa jurídica sub judice, e no pleno exercício desta função, deixou de efetuar o recolhimento de R$ 34.394,36 (trinta e quatro mil trezentos e noventa e quatro reais e trinta e seis centavos) a título de Imposto sobre...

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