Acórdão Nº 5018590-62.2021.8.24.0000 do Terceira Câmara Criminal, 04-05-2021

Número do processo5018590-62.2021.8.24.0000
Data04 Maio 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Habeas Corpus Criminal Nº 5018590-62.2021.8.24.0000/SC



RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO


PACIENTE/IMPETRANTE: DAVID PEREIRA DO NASCIMENTO (Paciente do H.C) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: OSVALDO JOSE DUNCKE (Impetrante do H.C) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: LUCETE ADRIANA EGER (Impetrante do H.C) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: MATHEUS PARANHOS MENNA DE OLIVEIRA (Impetrante do H.C) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: ANA CAROLINA MOHR (Impetrante do H.C) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: DAVINER BRUNO MEDEIROS JUNIOR (Impetrante do H.C) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: CAROLINA GEVAERD LUIZ (Impetrante do H.C) IMPETRADO: Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Palhoça


RELATÓRIO


Habeas Corpus distribuído por vinculação ao processo 5006751-40.2021.8.24.0000.
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de David Pereira do Nascimento, contra ato do Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Palhoça, que homologou o flagrante e converteu a prisão em preventiva nos autos n. 5001990-25.2021.8.24.0045.
O paciente foi preso em flagrante no dia 16-2-2021 por ter, em tese, praticado os delitos descritos nos artigos 33 e 35 da Lei 11.343/06. No dia seguinte, a prisão foi convertida em preventiva para a garantia da ordem pública e aplicação da lei penal. Na sequência, o paciente foi denunciado, juntamente com outro indíviduo, pelos mesmos crimes.
Alegam os impetrantes, em suma, a existência de constrangimento ilegal à liberdade do paciente ante a nulidade por invasão de domicílio.
Foi indeferido o pedido liminar por este relator (evento 16).
Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Leonardo Felipe Cavalcanti Lucchese, que opinou pela denegação da ordem (evento 21).
Este é o relatório

VOTO


Após examinar os pressupostos de admissibilidade, verifico que o habeas corpus merece ser parcialmente conhecido.
Cumpre relembrar que o habeas corpus constitui ação autônoma de impugnação, de natureza constitucional, destinada ao especial fim de tutela da liberdade do indivíduo, quando este direito subjetivo esteja sofrendo violência ou coação decorrente de ilegalidade ou abuso de poder (art. 5º, LXVIII, CF e art. 647, CPP).
Tendo em conta a natureza excepcional dessa ação constitucional, assim como suas inerentes características de simplicidade e sumariedade, o habeas corpus apresenta limites cognitivos estreitos, que inviabilizam a dilação probatória e tornam indispensável a demonstração de plano do alegado constrangimento ilegal à liberdade de locomoção do paciente.
Como relatado, por meio do presente writ, busca-se a revogação da prisão cautelar do paciente David Pereira do Nascimento. Passo ao exame da legalidade do ato judicial que determinou a restrição ao ius libertatis deste indivíduo.
No caso concreto, depreende-se dos autos que o paciente foi preso em flagrante no dia 16-2-2021 por ter, em tese, praticado os delitos descritos nos artigos 33 e 35 da Lei 11.343/06. No dia seguinte, a prisão foi convertida em preventiva para a garantia da ordem pública e aplicação da lei penal. O paciente foi denunciado, juntamente com outro individuo, pelos mesmos crimes.
Na sequência, o Juízo da origem examinou pedido de revogação da prisão cautelar, apresentado pela defesa técnica do paciente, oportunidade em que proferiu o ato diretamente impugnado por esta ação (evento 121 dos autos de origem):
Trata-se de petição formulada pela defesa de DAVID PEREIRA DO NASCIMENTO por meio da qual requer o trancamento da presente ação penal, sob o argumento de que houve invasão de domicílio pelos agentes policiais que atuaram na prisão em flagrante dos denunciados, bem como a revogação da prisão preventiva, por entender estarem ausentes os requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal (evento 109).
Com vista dos autos, o Ministério Público requereu a rejeição das teses apresentadas pela defesa, bem como a manutenção da prisão preventiva (evento 114).
A defensora dativa - Dra. Luara Bernardino, OAB/SC 59755 - anotando que o réu Hassler de Jesus Wratny constituiu advogado, requereu a fixação de honorários, por isso que apresentou resposta à acusação no ev. 73.
É o relatório.
Decido.
1. A defesa de David Pereira do Nascimento sustenta que os policiais não poderiam ter adentrado à residência dos réus, porquanto não possuíam autorização judicial para tanto, bem como porque a situação de flagrante emergencial que justificaria a violação de domicílio não restou demonstrada.
A alegação, contudo, não merece prosperar.
É certo que a casa é o asilo inviolável do indivíduo, assim como determinado pelo art. 5º, XI, da CF. Nada obstante, o legislador, ao mesmo tempo que estabeleceu a tutela domiciliar, apontou as exceções à inviolabilidade residencial. Dentre elas está a de flagrante delito, a ser aplicada ao caso.
A respeito, o Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral, que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial se revela legítimo quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo situação de flagrante delito no interior da residência (RE n. 603.616/RO, Rel. Ministro Gilmar Mendes, Dje 8/10/2010).
No caso em exame, as circunstâncias até então apuradas do caso concreto justificaram a entrada da polícia nas residências dos denunciados pois, segundo relatado no boletim de ocorrência e depoimentos dos policiais prestados na fase indiciária, durante a abordagem do veículo VW/Jetta, de cor prata, em que estavam os acusados, a guarnição apreendeu certa quantidade da droga conhecida como skank em uma mochila e, diante do nervosismo apresentado pelos suspeitos, da informação repassada por populares de que o veículo constantemente ia até a casa de n. 99, bem como pela admissão pelo acusado Hassler de que em sua casa teria mais daquela droga em uma mala rosa embaixo da cama, se dirigiram até residência do denunciado Hassler, onde a própria esposa deste confirmou o armazenamento do entorpecente, o qual foi encontrado na sequência.
Ainda segundo se extrai do boletim de ocorrência, após o denunciado Hassler ter informado voluntariamente a senha de acesso ao celular, foi possível identificar uma conversa mantida com o acusado David, em que este pedia que separasse o entorpecente para venda (Evento 1, P_FLAGRANTE5), o que denota claramente a situação de flagrância.
O delito de tráfico de drogas, cuja consumação é prolongada no tempo e gera estado de flagrância que se protrai enquanto presente (CPP, art. 303), serve como fundamento a autorizar a entrada dos policiais na residência, sem mandado judicial, por se tratar justamente de uma situação de excepcionalidade trazida pelo art. 5º da CF.
Sobre o tema, pertinente a doutrina de Renato Brasileiro de Lima:
"Em seu art. 5º, XI, a própria Constituição Federal autoriza a violação ao domicílio nos casos de flagrante delito, seja durante o dia, seja durante a noite, e independentemente de prévia autorização judicial. Em relação aos crimes permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência. Logo, estando o agente em situação de flagrância no interior de sua casa, será possível a violação ao domicílio sem mandado judicial. [...] Nesses casos, para que a polícia possa adentrar em uma residência sem mandado judicial, exige-se aquilo que se costuma chamar de "causa provável" (no Direito norte-americano, probable cause), ou seja, quando os fatos e as circunstâncias permitiriam uma pessoa razoável acreditar ou ao menos suspeitar, com elementos concretos, que um crime está sendo cometido no interior da residência" (Legislação Criminal Especial Comentada. Rio de Janeiro. Editora Impetus, 2013. p. 750-751).
E o doutrinador continua:
"A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, portanto, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que, dentro da casa, havia situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados. (...). Enfim, deve haver um controle a posteriori, exigindo-se dos agentes estatais a demonstração de que a medida fora adotada mediante justa causa, ou seja, que havia elementos para caracterizar a suspeita de flagrante delito no interior daquele domicílio, autorizando, pois, o ingresso forçado, independentemente de prévia autorização judicial. (Manual de processo...

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